Blog (que, nos seus primórdios, entre 2004-05, foi de um programa de rádio) sobre rock e cultura pop. Hoje é o blog de Chico Castro Jr., jornalista formado pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia. Atualmente, é repórter do Caderno 2+ do jornal A Tarde, no qual algumas das matérias vistas aqui foram anteriormente publicadas. Assina a coluna Coletânea, dedicada à música independente baiana. Nossa base é Salvador, Bahia, a cidade do axé, a cidade do terror.
Parque Solar Boa Vista recebe último fim de semana do Festival MA_SSA com Rael, Pirombeira, Radio Mundi e Zuhri
Vince de Mira e DJ Mangaio: Radio Mundi, foto David Campebell
Espaço histórico importante, o Parque Solar Boa Vista precisa e deve ser ocupado por quem de direito – a saber, o povo.
Ótima iniciativa, portanto, a do Festival MA_SSA, que ocupou o local nos fins de semana de setembro e que hoje e amanhã chega ao grand finale com shows grátis do rapper Rael (SP), Canela Fina, Psit Mota, Pirombeira, Radiomundi, Zuhri e Bloco Afro Mirim Okanbi.
Realizado por uma parceria entre empresas públicas e privadas via Fazcultura (Secretarias da Fazenda e de Cultura), o MA_SSA ainda oferece ao longo de todo o dia atividades como oficinas de Dança Urbana (com Milena Lacerda), Discotecagem (DJ Jarrão), Basquete (Basquete na Praça), Slackline (Slackline Salvador) e Jogos e Improvisação Cômica (Nariz de Cogumelo) etc.
Atração principal que fecha o festival amanhã, Rael deverá reunir boa parte da comunidade rapper local. Em boa fase, o paulista ainda encaixou duas outras apresentações na Bahia: ontem ele esteve em Vitória da Conquista e hoje em Feira de Santana.
Rael em foto Jorge Bispo
“Não tenho sempre a oportunidade de ir a Bahia, então é a chance de fazer uma grande celebração, esse é o clima”, afirma o artista, por email.
Sem atmosfera de balada
No show, Rael será acompanhado pelo DJ Soares. “A tour leva o nome do disco Coisas do Meu Imaginário (2018), mas tem músicas mais antigas, sim, a gente repassa a carreira desde o início. E tem um momento voz e violão também, em que toco músicas minhas com outros artistas, tipo Emicida, Criolo, Kamau etc”, conta.
Satisfeito por vir à Bahia, o rapper ficou ainda mais contente ao saber que se trata de um show aberto ao público: “Melhor que isso não tem, né? Tem o fato também de ser em um parque, essa ideia de as pessoas ocuparem o espaço público, que é delas na verdade, me deixa muito feliz”.
“E aí a possibilidade de receber famílias inteiras, com crianças, sair um pouco da atmosfera de balada, me agrada muito. Curto muito fazer show em Salvador, de verdade. Não é um lugar onde consigo estar todo mês, mas sempre que estou é muito especial, são shows quentes, plateia animada cantando tudo”, afirma.
"Estive no Carnaval este ano, cantei no Pelourinho, cantei no trio da Margareth Menezes com ela, foi muito especial, inesquecível, tenho um carinho muito especial por Salvador. Desta vez na verdade, chego à Bahia nesta sexta pra cantar em Vitória da Conquista, sábado em Feira de Santana e domingo em Salvador. É uma minitour que me deixa muito feliz", acrescenta.
Com uma cena de rap cada vez mais notada Brasil afora – vide os dois prêmios recebidos por Baco Exu do Blues esta semana no Prêmio Multishow – a Bahia está no radar de Rael há algum tempo: “Fico feliz de ver o rap da Bahia conquistando o Brasil. Do Nordeste vieram nomes essenciais para a história do rap, mas muitas vezes só chega para a maioria das pessoas o que está no circuito Rio-SP. Que bom que as coisas estão mudando”, diz.
Banda Zuhri, foto André Fofano
“Acho a BaianaSystem uma das coisas mais impressionantes da música brasileira dos últimos tempos. O disco é bom, mas o show tem uma energia que não dá pra explicar. Eu tive a oportunidade de estar no trio deles no último Carnaval aí em Salvador e fiquei muito impressionado, incrível a força que tem a música deles”, afirma.
Sobre a complicada situação política do Brasil, Rael parece manter o espírito elevado: "Apesar de tudo, sou otimista. Quem nasce na quebrada sabe desde pequeno o que é adversidade e aprende a lidar com ela. Estou esperançoso de que após esse doloroso período conseguiremos ver a democracia fortalecida, sem espaço para intolerância, preconceito e violência", conclui.
Festival MA_SSA / Hoje e amanhã, Atividades ao longo de todo o dia / Shows Rael, Pirombeira, Radiomundi, Zuhri e Bloco Afro Mirim Okanbi domingo, a partir das 17 horas / Parque Solar Boa Vista (Engenho Velho de Brotas) / Gratuito
Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá trazem show com repertórios completos do Dois e Que País É Este amanhã, na Concha Acústica
Marcelo Bonfá e Dado Villa-Lobos agora. Foto Fernando Schlaepfer
Há muito tempo atrás, em uma galáxia muito distante, o rock brasileiro estava na linha de frente entre as vozes que clamavam por democracia e justiça social no Brasil que apenas despertava de um transe de 20 anos causado pelo marchar de coturnos e a novela das oito.
Amanhã, quase ao mesmo tempo em que milhares de pessoas voltarão às ruas em todo o Brasil para protestar contra uma volta à este passado obscuro, dois remanescentes da Legião Urbana, uma das principais bandas daquele período, voltarão ao palco da Concha Acústica.
No repertório, a fúria e o afeto de dois de seus principais discos: Dois (1986) e Que País é Este (1987).
No palco, os membros originais Dado Villa-Lobos (guitarra) e Marcelo Bonfá (bateria).
Ao lado deles, o ator e cantor André Frateschi, Lucas Vasconcellos (guitarra), Roberto Pollo (teclados e programações) e Mauro Berman (baixo).
Intitulado Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá tocam Dois + Que País é Este, o show é parte da segunda turnê deste grupo. Na primeira, em 2015, comemoraram os trinta anos de lançamento do primeiro álbum, Legião Urbana (1985).
Encalacrados em uma feroz – e aparentemente interminável – pendenga jurídica com Giuliano Manfredini, filho e herdeiro de Renato Russo, Dado e Bonfá se encontram impedidos de usar o nome Legião Urbana na promoção dos próprios shows.
Nesta entrevista por email, Dado Villa-Lobos, aos 53 anos, fala do prazer de voltar a tocar estes repertórios ao vivo, da permanência das canções da Legião junto ao público e da inquietude que sente nestes dias tão estranhos.
ENTREVISTA: DADO VILLA-LOBOS
Como é o show? Os repertórios dos dois álbuns são tocados na íntegra ou há uma seleção das faixas mais significativas?
A Legião Urbana original em 1980 e poucos, foto Ricardo Junqueira
Dado Villa-Lobos: Esse show comemora os trinta anos do Dois e Que País é Este, a direção musical é do nosso baixista e maestro Mauro Berman que entendeu que deveríamos tocar todas as músicas dos dois discos fora da sequência e em blocos privilegiando a dinâmica das canções. Ficou demais, é isso que sinto. É muita história!
Esse grupo recrutado por você e Bonfá está junto há algum tempo e tem já alguma experiência tocando juntos. Como avalia a evolução da banda nesse tempo?
DV-L: A banda me acompanha em carreira solo há tempos, então foi muito simples e tranquila a adaptação ao repertório da Legião. A primeira tour foi uma experiência avassaladora para todos nós. Voltei a entender essas músicas como nunca antes, voltei um músico definitivamente melhor, mais sereno, contemplativo, sem qualquer outro compromisso que não nossa música.
Música popular, no decorrer do tempo, tem um de dois destinos: ou fica eternizada na memória do público ou cai no esquecimento (pode até ser "resgatada" em algum momento, mas até para isso, precisa ser, claro, esquecida). A Legião Urbana, obviamente, pertence ao primeiro grupo. A que você atribui essa permanência da música da Legião junto ao grande público?
DV-L: Ah, só posso acreditar que foi um sonho adolescente de se fazer uma banda de rock e mudar o mundo a sua volta fazendo canções universais, atemporais – que confabularam com as demandas do universo no espaço e tempo de sua criação... Para repetir isso, só com muita magia e feitiçaria transcendental. A banda era fabulosa no estúdio.
