sexta-feira, janeiro 21, 2005

THERE AIN'T NO CURE FOR THE SUMMERTIME BLUES

FODA-SE O VERÃO. Sim, foda-se mesmo. Caguei para o festivalzinho da rede dona do pedaço, caguei para o skol spirit, para a ilha de caras, camarotes de carnaval que prometem o paraíso na terra e essa gentalha feliz que parece viver num desses comerciais de telefonia celular: todo mundo é lindo, sarado e só falta sair flutuando de tanta felicidade (e tudo por causa de um celular). Fala sério, é tudo muito nojento, fake até o cú fazer bico.

Por conta disso, resolvi fazer finalmente um post sobre uma das minhas bandas preferidas desde... desde sempre mesmo.

Se você, assim como eu, está cagando e andando para o verão e toda a sua forçada alegria, uma boa dica é se trancar em um quarto (de preferência com ar-condicionado, ou no mínimo um ventilador) para ouvir os Cowboy Junkies, a melancólica banda canadense que, pelo que sei, nunca gozou de muita popularidade na terra da alegria.

Também, pudera: seus discos costumam ser verdadeiros tratados sobre a tristeza, a solidão e os desencontros amorosos dos personagens de suas letras. O som, ouso arriscar, seria um feliz (opa) cruzamento de Velvet Underground com Neil Young. Um híbrido de rock alternativo com country rock e uma pitada de blues. Peraí! Mas isso não é o tal do alt-country, Franchico?

É, né? Fazer o quê? Os Vaqueiros Viciados já estavam em cima do lance desde 1984, quando o guitarrista Michael Timmins e o baixista Alan Anton fundaram a banda. Em 1985 entram em cena os irmãos de Michael, Peter e Margo Timmins, na bateria e vocais, respectivamente, fechando a formação que perdura até hoje, um caso raro no cenário do rock, tão afeito a vontades, chiliques e ataques de estrelismo.

Ah, quantos devaneios noturnos (e diurnos tb) a maravilhosa voz etérea da musa Margo já não embalaram, quantas vezes o som quase sempre limpo da guitarra perfeita de Michael já não nos transportou para a paisagem gelada das florestas de pinheiros canadenses, aquela imensidão, aquela solidão reconfortante, longe de toda essa podridão que nos cerca? Pois é, o som do Cowboy Junkies é capaz de tudo isso e muito mais. Por isso é que eu digo: Cowboy Junkies é O som do verão, pra mim.

Feita esta breve introdução, passemos agora a uma rápida discografia comentada, com links para a página de cada disco no site All Music, para quem quiser conferir.

Whites Off Earth Now!! (1986) - O primeiro disco do CJ é quase uma coletânea de covers (só uma faixa, Take me, é de autoria própria) muito bem escolhidos entre standards do blues e country rock. John Lee Hooker, Robert Johnson, Bruce Springsteen e Lightnin Hopkins dizem presente nessa coleção de canções que já mostrava a quê os Junkies vieram. Nunca lançado no Brasil, esse disco, um lançamento independente gravado com um único microfone, é um dos poucos que eu nunca ouvi, mas diz que Margo já canta maravilhosamente aqui.

