quinta-feira, abril 06, 2017

HOMERO E CAYMMI SE ENCONTRAM NA ODISSEIA BAIANA DE FILIPE LORENZO - HOJE, NO SESC PELOURINHO

Filipe Lorenzo, foto Rafael Martins
Quem tá ligado já sabe: uma turma nova e talentosa tem renovado a música popular brasileira feita na Bahia.

Nomes como Giovani Cidreira, Ian Lasserre, Bruna Barreto, Dimazz, Jadsa Castro, Kalu e outros tem apresentado trabalhos de alto nível, dialogando com a tradição da MPB, com a cultura popular, com o rock, com o experimentalismo etc.

Um desses “outros” é Filipe Lorenzo, que lança seu primeiro álbum, Odisseia Baiana, com show quinta-feira, no Teatro Sesc Senac Pelourinho.

Professor de História na rede municipal, aluno do curso de Música Popular da Ufba, Filipe promove em sua obra um encontro entre Homero (aquele d’A Odisseia) e Caymmi em plena Baía de Todos os Santos, em uma obra de musicalidade delicada.

“Acredito que Caymmi e Homero se encontram em pontos cruciais da Odisseia. Quero evitar superinterpretações, então busco ser cauteloso neste sentido da conceitualização. De qualquer forma, penso que ambos construíram as suas histórias através do mar e da leitura que fizeram dele. Acredito que são figuras que souberam traduzir o mar e todo o seu mistério, beleza e horror de forma original e inovadora para suas respectivas épocas e povos. Homero é responsável por carregar um quinhão de referências fundamentais para a estruturação da cultura do ocidente, assim como Caymmi é fundamental na construção de uma cultura tipicamente baiana”, arrisca Filipe.

“Posso assim dizer que os dois são referências culturais imortais, souberam trazer a temática do trânsito entre o caos e o cais como transformadores das suas realidades, juntando espiritualidade, aventura, divindades e amores”, diz.

Filipe começou cedo, e como quase todo mundo dessa geração, já passou por banda de rock.

"Comecei a minha relação com a música como apreciador, desde muito cedo. Cresci em casas (pais separados) que se ouvia de Xangai a Beatles, dos Mutantes a Gipsy Kings. Tenho um pai que sempre tocou violão, desde muito jovem tive interesse. Comecei a aprender violão aos 12 anos, tomei aulas com Rubem Tavares e depois comecei a estudar por conta própria.Tive banda quando adolescente, tocava guitarra e buscava uma sonoridade mais voltada para o rock, grunge, heavy metal. Com 17 anos formei o grupo Caracol com alguns amigos, que tinha uma pegada mais samba rock e forte influência do som contemporâneo da época: Incubus, Los Hermanos, Scambo... Após a dissidência do grupo, mudamos a sonoridade e criamos a Panos e Mangas: Eu, Daniel Reuter e Ítalo Marques. A partir daí começamos a tocar mais o universo da MPB, de forma acústica. Voltei ao violão e comecei a cantar algumas canções. Aos 21 anos ingressei na Escola Baiana de Canto Popular, de Ana Paula Albuquerque. Fiz formação lá e cheguei a trabalhar como professor de canto posteriormente, por um tempo. Hoje faço o curso de Música Popular na UFBA desde 2012. Por conta do meu ofício como professor municipal de história, a universidade não tem sido o principal espaço de aprendizagem, mas sim a vivência e experiências de palco e o trabalho pessoal em casa. Quando decidi produzir o disco, em 2015, a Panos e Mangas deixou de se apresentar, decorrente também de demandas externas dos outros integrantes", relata.

A hora de rodar

Filipe Lorenzo, foto Rafael Martins 
Falando (e cantando) bonito assim, não foi difícil atrair grandes músicos para seu projeto, como Mateus Aleluia, Sebastian Notini, Paulo Muttti  e os já citados Ian e Bruna. E mais: Antônio Carlos & Jocafi lhe deram uma música inédita para ele gravar: Mirê Mirê.

“Fico muito honrado em fazer parte desta nova cena musical baiana... costumo dizer, sem falsa demagogia, que sou fã dos meus parceiros. Pois suas canções e criações me emocionam e me tocam da mesma forma que muitas canções de grandes mestres da MPB. Acredito que é uma cena que vem se fortalecendo nos últimos 5 anos, através principalmente do intercâmbio de canções e de participações. Desde o meu projeto da Panos e Mangas, sempre tive o desejo de unir músicos, musicistas e compositores(as) nas apresentações. Promovemos encontros e a partir daí se abriu um campo frutífero de produção... me entendo no meu projeto pessoal não só como compositor mas também como intérprete e estou sempre antenado à procura de novas parcerias e canções que possam integrar o repertório. Vejo que é uma cena que tem referências similares do que se compreende por música, para além de uma questão estritamente geracional... talvez tenhamos a sorte de sermos muito generosos entre nós, sem disputas de ego ou vaidades. Vejo uma turma que quer crescer mas quer levar o resto do pessoal junto, creditar, dar espaço, oportunidades”, observa.

