quarta-feira, junho 05, 2013

GUITARRA VERSUS SAX: PAT METHENY TRAZ SHOW DA SUA UNITY BAND À CIDADE

O guitarrista norte-americano Pat Metheny nunca foi nenhuma unanimidade.

Maravilhou meio mundo com álbuns como 80/81 (1980) e Offramp (1981).

Horrorizou em igual medida, ao adotar a guitarra sintetizada Roland GR-300, um trambolho que logo foi abandonado.

Referência da guitarra no jazz dos últimos 40 anos, o Pat traz o show do seu mais recente trabalho, Unity Band, para Salvador, no dia 12 de junho, dentro da edição 2013 da Série TCA.

Fã declarado de música brasileira, Pat já tocou com gente do quilate de Naná Vasconcelos, Ivan Lins, Tom Jobim, Milton Nascimento e Toninho Horta.

“Para mim, o Brasil viveu uma ‘era de ouro’ da música entre os anos 1960 e 70, mais ou menos como aconteceu nos Estados Unidos entre as décadas de 1940 e 50, com o surgimento do be bop (jazz moderno)”, opina Pat, em entrevista por email.

Para ele, foi justamente a proximidade que havia entre as músicas brasileira e norte-americana que possibilitaram um “diálogo natural” entre ele e os músicos brasileiros.

“Aquele momento particular da MPB foi talvez a última vez, em qualquer forma de música popular, na qual harmonia e acordes desempenharam papeis centrais no aspecto formal do que torna esta forma de música tão atraente”, observa.

De fato, Pat chegou a morar no Brasil por um tempo nos anos 1980 e visitou Salvador, mas não chegou a se apresentar por aqui. Daí seu entusiasmo pela visita de daqui a alguns dias.

“Estou muito animado por chegar até aí desta vez. Já visitei a cidade e adorei, mas não tive a chance de tocar. Por isso mesmo, estou planejando um longo repertório”, avisa Pat.

“Ainda que o foco esteja nas músicas do disco da Unity Band, vamos cobrir um largo espectro dos meus trabalhos”, diz.

Guitarra e sax na frente

Formada por Chis Potter (sax tenor), Antonio Sanchez (bateria) e Ben Williams (baixo), a Unity Band surgiu da admiração de Pat pelo sax de Potter.

Na verdade, esta é a primeira vez que ele trabalha com um saxofonista na linha de frente com sua guitarra –  até mesmo dobrando os acordes (quando os dois instrumentos tocam juntos a mesma linha melódica).

“Tenho sido muito sortudo, por que pessoas que adoro como fã, eventualmente se tornam colaboradoras e amigas”, afirma o músico.

Lá fora, já fez parcerias com nomes de peso como  Herbie Hancock,  Ornette Coleman,  Sonny Rollins, Brad Mehldau e até David Bowie (no hit This Is Not America).

“Mas cada músico com quem toquei me ofereceu uma janela para diferentes formas de pensar. Adoro estar entre pessoas com pontos de vista fortes e habilidades musicais profundas que se  manifestam nessas visões de realidades musicais”, viaja Metheny.

Como todo jazzista de estirpe, Pat tocado em dois ou três projetos ao mesmo tempo. Seu último CD é uma releitura de obras de John Zorn:  Tap: John Zorn's Book of Angels Vol. 20.

“Este  é um projeto especial, no qual eu arranjei radicalmente as notas, de forma que quase as transformei em outra coisa. Mas não importa como você a trate, a escrita de John sempre retém sua força musical própria”, conclui Pat Metheny.

Pat Metheny & Unit Band / 12 de junho (quarta-feira), 21 horas / Teatro Castro Alves / R$ 100 (filas de A a P), R$ 80 (Q a Z) e R$ 60 (Z1 a Z 11) / Vendas: bilheteria TCA e SACs Barra e Iguatemi


BOLLAND STRIPS! O ARTISTA DE CAMELOT 3000 E A PIADA MORTAL SE DESNUDA EM TRABALHOS AUTORAIS

Ídolo dos fãs no Brasil desde que abrilhantou com seus incríveis desenhos obras clássicas como Camelot 3000 e Batman: A Piada Mortal, Brian Bolland não tinha nenhum trabalho autoral só seu publicado por aqui.

Com o  recém-lançado álbum Bolland Strips! (Ed. Nemo), essa lacuna acaba de ser preenchida.

Dono de um dos traços mais firmes e precisos  da história das HQs, ele mostra aqui sua produção independente, já que até agora, só o que se conhecia dele no Brasil eram seus trabalhos para a DC Comics, já citados.

Basicamente, o álbum se divide entre duas séries escritas e desenhadas por artista inglês para editoras europeias: A Atriz & O Bispo e Sr. Mamoulian, mais algumas HQs curtas e ilustrações de portfólio.

Quem procurar por aqui traços dos seus trabalhos mais conhecidos vai quebrar a cara.

Mas pode ser recompensado com a descoberta de um artista muito mais completo e intrigante do que se supunha.

Bolland é famoso pelos desenhos detalhistas para Camelot 3000 e A Piada Mortal, HQ clássica do Batman escrita por Alan Moore.