The Trinity Session (1988) - Como definir a perfeição? Como tentar descrever o indescritível? Como passar para a tela do computador toda a extraordinária sensação narcótica provocada pela simples audição dessa obra de arte? Com The Trinity Session, o CJ atingiu um patamar de qualidade tão alto, que muita gente até hoje acha este o melhor disco do grupo. Eu gosto tanto da banda em sua plenitude que hesito muito em concordar com a tese de insuperabilidade (essa palavra existe?) desse álbum, mas se tivesse que escolher UM só na discografia para levar comigo para uma ilha deserta, muito provavelmente, seria esse mesmo. Gravado em uma única noite (e que noite mágica deve ter sido) em uma igreja abandonada em Toronto, a The Holy Trinity Church, e novamente com apenas um microfone e um gravador DAT, esse disco catapultou os Cowboys para a fama no circuito das college radios no Canadá e EUA. Lembro que na época, foi até lançado em vinil no Brasil, para gozo dos críticos da Bizz e um ou outro gato pingado que teve a felicidade de adquiri-lo na época, como o verme-mór Sérgio Cebola (exímio conhecedor da obra dos irmãos Timmins). É desse disco seu maior hit, ironicamente, um cover do Velvet, Sweet Jane, posteriormente popularizado pela trilha sonora do filme Assassinos por natureza, de Oliver Stone, que ainda teve a pachorra de incluir diálogos dos personagens no meio da música. Mala. Outra cover bem legal constante desse álbum é Blue Moon Revisited (Song for Elvis), a melhor e mais tocante homenagem ao Rei que eu já ouvi na vida. Voltando o disco em si, não tem essa de melhor ou pior faixa: trata-se de um álbum coeso, para ser ouvido em sua totalidade, do início ao fim sem pular uma faixinha sequer. Se vc nunca ouviu a banda e quer conhece-la, comece por este aqui, que não tem erro: é paixão na certa.

The Caution Horses (1990) - É natural: depois de um disco amplamente celebrado tanto pela crítica quanto pelo público, qualquer banda treme nas bases na hora de gravar seu sucessor. The Caution Horses se ressente exatamente dessa tensão: não é maravilhoso como seu antecessor, mas analisado isoladamente, revela-se uma bela coleção de canções delicadas, etéreas, perfeitas para serem ouvidas em uma tarde fria e cinzenta. Destaque para a cover da clássica Powderfinger, do pai Neil Young e as belíssimas Sun comes up its tueday morning e Escape is so simple.

Black Eyed Man (1992) - Esse foi o disco dos Junkies que me ganhou. Até então, já tinha ouvido falar da banda, mas nunca havia dado muita atenção, confesso. Até que, por volta de 1993, 94, me caiu nas mãos uma fita cassete com esse álbum gravado. E foi amor a primeira mordida. Os vocais por vezes narrados, por vezes cantados de Margo são um deleite para qualquer pessoa com um mínimo de sensibilidade, rocker ou não. Os arranjos, com uma roupagem ligeiramente (mesmo) mais pop deram o upgrade necessário no som da banda, para que não soassem tão sonolentos quanto no cd anterior. As primeiras seis músicas são perfeitas, devem ser sorvidas de uma talagada só, sem parar. O resto do disco mantém o nível, claro, mas com um tantinho menos de coesão quanto esse lado A. O dueto com o cantor John Prine (who?) na valsa If you were the woman and I was the man permanece ainda hoje como uma das mais românticas e sofisticadas canções de amor já registradas em vinil, coisa de fazer Cole Porter corar (ou chorar). Tudo o que o 10.000 Maniacs sempre quis fazer na vida, mas nunca teve talento bastante.

Pale Sun, Crescent Moon (1993) - Lançado ano seguinte, esse cd certamente não é tão brilhante quanto o Black eyed man, mas continua a trilha aberta por ele ao atualizar ainda mais o som do grupo, sem descaracteriza-lo. Ótimo de ouvir do início ao fim, Pale sun marca o fim do contrato do CJ com a gravadora RCA e traz ainda um cover do Dinosaur Jr, a faixa The post. A voz de Margo continua absolutamente sedutora e a execução instrumental, certamente inequívoca. Pode comprar de olhos fechados, que o meu eu já ganhei no meu aniversário em 1998, de quem? De quem? Ora, do reverendo Cebola, claro. Quem mais? Valeu, dodjão!

Lay It Down (1996) - Considerado o álbum mais rock dos Junkies, Lay it down foi o primeiro lançamento deles pela Geffen e mostrou como é que se muda o som de uma banda sem deixar que se perca o seu sabor característico e seu clima intimista. Aqui os acordes de guitarra estão mais sujos e mais altos e as levadas de bateria mais velozes e dinâmicas. Mas ainda assim, são os Junkies fazendo o que sabem fazer melhor: country rock melodioso, com claras influências do conterrâneo Neil Young.