Nos Estados Unidos, grupos como Aerosmith e Rolling Stones já processaram campanhas políticas por uso indevido de suas canções. Aqui no Brasil, Que País É Esse é volta e meia citada tanto em protestos de esquerda, quanto de direita. Te incomoda essa "promiscuidade"?
DV-L: É difícil ver sua música relacionada com Poder, Corrupção e muita Mentira (citação de Dado ao álbum Power, Corruption and Lies [1983], da banda New Order). O Brasil é esse abismo que nunca chega mesmo, e pra citar meu conterrâneo Claude Lévi-Strauss em 1935, “O Brasil vai sair da barbárie pra decadência sem passar pela civilização”. Deus salve nossa gente. (Dado, assim como o filósofo que ele citou, nasceu em Bruxelas, em 1965. Seu pai, Jaime Villa-Lobos, era diplomata na Bélgica. Dado só passou a morar no Brasil a partir de 1979).
Pessoalmente, como é a sensação de tocar essas músicas tanto tempo depois? Tem um peso, por conta de toda a bagagem emocional e de memórias ou você consegue deixar toda essa bagagem um pouco de lado para simplesmente curtir o momento?
DV-L: Está sendo incrível como antigamente, sendo que agora essas músicas passaram a ser parte de nossas vidas. É como ver sua vida passar na forma dessa experiência sonora indescritível. Como dizíamos trinta anos atrás: show da Legião... sempre uma nova emoção.
Sei que vocês preferem não falar muito sobre as questões legais envolvendo o nome Legião Urbana, mas é inescapável. Chegou-se a um acordo (com o herdeiro de Rento Russo), já que pelo menos vocês dois conseguiram viabilizar uma turnê com as músicas da banda?
DV-L: Sem acordo, sem conversa. Me parece que se trata de uma questão insolúvel para a outra parte.
Ainda existe material inédito da Legião engavetado para ser lançado futuramente? Ou tudo ainda depende de acordo entre as partes?
DV-L: Bem, planejamos lançar junto com essa tour os outtakes (sobras de estúdio) do Dois. Percebi que tínhamos algumas pérolas como a gravação de Juízo Final, uma versão de Fábrica em inglês, entre outras tantas. Tendo certo controle da questão autoral, o herdeiro simplesmente vetou o projeto, a companhia de discos recolheu-se e eu simplesmente tirei meu time de campo pra não mais voltar a pensar nesse assunto. Perdem todos, perde o público, perde a História.
Chegando tão perto das eleições, como o cidadão Dado se sente neste momento? Mais para o esperançoso ou mais preocupado?
DV-L: Preocupado, angustiado, ansioso, perturbado, aflito, atormentado, medroso e pensando seriamente em dar um tempo desse lugar...
Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá tocam Dois + Que País é Este / Sábado, 19 horas / Concha Acústica do Teatro Castro Alves / R$ 120 e R$ 60 / Camarote: R$ 240 e R$ 120 / Vendas: Bilheteria TCA, SACs Shopping Barra e Shopping Bela Vista e www.ingressorapido.com.br
Hoje: Josyara lança o aguardado Mansa Fúria com show na Sala do Coro do TCA
Josyara é muitas na foto de Natália Arjones
Desde que surgiu na cena local com aquela voz toda e aquele violão cheio de personalidade, Josyara veio ganhando mais e mais admiradores.
Hoje, ela fecha um ciclo ao lançar seu segundo álbum – o primeiro em um esquema profissional de alcance nacional: Mansa Fúria, pelo Natura Musical.
O show é às 20 horas na recém-reinaugurada Sala do Coro do Teatro Castro Alves.
No palco, a artista se faz acompanhar por dois músicos: Lucas Martins (baixo e programações) e Bruno Marques (bateria e programações).
Produzido por Junix 11 (que entre outras atividades, é “o outro guitarrista” da Baiana System), Mansa Fúria é retrato acabado da artista juazeirense que se lançou em Salvador e há anos atua em São Paulo: é sertão, litoral e metrópole. Regional, provinciano e cosmopolita. Acústico, afro e eletrônico.
Tropicalista e pós. Mansa e furiosa – e quem nunca?
Se na primeira metade do disco é a face baiana interiorana (mansa) que prevalece, o lado B é a fúria da cidadã que se impõe, de acordo com os dias de luta que ora nos convocam.
“Essa sequência veio junto com o próprio nome Mansa Fúria. Essa dualidade está nos prazeres que sinto quando vejo o mar, a natureza. É uma liberdade infantil, interiorana”, conta Josyara.
“E o lado b é a fúria, dizer as coisas objetivas, de formas mais diretas. O conjunto é uma água barrenta clara”, define.
A letra de Engenho da Dor não deixa dúvidas: Josyara sabe muito bem quem é de que lado está: “Nobre cabelo ao tempo / Que embola nas mãos do meu amor / Eu que não quero tormento / Me encaro nos noticiários de horror / Bomba de efeito moral / Saiu no jornal que é preciso esconder / Pra agradar os senhores do engenho da dor / Não vamos voltar pra senzalas / Não vamos voltar pros porões / Não vamos voltar pros armários / Não vamos voltar pras prisões / Há de ver que a liberdade / Tá cravada no ser/ Na alma”.
Porradas como esta são emolduradas por uma sonoridade que é ao mesmo tempo árida e rica, unindo o violão de Josyara, o fagote de Uru Pereira (Laia Gaiatta) e os sons eletrônicos providenciados pelo produtor.
“Junix comenta que o desafio maior foi manter intacta a coisa da voz e violão que vem da minha raiz com os elementos de apoio, como o naipe de fagotes, que é incomum na música popular mas dialoga com a música do interior, as filarmônicas”, conta Josyara.
“Mas cada música tem vida proporia, tem seu dizer, os arranjos foram pensados música por música, de acordo com o que elas pedem: os silencios, a respiração, os diversos elementos. Tem um sentido, um caminho nesse conjunto”, acrescenta.
A esperança está aí
Josyara, foto Natália Arjones
Lançado nacionalmente no último dia 6 com show no Centro Cultural São Paulo, Mansa Fúria está apenas começando seu giro pelo país.
“Sim, temos perspectivas de fazer outros shows pelo país. Já estamos circulando pelo interior de São Paulo. Já fizemos São José do Rio Preto e Bauru. E no dia 27 de outubro me apresento em Recife“, conta.
De luta, Josyara está preocupada com o futuro do paí pós-eleições, mas sem medo: “É um momento em que não temos onde respirar, parece que o esforço que fazemos não é capaz de mudar esse caos nos pressionando. Ao mesmo tempo, a esperança está aí, todos que tem sensibilidade se juntando. Desejo sempre o melhor mas tô pronta para o que der e vier”, conclui.
Josyara: Mansa Fúria / Hoje, 20 horas / Sala do Coro (Teatro Castro Alves) / R$ 20 e R$ 10 Mansa Fúria / Josyara/ Produzido por Junix 11 / Natura Musical / Disponível nas plataformas digitais
NUETAS
Júlio Caldas no BSC
Hoje tem mais uma edição do evento Beatles Social Club. E quem anima a Companhia da Pizza desta vez Julio Caldas & Banda. 20 horas, gratuito.
Paulo Mutti no Sesc
Músico de larga experiência no cenário baiano e nacional, Paulo Mutti lança seu primeiro álbum solo, Quietude, hoje no Teatro SESC Casa do Comércio. 20 horas, R$ 30.
Andaluz na Tropos
A banda Andaluz leva seu belo show Perdido em Contos e Sonhos ao Tropos Gastrobar quinta-feira, 21 horas. Pague quanto quiser .
Cinco bandas free
Malgrada, Ronco, Madame Rivera, My Friend is a Gray e Thiago Schindler fazem o evento Flash Day neste sábado, no Santa Máquina Tatuagem (Alameda das Cajazeiras 145, Caminho das Árvores). 14 horas, gratuito.
Exoesqueleto no BB
A banda Exoesqueleto lança disco novo no Bardos Bardos. Sábado, 16 horas, gratuito.
Batalhão de músicos homenageia Luciano Souza, Dom Lula Nascimento e Annunciação hoje, na Casa da Música (Abaeté)
Dom Lula. Foto Péricles Mendes
Três músicos geniais, contemporâneos e de perfis parecidos, Luciano Souza, Dom Lula Nascimento e Annunciação ganham merecida homenagem de um batalhão de colegas hoje, na Casa da Música.
Além das características acima citadas, há duas outras que os unem: os três morreram há mais ou menos pouco tempo – e em condições difíceis, destino comum a artistas que não transitam pelo meio mais comercial / popular.
