segunda-feira, setembro 05, 2016

MESTRE DA MICROFONIA DESPLUGADO

Lee Ranaldo traz à Salvador seu show acústico solo. O ex-Sonic Youth se apresenta dia 15, no Cine-Teatro Solar Boa Vista, dentro do evento Low Fi - Processos Criativos

Lee Ranaldo, foto Leah Singer
De vez em quando – bem de vez em quando – Salvador recebe um artista de rock internacional realmente relevante.

O ex-Sonic Youth Lee Ranaldo é o próximo destas esparsas ocasiões, se apresentando em Salvador no próximo dia 15, no Solar Boa Vista.

O lendário guitarrista trará a Salvador seu show acústico solo, ou seja: voz e violão.

Ele se apresenta dentro do evento periódico Low Fi - Processos Criativos, capitaneado pelo músico e produtor Edbrass Brasil, ex-membro da antológica banda local Crac!.

“Esse show é uma parceria minha com a Desmonta, uma produtora de São Paulo”, conta. “Eles trabalham com Lee desde 2011, já trouxeram ele ao Brasil outras vezes”, diz.

Destemido, Edbrass conta que dispõe do apoio logístico de alguns amigos e parceiros, mas que quem “se coçou” para viabilizar o evento foi ele mesmo.

“Tô apostando tudo na bilheteria. Tenho apoio dos amigos, mas é na raça mesmo”, afirma.

Em entrevista por telefone exclusiva para a Bahia, Lee Ranaldo conta que sim, já ouviu falar de Salvador, e está ansioso para conhecer a música local.

“Faz mais de uma década que me falam de Salvador, da Bahia e de sua música. É possível que até já tenha ouvido algo, mas não saberia dizer se era música baiana, mesmo. Mas estou realmente ansioso para descobrir mais, e talvez experimentar algo”, avisa.

Lee tem duas más notícias para os fãs nostálgicos de sua (de fato, saudosa) ex-banda. A primeira: “Não planejo tocar músicas do Sonic Youth”.

“É uma turnê acústica solo, algo que tenho feito mais e mais nos últimos anos e que tem dado muito certo. Tenho feito muitos concertos bem sucedidos assim, o que tem me agradado demais”, afirma.

Lee aproveitará esta turnê acústica pelo Brasil para testar algumas músicas novas, além de tocar canções de seus outros discos e alguns covers.

“Vou estrear diversas canções que estarão no meu próximo disco, o que me deixa muito animado, além de tocar músicas dos meus outros discos. Talvez um ou dois covers”, diz Lee, daquele jeito tranquilão típico.

Ah, a segunda má notícia para os fãs do SY: não há planos para a reunião da banda.

“Da perspectiva deste momento, eu não imaginaria acontecendo de forma alguma. Eu não acredito que, hoje em dia, qualquer um de nós esteja pensando seriamente nisto. Não mesmo. Eu nunca penso nisso, com toda franqueza”, diz.

“E eu diria o mesmo de Kim (Gordon, baixista) e Thurston (Moore, guitarrista). Todos estão fazendo coisas por conta própria e felizes assim. Mas sabe, pessoalmente, não vou dizer ‘nunca vai acontecer’,  vamos deixar assim. Mas não prevejo uma reunião em breve”, reforça.

Em seus últimos discos, Lee arregimentou uma banda chamada The Dust, com o parceiro de SY Steve Shelley na bateria. Agora, para seu próximo disco, ele planeja formar uma nova banda.

"Sim, estou tocando com umas duas bandas diferentes neste momento. Meu próximo álbum é algo bem diferente dos dois últimos, então estou tentando formar uma banda nova, com membros da The Dust e um cara de Barcelona chamado Raul Fernandez. Na minha ultima turnê pela Europa ele tocou em minha banda. Tem alguns músicos diferentes com quem tenho tocado, então ainda estou tentando definir quem exatamente tocará comigo neste novo conjunto, por que este novo disco é um pouco mais 'produzido' do que os anteriores, é muito menos um disco de banda e bem mais produção", conta.

O SY na foto interna do LP Daydream Nation: Kim, Lee, Steve e Thurston
Lee vê pouca diferença entre seus objetivos como artista solo ou parte de uma banda, fora o tamanho dos lugares onde toca.

"Acho que sim. Não sei se chamaria de visão diferente, mas há coisas diferentes que você pode fazer quando toca solo e quando está em uma banda. Pra mim, uma das coisas que mais me agradam (como artista solo) é que as performances podem ser bem íntimas, posso tocar para audiências menores, sentadas. Uma das coisas que gosto é que esses shows solo não costumam ser em casas noturnas de rock, mas em locais que podem ser considerados mais especiais, ou apenas diferentes, criando um ambiente onde podemos criar uma situação mais íntima, mais adequada para este tipo de música. Quando toco com uma banda de rock, é mais excitante, digamos, você toca em casas noturnas, festivais e coisas assim. Em alguns casos, são as mesmas canções, mas em formatos diferentes, o que traz a tona sentimentos e emoções diversas

Ruído? Que ruído?

