segunda-feira, outubro 03, 2016

O HORROR É REAL

Nobel de Literatura 2015, bielorussa Svetlana Aleksiévitch tem dois livros lançados no Brasil: Vozes de Tchernóbil e A guerra não tem rosto de mulher

Svetlana. Foto Elke Wetzig / Wikicommons
Mark Twain uma vez disse que “a diferença entre a verdade e a ficção é que a ficção faz mais sentido”.

Certamente, a  jornalista bielorussa Svetlana Aleksiévitch tem uma compreensão profunda deste fato. Não a toa, os relatos orais que ela apresenta em seus livros lhe valeram o prêmio Nobel de Literatura em 2015.

Neste ano, coincidindo com a visita da autora ao Brasil durante a última Flip - Festa Literária Internacional de Paraty, a Companhia das Letras começou a publicar seus livros no Brasil, com tradução direto do original russo.

Primeiro, saiu Vozes de Tchernóbil, traduzido por Sonia Branco. Mais recentemente, chegou às livrarias A guerra não tem rosto de mulher, vertido para o português por Cecília Rosas. Outros virão.

Os dois já publicados compartilham uma estrutura idêntica: são compilados de relatos orais, colhidos pela autora, de centenas de pessoas.

Juntas, as histórias que essas pessoas contam formam uma história maior e até então não revelada.

Juntos, seus livros contam uma outra história, ainda maior: o fim dos homens e mulheres soviéticos.

Catástrofe nuclear

Ocorrido há 30 anos, o desastre nuclear de Tchernóbil assombrou o mundo por várias (e óbvias) razões.

Mas talvez a principal – para o mundo ocidental, especialmente – é que o regime socialista soviético, totalitarista por natureza, sempre escondeu a real extensão de suas consequências.

Não adiantou muita  coisa, como sabemos – e o acidente em si acabou apressando a dissolução da URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas), então já em marcha.

Em Vozes de Tchernóbil, Aleksiévitch oferece uma visão completa e inédita do pior acidente nuclear de todos os tempos.

Há depoimentos de bombeiros,  esposas,  filhos, liquidadores (os pobres coitados – armados de pás – que eram enviados para recolher a terra contaminada), engenheiros  químicos, moradores das localidades próximas, professores – todo tipo de gente.

A cada depoimento, lemos não apenas histórias tristes de pessoas que deram suas vidas para tentar debelar o incêndio e o posterior vazamento de radiação.

Lemos relatos de vidas inteiras, famílias, cidades inteiras evacuadas – tudo dito com a simplicidade e a sinceridade das pessoas comuns, distante do trololó oficial (e mentiroso) das autoridades.

O que fica óbvio é que, ocorrido o acidente, ninguém, absolutamente ninguém, nem cientistas, nem governo, nem populares, ninguém tinha noção do que era aquilo.

Pilotos de helicópteros militares foram alguns dos primeiros a serem mobilizados para debelar o incêndio no reator nuclear, despejando pranchas de chumbo e depois, areia – tudo isso, pairando sobre as chamas radioativas. Nenhum deles viveu muito tempo.

“Para atingir o alvo corretamente, os pilotos abriam as cabines e cravavam os olhos para determinar a inclinação necessária: direita-esquerda, acima-abaixo. As doses (de radiação no local) eram uma loucura!”, relata Guenádi Gruchevói, diretor da Fundação para as Crianças de Tchernóbil.

Em torno da usina, foi estabelecida uma zona de exclusão de 30 quilômetros. Mas muitas pessoas – camponeses, principalmente, nascidos e criados ali – simplesmente ficaram, ao léu.

Camadas de terra superficiais precisavam ser removidas e enterradas profundamente. Todos os animais, domésticos e silvestres, eram abatidos a tiros.

“Enterrávamos o bosque... Serrávamos as árvores, reduzindo-as a metro e meio, envolvíamos em plástico e as empurrávamos para uma fossa. (...) Não sei em qual poeta li que os animais são outros povos. E eu os exterminava às dezenas, centenas, milhares, sem saber sequer como se chamavam”, relata o liquidador Arkádi Filin.

Passadas três décadas, a catástrofe ainda parece um fenômeno maior do que aquilo que os depoimentos dão conta: “Depois de Tchernóbil, o que restou foi a mitologia de Tchenóbil. Os jornais e as revistas competem entre si para ver quem escreve as coisas mais terríveis, e esses horrores agradam, sobretudo, àqueles que não os viveram. (...) Por isso, o que se deve fazer não é escrever e sim anotar. Documentar os fatos. Mostre-me uma novela fantástica sobre Tchernóbil. Não há! Nem haverá! Garanto”, afirma o jornalista Anatóli Chimánski.

Heroínas soviéticas

A pegada dura, sem retoques, mas ainda assim, extremamente tocante, é a mesma é A guerra não tem rosto de mulher, que compila depoimentos das mulheres soldado soviéticas que combateram na 2ª Guerra Mundial.

Publicado na URSS em 1985, teve muitos trechos censurados pelo Partido Comunista, porque eles  “destronavam a mulher heroína”, dada a crueza de detalhes.

Nesta edição, os trechos censurados estão incluídos.

Eis um deles, a título de amostra: “Capturávamos prisioneiros e levávamos para o destacamento. Mas não fuzilávamos, era uma morte leve demais para eles: nós os esfaqueávamos como porcos, com as baionetas, cotávamos em pedacinhos. (...) O que você sabe a respeito dessas coisas?! Eles queimaram minha mãe e irmãzinhas em uma fogueira no meio da aldeia”.

Vozes de Tchernóbil - Crônica do futuro / Svetlana Aleksiévitch / Companhia das Letras / 384 p. / R$ 49,90/ E-Book: R$ 34,90 

A Guerra Não Tem Rosto de Mulher / Svetlana Aleksiévitch / Companhia das Letras/ 392 p. /R$ 49,90 / E-Book: R$30,90


Abaixo, vídeo do encontro de Svetlana com leitores em São Paulo, promovido pela Companhia das Letras

6 comentários:

Franchico disse...

Por que paulistas e baianos tem mais é que se fuder:

http://jornalggn.com.br/noticia/por-que-haddad-deve-ganhar-e-acm-neto-nao-por-marcos-villas-boas

Juntinhos, abraçados. Eta povo estúpido.

Franchico disse...

Deu ruim pra Marina.

http://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/dirigentes-da-rede-saem-e-publicam-carta-aberta-criticando-vazio-politico-do-partido/

Não dou seis meses pra ela se filiar ao reduto das ninfas, à casa das santas, ao oásis da pureza (bem branquinha, diga-se de passagem, né Imbassahy?) na política brasileira: o primeiro (e espera-se, único) PSDB.

Franchico disse...

Parece que o melhor filme de zumbis dos últimos anos vem da Coreia:

http://www.bleedingcool.com/2016/10/02/train-busan-review-south-korean-zombies-train/

Do Sul, claro.

É que os zumbis da Coreia do Norte já são reais, mesmo.

Franchico disse...

O trailer 2 é melhor ainda:

https://youtu.be/1d4DACwz49o

Franchico disse...

Por que Joãozinho Trinta ("Quem gosta de pobre é intelectual") continua atualíssimo:

http://www.brasilpost.com.br/2016/10/03/story_n_12303354.html?utm_hp_ref=brazil

"Se Câmara de SP fosse uma pessoa, seria homem, branco e milionário"

Rodrigo Sputter disse...

http://www.brasilpost.com.br/2016/10/02/mbl-elege-vereadores_n_12302946.html

pq eles não montaram um partido novo??

pq se coligaram com uns partidos velhacos e com histórico de corrupção?