Neste álbum, os fãs poderão descobrir um artista muito mais complexo do que  se imaginava por aquelas HQs.

A Atriz, o Bispo e o perplexo

A Atriz & O Bispo é sobre este estranho casal, formado por uma espevitada beldade em roupas provocantes e um senhor idoso, sempre em trajes eclesiásticos.

Eles vivem de forma muito comum,  em uma casa de subúrbio em Londres.

Os desenhos são no mais puro estilo Bolland clássico: detalhistas, hachurados, expressões faciais no limite do realismo fotográfico.

Mas são nos textos que o autor surpreende: é tudo em quadras, versos de quatro linhas que soam quase como nossos cordeis nordestinos (ponto para a tradução cuidadosa de Cassius Medauar, acrescente-se).

Como o próprio Bolland escreve em um texto introdutório, Sr. Mamoulian, a série seguinte, foi produzida em estilo bem mais despojado por que “desenhar estava me dando muito trabalho na época”.

Dado o nível de detalhismo que ele imprime em praticamente tudo o que faz, não pega bem culpá-lo.

Até por que Mamoulian também não decepciona.

Sujeito estranho, de olhos arregalados, cabelos espetados, acima do peso e em eterna expressão de estupor, Bolland diz que Mamoulian é ele mesmo.

Se for, representou muito bem sua perplexidade, característica inerente à quem se propõe artista.

Bolland Strips! / Brian Bolland / Tradução: Cassius Medauar / Nemo / 96 páginas / R$ 38 / www.editoranemo.com.br

terça-feira, junho 04, 2013

ATO 5: PUNKS BAIANOS DE PRIMEIRA HORA FAZEM SHOW COM CAMISA NA SEXTA


A Coletânea O Rock Loco hoje volta no tempo, mas retorna já já para o agora.

Em meados dos anos 1980, toda uma cena roqueira se formou, catalisada pelo estouro do Camisa de Vênus e do chamado BRock.

Escaldada e sufocada após o fim recente da ditadura militar, jovens de todas as classes sociais encontraram no rock sua forma de expressão de preferência.

Aqui, bandas punk e o pós-punk pululavam, para horror da tradicional família baiana.

Uma fértil cena de bandas punk e pós-punk surgiu, circulando por points como a loja Not Dead, Teatro Vila Velha, Clube de Engenharia, Solar Boa Vista, bares como o Manga Rosa, Espaço Bleff e outros.

Em em meio à tudo isso, uma rapaziada punk do bairro de São Caetano resolveu protestar.

Mas protestar mesmo, começando pelo nome da banda que formaram: AI-5.

“Ticka (Sinval carlos, baterista) era amigo de infância de Tinho (baixista), lá na Fazenda Grande do Retiro. Aí, quando Tinho foi morar no São Caetano, a gente se conheceu”, relata Neilton, vocalista.

“Tinho e Ticka já tinham uma banda chamada Revolta Suburbana, que tocou com o Cólera em Salvador, em 1984”, diz.

Rapaziada humilde, mas esclarecida, esses caras circulavam pelos shows da cena local: “Em 1986, rolavam shows do Camisa, Dever de Classe, Proliferação, Via Sacra, Velorium e outras. A AI-5 já estava formada, só não tinha tocado ainda”, diz.

O primeiro show foi em 1987, no Clube de Engenharia, um dos espaços que reunia o povo do rock, assim como a loja Not Dead, Teatro Vila Velha, Clube de Engenharia, Solar Boa Vista, bares como o Manga Rosa, Espaço Bleff e outros.

Aí começou a saga da AI-5 (Ato Institucional 5), nome que, como se sabe, carrega um karma pesado ao citar o golpe definitivo da famigerada ditadura militar contra a democracia.

“Logo no primeiro cartaz que colamos na rua, um senhor desceu de um carro e disse: ‘vocês são malucos, estão fazendo apologia a isso’? Aí respondemos que era justamente o contrário, somos contra o militarismo e tal. Aí até ele disse que ia no show”, lembra Neilton.

Em outra ocasião, a banda foi entrevistada pelo lendário radialista Baby Santiago em uma emissora local: “Ele disse que ia entrevistar a gente, mas não ia pronunciar o nome da banda. O pessoal ainda tinha muito medo, mesmo com a ditadura já encerrada”, afirma Neilton.

Punk's not dead

O tempo passou e, depois de muitos shows e participações engajadas em protestos organizados por sindicatos e outras entidades, membros começaram a sair.

Em 2010, Ticka e Neilton, os remanescentes, resolveram reformar a banda, agora como Ato 5.

Lançaram CD em 2011 e, nesta sexta-feira, tocam com o Camisa de Vênus.

Assistir às duas bandas é testemunhar a própria história do rock local.

Além de Neilton e Ticka, a Ato 5 atual conta com Alan e Cristiano Ferreira (guitarras) e José Carlos (baixo).

Fotos: Arquivo da banda Ato 5.