Em sua música, Filipe traz muita delicadeza, tanto em sonoridade quanto em seus conceitos. Algo que cai bem, em um momento onde a brutalidade - física e retórica - parecem dominar a sociedade.

"Há um dito de Mateus Aleluia na faixa Africanizar, do meu disco, que acredito que sintetize muito bem o que penso sobre o poder cultural. Ele diz: 'Nós revigoramos nossos pés em contato com o rude chão. Nós somos filhos do canto e da dança. Seremos. Somos'. Não acredito que há caminho para justiça social, gentileza, cuidado com o outro sem o poder da arte. Não acredito num futuro inclusivo da sociedade brasileira sem a estruturação da arte-educação na escola e vida dos(as) jovens. Salvador fez recentemente 468 anos de uma história marcada por violência e injustiça, mas o que nos caracteriza fortemente como povo mundo afora está arraigado na nossa resistência cultural. Na resistência cultural do povo negro, principalmente. Quando o Seu Mateus diz o que diz, nos mostra que há um cordão que liga claramente a nossa história a este processo de construção do que queremos ser. Seremos este exemplo de povo que consegue revigorar os pés nas adversidades, através do canto, da música, do fazer e expressões artísticos? Seremos, se somos", afirma.

Humanista, Filipe também acredita que só a arte e a cultura podem nos salvar da barbárie.

"Passamos um momento de extrema intolerância, de cisões e de embrutecimento da sociedade. Os fatores são multi-transversais e complexos, ainda estamos observando o bonde passar e não sabemos muito bem aonde isso tudo vai dar, mas me fica uma sensação imensa de que a arte precisa entrar nesse jogo como um instrumento de sensibilização e educação. Precisamos aprender a ouvir o outro, a enxergar o outro, a ler o outro e precisamos estar dispostos a compreender o que o outro quer dizer. Não há nada que nos conscientize mais para isso do que a literatura, o teatro, a música e todas as ramificações de expressão artística. A luta por uma institucionalização desta forma de pensar é precisa, porém dura, afinal, a arte liberta, faz questionar e não é de interesse de certas correntes políticas, as quais muitas vezes estão ocupando os espaços institucionais, que o povo possa pensar fora da caixa e da mediocridade. Então sim, acredito que a arte possa nos salvar da barbárie", reflete.

Com passagens “voz e violão” por Brasília e São Paulo, Filipe quer agora viajar seu show com banda  completa.

“Bom, o trabalho de agora é exatamente este. Levar a Odisseia para além da Bahia... Tenho uma produtora em Brasília, que é uma cidade que tenho algum envolvimento musical, inclusive fiz um pré-lançamento lá em Outubro do ano passado, mas em formato solo: voz e violão. O plano é fazer o show com banda e o lançamento oficial do disco lá no segundo semestre, no Clube do Choro. Tive uma experiência em São Paulo no Teatro Commune em novembro, num projeto chamado Invasão Nave, também em formato reduzido: Eu e Paulo Mutti. Estamos buscando os SESCs e sempre antenados pra festivais e curadorias... é um trabalho árduo, de paciência e persistência... Estou buscando também estabelecer contato no interior do Estado, muitas vezes subutilizado e subestimado pelos artistas da capital. Tenho muito desejo de passar com a Odisseia pelo recôncavo e espalhar as canções e poesias dos poetas de cá”, conclui.

Odisseia Baiana, de Filipe Lorenzo / Hoje, 20 horas / Teatro Sesc Senac Pelourinho / R$ 20 / www.facebook.com/filipelorenzo



NUETAS

Pastel, Laia e livro

O Quanto Vale o Show? de hoje terça-feira última é foi só diretoria: Pastel De Miolos e Laia Gaiatta, com o lançamento do livro Blasfêmias & Orações, do Reverendo T. Intervenções de Lima Trindade, Sandro Ornellas, Gustavo Rios, Katia Borges, Isaac Fiterman, Nalini e Orlando Pinho. Dubliner’s, 19 horas, pague quanto puder. (Ops, já foi! Foi mal!)

Ivan e Gigito’s blues

Sexta-feira tem Ivan Motoserra e o bluegrass de Gigito no Dubliner’s. 22 horas, R$ 10 (até 0h), R$ 20 (após).

Weekend agitado

Batrákia, Drearylands, Lúpulla e muitas outras bandas (veja no cartaz) estão no festival Vida Rock Nova, sábado e domingo na Concha Acústica Roger Batera, em Lauro de Freitas. 17 horas, 1 quilo de alimento não perecível.

Um comentário:

Franchico disse...

OK, parem as rotativas! Thom Yorke foi pra praia!

http://www.spin.com/2017/03/thom-yorke-beach-daily-mail-tabloid/

Com a namorada! Tirou a camisa e tudo!

U.A.U.