Como não são – foram – exatamente populares em vida, cabe aos amigos, parceiros e seguidores da nova geração lembrar e homenagear.
Hoje, a Casa da Música receberá um verdadeiro quem é quem da música instrumental baiana, como as bandas Raposa Velha (Zeca Freitas, Fred Dantas e Asa Branca), Triatu’an (Edu Fagundes, Luciano Chaves e Asa Branca), Laurent Rivemales Trio (Laurent, Isaías Rabelo e Nino Bezerra), Joatan Nascimento, Hugo Sanbone, Amadeu Alves e mais uma dezena de nomes, todos em torno dos homenageados.
Antes da mega jam ainda será exibido um documentário semiamador sobre Dom Lula, dirigido justamente por um dos organizadores do evento, o maestro Zeca Freitas.
“Esse projeto nasceu com Annunciação já bastante doente, ele foi internado no hospital da Irmã Dulce e tal, mas faleceu (em julho último). Aí veio a ideia da homenagem. Fizemos uma lá mesmo na Casa da Música, uma coisa bem simples”, conta Zeca.
“Chamamos os amigos pra conversar sobre ele e tocar e foi muito bom. Aí a própria Casa elogiou e solicitou uma nova edição. Como recentemente também morreu o Dom Lula, resolvemos juntar, os dois bateristas, que tinham tudo a ver. Para terminar acrescentamos Luciano Souza, que era do mesmo time da gênios”, diz.
Luciano Souza, foto Nancy Viegas
Um abrigo para os artistas
A partir da triste realidade de dificuldades que os três viveram em seus últimos dias, Zeca conta que o grupo organizador pensa em uma ações mais abrangente para ajudar artistas ainda vivos.
“Uma ideia é ter uma casa para abrigar músicos já no fim da vida com apoio, um abrigo”, conta.
“A gente sabe que não é fácil, mas está lançada a ideia. Agora vamos apenas chamar os amigos para tocar e conversar sobre esses três, que eram todos muito queridos e geniais”, conclui.
homenagem aos Mestres / Hoje, das 18h às 22 horas / Com Raposa Velha, Triatu’an, Joatan Nascimento, Hugo Sanbone, Laurent Rivemales Trio, Amadeu Alves, Shalin Way, Lia Chaves, Wadson Calasans e outros / Casa da Música (Parque do Abaeté, s/n – Itapuã) / Colaborativo Relembre matéria do blogueiro com Luciano Souza aqui.
Ouvida e cultuada no mundo todo, Joyce celebra cinco décadas de brilhantismo no show 50, que acontece hoje e amanhã no Café-Teatro Rubi. No repertório, sucessos e músicas do primeiro álbum
Joyce, foto Leo Aversa
Artista de primeira grandeza da música brasileira, Joyce Moreno volta à Bahia com o show 50, no qual celebra cinco décadas de carreira.
Mais lembrada pelo público graças ao grande sucesso de canções como Clareana, Feminina e Monsieur Binot, Joyce é um daqueles talentos que vem em um pacote completo: belíssima cantora, violonista muito habilidosa e compositora de mão cheia.
No show 50 ela mesclará as canções do seu primeiro álbum, Joyce (1968), regravado por ela mesma tim tim por tim tim agora em 2018, com os sucessos de público.
No palco, apenas ela e o baterista - percussionista Tutty Moreno, seu marido. “É uma formação estranha, mas funciona às mil maravilhas. Temos uma afinidade musical muito grande”, conta Joyce por telefone, do Rio.
Além de todas as qualidades acima citadas, Joyce é figura de importância vital na MPB por outras razões. Vamos dar três delas.
Primeira: sempre foi de uma independência artística a toda prova. “Acredito que minha maior conquista nesses 50 anos foi essa, não ficar presa em esquema comercial. Sempre fiz a música que amo e acredito”, afirma.
Segunda: foi uma pioneira compositora de música popular em uma época em que isso ainda não era nada bem visto: “Quando comecei fui muito criticada por compor na primeira pessoa do feminino. Isso quase não existia, a não ser feitas por homens, como Ary Barroso, Assis Valente e Chico Buarque”.
“Não era correto, era considerado vulgar ser uma mulher compositora. Mas passados dez anos de minha estreia, teve um movimento fortíssimo de compositoras. Isso provou que eu estava certa desde o começo. E grandes interpretes começaram a gravar minhas músicas”, diz.
Disciplina curricular
Com o instrumento de trabalho, foto Leo Aversa
A terceira razão que atesta a importância de Joyce na música brasileira é decorrente direta da segunda: ela estabeleceu – ou foi fundamental no processo – de estabelecimento de uma linguagem feminina na MPB.
“A linguagem musical feminina é a maior marca das minhas composições”, afirma a artista.
O resultado de tamanho talento não poderia ser outro: Joyce é admirada nos quatro cantos do planeta.
Como a maioria dos grandes artistas da MPB, Joyce tem um xodó especial pela Bahia: "Amigos baianos, sempre tive. Sou casada com um baiano. Tutty tocou com Gil, Caetano e Bethania, tem uma longa historia com a música da Bahia, embora tenha saído daí muito jovem. Nos conhecemos em Nova York e criamos uma linguagem musical entre nós muito próxima. Temos as mesmas origens, e embora ele tenha ficado conhecido como o baterista do Tropicalismo, era muito ligado ao samba jazz. Eu também venho dessa mesma origem e seguimos em frente fazendo uma música que é derivada disso e recebe essa influências todas. Isso fortalece muito esse laço Rio-Bahia. Até gravei um álbum com esse nome com Dori Caymmi. Nos meus shows sempre tem um momento Dorival. Já gravei um disco só com músicas dele e vamos tocar algumas nesse show também", diz.
Em 1976, no álbum Passarinho Urbano, Joyce gravou o clássico anti-ditadura Pesadelo, de Paulo César Pinheiro e Maurício Tapajós. A canção voltou à baila após ter sua letra citada pelo jornalista Chico Pinheiro na ocasião da prisão de Lula, em abril último.
Um trecho para relembrar: "Quando o muro separa uma ponte une / Se a vingança encara o remorso pune / Você vem me agarra, alguém vem me solta / Você vai na marra, ela um dia volta /
E se a força é tua ela um dia é nossa / Olha o muro, olha a ponte, olhe o dia de ontem chegando / Que medo você tem de nós, olha aí / Você corta um verso, eu escrevo outro / Você me prende vivo, eu escapo morto / De repente olha eu de novo / Perturbando a paz, exigindo troco / Vamos por aí eu e meu cachorro / Olha um verso, olha o outro / Olha o velho, olha o moço chegando / Que medo você tem de nós, olha aí".
"Como ela segue atual. Eu vejo esse momento com muita apreensão. Acho que falhamos em ensinar a historia do Brasil às novas gerações. É uma falha imperdoável. Nesse momento, temos que ficar muito apreensivos mesmo. Mas também acho que vivemos um momento muito forte da identidade feminina, uma coisa que aliás nasceu aí na Bahia, com Gal, Bethania e bem antes delas Maria Quitéria, Joana Angélica. Temos estátuas delas aqui no Rio de Janeiro. Mais do que qualquer partidarismo, a questão feminina está mais atual do que nunca", afirma Joyce.
Além de frequentar rotineiramente os palcos dos grandes festivais de jazz, foi “descoberta” pelos DJs, que adotaram e remixaram canções como Feminina, Baracumbara e Aldeia de Ogum.
“Semana passada voltei de um curso na Califórnia sobre minha música. É, depois de uma certa idade a gente vira disciplina. E isso já aconteceu em outras universidades, em Berkeley e na Europa. Nossa música é a coisa mais forte da cultura brasileira. E o mundo ama. Dá um orgulho danado”, conclui.
Joyce Moreno: 50 / Hoje e amanhã, 20h30 / Café-Teatro Rubi / R$ 100 e R$ 50 / Vendas: Bilheteria C.T. Rubi ou www.compreingressos.com
Com um caminhão de hits no currículo, A Cor do Som comemora 40 anos de formação com show na Concha Acústica do TCA neste domingo
Mu, Armandinho, Gustavo, Ary e Dadi na foto de Daryan Dornelles
Marco histórico da música pop brasileira, a banda A Cor do Som segue comemorando suas 4 décadas de fundação (em 2017) com lançamento de disco ao vivo com canções inéditas e a turnê A Cor do Som - 40 anos, que chega neste domingo à capital baiana, na Concha Acústica do TCA.