Miles from Our Home (1998) - Ah, esse é um dos meus preferidos, junto com o Trinity session e o Black eyed man. Por que? Na época em que saiu (e eu comprei logo em seguida), eu não sabia, mas hoje, olhando em retrospecto, dá para arriscar que esse disco é um feliz cruzamento (onde foi que eu já li isso hoje?) entre as guitarras altas do Lay it down com as melodias matadoras do já citado Black eyed man. Diz que o crédito desse fato se deve à produção puta velha de John Leckie (que já havia a polido as gemas The Stone Roses, o primeiro da banda e The Bends do Radiohead). Mas na boa: pérolas como New dawn coming, The Summer of discontent e Darkling days, entre outras (o álbum é todo bom, sem brincadeira) já devem nascer prontas, lindas que só. Necessário, fundamental para quem quer conhecer o que essa banda fez de melhor.

Waltz Across América (2000) - Chutados da Geffen, o Junkies soltam de forma independente (pelo seu próprio selo, Latent Records) esse CD ao vivo, infelizmente nunca lançado no Brasil. Deve ser uma boa porta de entrada para neófitos, vide a feliz seleção de clássicos Junkies escolhida para entrar no álbum. Do lado de cá, só dá para imaginar que delícia que deve ser testemunhar um show dessa turma.

Open (2001) - Esse foi lançado aqui (uns dois anos depois) pela Sum. Trata-se de um álbum um tanto mais urbano dos Junkies, onde a faceta Velvet Underground sobressai mais claramente que a Neil Young. Beleza, não é brilhante, mas ainda contém seus momentos como Upon still waters (a curly blonde disaster...), I?m so open e algumas outras. Michael Timmins continua em excelente forma guitarrística.

One Soul Now (2004) - Recém-lançado lá fora, diz que é mais um bom disco da gangue dos Junkies. Esperemos que alguma boa alma se dê ao trabalho de lança-lo por aqui.

Além desses álbuns de carreira, o CJ têm algumas boas coletâneas que servem como introdução aos neófitos que preferem ouvir o som da banda em sua plenitude antes de mergulhar em suas obras mais específicas. Recomendados: Studio: Selected Studio Recordings 1986-1995 e Rarities, B-Sides and Slow, Sad Waltzes.

Por hoje é só. Stay Junky.

10 comentários:

Anônimo disse...

Ivete com camisa de Ramones é mesmo mal e bem que ela podia posar nua, não para a Playboy que é chique mas para estas revistas bem bagaceira como Private com uma calçolinha con estampa do Silvano Sales. Já o Cowboy Junkies com certeza não é muito ouvido pela galerinha rocker de Salvador que prefere baboseiras como Flaming Lips e bandas imaginárias soturnas do tipo Altered Shoes For Miserable Personalities.

Franchico disse...

Concordo e discordo. Concordo com a primeira parte de seu comentário. Playboy é mesmo muito chique pra ela. Rudolf Sexo Bizarro seria mais apropriado. Agora, qto ao Flaming Lips, devo discordar. Trata-se de uma grande banda, uma das melhores das últimas décadas, qualquer dúvida é só ouvir seus dois últimos discos de estúdio, lançados em 1998 e 2002. E a razão da galerinha rocker de Salvador não se ligar muito em Cowboy Junkies não é o Flaming Lips, não. Muito antes eu poria a culpa nas desgraças do hardcore melódico e nu metal, massificados pela televisão. mas valeu seu comentário, Anônimo. apareça (de preferência, assinando seu nome, valeu?).

osvaldo disse...

Calma Chicão.Já vi que o verão não é sua estação favorita, tambem não é a minha, apenas aprendi a não me incomodar tanto com a Faustinada(olhaê Miguel), deixa eles se lambuzarem.O que me incomoda mesmo é (como diz Pitty)a falta de opção, a ditadura monocultural.Mudando de um polo a outro, o Trinity Session saiu na epoca no Brasil, comprei em...fita K-7! e é um discaço(no caso uma fitaça).Mas nesta praia sou mais o Walkabouts(mais viceral e pesado), nem mesmo a maravilhosa Margo Timmins faz frente a diva Carla Thorgensen. Quanto a esse lance de Ivete, não me surpreende não.O proximo passo deve ser lançar uma versão arrocha/axé de I wanna be Sedated(de loló).

osvaldo disse...

