segunda-feira, agosto 14, 2017

LOKURA EM ALTA FIDELIDADE

Clássico do rock e da MPB, Loki?, de Arnaldo Baptista, volta em vinil 180 gramas via Polysom. Despercebida na época, obra ganhou status de cult graças à genialidade insana do ex-Mutantes

Arnaldo em 2017, divulgando nova mostra de quadros. Ft Henrique Queiroga
Ao contrario do que pensam muitos empresários e produtores, a música popular pode (e deve) tratar de outros temas além das dores da traição amorosa e demais banalidades correlatas.

Os males da alma, o isolamento e, digamos, os discos voadores já inspiraram grandes artistas e criarem obras referenciais, eternas.

No Brasil, um álbum movido a tristeza e loucura incipiente é há mais de 40 anos reverenciado como um dos melhores do rock nacional – e da MPB mesmo: Loki? (1974), do ex-Mutante Arnaldo Baptista, que agora volta às lojas no formato perfeito para ouvi-lo em toda a sua grandeza: em LP de vinil 180 gramas.

Gravado logo após sua saída dos Mutantes e do seu divórcio de Rita Lee, Loki? é o desabafo, o grito de dor de um homem extremamente talentoso e sensível em um momento especialmente frágil: isolado em um sítio na Serra da Cantareira (SP), entre o abuso do LSD e  a sanidade que começava a lhe abandonar, um processo de degradação que culminou em uma tentativa de suicídio em 31 de dezembro de 1981.

Felizmente, Arnaldo sobreviveu e – mesmo tendo de viver com as sequelas daquele período trágico – está hoje feliz, vendo sua obra (solo e com os Mutantes) ser cada vez mais aclamada como uma das mais fundamentais da psicodelia planetária.

Não a toa, nomes como Kurt Cobain, Sean Lennon, Devendra Banhart, Kevin Parker (Tame Impala)  e a revista inglesa Mojo, entre outros, já rasgaram declarações de amor ao eterno Mutante.

“(Estou) Adorando a vida, achando as coisas que acontecem de repente maravilhosas, que nem esse lançamento”, diz Arnaldo ao telefone.

Conhecido pelas obsessões audiófilas (guitarras, só marca Gibson e amplificadores, só valvulados), Arnaldo aprovou com louvor a qualidade sonora do vinilzão 180 gramas de Loki?: “Com a profundidade maior dos sulcos no vinil de 180 gramas, a agulha penetra mais, então dá um grave mais poderoso”, justifica.

“Tenho a impressão de que Loki? foi o (meu trabalho) mais marcante, foi feito numa época da minha vida que eu precisava mostrar isso. Estava sem gravadora, sem conjunto, sem nada, Então foi uma coisa importante na minha vida e na minha carreira”, afirma.

Power trio sem guitarra

Arnaldo no sítio da Cantareira, 197? Foto Grace Lagoa
Ainda que seja considerado “de rock”, Loki? é – como os melhores discos de rock, na verdade – uma obra que transcende os limites do gênero, tornando-o quase indefinível.

A começar pelo fato de ser um disco que, apesar de ser considerado de rock, prescinde do seu instrumento mais simbólico: a guitarra. Quase todas as músicas apresentam apenas piano, baixo e bateria.

“Eu meio que me desapercebi disso, por que o disco (na época do lançamento) foi muito mal divulgado. O André Midani (então diretor da gravadora Philips) não gostava de mim, eu acho, aí não divulgou o disco. Então o pessoal não ficou sabendo”, diz Arnaldo.

Se o próprio Arnaldo nem tchuns para esse “mero detalhe”, o mesmo não se pode dizer dos seus parceiros Dinho Leme (bateria) e Liminha (baixo), colegas Mutantes que gravaram Loki? com ele.

“Quando comecei a gravar com o Dinho e o Liminha  não precisou de muito ensaio. Foi tudo no improviso, e o Liminha não queria assim, queria que fosse igual ao Yes: ‘Ah, não quero nada disso, tá parecendo Sérgio Mendes’! Aí eu disse ‘vai ficar assim mesmo’, e foi assim a gravação”, resume.

"Uma coisa que é importante na minha carreira, no sentido de experimentar sem guitarra, com o piano fazendo que nem no Oscar Peterson (Trio), no Zimbo Trio, uma parte total sem guitarra e no fim uma música só de guitarra (É Fácil)", acrescenta.

O resultado é uma coleção de dez faixas em 34 minutos que valem por um mergulho no mar de angústia que afogava o músico na época.

O que separa gênios como Arnaldo dos meros mortais é que, mesmo agonizante, o mergulho é pleno de arte: pianos que vão do clássico ao honky-tonky à bossa nova na mesma faixa (Será Que Eu Vou Virar Bolor?), teclados Moog emoldurando a mais sublime das dores (Desculpe), samba psicodélico com arranjo de Rogério Duprat (Cê Tá Pensando Que Eu Sou Loki?), delírios molhados adolescentes (Vou Me Afundar na Lingerie) e por aí vai. Um monumento.