No auge da fama, o SY apareceu n'Os Simpsons, em episódio de 1996
Influência fundamental para o estouro do chamado rock alternativo no início dos anos 1990, o Sonic Youth foi fundado em Nova York por Lee, Thurston Moore, Kim Gordon e o baterista Steve Shelley, em 1981.

A banda acabou em 2011, quando o casal Moore e Gordon se separou de forma não muito amigável.

Ousado, o quarteto explorava afinações não convencionais e misturava influências punk com a música eletroacústica de  John Cage e Karlheinz) Stockhausen. Lançou LPs antológicos, como Sister (1987),  Goo (1990) e Dirty (1992).

“Começamos de forma muito simples em Nova York, oriundos de uma cena bem experimental, então havia muitos precursores naquela época. Alguns deles sequer chegaram a sair de Nova York. Na época em que começamos a ficar mais conhecidos, ali pelo meio, fim da década de 1980, o mundo começou a despertar para aquilo que se chamou de 'rock alternativo', ou 'música underground'. Mas, para nós, estávamos apenas seguindo nosso caminho, nós já fazíamos aquele tipo de música”, afirma.

“Começamos inspirados por tudo o que acontecia em Nova York no fim dos anos 1970, início dos 80, do punk à new wave, do rock experimental ao minimalismo experimental e coisas assim. Estávamos tentando sintetizar todas as nossas influências do movimento de Nova York, Stooge, MC-5, John Cage, (Karlheinz) Stockhausen, coisas assim. Estávamos tentando conjugar todos esses elementos diversos em nossa própria combinação. A uma certa altura, fomos colhidos em todo aquele entusiasmo mundial pelo rock alternativo. Mas sempre estivemos em nosso próprio caminho, de certa forma. Fomos incluídos no pacote, mas éramos bem diferentes da maioria daquelas bandas que seguiam o 'som de Seattle'. Tínhamos nossas próprias aspirações e influências individuais”, diz.


Tanto Lee quanto Thurston Moore iniciaram sua carreira na orquestra de guitarras do compositor erudito de vanguarda Glen Branca, em meio ao vibrante cenário novaiorquino da época. Ele reconhece que Branca o influencia ainda hoje.

"É difícil... De certa forma, é fácil ver as influências, mas... As influências estão estabelecidas e alguém como o Glen, a música dele... Ele ainda faz música, mas não é do tipo que ouve falar por aí o tempo todo, ou na grande mídia. As pessoas que tem interesse neste tipo de coisa estão ouvindo sua música e seguem o que ele anda fazendo. Não é algo que abalou o planeta como o Nirvana, quando o mundo todo parou e reconheceu que algo novo estava acontecendo ali. Mas para mim, muitas coisas que aconteceram naquela época foram tão importantes e influentes, que certamente influíram na música que fiz ao longo de toda a minha carreira", observa.

Cheia de ruído e microfonia, mas bela assim mesmo, a música do Sonic Youth era íntegra, reafirma Lee, soltando até uma farpa para os contemporâneos do Jesus & Mary Chain.

Lee em foto de sua filha, Sage Ranaldo
“Eis algo estranho para se conversar, por que as vezes, quando as pessoas usam a expressão 'ruído' (noise, em inglês), a usam de forma desdenhosa ou depreciativa. Pra mim, não há... Quero dizer, posso usar o termo como um atalho para aquilo que não se refere a um som melódico e sim, para algo dissonante ou abrasivo. Mas, para mim, (o ruído) é tão parte da música quanto qualquer coisa considerada bela. Não dá para ter uma, sem a outra, entende? Não é uma questão de simplesmente pegar uma canção no sentido tradicional do termo e injetar ruído nela, para torna-la mais extrema ou algo assim. Penso que cada peça de música encontra seu próprio equilíbrio entre, por um lado, ser mais melódica, mais bela, e, pelo outro, ser mais ruidosa ou dissonante. Sinto que é tudo parte integrante da música, por que não eu não gosto de separar a ideia do ruído da ideia da música. Pra mim, é tudo música, o ruído não se encontra em uma categoria diferente. No Sonic Youth, nós não escrevíamos canções e depois decidíamos (injetar ruído), como o Jesus & Mary Chain costumava fazer. Eles escreviam essas canções pop e aí adicionavam camadas de ruído por cima, fazendo-as soar 'avant-garde'. Com o SonicYouth não era assim de jeito nenhum. Fazíamos canções que integravam todo tipo de sons diferentes. Algumas passagens eram muito bonitas, outras soavam loucas ou ruidosas. Dependia muito do que estávamos tentando realizar em cada música. Então, pra mim, (o ruído) é só mais uma ferramenta disponível quando se faz música”, afirma.