Ato5 e Camisa de Vênus / sexta-feira, 19 horas / Cine Teatro Solar Boa Vista (Engenho Velho de Brotas) /  R$ 15

NUETAS

São Caetano calling
Como se vê na matéria da Ato 5 aí ao lado, São Caetano é pólo cultural alternativo não é de hoje. Neste sábado, um dos projetos que movimentam o bairro, o Radiola Alternativa, faz sua primeira edição em casa nova: espaço Gangara (defronte Colégio Ramo da Videira). Sábado, com as bandas Latryna, The Lex e Os Caras da Rádio. 17 horas, R$ 3.

Dimazz hoje, no TVV
Dimazz segue com sua residência mensal na Vila da Música. Hoje ele recebe Cascadura e o Camará Ensemble - Grupo de Câmara da Ufba. Diversidade musical recomendada. Sala Principal do Teatro Vila Velha, 20 horas, R$ 30 e R$ 15.

Bons sons vezes 2
Scambo & Sertanília dividem o palco do Portela Café nesta sexta-feira. Às 22 horas, R$ 20 (antecipado, na Midialouca). Na porta, sobe para R$ 25.

Tchaikovsky Fest na quinta

A Orquestra Sinfônica da Bahia (OSBA) realiza nesta quinta-feira, seu Festival Tchaikovsky, com a pianista brasiliense Ligia Moreno (ao lado) como solista convidada e regência de Eduardo Torres. No programa do concerto em homenagem ao mestre Romântico russo Piotr Ilitch Tchaikovsky (1840-1893), estão as peças Elegia; Concerto para Piano nº1 em Sib Menor op.23 e a Sinfonia nº6 Patética. Quinta-feira (dia 6), às 20 horas, na Sala Principal do Teatro Castro Alves, R$ 20 e R$ 10.

segunda-feira, junho 03, 2013

70 ANOS: JUNKY, DE WILLIAM BURROUGHS, VOLTA EM EDIÇÃO DEFINITIVA - E AINDA É O MAIOR BARATO


Para falar de Junky - Drogado, o clássico beat de primeira hora de William S. Burroughs (1914-1997), é preciso ter em mente duas coisas.

Uma: jamais julgar. Duas: mandar a hipocrisia classe-média  às merecidas favas.

Por que Junky é assim: sem retoques, sem meias palavras, sem julgamentos.

Publicado originalmente nos Estados Unidos em 1953, a obra relata o dia-a-dia de Bill Lee (o próprio Burroughs), um viciado (junky, na gíria) em heroína (junk) e no que mais pintar.

O estilão anavalhado, seco mesmo – quase noir – da narrativa em primeira pessoa, além da absoluta amoralidade ou propósito do personagem principal (fora se drogar) fez com que Junky fosse considerado “impublicável” na época.

Falar de drogas pesadas  era uma coisa tão complicada (na verdade, ainda é), que o poeta Allen Ginsberg nota, na introdução desta edição, que “se alguém dissesse em voz alta ‘fumo’ no ônibus ou no metrô, podia ser preso. Mesmo que estivesse apenas discutindo mudanças na legislação”.

Foi Ginsberg (o célebre autor de Uivo), o grande incentivador de Burroughs, ao lado de outro poeta beat: Carl Solomon (De Repente, Acidentes). Juntos, eles foram os responsáveis por botar Junky nas bocas.

Solomon era sobrinho do dono da editora Ace Books. Assim, Junky foi publicado não apenas com diversos cortes, mas em uma esdrúxula edição Two Books in One (dois livros em um), com outro livro no verso, escrito por um ex-agente da Delegacia Federal de Entorpecentes.

Esta edição, felizmente, não só não traz o dispensável livrinho moralista do cana, como chega, pela primeira vez, com o texto integral, sem cortes.

Para confirmar o caráter “definitivo” anunciado na capa da presente edição, a tradução é do mesmo Reinaldo Moraes que já havia traduzido a versão publicada pela Brasiliense nos anos 1980.

Para quem não sabe, Moraes é autor daquele que talvez seja o maior clássico beat brasileiro: Tanto Faz (1981).

Tão direto que fica cômico

Em tempos que se discute a legalização da maconha e uma mudança de paradigmas no combate ao tráfico e tratamento de viciados, Junky oferece uma visão sobre o tema das drogas tão descompromissada com a seriedade inerente ao assunto, que recomendar sua leitura como referência seria, no mínimo, uma irresponsabilidade.

É esse mesmo descompromisso, porém, que torna sua leitura tão fascinante.

Alguns trechos são tão absurdamente diretos que chegam a ser cômicos, de tão subversivos.

Exemplo: quando adota o uso de cocaína para se livrar da heroína, o narrador faz as seguintes considerações: “Coca é puro barato. Te deixa ligadão – uma ligação mecânica que começa a te abandonar mal você começa a senti-la. (...) Mas no que a cocaína abandona seu organismo, você esquece por completo dela. Cocaína não provoca dependência”.

Hum, hum.

Incorreção política à parte, Junky deve ser lido pelo que é: um clássico de sua época.

Junky - Drogado - Edição Definitiva / William S. Burroughs / Companhia das Letras/ 176 p./ R$ 37/ E-book: R$ 26/ www.companhiadasletras.com.br