Outro fator interessante do álbum é sua capa, onde o músico aparece apoiado pelos braços sobre um cenário espacial. "Eu tinha uma casa  na Cantareira e a gente queria fazer uma coisa quase como se fosse num templo, né? Na foto, eu tô de costas para o céu na sacada da casa. Na contracapa eu tô deitado no chão com um anjo atrás de mim, uma estátua. Então ficou bonito", diz o músico.

Em 2013, Arnaldo disse a este jornalista que estava gravando um novo álbum para o qual já tinha até título: Esphera. Infelizmente, este ainda não viu a luz do dia, quatro anos depois.

"Ainda não tenho (previsão de lançamento). Quando me perguntam isso, eu sempre falo: 'a Lucinha é que sabe'. E ela fala: 'Deus é que manda'. É que ainda não tem nada certo, mas vai ser importante para o que vem acontecendo na música em relação a ele", afirma.

E finalmente: Arnaldo continua não gostando do Alice Cooper (como ele canta em Será Que Vou Virar Bolor?)? "Eu não gostava era de um caso que a Rita (Lee) tinha, que era com um roadie do Alice Cooper (quando este se apresentou no Brasil em 1974). Então falei isso para ser contra ele, até por que não gostava dele mesmo, por que matava animais no palco", justifica.

(Segundo o próprio Alice Cooper em entrevistas, pessoas na plateia jogaram uma galinha no palco durante um show. Ele jogou a galinha de volta, que acabou prontamente destroçada pela turba ensandecida).

Com o relançamento, Arnaldo, que hoje mora em um sítio em Juiz de Fora (MG), tem corrido algumas capitais fazendo shows.

“Fiz  três datas agora em Brasília. Tá pintando uma leva de shows que vai satisfazer meu público. Aí em Salvador ainda não sei, mas se pintar alguém que queira comprar, eu vou e faço”, afirma. Em outubro, ele se apresenta em Recife – dica pros Loki locais.

Loki? / Arnaldo Baptista / Polysom - Universal Music / Preço sugerido: R$ 89,90

6 comentários:

Franchico disse...

Batman team-up com Sandman!

https://omelete.uol.com.br/quadrinhos/noticia/dark-nights-dc-surpreende-e-relaciona-a-saga-de-batman-com-sandman/371959/

Meu eu nerd de 15 anos ficou todo molhadinho, ui!

Franchico disse...

Vamo se informar direitinho e parar de passar vergonha nas timelines da vida, vamos? Que tal?

https://voyager1.net/amp/filosofia/o-nazifascismo-e-de-direita-uma-abordagem-filosofica/

Direitopatas, segurem que este filho é de vocês, tá? Quem pariu Adolf que balance!

rodrigo sputter disse...

DISCAÇO, não lembro quando ouvi-o pela primeira vez, mas no começo dos anos 2000, bem no comecinho mesmo, fez minha cabeça, ficava ouvindo-o de madruga...dava um bom barato...solidão...melancolia e melodias incríveis...letras que diziam...e muito...até que não tá caro assim viu...pq já vi cada preço...mas ainda assim não é um preço popular...

rock hoje...bora???
deve ter uns dez anos que tu num ouve noix:

http://www.fotolog.com/thehonkers/248000000000037432/

vá, senão é bolsonaro 2018-hehehe
"rir" pra num chorar...vou nem brincar com uma porra dessas...isola...mas eu venho há anos alertando, pra num ser bolsonaro x aécio no 2o turno de 2018...penseaí??

rodrigo sputter disse...

meu tcc em filosofia foi sobre spengler, citado no texto, mas li pouco sobre essa parte político-econômica dele...foquei mais em um livro e numa parte filosófica, que Spengler aborda a questão da técnica...mas ele realmente não ia com a cara de marx...mas não o chamaria de direitista...teria que me aprofundar mais...era um socialista conservador...mas não sei até que ponto esse conservadorismo seria visto atualmente...mas não estou aqui pra defender spengler...aliás logo adiante ele fala um pouco da diferença desse socialismo conservador...spengler pode ter "influenciado" os nazistas, mas nunca simpatizou com os mesmos...nem com Hitler...Spengler não via com bons olhos toda essa "produção em massa" produzida em sua época...aliás, ele foi um dos autores proibidos pelos nazistas, e quando morreu (1936), Hitler estava no poder, porém, a guerra só começa em 1939 e a perseguição aos judeus em 1936, se não me engano, de forma mais radical...no wikipedia vc acha isso:
"Alguns nazistas, incluindo Joseph Goebbels, viram Spengler como um precursor intelectual, mas ele acabou sendo condenado ao ostracismo pelos nazistas em 1933 por conta de seu pessimismo sobre o futuro da Alemanha e da Europa, bem como sua recusa em apoiar idéias nazistas de superioridade racial.".