E eles vem com preciosos reforços. A formação clássica segue intocada: Armandinho (guitarra, voz), Dadi (baixo, voz), Mú Carvalho (teclados, voz), Gustavo Schroeter (bateria) e Ary Dias (percussão).
Só que, além deles, mais dois músicos de apoio se juntam ao quinteto. “Estamos com um reforço incrível no nosso time. Pedro Dias e Luíz Lopes, os Filhos da Judith (banda carioca de rock) nos vocais”, conta Dadi por email.
“Pedro também toca baixo e Luiz, guitarra. Em algumas músicas cantadas vou tocar guitarra e o Pedro vai pro baixo. Estamos ensaiando com eles e muito empolgados com este reforço nos vocais da Cor do Som”, acrescenta.
Além dos novatos, que também costumam tocar na banda de ninguém menos que Erasmo Carlos (melhor selo de qualidade, impossível), três músicas novas serão apresentadas: Olhos D'Água (de Mu Carvalho, Pierre Aderne e Alexis Bomtempo), Volúvel (Dadi Carvalho e Arnaldo Antunes) e Somos da Cor (Armandinho e Maria Vasco).
“Algumas novidades vão marcar esse novo show. Além dessas três músicas inéditas e do irmãos Pedro e Luiz, alguns arranjos foram atualizados, preservando um festivo revival com as músicas que marcaram época”, conta Armandinho.
No disco A Cor do Som 40 Anos, que também saiu em LP de vinil, são cinco as canções inéditas – e vários os convidados ilustres: Gilberto Gil, Roupa Nova, Samuel Rosa, Lulu Santos, Djavan e outros.
“Ficamos super satisfeitos com o resultado (do disco). Gravamos cinco inéditas: duas minhas, duas de Dadi e uma de Mu. Tivemos ilustres convidados, que conviveram com nossa história musical, alguns escolheram o que gostariam de cantar e os deixamos à vontade. O resultado foi intimidade total e um som maravilhoso”, conta Armandinho.
BRock, Novos Baianos, Trio
Marcante pela mistura de rock, pop, jazz e ritmos brasileiros que praticava, A Cor do Som foi cria direta da genialidade revolucionária d’Os Novos Baianos, levando essa receita – que já era praticada por Moraes, Baby & Cia – às últimas (e adoráveis) consequências.
Feliz encontro entre músicos extraordinários da Bahia e do Rio, A Cor do Som fez um sucesso estrondoso nas FMs entre o final dos anos 1970 e 80 com hits inesquecíveis como Zanzibar, Dentro da Minha Cabeça, Menino Deus, Abri a Porta, Magia Tropical, Swingue Menina, Alto Astral e outros.
Curiosamente, foram devorados pela mesma geração para a qual abriram caminho e foram uma influência decisiva, a do rock brasileiro dos anos 80 (o chamado BRock).
“A gente teve a influência dos Novos Baianos, banda que tive a felicidade de participar”, lembra Dadi.
“A rapaziada do BRock sempre fala pra gente que ia em todos os nossos shows. Paralamas, Barão Vermelho. Acho que o Paralamas é o que tem mais a ver com esta onda”, acrescenta.
Não a toa, Dadi chegou mesmo a integrar o próprio Barão Vermelho por um breve período, deixando sua marca em um dos melhores álbuns da banda do Roberto Frejat: Na Calada da Noite (1990).
Já Armandinho lembra que, na época do auge d’A Cor do Som, seu turno era dobrado, já que respondia pelas guitarras n’A Cor e no Trio Elétrico Armandinho, Dodô & Osmar.
“Era uma canseira com certeza, shows quase todos os dias. Tipo sair do Rio Grande do Sul pro Ceará ou fazer dois shows em cidades diferentes num mesmo estado no mesmo dia, com diferença de poucas horas, um com o Trio o outro com a Cor. Ufa!”, relata Armandinho.
E apesar de A Cor e do Trio terem canções em comum no repertório, até a abordagem era outra: “Um (o Trio) tem base mais nos frevos e ritmos afrobaianos, enquanto o outro (Cor) é mais suave ou reguiados com um instrumental à base de chorinhos e baiões progressivos”, observa.
“Com um ponto de encontro nos momentos mais festivos quando tocamos Zanzibar, Beleza Pura, Dentro da Minha Cabeça, tendo em comum o instrumento que coloquei uma quinta corda, divulguei pro Brasil e pro mundo e dei o nome de Guitarra Baiana”, conclui o mestre, amém.
A Cor do Som – 40 anos / Domingo, 19 horas / Concha Acústica do Teatro Castro Alves / R$ 80 e R$ 40 (primeiro lote) / R$ 100 e R$ 50 (segundo lote) / Camarote: R$ 160 e R$ 80/ Vendas: Bilheteria TCA, SACs Shopping Barra e Shopping Bela Vista e www.ingressorapido.com.br
Malefactor lança documentário de 25 anos e faz show sábado com Headhunter DC
Jafet Amoedo, Daniel Falcão, Lord Vlad e Danilo Coimbra por Sergio Franco
Falo isso sempre por aqui: o heavy metal baiano (em seus vários estilos) é dos melhores do mundo, com bandas de primeira linha, reconhecidas inclusive no exterior.
Uma delas é a Malefactor, que fez 25 anos em 2017 e agora, graças à iniciativa do músico e jornalista Sérgio Franco Filho (ex-Automata), ganhou um documentário dando conta dessa trajetória.
Com mais de 50 minutos de duração, Malefactor: 25 Anos Sob A Lei da Espada já está disponível no You Tube e traz entrevistas com integrantes, ex-integrantes, jornalistas, amigos e fãs, além de muitas imagens de arquivo coletadas desde os anos 1990.
“O documentário foi um convite do diretor Sérgio Franco, como trabalho de conclusão de curso da faculdade de jornalismo. Ficamos honrados demais com o convite”, conta o vocalista e fundador Vladimir Senna, o Lorde Vlad.
“Gostamos muito (do resultado), mas a intenção é ampliar o filme com extras (no DVD), já que 50 minutos é pouco para contar o que passamos nestas mais de duas décadas na estrada do metal”, diz.
Com álbuns lançados no exterior e duas turnês internacionais no currículo – tocaram inclusive no Wacken (Alemanha), maior festival de metal do planeta – o Malefactor lançou seu último álbum, Sixth Legion, no ano passado.
Danilo Coimbra em ação, foto Sergio Franco
"Na verdade o filme saiu com um ano de atraso, e já completamos 26 anos. Dia 22 de setembro (sábado) agora, iremos estar com o Headhunter D.C., outra banda batalhadora (31 anos de atividade) para celebrarmos o metal baiano, num grande show na Groove Bar na Barra. O DVD do doc irá sair em Portugal pela mesma gravadora que lançou nosso ultimo álbum por lá, e aí sim faremos uma grande festa para celebrarmos o filme", conta.
“Agora o projeto é fazer dois novos video clipes com musicas do Sixth Legion em regiões belíssimas da Bahia. E em 2019, voltarmos a uma turnê europeia ou sulamericana. Agora com o disco lançado em Portugal e na Grécia, tem aparecido convites para entrevistas por lá e quem sabe, não role finalmente nosso retorno pela terceira vez ao continente europeu”, acrescenta Vlad.
Amor ao metal
Formada atualmente por Vlad (vocal e baixo), Danilo Coimbra e Jafet Amoêdo (guitarras) e Daniel Falcão (bateria), a Malefactor tem uma história e tanto de luta e fé no próprio taco – ou melhor, espada.
Podem não ganhar dinheiro, mas tem moral para bater no peito: fazem o que amam sem jamais se vender ou buscar aprovação de ninguém.
“Conhecemos vários países, tocamos em quase todos os Estados do Brasil, dividimos palcos com ídolos e fãs. Tudo por causa da banda. Ganhar dinheiro com música underground é uma ilusão. Das centenas de bandas brasileiras, provavelmente só umas cinco realmente vivem exclusivamente da banda, sendo que algumas ainda precisam agregar com workshops e trabalhos de estúdio para outros artistas para obter uma renda compatível com a de artistas de estilos mais populares”, diz.
Lord Vlad, a voz malefactoriana na lente de Sergio Franco
“Fazemos por amor ao metal, e conseguimos, pelo menos, não ter nenhum gasto para nossos projetos há um bom tempo, embora projetos bem maiores estão em vista, e precisaremos realmente de apoio cultural em algum momento. O que deve ser de fato a cultura do incentivo, e não investir em artistas que já não precisam deste tipo de apoio. Já tem a iniciativa privada ao lado deles. A música alternativa dificilmente recebe esse apoio”, reivindica Vlad, justamente.
