segunda-feira, agosto 20, 2018

MEGA MANGÁS

Obras clássicas para adultos do quadrinho japonês chegam ao Brasil em edições caprichadas. Temas vão do folclore à temas sociais pesados, como corrupção e máfia

Ayako: obra de gênio de Osamu Tezuka
Nem só de robôs gigantes, bichinhos fofos e samurais do tempo do Toshiro Mifune (pergunte ao seu avô) vivem os quadrinhos japoneses.

Nos últimos meses, livrarias e comic shops tem recebido uma magnífica leva de obras-primas em mangá para adultos.

Aqui destacamos três dos melhores quadrinhos lançados este ano no Brasil – em qualquer gênero: Ayako, de Osamu Tezuka; NonNonBa, de Shigeru Mizuki e Tekkonkinkreet, de Taiyo Matsumoto.

A despeito de serem três obras-primas produzidas em diferentes épocas, o destaque fica mesmo com Ayako.

Quem conhece quadrinhos sabe o porque pelo mero mencionar de seu autor: Osamu Tezuka (1928 - 1989), também conhecido como Manga no Kamisama, o deus do mangá.

Criador de Astro Boy, autor de outros mangás antológicos como Buda e Adolf, Tezuka foi um dos maiores gênios da arte da narrativa sequencial, ombro a ombro com outros mestres como Carl Barks (a mente criativa por trás de Walt Disney), Will Eisner, Stan Lee & Jack Kirby e Robert Crumb.

NonNonBa e suas assombrações
Em Ayako, Tezuka construiu um dos maiores paineis sociais do Japão pós-guerra em qualquer linguagem – literatura, TV e cinema incluídos.

Com mais de 700 páginas, a obra (em bela edição capa dura da Veneta) é absolutamente viciante, como os melhores romances clássicos.

Tudo começa quando Jiro Tenge retorna da guerra, depois de anos como prisioneiro dos americanos –  uma imperdoável desonra entre os japoneses. Seu pai, Sakuemon, um influente latifundiário em sua região, o “recepciona” dizendo-lhe que preferia que tivesse morrido em combate e que está deserdado.

Na sequência,  Jiro descobre um vergonhoso segredo no seio de sua família.

Para completar, o próprio Jiro carrega seus segredos e vergonhas de guerra.

A partir daí, a trama só se intensifica a cada página, envolvendo diversos aspectos da sociedade japonesa no pós-guerra, como a paranoia anticomunista, espionagem, choques de gerações, luta de classes, corrupção política, Yakuza (máfia), machismo.

O visual alucinante de Tekkon Kinkreet
Sem contar as inúmeras perversões caseiras da família Tenge, coisa de fazer corar as faces de   Nelson Rodrigues.

Junte-se a isso tudo a imensa maestria gráfica de Tezuka e o que se tem é uma obra-prima irretocável em todos os aspectos.

Youkais e meninos de rua

Os outros dois lançamentos (NonNonBa e Tekkonkinkreet) inauguram o selo Tsuru, da editora Devir, dedicado a lançar somente a nata dos mangás adultos, entre clássicos e contemporâneos.

E começou bem, lançando duas grandes obras bem diversas entre si. NonNonBa é uma deliciosa reminiscência lírica da infância de seu autor, Shigeru Mizuki (1922-2015), em sua cidade, Sakaiminato.

A grande estrela de  NonNonBa é a avó do autor, uma senhorinha muito fofa que sabia tudo dos youkais, espíritos-monstros do folclore japonês.

Shigee-san, alter-ego do autor na infância, vivia aterrorizado com os tais youkais, por isso não desgrudava da avó, que o ajudava a enfrentar seus medos.

Delicada, engraçada e tocante, NonNonBa é outra leitura agilíssima e um clássico inescapável dos mangás.

Em Sakaiminato, Mizuki é tão querido que lá existe uma rua com seu nome, decorada com mais de 100 estátuas de bronze dos seus personagens.

Tekkonkinkreet, por outro lado, é completamente diferente. Nele, acompanhamos as aventuras de dois meninos de rua, Kuro (preto) e Shiro (branco), que se movem pela cidade como entidades parkour, entre postes e tetos de edifícios.

Eventualmente, acabam entrando em choque com a Yakuza, que busca dominar a sua cidade, a fictícia Takaramachi.

Até aí, nada demais, não fosse o fato de seu autor, Taiyo Matsumoto, ter criado um visual absolutamente alucinante e riquíssimo em detalhes.

A trama em si não deixa por menos, com sequências de ação e violência muito fortes (lembre-se, este não é um mangá para crianças), deitadas sobre o papel de forma vanguardista por Matsumoto, um artista que destoa completamente do visual tradicional da indústria do mangá.

Ayako /  Osamu Tezuka / Veneta/ Tradução: Marcelo Yamashita Salles e Esther Sumi/ 720 p./ R$ 129

NonNonBa / Shigeru Mizuki/ Devir/ Tradução: Arnaldo Oka/ 428 páginas / R$ 89,90

Tekkonkinkreet / Taiyo Matsumoto/ Devir/ Tradução: Arnaldo Oka/ 620 páginas/ R$ 94

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