Spengler lendo o texto, influenciou nessa questão antropológica de Homem, esse trecho é bem spengleriano:

"O nazi-fascista acredita que o destino da humanidade é a desagregação. Somente as elites que conduzem as massas podem evitar esse destino e de forma heroica. Mitos como “nação”, “estado”, “raça” e as próprias “elites” servem como mitos congregadores e têm função educativa."

rodrigo sputter disse...



porém não lembro de spengler no livro que eu li, falar de que a raça ariana seria a raça heróica e a única a "salvar" a humanidade...ele era bem "pessimista" (não gostaria de usar esse termo, prefiro realista), em relação a humanidade, podemos ver bem nessa parte:

"O homem era e é demasiadamente superficial e covarde para suportar a idéia da mortalidade de todas as coisas vivas. Ele a envolve no otimismo cor-de-rosa do progresso, amontoa sobre ela as flores da literatura, fica a rastejar por trás de uma muralha de ideais para não enxergar nada. Mas a transitoriedade, o nascimento e o passamento, é a forma de tudo quanto tem realidade - desde as estrelas, cujo destino para nós é incalculável, até o efêmero formigueiro do nosso planeta. Avida do indivíduo, seja ele animal, planta ou homem, é tão perecível como a dos povos e das culturas. Cada criação está predestinada à decomposição; todo o pensamento, todo o descobrimento, todo o feito estão condenados ao esquecimento. Aqui e alí, por toda a parte vislumbramos cursos da história de grandioso destino e hoje desaparecidos. Vemos em torno de nós ruínas das obras "que foram", de culturas mortas. No descomedimento de Prometeu, que ergue as mãos para os céus para submeter as potências divinas ao homem, estava implícita a queda. Que é feito, pois, dessa palavrosa alusão às "realizações imorredoiras"?

Oswald Spengler em "O Homem e a Técnica", Páginas 30-31."

Outro trecho de Spengler interessante, sobre a "humanidade":

Entre os enxames das estrelas "eternas" intrinsecamente não importa qual seja o destino deste pequeno planeta que segue seu curso por breve tempo em algum lugar do espaço infinito. Ainda mais insignificante é aquilo que em sua superfície se move durante alguns instantes. Mas cada um de nós, intrisicamente um nada, se vê lançado nesse universo rodopiante por um minuto indizivelmente breve. Por isso este mundo em miniatura, esta história universal, é algo de suprema importância. E, o que é mais, o destino de cada um desses indivíduos não consiste apenas em, por seu nascimento, terem sido eles trazidos para dentro desta história universal, mas sim em haverem aparecido num determidado século, num determidado país, num determindado povo, numa determinada religião, numa determinada classe. Não está ao nosso alcance escolher entre ser filho dum camponês egípcio de 3..000 A.C., de um rei persa ou então dum vagabundo de nosso dias. A esse destino temos de nos adaptar. Ele nos condena a certas situações, concepções e ações. Não existe "o homem em si" tal como um querem os filósofos, mas apenas homens de uma época, de uma localidade, de uma raça, de uma índole pessoal que travam batalha com um dado mundo e acabam vencendo ou sucumbindo, enquanto o universo ao redor deles segue lentamente o seu curso com uma indiferença divina. Essa batalha é a vida - a vida, sim, no sentido nietzschiano - uma luta tôrva, impiedosa e sem quartel, que nasce da vontade-de-poder.

Oswald Spengler em "O Homem e a Técnica", Páginas 31-33.

rodrigo sputter disse...

creio que a união soviética mesmo revolucionária teve muitos - e muitos - erros e equívocos no seu início e consequência, mas é de pensar que era um "país", uma unificação nova e saindo do século 19...outro pensamento, outro mode de vida...de pensar a humanidade, as minorias...não acho que somente o facismo, nazismo era contra o intelectualismo, vide que a arte em geral não podia ser muito "bonitinha", pois era burguesa, tinha que ser mais dura e realista, vide que muitos artistas ficaram proibidos de fazer uma arte diferente do partido, muitos "exilados", mortos e "suicidados", recentemente li um livro do Isaac Bábel, que foi do exército vermelho, socialista, porém stalin no grande expurgo "mandou" fuzilá-l...

Sinceramente, colocar nazi e comunismo no mesmo bolo por causa da proposta de "um novo Homem" é realmente muita preguiça intelectual...
já vi muito nazi se dizendo anticapitalista, porém se dizer mais ainda anticomunista até o talo...acho "engraçado" essa galera de direita chamar os nazis de esquerda, queria ver eles falando isso num congresso nazista, numa reunião...ah! isso eu queria ver...mas filmado...porque não queria tá perto disso nem a pau...

outra coisa tudo agora é marximo cultural...embora o marxismo cultural não tenha sido idealizado por marx...marx tem tanto livro lançado, mais de 110, e "quase ninguém" dos dois lados sequer leu unzim bem lido...

o grande problema é, que no "comunismo" e no fascismo, vc tem uma figura de um ditador pra culpar cair em cima deles...enquanto no capitalismo eles esquecem de 4 em 4 anos quem é o culpado...e mesmo esse culpado anda com outros culpados, que se diluem pra saber quem foi que ferrou tudo afinal de contas...