Parceiro de uma infinidade de nomes que vão de Quincy Jones a Lenine, do jazz ao pop, o virtuoso camaronês do contrabaixo Richard Bona se apresenta amanhã, às 20 horas, na Sala Principal do Teatro Castro Alves. Filas A a P: R$ 170 e R$ 85, Q a Z5: R$ 150 e R$ 75 e Z6 a Z11: R$ 130 e R$ 65. Som de gente grande.
Dom Lula Nascimento, mestre. Foto Vinicius Passarinho
René Nobre, o Véio
René Nobre apresenta suas versões acústicas de clássicos no show Rock de Véio. Quinta-feira, 20 horas, grátis, no Groove Bar.
Tributo aos mestres
Saudosos mestres da música baiana, Dom Lula Nascimento, Annunciação (bateristas) e Luciano Souza (guitarrista), serão homenageados por uma turma da pesada segunda-feira (24) no show Sem Paranoia. Com Zeca Freitas, Fred Dantas, Hugo Sanbone, Laurent Rivemales, Joatan Nascimento e muitos outros. 18 horas, na Casa da Música (Itapuã), pague quanto puder.
Uma descoberta tardia sobre a própria mãe levou o escritor espanhol Antonio Altarriba a investigar seu passado. E o que ele descobriu foi mais do que uma história de família
Foi só bem próximo do momento da morte de sua mãe, Petra, que Antonio descobriu que ela tinha o braço esquerdo quase imóvel, incapaz de flexionar plenamente.
Foi assim que Antonio também se deu conta de que sabia muito pouco sobre ela.
No romance gráfico Asa Quebrada, o escritor Antonio Altarriba – auxiliado pela expressiva arte em preto & branco do desenhista Kim – acerta as contas com o passado de Petra Ordóñez, sua mãe.
Perplexo pela descoberta tardia, Antonio visita o asilo em que se encontra seu pai a fim de pergunta-lo sobre a deficiência de Petra. Mas o pai nem desconfiava.
Ainda mais perplexo, Antonio volta para casa, imerso em perguntas sem resposta: “Como pode ser que meu pai não soubesse que minha mãe não movia o braço? Como era a intimidade deles? Que carinhos faziam entre si? De que abraço eu nasci?”
A partir desse tapa na cara que a vida deu em Antonio, ele reconstrói toda a vida de sua mãe a partir justamente do próprio incidente que aleijou Petra: seu nascimento.
Ao dar Petra à luz, Sofia, sua mãe, morreu. O pai de Petra, Damián, um barbeiro com pretensões a ator dramático, fã de Shakespeare, enlouquece de dor ao receber a notícia.
A cena bizarra que se segue faz jus à predileção de Damián pela tragédia teatral – e também soluciona o mistério do braço curto de Petra. Contar mais é estragar a leitura de possíveis leitores da obra.
Conspiração monarquista
Obra de leitura viciante, Asa Quebrada tem pelo menos três níveis de leitura.
O primeiro e mais obvio é ser encarado como o mero relato biográfico da mãe de seu autor.
Mas também pode ser um testemunho pungente da força e da abnegação silenciosa das mulheres espanholas em uma sociedade profundamente católica, machista e dominada por uma ditadura militar sanguinária e de cunho fascista.
E por último também pode ser lida como um comentário acerca desta mesma ditadura, jogando alguma luz em personagens históricos com os quais Petra Ordóñez conviveu, como o General Juan Bautista Sánchez González (1893 - 1957).
Já adulta, após a morte do pai Petra foi trabalhar de governanta na mansão de Sánchez González, em Zaragoza.
As duas faces da Espanha franquista: acima, a babação de ovo fascista...
Acontece que o tal general era um “rebelde” dentro da cúpula de poder do Generalíssimo Francisco Franco (1892 - 1975).
Monarquista convicto, Sánchez González – sustenta Antonio Altarriba – conspirava com alguns companheiros de farda para destituir Franco do poder e restaurar o regime monárquico na Espanha.
Entre os cuidados com os filhos do general e o serviço de copa e cozinha, Petra captava aqui e ali o burburinho conspiratório na mansão do militar – porém, à moda silenciosa das mulheres de então, mantinha-se absolutamente discreta sobre tudo o que via e ouvia.
...Enquanto a perseguição aos inimigos do regime não dava tréguas
Acabou que, pouco tempo depois de Petra pedir demissão do emprego para se casar com Antonio Altarriba (pai do autor), Sánchez González morreu em condições misteriosas, um episódio até hoje mal explicado na própria Espanha.
A edição bem cuidada da Editora Veneta traz um posfácio de Altarriba, no qual ele detalha todas as descobertas que fez ao pesquisar sobre a vida da própria mãe, incluindo os fatos conhecidos e as teorias correntes sobre a morte do General Sánchez González.
Completam a edição fotos de família e os estudos de personagem do desenhista Kim, pseudônimo de Joaquim Aubert i Puig-Arnau.
Altarriba, que é Doutor em Literatura Francesa pela Universidade do País Basco, é autor de quatro romances premiados em seu país natal. Que venham outras obras de sua lavra.
Asa Quebrada / Antonio Altarriba e Kim / Veneta/ Tradução: Marcelo Barbão / 272 p./ R$ 64,90
Morto há um ano, Luiz Melodia ganha show-tributo do velho amigo Lazzo. Procura surpreendeu o artista e o Café-Teatro Rubi: com ingressos esgotados para hoje e amanhã, nova sessão no domingo
Lazzo, a elegância em pessoa, foto Djalma Santos
15 de agosto último. Em transmissão ao vivo (pelo Canal Brasil), Lazzo Matumbi, Iza e Liniker sobem no palco do Theatro Municipal do Rio de Janeiro para uma agitada versão de Negro Gato, de Luiz Melodia, o homenageado da última edição do Prêmio de Música de Brasileira .
Parece que muita gente aqui em Salvador viu e curtiu a performance do baiano, já que o show Lazzo Canta Melodia, hoje e amanhã no Café-Teatro Rubi, teve os ingressos esgotados.
Mas não vos desesperei: foi aberta uma nova data, neste domingo.
A procura em alta pegou até o próprio Lazzo de surpresa: “Rapaz, eu não esperava não”, confessa Lazzo.
“Mas achei bacana demais. Rolou uma expectativa interessante pelo que alguém como eu, que tem um carinho muito grande pelo Melodia, poderia fazer em um show de releituras dele. Acho que as pessoas curtiram a ideia”, acrescenta.
O sucesso dessa primeira leva de shows poderá inclusive abrir espaço para repeti-lo no Rubi – ou mesmo leva-lo para outras cidades: “Com certeza vamos repetir. Quando o show é bem programado, produzido, arranjado com carinho, fazendo com respeito e do meu jeito, acho que sim”, confirma.
“Eu nunca nem gostei muito de fazer show de releitura. Sou muito apegado aos meus arranjos, mas o Melodia eu sempre tive o maior carinho, já cantava músicas dele no meu show, então não trem mistério”, afirma.
Praia dos Artistas
Liniker, Lazzo e Iza no PMB 2018, foto Diego Padilha / Divulgação
De fato, Lazzo e Melodia – que morreu há pouco mais de um ano, em agosto de 2017 –, eram amigos de longa data. Melodia, que foi casado com uma baiana, tinha casa em Salvador e chegou a morar por na cidade
“Íamos muito à Praia dos Artistas, na Boca do Rio, que ele morava lá perto. Tínhamos uma relação de muito carinho e admiração mútua”, conta Lazzo.
“Quando ele faleceu, achei que não seria legal fazer quando ele faleceu achei que não seria legal fazer show em homenagem e tal. Mas aí fui convidado pra cantar Negro Gato com Liniker e Iza no Prêmio de Música de Brasileira e eu disse ‘claro que vou, ele era meu amigo’. Aí quando voltei do Rio, foi já nessa vibe de fazer esse show”, relata.
Liniker e Iza não vem desta vez, mas quem for ao Rubi curtirá o vozeirão aveludado do grande Lazzo cantando não apenas Negro Gato, mas também Juventude Transviada, Surra de Chicote, Pérola Negra, Magrelinha e outras pérolas do compositor.
No palco, Lazzo contará com banda de cinco músicos: Kiko Souza (flauta e sax), Germano Maninho (guitarra), Luizinho Oliveira (baixo), Juliana Oliveira (teclados) e Igor Galindo (bateria).
