quarta-feira, abril 11, 2007

A SINFONIA DO SONHO FEBRIL

Air, o duo francês que embasbacou o mundo com Moon Safari (1998), está de volta com Pocket Symphony

A melhor e também a pior coisa que pode acontecer para um artista é lançar uma obra-prima. Ao mesmo tempo em que esta o alça a condição de "mestre", "gênio", "magnânimo", "necessário", ela também pode simplesmente acabar com sua carreira, fazendo com que toda a sua produção subseqüente se resuma a tentativas de superar aquele fugaz - e ao mesmo tempo, eterno - momento de genialidade. Claro que há exceções, mas estas, como se sabe, existem exatamente para confirmar a regra.

O Air, um duo francês surgido no enclave burguês de Marselha em 1995, formado por Nicolas Godin e Jean-Benoît Dunckel, meio que é um exemplo disto. Em 1998, após uma brilhante seqüência de singles publicados por selos de música eletrônica, eles lançaram seu primeiro CD, intitulado Moon Safari. Este excedeu - e muito - os ótimos singles anteriores com um álbum genial - desde o primeiro segundo de som até o último acorde.

Moon Safari, que ainda rendeu os hits Sexy Boy e Kelly, Watch the Stars, trouxe para o público todo um requinte europeu que conjugava o experimentalismo sexualmente perverso de um Serge Gainsbourg com influências de autores eruditos do século XX como Maurice Ravel e Erik Satie e a melancolia das trilhas sonoras de filmes italianos, aliada a uma pegada pop eletrônica absolutamente irresistível e de apelo universal - ainda que distante da pista de dança e mais afeita à sala de estar. Esse tempero eletrônico e o clima de sonho eram tirados do som de teclados vintage como Moog e Rhodes, remetendo à nomes como Vangelis e seu conterrâneo Jean-Michel Jarre.

O resultado dessa salada toda foram melodias que eram ao mesmo tempo confortáveis e inusitadas, causando uma estranha nostalgia, uma idéia de futuro ultrapassado, como um desenho dos Jetsons em slow motion. De forma genial, a música do Air conseguia ser tão etérea, leve - e necessária - quanto o próprio elemento que lhe dá nome.

Montados sobre tamanho elefante branco logo no início da carreira, só restava ao duo seguir em frente, tentando - ou não - superar o disco que os alçou à fama mundial.

A tentativa mais recente, intitulada Pocket Symphony - entregue-se logo -, não deu conta da hercúlea tarefa. Contudo, que bom que eles continuam tentando, e com isso, gerando mais e melhores álbuns do Air.

A novidade agora é uma maior aproximação com a música japonesa, já ensaiada desde o disco anterior, Talkie Walkie (2004), com a faixa Alone in Kyoto. Para isso, Godin aprendeu a tocar dois instrumentos de cordas básicos para a musicalidade nipônica: o koto e o shamisen. O ouvinte leigo dificilmente fará a ponte entre o som do Air e as escalas orientais ensaiadas em faixas como Mer du Japon e One Hell of a Party, tamanha a sutileza com que são utilizadas.

"Sutileza", aliás, é palavra-chave para entender o som de Nicolas e Jean-Benoît. Em Pocket Symphony, o Air nos traz uma música tão rica quanto econômica. Não há profusão de notas ou acordes emitidos a esmo, e sim, uma miríade de climas e harmonias meticulosamente planejadas para fazer o ouvinte flutuar no espaço - mesmo que esteja com os dois pés firmemente plantados no chão e nem faça uso de substâncias não recomendadas pela Constituição.

Os recursos eletrônicos são usados com parcimônia e elegância, cedendo a predominância aos instrumentos orgânicos como violões, pianos, percussões (sequer há bateria em todas as músicas) e os tais instrumentos orientais.

A música desses dois franceses alienígenas leva o ouvinte embora para um passeio, um suave navegar por um Mar do Japão imaginário, uma seqüência de paisagens de sonho.