Sorry Carla dear, é Torgerson e não Thorgersen, farei um post em breve.

Anônimo disse...

Miguel Cordeiro
O Trinity Session foi relativamente bem comentado aqui no Brasil na época do lançamento. Eu também tive uma fita K7 que ouvi tanto que o tape deck mordeu e terminou partindo mas guardei a capinha como memorabilia. O Cowboy Junkies não dá bola fora e graças a Deus não faz parte de esquema nenhum. Quanto ao summertime blues concordo com osvaldo. Não adianta esquentar a cabeça porque coisas piores ainda vão pintar na terra do axé, afinal rust never sleeps. A baianidade é a disneylandia dos Faustinos.

Anônimo disse...

Miguel Cordeiro
O Trinity Session foi relativamente bem comentado aqui no Brasil na época do lançamento. Eu também tive uma fita K7 que ouvi tanto que o tape deck mordeu e terminou partindo mas guardei a capinha como memorabilia. O Cowboy Junkies não dá bola fora e graças a Deus não faz parte de esquema nenhum. Quanto ao summertime blues concordo com osvaldo. Não adianta esquentar a cabeça porque coisas piores ainda vão pintar na terra do axé, afinal rust never sleeps. A baianidade é a disneylandia dos Faustinos.

cebola disse...

Valeu, Chiconha, boa dica para o verão. Recomendo tb, no mesmo clima, o mojave 3 ( Excuse for Travellers ) e pros momentos mais agitados, uma das minhas bandas preferidas de todos os tempos, e ainda em atividade, o Wilco( qualquer disco ).

Franchico disse...

uma das coisas mais legais de fazer esse blog é q a galera amiga sempre comparece, contribuindo com seus conhecimentos e enriquecendo todos os que lêem. eu acho.
esses dias eu ando meio descontrolado, "quebrando objetos inúteis como quem leva uma topada", "disparando tiros a esmo". afinal, como diz essa velha canção, "eu não posso causar mal nenhum, a não ser a mim mesmo". deve ser o calor. ou pior, a forma como estamos (estou) vivendo. vou tentar me segurar mais, não adianta ficar tacando pedra em vidraça que eu não tenho nem altura para alcançar. eu morro e a merda continua aí, dominando tudo e todos. (como se eu fosse detentor de alguma grande verdade. rá.) após esse breve desabafo, vamos responder aos amigos: Márcio, vc vai ficar por aí esse carnaval? como eu num tenho um puto pra viajar ou fazer porra nenhuma mesmo, vamos marcar essa session. Braminha, já tinha lido alguma coisa (acho que em alguma antiga Bizz) sobre esse Walkabouts, mas nunca ouvi. vamos fazer esse intercâmbio? valeu, Cebola e Miguel, pela presença nos comments, e contem comigo pra manter essa bagaça de pé.

Franchico disse...

ah, Cebola, esse cd do Mojave 3 eu já tenho há tempos, e é maravilhoso mesmo. o Wilco dispensa comentários e é uma das minhas preferidas desde que consegui botar minhas mãozinhas suadas no Yankee Hotel Foxtrot, em 2002. eu queria mesmo era uma cópia do A.M., qualquer hora dessas a gente combina isso aí.

osvaldo disse...

Eu só quero dizer que "The Caution Horses" é uns dos melhores titulos, frase, nome de cd, sei lá , ever.O disco não é dos melhores dos C.J., mas esse titulo, sei não, quem poderia pensar numa coisa dessas?, Os Cavalos da Cautela, ou Cautelosos, não sei, me parece alguem na beira do precipicio dizendo que precisa dos cavalos da cautela.