Toda a elegância e talento de Joe Bonamassa e Beth Hart: Black Coffee
Ninguém chamou, mas nóis voltou: o podcast Rocks Off retorna para mais uma rodada de novidades e lançamentos.
Nesta edição, Nei Bahia, Osvaldo Braminha Silveira Jr. e este (lesado) blogueiro botam pra rodar na fita músicas novas de potentados do rock (ah, esses coroas teimosos que não largam dessa coisa velha e ultrapassada!) como Alice in Chains, Interpol, Death Cab For Cuttie, Dan Baird (The Georgia Satellites), The Jayhawks, Black Coffee (Joe Bonamassa + Beth Hart), Jim James (My Morning Jacket), White Denim e outros mais ou menos cotados.
Tem rockão, tem rockinho e tudo o que está entre os dois extremos.
Membro da Pirombeira, Ian Cardoso confirma talento a ser observado em disco solo
Ian Cardoso, pronto para saltar na piscina de roupa e tudo. Foto Lara Perl
Guitarrista da Pirombeira e da banda Dziga Tupi (de Ronei Jorge), Ian Cardoso lança esta semana seu primeiro trabalho solo, o EP Reina.
Como está passando uma temporada em São Paulo, cursando uma disciplina como aluno especial na Usp, o primeiro show de lançamento será por lá mesmo, nesta quinta-feira, no Brazileria Bar. Ainda não há data em Salvador.
Com cinco faixas, Reina soa como uma trip profunda de Ian em busca de sua própria essência, mas não em torno do próprio umbigo.
Não à toa, o disco está recheado de convidados ilustres – o que dá uma boa ideia da moral do rapaz na comunidade musical baiana.
Tem Rebeca Matta (dueto com Ian em O Medo), Matheus Aleluia (trompete em duas faixas), Mathias Traut (trombone em duas faixas), Rowney Scott (sax soprano), Nancy Viégas e Mônica Freire (vozes na faixa-título), entre outros.
“Acho que produzir um trabalho solo teve muito a ver com um momento da minha trajetória criativa, uma necessidade de auto-investigação mais profunda, onde eu pudesse vivenciar uma determinada curva produtiva até as últimas consequências e dar vazão às coisas, abrir espaço pra outras coisas novas. Até porque, com exceção da faixa Reina, não houve um processo composicional específico pro EP. As músicas já existiam, e a escolha do repertório foi uma das primeiras etapas dessa "curva produtiva" que mencionei. A partir daí que fui construindo o panorama pelo qual os assuntos foram desenvolvidos. A música Reina, foi gerada já com a ideia de fazer um EP mais madura na minha cabeça. Talvez por isso acabou alinhando a história ali, e dando título ao trabalho. Então entendo que a música aponta por onde vai andar”, afirma Ian, por email, de SP.
"A Pirombeira é um grande laboratório de fusão de ideias. Várias cabeças pensantes, todo mundo lida com a composição e os arranjos acabam sendo este ponto de encontro entre várias perspectivas. E isso naturalmente forja uma qualidade estética. Então a forma como a música ou um tema aparece pra mim diz muito sobre por onde ele pretende caminhar. A própria música de alguma maneira reivindica o lugar que quer ocupar. Tem uma autonomia ai. Mas aí a gente vai experimentando também. Acho que Reina é um ponto de contato entre tudo que já fiz. Por ser uma estreia, surgiu um pouco desta pretensão e daí vamos ver o que surge", acrescenta.
Além de todos aqueles convidados bacanas, a banda que toca com Ian no disco não deixa por menos: Aline Falcão (vozes e teclados), Alexandre Vieira (baixo) e Marcos Santos (bateria).
“Todas as pessoas que realizaram esse EP comigo me ensinaram muito. São pessoas que eu admiro, que possuem trajetórias únicas e com quem me encontrei em diferentes momentos da vida. São referências pra mim”, elogia.
“Ter conseguido reunir essa galera traz uma sensação revigorante de realização. Dá sentido às coisas. Isso contribuiu pro colorido e pra intensidade do trabalho, muito norteado pelo afeto, generosidade e colaboração”, afirma.
Dualidades e perguntas
Ian cita o clássico brasileiro Caipira Picando Fumo, foto Lara Perl
Na capital paulista, Ian dá continuidade aos seus estudos - estudos esses que fazem parte do próprio processo criativo de Reina: "Vejo a academia como mais um espaço pra trocar ideias e acessar novos pontos de vista. O EP Reina, inclusive, foi desenvolvido durante o curso de Mestrado Profissional em Música que fiz na UFBA, com orientação de Rowney Scott, que também participa do EP e a quem atribuo uma parte importante da maturação do trabalho", conta.
De sonoridade cheia e com melodias que impressionam pela beleza, Reina confirma Ian como um talento evidente a ser acompanhado.
Complexo sem medo de ser complicado – até porque a vida não é nada simples – Ian descreve sua obra como uma busca pelas perguntas, ao invés de respostas fáceis.
“Acho que a marca do EP é justamente o questionamento das definições, das dúvidas, dos sonhos. O discurso gera mais perguntas que respostas. Fala da vida e da morte. Do tudo e do nada. Das cicatrizes e do corpo como esse emaranhado de memórias”, diz.
“As letras giram por aí e a sonoridade vai junto. A sonoridade é o grande elo. Transita em dualidades: agressivo, brando. Velho, novo”, observa.
Infelizmente, ainda nã há uma data para o show solo de Ian na capital baiana: "Tô querendo tocar mais o show, que contém não apenas as músicas do EP mas outras novas e algumas outras versões de músicas que tocamos na Pirombeira. E seguir buscando caminhos pro som circular. Ainda não temos a data do show de lançamento em Salvador, mas espero que ocorra em breve! Em breve também vai ser lançado um clipe", conclui o músico.
O músico camaronês Richard Bona: show e oficina semana que vem
Nome de destaque no jazz mundial, o camaronês Richard Bona faz show no TCA e workshop. O show é dia 19 (quarta-feira). Já a oficina, intitulada Jazz Fusion e Ritmos Africanos, é um dia antes (18, terça-feira). A partir das 15 horas, no 55 Condomínio Cultural (Rio Vermelho). Investimento: R$ 80. Infos e inscrições: 9 9124-2095.
Duda sábado, free
Duda Spínola faz aquele som de astral bacana sábado, 16 horas, no Bardos Bardos. Pague quanto quiser ou puder.
Capitão Elvis Parafa
Sumido, o pândego Capitão Parafina ressurge encarnando Elvis! É o show Elvis por Capitão Parafina & Os Presleys. Sábado, 22 horas, R$ 20 (Sympla). No Groove Bar.
Ex-membros da icônica banda Sonic Youth encontraram um pequeno mas fiel nicho de admiradores no Brasil. Enquanto o baterista fez uma banda com brasileiros, Lee Ranaldo, que já se apresentou em Salvador, lançou um livro de memórias
Riviera Gaz: Gustavo, Steve Shelley e Paulo K, foto Renata Molina
Uma das bandas de rock mais influentes de todos os tempos, o Sonic Youth (1981-2011) inspirou o Nirvana de Kurt Cobain e a última grande onda roqueira, que varreu o mundo nos anos 1990. Agora, dois de seus ex-membros tem novos trabalhos lançados no Brasil.
Mais do que isso: esses trabalhos são um reflexo de uma certa relação que esses músicos tem construído – ora, vejam – com o Brasil. Trata-se de um disco e um livro.
O disco é Connection, álbum de estreia da banda Riviera Gaz, que traz na sua formação o guitarrista e vocalista Gustavo Riviera (ex-Forgotten Boys), o baixista Paulo Kishimoto (que também é tecladista de Pitty) e o baterista Steve Shelley, que respondia pelas baquetas no SY.
Já o livro é JRNLS80s: Poemas, Letras, Cartas, Anotações e Cartões-Postais dos Primeiros Anos do Sonic Youth, do seu ex-guitarrista, Lee Ranaldo. (JRNLS80s pode ser traduzido como “diários dos anos 80).
O elo que conecta ambas as obras são as constantes viagens ao Brasil que Ranaldo tem feito para os lados de cá desde o fim do Sonic Youth
Quase todo ano, o músico, que também é escritor, poeta e artista visual, vem ao país se apresentar. As vezes vem com banda. Outras, vem sozinho com seus violões e guitarras.
Numa dessas, em setembro de 2016, se apresentou até em Salvador, diante de uma incrédula plateia de velhos e novos fãs, no palco do Cine-Teatro Solar Boa Vista, dentro da série de eventos Low Fi - Processos Criativos (do músico e agitador cultural Edbrass Brasil).