Fãs antigos certamente não se decepcionarão. Todo o climão de sonho febril, as melodias a la française e o romantismo frio de robô de comercial de whisky estão de volta em faixas como Space Maker, Once Upon a Time e Left Bank.

Apreciadores do brit pop dos anos 90 terão uma razão a mais para curtir o álbum com a participação de Jarvis Cocker, o ex-líder do Pulp, em One Hell of a Party, cantando e na autoria da letra. Não é a melhor faixa do disco, mas na falta do Pulp, está valendo.

Música sensual e onírica é a marca do Air

O Air surgiu em 1995, depois que os estudantes de arquitetura Nicolas Godin e Jean-Benoît Dunckel, que tocavam numa banda chamada Orange, decidiram trabalhar juntos em um novo projeto.

Após lançarem alguns singles, botaram na rua seu primeiro álbum, Moon Safari (1998). Com o sucesso inesperado, passaram a ser requisitados para assinar trilhas sonoras de filmes (como As Virgens Suicidas, de Sofia Coppola), espetáculos de dança contemporânea, desfiles de moda e exposições de artes plásticas.

Em 2001, lançaram o segundo álbum, The 10,000 Hz Legend. Mais experimental, decepcionou um pouco quem esperava por um novo Moon Safari.

Em 2004, voltaram às boas com Talkie Walkie, onde faziam a ponte entre o experimentalismo árido de The 10,000 Hz Legend e o frescor criativo de Moon Safari.

Engana-se porém, quem imagina que o Air produz música new age para meditação. Os ares por onde flanam Nicolas e Jean-Benoît são bem mais excitantes do que um ouvinte desavisado pode imaginar.

A música para meditação pressupõe o esvaziar da mente para se atingir um determinado estado de relaxamento. A música do Air, ao contrário, povoa a mente do ouvinte com imagens oníricas de forma sedutora, sensual mesmo. Em suma: tem coisas que só os franceses podem fazer por você.

Matéria publicada no jornal A Tarde de 11 de abril de 2007. Texto sem a edição do jornal.

7 comentários:

Franchico disse...

Em tempo: a expressão "substâncias não recomendadas pela Constituição" é copyright do senhor Franciel Cruz, o guru do Nordeste de Amaralina.

Eu posso até chupar, mas quando o faço, dou o devido crédito...

Franchico disse...

Esse tal de Alan Moore é um pervertido de marca maior, mesmo. Onde já se viu? Humph!

http://www.universohq.com/quadrinhos/2007/n11042007_08.cfm

Franchico disse...

Primeira imagem do hilário Steve Carell como o Agente 86.

http://www.omelete.com.br/Conteudo.aspx?id=100004953&secao=cine

E ainda tem a bonitinha Anne Hathaway (daquele filme idiota, O Diabo Veste Prada) como a Agente 99.

Qualquer filme com Steve Carell me interessa. Alguém aí já viu a primeira temporada da versão americana de The Office? Já tem em locadoras e é bom demais!

Franchico disse...

The Walkmen, Yeah Yeah Yeahs e Snow Patrol estão na trilha sonora de Homem-Aranha 3 e disponíveis para ouvir no MySpace do filme.

http://www.myspace.com/spiderman

osvaldo disse...

O Air em muitos aspectos parece o Pink Floyd, mais suave e viajando em smart drugs. Então Get Smart ( como era chamada a serie Agente 86 no USA) com Steve Carell deve acompanhar os tempos.

Franchico disse...

The Dead Won't Die!

http://www.youtube.com/watch?v=KuGpDCJQxTc

Franchico disse...

Página óctupla (!) do desenhista fodástico-cinematográfico Bryan Hitch para The Ultimates Volume 2, nº13.

http://www.newsarama.com/marvelnew/Ultimate/13/Ults13_8ppg.html

No Brasil, conhecido como Os Supremos, uma versão "malvadinha" dos Vingadores do universo Ultimate, publicada aqui na revista Homem-Aranha Millenium. e Ultimates é uma das melhores revistas de super-heróis dos últimos 20 anos, fácil.