Por fim, a pergunta que não quer calar – e que é respondida de forma muito enfática: ”Estou apoiando Hillary, com toda certeza. Estou realmente esperançoso que ela seja eleita e não, definitivamente não, não o Trump. Definitivamente não. Acho que Hillary pode ser uma boa presidente e estou muito animado com a ideia de ter uma mulher na Casa Branca. Primeiro um negro e agora uma mulher, será um grande dia para os Estados Unidos. Ambos tem muita controvérsia em seu redor, mas acho que Trump seria um desastre absoluto. E eu realmente acho que Hillary seria muito boa presidente”, conclui o guitarrista.

Lee Ranaldo: acoustic solo / Dia 15 (quinta-feira), 20h30 / Cine-Teatro Solar Boa Vista (Parque Solar Boa Vista, s/nº, Engenho Velho de Brotas) / R$ 80 e R$ 40 (Vendas: Sympla)

7 comentários:

Franchico disse...

RIP Yuri Almeida AKA DJ Poha

https://www.facebook.com/teatro.rival/photos/a.186921328073205.39014.181581445273860/1078138948951434/?type=3&theater

Cara super alto astral, da primeira turma de Comunicação da UcSal (1991). Tínhamos alguns amigos em comum, então volta e meia nos encontrávamos nos eventos da Facom, da própria UcSal ou no rock. Sempre de bom humor, disposto a curtir muito. Um sujeito muito legal. Filho de Ieda e Ailto, da produtora Palco, que traz muitos shows de medalhões da MPB pro TCA. Meus pêsames aos amigos e familiares.

Anônimo disse...

"Lee tem duas más notícias para os fãs nostálgicos de sua (de fato, saudosa) ex-banda. A primeira: 'Não planejo tocar músicas do Sonic Youth'." Não é "má noticia." Lee está tocando na maneira que Lee sempre tocou - forte, com sonoridades que todos os fãs de SY reconhecem. E agora temos músicas novas, lindas, com boas letras (de Lee e Jonathan Lethem). Onde sai má notícia??

Franchico disse...

Prezado anônimo, veja como escrevi: "duas más notícias para os FÃS NOSTÁLGICOS de sua (de fato, saudosa) ex-banda".

Acredito que os "verdadeiros" fãs do Sonic Youth não são nostálgicos, pelo próprio caráter vanguardista da banda.

Ou seja, para mim ou para você, não chega a ser má notícia. Pode ser para um ou outro, mas...

Entendeu?

Adelvan disse...

"Lançou LPs antológicos, como Sister (1987), Goo (1990) e Dirty (1992" - Isso! São exatamente os três que eu mais gosto - sem desmerecer vários outros também excelentes - e alguns que não me entram, mas ok, eu é que devo ser birro demais pra entender. Quanto à crítica ao jesus, até concordo, no sentido de que o SY era realmente mais sofisticado nos arranjos, MAS isso não me faz perder um milímetro do meu gosto pelos caras. Sou hiperultramegafã do jesuas and mary chain. "Psychocandy" é um dos discos que mudou minha vida.

Franchico disse...

Também continuo adorando o J&MC, Adelvan! Mas faz sentido mesmo, o que ele disse. Enquanto as músicas do SY eram construídas levando o noise em conta, no J&MC o noise era como o glacê do bolo. Não diminui em nada minha adoração por essa grande banda, mas nos faz entender melhor a proposta de cada um.

Continuo amando o Darklands, Automatic, Honey's Dead e Munki.

Ah, citei esses discos por duas razões: por terem títulos curtos (ocupando menos linhas no parco espaço de uma página de jornal) e também por serem alguns dos meus preferidos. O Sister eu tenho até em vinil.

Rodrigo Sputter disse...

o disco q me fez conhecer os caras foi o experimental jet...em k7, vendeu em salvadoro cd baratim...na akydisco...junto com cramps...bo diddley...weezer...algo entre 2,90 e 3,90...comprei o meu do cramps na aky disco q ficava na praça de alimentação do iguatemi...uma viagem daqui até lá pra pegar o cd...hj vou rapidinho de bike...tenho esse q citei do sonic e o washing machine em cd...e são os que mais escutei e gosto...se são os melhores não sei...mas ter os cds originais me fez ouvir muito esses...

num senti tão alfinetada...ou uma crítica construtiva...ou diferenças de barulhos...acho ambos válidos...embora concorde mais com ele...são conceitos barulhísticos diferentes...e o cara faz show solo e querem q o cara toque SY? na viola...eu até queria ver como seria-eheheh

do jesus, o psycho é meu fave...tenho esse o dethroned em cd original...e um de b-sides...mas darklands é uma das canções mais belas de todos os tempos...será q ele vai tocar essa??
heehhehee
colocar o sonic no balaio do grunge só mesmo a imprensa pra fazer isso...sem querer te colocar no bolo...mas sei q vc tb concorda comigo...

andre L.R. mendes disse...

esse show vai ser imperdivel.