Também numa dessas vindas ao país, Lee se fez acompanhar justamente pelo ex-parceiro de SY na bateria, Steve.
“Ele estava vindo para fazer um show no Brasil com o Lee Ranaldo. Aí um amigo dele, que é meu amigo e do Paulo, fotógrafo em Paris, nos colocou em contato para nos encontrarmos”, conta Gustavo.
Lee Ranaldo e Steve Shelley no SY, anos 80, foto JRNLs80s
“Nessa época eu tinha gravado uma demo com algumas músicas solo quando estava em Paris. Paulo, que havia gravado comigo, sugeriu mostrar pro Steve e ver se ele era afim de gravar com a gente. Ele topou, aí começou a crescer. Temos um EP, um disco e já fizemos três turnês”, relata.
Uma saborosa novidade do rock este ano, o disco do RG desce redondo com um som meio classic rock, meio indie, mas difícil de rotular – o que é sempre um bom sinal.
“A banda foi, continua e continuará se inventando, a cada momento que nos juntamos saem coisas novas e as coisas mais antigas também se modificam, o todo se movimenta. Estamos fazendo coisas que achamos legais e essa é a ideia. Por isso não nos definimos tanto, mas tá no rock”, afirma.
"Foi demais (trabalhar com Steve), ele é um excelente baterista, resolve e toca muito bem, é um cara muito legal e nós três nos damos muito bem, portanto ocorreu tudo bem legal, todos já tocam há um bom tempo em outras bandas. Ficamos felizes com o resultado do disco. Decidimos deixar de fora do disco algumas músicas, mas algumas estão no show. O Steve foi quem acompanhou a mixagem em Nova York, feita pelo John Agnelo, que já mixou o Sonic Youth, Dinosaur Jr. e vários discos legais", relata Gustavo.
Depois da turnê de lançamento que passou por algumas cidades do Sul, Sudeste e Chile, Steve voltou aos Estados Unidos, mas o trio já faz planos para um novo giro.
Lee Ranaldo no metrô de SP, foto Acauã Novais
“Estamos começando a pensar na próxima turnê para o começo do ano que vem. Queremos muito tocar em Salvador e no Nordeste todo. Quase rolou nessa última turnê, que teve que ser corrida. Mas vamos na próxima”, promete.
On the road com a banda
A outra novidade – uma preciosidade para fãs do Sonic Youth em particular e do rock em geral – é este volume de memórias de Lee Ranaldo.
Deliciosa leitura, os diários de estrada de Lee Ranaldo cobrem o período entre 1980 e 1989, os anos de underground do SY, antes de serem entronados como os Godfathers (Padrinhos) of Grunge e alcançarem a fama mundial.
Desta forma, viajamos com Lee, Steve e o então casal Thurston Moore e Kim Gordon pelos recantos mais remotos dos Estados Unidos, bem como por várias cidades europeias, entre shows em espeluncas e longos períodos on the road.
Sensível, Lee escreve quase sempre com o coração na mão, entre quase-depressões, o estupor do cansaço da vida na estrada e o transe de drogas consumidas sem tanto afã.
Apesar de claramente influenciado pela literatura beat – e quem não o era nos anos 1980? – Lee também se entregava volta e meia a elocubrações razoavelmente profundas sobre arte, perda e o vazio da vida, fosse no interior do Kentucky ou em alguma cidade medieval na Bélgica.
Há relatos de encontros sensacionais com outras bandas importantes da época, como Dinosaur Jr., fIREHOSE e Big Black, o que só torna a leitura ainda mais prazerosa para apreciadores do gênero.
A edição da Terreno Estranho ainda traz um posfácio do editor, “Reverendo” Fábio Massari, relembrando seu primeiro show do Sonic Youth, em Londres, 1987, com aquele rigor factual e estilístico que seus fieis seguidores desde os tempos da antiga MTV Brasil tanto admiram.
Jrnls80s / Lee Ranaldo / Terreno Estranho/ Tradução: Paulo Alves/ 240 páginas/ R$ 54,90
Trecho: “O público nos quer perdidos, eles querem nos ver ondular e contorcer, encenar suas próprias agressões. (...) Mas eu quero me perder hoje no palco, entrar e tocar e sentir o sangue correndo nas minhas veias” Lee Ranaldo,em JRNLS80s
Amanhã, 50 anos terão se passado desde que quatro cabeludos subiram juntos no palco pela primeira vez – e o rock nunca mais foi o mesmo. Confira as novidades e relatos que marcam os 50 anos do Led Zeppelin
Chicago, 1977, foto Jim Summaria / Wikimedia Commons
No primeiro episódio da série Sharp Objects, badalada super-produção da HBO, a protagonista interpretada por Amy Adams entra em seu carro e, ato contínuo, acessa via digital o álbum Led Zeppelin I, de 1969. Dá a partida e acelera em direção ao seu destino. Canções deste e de outros álbuns do quarteto inglês são ouvidas ao longo da série.
Este é só um exemplo banal de como, 50 anos – e muitas mudanças de tecnologia – depois, o Led Zeppelin segue entranhado na cultura pop e no imaginário coletivo.
Cientes disso, os três membros remanescentes anunciaram no dia 8 de junho último, via redes sociais, o lançamento de um livrão de arte de 400 páginas com fotos e artes inéditas da banda, selecionadas através de curadoria que contou com os pitacos dos próprios Robert Plant, Jimmy Page e John Paul Jones.
Led Zeppelin by Led Zeppelin, o já cobiçado volume, sai pela editora inglesa Reel Art Press e chega às lojas agora em 2 de outubro, mesmo dia em que a recém-formada banda The New Yardbirds resolveu trocar de nome para Led Zeppelin.
Versões para italiano, alemão, japonês e holandês já foram anunciadas. Ainda não há previsão de lançamento de uma edição em português.
Além disso, o álbum ao vivo The Song Remains the Same (1976), trilha-sonora do extravagante filme-concerto do mesmo ano, também ganha reedição remasterizada em diversas versões, incluindo uma caixa de luxo com quatro discos de vinil, dois CDs e três DVDs, além dos mimos de praxe.
Maio de 2018: Jones, Plant e Page apresentam o livro, foto Reel Art Press
Se bem entendessem, Plant, Page e Jones poderiam ainda inventar outros produtos para inundar as prateleiras das lojas e esvaziar as carteiras dos fãs – e ainda seria pouco, diante da permanência de sua música e a extensão de sua influência.
Culto igual só encontra paralelo nos Beatles – de fato, imbatíveis neste quesito. Listar as razões do porque são um convite à precipitação pluvial sobre terreno encharcado.
Apesar dessa movimentação recente na casa do Zepelim de Chumbo animar os fãs mais esperançosos por uma nova reunião da banda, as chances disso voltar a acontecer são bem baixas.
Em uma recente entrevista à revista inglesa Mojo, Robert Plant foi perguntado se estava animado com a marca de 50 anos da banda.
“Não. Isso só me deixa mais consciente de como o tempo voa e há quanto tempo John Bonham (baterista cuja morte em 1980 precipitou o fim do LZ) não está mais conosco, um baita preço que pagamos por tudo isto”, respondeu.
“São 50 anos, mas não só: são 38 anos de tristeza para uma família”, acrescentou.
Mas nem tudo está perdido. Jimmy Page contou em entrevista à revista Planet Rock que muito material ao vivo inédito, engavetado há décadas, deverá chegar às prateleiras das lojas nos próximos dez anos.
A capa do livrão, Reel Art Press
Na O2 Arena
Amanhã, 7 de setembro, faz 50 anos que Page, Plant, Jones e Bonzo (John Bonham) subiram em um palco juntos pela primeira vez. Local: Gladsaxe, Dinamarca.
Se apresentaram ainda como The New Yardbirds, jogada de Page para ganhar o público da ex-banda, extinta há pouco tempo.
Menos de um mês depois, se tornariam Led Zeppelin, nome sugerido por Keith Moon, baterista do The Who.
O resto, como se diz é história. E fãs, milhões de fãs.
Um ilustre fã baiano é Martin Mendonça, o guitar-hero que responde pelas seis cordas na banda de Pitty.
Curiosamente, seu maior ídolo no LZ não é Jimmy Page, e sim, o indefectível Bonzo.
“Sua displicência e precisão, as levadas insanas de bumbo, a pegada matadora e o som que ele tirava da bateria (muitas vezes microfonada com nada além de alguns Shure SM 57!) ainda não encontraram paralelo nesse mundo”, afirma.
“Meu álbum favorito é o Houses Of The Holy (1973), que escolho por questões afetivas: foi o primeiro deles que me pegou, acabou sendo minha porta de entrada”, diz.
Outro fã de carteirinha é um felizardo: o jornalista Ricardo Palmeira, que teve a felicidade de assistir ao único show de retorno do Led Zeppelin, em dezembro de 2007. De graça. E ainda foi pago por isso.
Amostra de divulgação do conteúdo do livro
Na época, Ricardo trabalhava em uma empresa que fornecia cerveja às arenas no Reino Unido.
No dia do show, lá foi o rapaz, que então já era fã de carteirinha, com uma mochila cheia de cerveja em garrafa pet vender bebida aos fãs eufóricos na beira do palco.
Quando o show começou na Arena O2, em Londres, “Eu estava petrificado, com a musculatura tensa e medo de ver uma idolatria se desfazer diante de mim. Olhei ao redor e vi 20 mil pessoas travadas da mesma forma, até porque os músicos já haviam passado dos 60 anos”, conta.
Depois que a tensão se desfez, foi só alegria: “As duas horas seguintes se transformaram em um showzaço de rock ’n’ roll como nunca imaginei. No palco, a maior banda de todos os tempos. Na plateia, uma multidão ensandecida, dançando, vibrando, se divertindo e cantando cada pedaço de cada letra. Na reta final do show, eu e dois colegas estávamos pulando e acompanhando as músicas usando as long necks como baquetas de bateria. Voltei para casa realizado”, relata.
Ô, felicidade.
DEPOIMENTOS NA ÍNTEGRA
Martin Mendonça e seu LP favorito, foto Tomás Mendonça
Martin Mendonça:
O Led Zeppelin é uma de minhas bandas favoritas e das mais importantes na minha formação. o curioso é que, apesar de contar com ninguém menos que Jimmy Page nas guitarras, o integrante que teve mais impacto sobre mim foi o baterista, John 'Bonzo' Bonham. sua displicência e precisão, as levadas insanas de bumbo, sua pegada matadora e o som que ele tirava da bateria (muitas vezes microfonada com nada além de alguns Shure SM 57!!!) ainda não encontraram paralelo nesse mundo. sem falar que aquela sua postura anti-rockstar / fazendeiro / rabugento era irresistível, hahahaha. Meu álbum favorito é o Houses Of The Holly, que escolho por questões afetivas pois foi o primeiro deles que me pegou, acabou sendo minha porta de entrada para o que estava por vir e, até hoje, é impossível escutar sem sentir aquela novidade.
Ricardo Palmeira, exclusivo para o A TARDE ON LINE.
Led Zeppelin, 10 dezembro de 2007, O2 Arena, Londres, por Ricardo Palmeira
O Led Zeppelin é minha banda favorita há pelo menos 15 anos. Só que, instintivamente, dentro de mim, esta minha admiração era como se fosse por uma lenda. Afinal, a banda acabou em 1980 e eu só nasci em 1982. Era assim que eu enxergava o Led Zeppelin: uma lenda!
Eis que, em 2007, eu morando em Londres, surge a noticia, por volta de outubro, que o Led Zeppelin faria um show único na cidade. A princípio, marcado para meados de novembro. Mas foi adiado devido a um machucado na mão de Jimmy Page, o que levou a banda a adiar os ensaios. Mal sabia eu que estava dando uma das maiores sortes da minha vida ali...
O concerto seria realizado em 10 de dezembro. Uma segunda-feira. Nunca vou esquecer! Pela gigantesca procura, os compradores seriam definidos por sorteio. Para participar, era necessário se inscrever pela internet.
Lá vou eu fazer minha inscrição e... o site já estava travado, e as inscrições encerradas. Motivo: em menos de 48 horas, eram mais de 1 milhão de inscritos, sendo que a casa onde o show seria realizado, a O2 Arena, só comportava cerca de 20 mil pessoas. Simplesmente desisti de ir para o show. O Led Zeppelin continuaria sendo uma lenda!
Eu havia trabalhado por seis meses numa empresa que fazia venda de bebidas em arenas multiuso por todo o Reino Unido. Uma dessas arenas era justamente a O2.
Poster que vem de brinde com o livro LZ by LZ
Porem, cerca de dois meses antes do show, eu havia começado a trabalhar em outro local por questão de melhor remuneração. Por volta de duas semanas antes do show, eu retornei a esta empresa para fazer alguns eventos ocasionais.
Quando soube que trabalhariam no show do Led Zeppelin, iniciei uma campanha interna para ser fazer parte da equipe no dia. Deu certo!!!
Quando chegou a tal segunda-feira, 10 de dezembro de 2007, eu vivi uma das maiores euforias de minha vida. Assisti ao show do Led Zeppelin! E ainda recebi por isso.
Fiquei posicionado estrategicamente – alinhado com os gestores da casa, claro – com alguns colegas de trabalho num ponto em que víamos o show bem perto do palco, enquanto servíamos parte do público com cervejas pet que carregávamos em uma mochila.
O que presenciei naquele dia, eu carregarei comigo para sempre. Os ingressos custaram no site em média 150 libras (à época, 600 reais). Com cambistas, estava na casa de 1000 libras (4 mil reais). E o público chorava de felicidade ao conseguir um.
As pessoas entravam na arena mais eufóricas do que a torcida do Bahia após uma goleada pelo Brasileirão. Enquanto eu servia as cervejas, conheci gente do mundo inteiro. Gente que viajou milhares de quilômetros só para ver o show. Norte-americanos, alemães, japoneses... e, claro, brasileiros.
Um, em especial, vestia a camisa do Fluminense e parecia uma barata tonta. A felicidade o deixava desnorteado. Fiz logo amizade com ele e acabei descobrindo se tratar de um carioca que residia em Salvador. Foi uma felicidade só! E ele ainda passou a me chamar de ídolo, pois, enquanto pagou feliz cerca de 4 mil pelo ingresso, eu entrei de graça.
Começou o show e, de repente, eu fiquei extremamente nervoso. Enfim, ia descobrir até que ponto a lenda tinha algum fundo de realidade. A banda começou a tocar. A primeira música foi ‘Good Times, Bad Times’. Eu estava petrificado, com a musculatura tensa e medo de ver uma idolatria se desfazer diante de mim. Olhei ao redor e vi 20 mil pessoas travadas da mesma forma, até porque os músicos já haviam passado dos 60 anos. Quase não se ouvia barulho da plateia.
O já clássico show na O2 Arena, foto Paul Hudson / Wikimedia Commons
Foi quando me dei conta que meus medos particulares eram compartilhados com o mundo inteiro. O som que vinha da banda, porém, estava limpo, forte e afinado de modo impecável.
Terminou a primeira música e se ouviram imensos aplausos, com num teatro. Para o Led Zeppelin, era pouco. Tanto que, ao começar a segunda música, eu e toda a plateia voltamos a travar. A tensão, embora menor, continuava.
Porém, a segunda música, ‘Ramble On’, foi tocada de modo ainda mais espetacular. Ao fim dela, a explosão de alegria foi total. Parecia um gol decisivo em final de campeonato.
Neste momento, minha musculatura relaxou. A dos 20 mil presentes também. A partida estava ganha. E as 2h seguintes se transformaram em um showzaço de rock’n’roll com nunca imaginei.
No palco, a maior banda de todos os tempos. Na plateia, uma multidão ensandecida, dançando, vibrando, se divertindo e cantando cada pedaço de cada letra.
Na reta final do show, eu e mais dois colegas já estávamos pulando e acompanhando as músicas usando as long necks para imitar baquetas de bateria. Voltei para casa realizado.
Para completar, um ano e meio depois, eu já de volta a Salvador, estava conversando sobre o show num churrasco em família quando um primo comentou de um amigo dele carioca, mas radicado em Salvador, que viajou à época para Londres só para ver o Led Zeppelin.
Eu emendei: “por acaso, esse rapaz é torcedor do Fluminense?”. Meu primo se espantou: “Como você sabe???”. E descobrimos a coincidência! O tal rapaz se chamava Aragon. Uma figuraça!
Semanas depois, meu primo me levou para uma visita na casa dele. Quando me viu, o cara ficou eufórico. Já chegou me servindo uma cerveja e gritando: “meu ídolo! Mentira que você está aqui!”.
Na sequência, me mostrou um pôster gigante do Led Zeppelin na sala e me apresentou à esposa e a outro amigo também presente. Virei um dos signos daquela aventura dele. Por fim, sentamos a turma na varanda e começamos a beber e resenhar por horas sobre o show. Ficou para a história!