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Game Over Riverside, foto Fernando Fernandes |
Original da cena underground da década passada, a Game Over Riverside cumpre a trajetória de tantas outras bandas locais: após alguns anos parada por que os integrantes precisavam cuidar da vida (leia-se trabalhar, estudar etc), ela anuncia seu retorno com shows e um CD para breve.
Entre o grunge tardio e a estética faça-você-mesmo do punk, a GOR pratica um rock alternativo com letras em inglês bem legal, que deve agradar fãs de bandas como Sonic Youth, Nirvana e congêneres.
No Bandcamp do quinteto já tem duas faixas para ouvir e baixar: Deep Waters e Sadness Online.
Lançadas como singles virtuais, ambos tem capa assinada pelo fotógrafo Fernando Fernandes, sendo que o “modelo” é ninguém menos que o popular Rodrigo Sputter Chagas, da The Honkers.
E não é que o rapaz leva jeito?
“Sim, é uma homenagem. Sputter sempre nos incentivou, nos deu força, sempre nos cobrou um registro de nossas músicas. Foi umas das poucas pessoas que, durante o tempo que estivemos parados, cobrava o nosso retorno”, conta o baterista Leo Cima.
Caos, drama, deboche
No mês que vem, a GOR lança seu primeiro registro, um EP com seis faixas (incluindo as duas já citadas), ainda recuperado o repertório da primeira fase do grupo.
“Todas as canções que estão no CD foram compostas antes de pararmos. Tínhamos uma espécie de débito com elas e preferimos grava-las para firmar a existência de cada uma e porque acreditamos no potencial delas”, conta.
“Pretendemos voltar ao estúdio no final do ano para gravar a outra metade do nosso repertório que ficou de fora. Antes, queremos tocar o quanto pudermos. Temos algumas datas dentro do que a gente apelidou como The Grunge Days are Gone Tour (Turnê Os Dias do Grunge Acabaram)”, acrescenta o baterista.
Formada por Leo, André Gamalho (baixo), Leko Miranda e John-John Oliveira (guitarras), Sérgio Moraes (vocal e guitarra base), a Game Over Riverside se apresenta de hoje a oito (dia 19) no Quanto vale o Show?, de Rogério Big Bross Brito.
Definida por Leo como “caótica, dramática e ao mesmo tempo debochada”, a GOR é uma banda que vale a pena ser acompanhada.
Quanto Vale o Show? com Game Over Riverside e Os Canalhas / Terça-feira (19 de abril), 19 horas / Dubliner’s
www.gameoverriverside.bandcamp.com
NUETAS
RestGate no Irish
Todas quarta-feira, a banda RestGate Blues toca a noite Blues na Faixa, às 22 horas, gratuito. Já no dia 22 (sexta), rola a Blues Feelin' Night, com a RestGate, Celso Dutra & Blues House, Soir e participação de Eric Assmar. Dubliner’s Irish Pub, 22 horas, R$ 20.
Vendo 147 reestreia
A Vendo 147 se notabilizou pelos seus dois bateras. Um deles (Dimmy Drummer), porém, deixou o país. Sábado, a nova formação estreia com show no Dubliner’s. A night ainda conta com Du Txai e os Indizíveis. 22 horas, R$ 20.
Frabin, Mapa etc.
O catarinense psicodélico Frabin se junta à banda local Mapa para dois shows.
Sábado Sexta-feira, no Taverna Music Bar, com DJset da SOFT PORN, 21 horas, R$ 15. E
domingo sábado em Camaçari, no John Sebastian Bar, com Declinium e DJ Pivoman, 21 horas, R$ 15.
ENTREVISTA: LEO CIMA (GAME OVER RIVERSIDE)
A banda surgiu no início da década passada, depois parou e agora está de volta. O que houve para banda parar? E por que decidiram voltar?
Leonardo Cima – A banda parou por questões externas. Éramos muito jovens quando surgimos e paramos em uma época na qual dois de nós (a G.O.R. tinha seis músicos) tiveram que priorizar os seus compromissos pessoais e profissionais com mais afinco e acabaram saindo, aí ficou difícil manter o grupo. Também não queríamos substitui-los, não havia sentido em continuar com aquele trabalho sem eles. A Game Over Riverside era uma banda de palco, caótica, dramática e ao mesmo tempo debochada, era aquela coisa da tão falada química entre os integrantes que não fazia sentido dar continuidade faltando algumas peças. Em três anos de atividade, construímos para nós mesmos algo bom e significativo, em uma época em que o cenário era de certa forma efervescente (mesmo com condições piores das que a de hoje) em meio a ótimas bandas como The Honkers, Sine Qua Non, Machina e Costeletas de Fogo, e concluímos que o melhor a se fazer era deixar a coisa quieta em seu canto. Mesmo assim eu, Sérgio Moraes (vocal), Ricardo Cidade (ex-baixista) e Leko Miranda (guitarrista) seguimos adiante e continuamos com a música em um projeto mais pesado e experimental, juntamente com o vocalista Gil Dantas (ex-Mistery). A Hardrons, que chegou a contar com John-John Oliveira (guitarrista) na sua fase final, levou dois anos para tomar forma. Lançamos um single com duas canções que teve uma boa receptividade na cena, fizemos um punhado de shows e terminamos por divergências nas nossas agendas. Sérgio foi o único nesse hiato que não parou com a música, mantendo até hoje o seu projeto de música eletrônica que ele possui desde o ano de 1999, o Atakama Project. Mesmo uma volta não estar em nossos sonhos mais molhados por muito tempo, decidimos nos reunir por saudade mesmo de estarmos juntos fazendo música e tocando as nossas velhas canções. Com mais idade no couro e com mais maturidade para lidar com os dilemas do dia a dia, em 2014 conseguimos nos organizar para fazer alguns ensaios e ver no que ia dar. Já no primeiro deles a vibe foi tão boa que os planos para o futuro começaram a surgir. Levamos um pouco mais de tempo para se apresentar porque Ricardo teve que sair da banda por motivos pessoais e nesse movimento acabamos passando por um novo período de adaptação, com André Gamalho saindo de uma das três guitarras e assumindo o posto de baixista. Com essa readaptação vieram os primeiros shows em 2015 e estamos aí, para a alegria das ex-virgens da cidade baixa.
Vocês cantam em inglês em uma estética bem rock sujo, influenciada pelo grunge. Podem dizer o que motiva a opção por essa estética e que bandas influenciam a GOR?
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Game Over em clima de descontração, foto Fernando Fernandes |
LC – Quando nos conhecemos nos colégios e ruas da cidade baixa, éramos uns garotos de dezesseis, dezessete anos de idade que, por uma boa coincidência, ouviam quase as mesmas bandas, que por sinal eram estrangeiras. Até as bandas daqui de Salvador que ouvíamos cantavam em inglês (brincando de deus e The Dead Billies). Então foi natural a incorporação do inglês nas nossas composições no momento em que formarmos o grupo, isso anos depois do nosso primeiro encontro. Não existiu uma razão especial por optarmos por esse idioma, simplesmente decidimos em ter letras em inglês e assim foi. Sempre escutamos grunge, ao mesmo tempo em que escutamos muito britpop também. Somos de uma época que dava (e ainda dá) muito prazer em pesquisar novos sons, então descobríamos bandas das mais variadas vertentes do rock. Todo sábado no final da tarde nos reuníamos para assistir o Lado B da MTV a procura de uma novidade. Era certo rolar no cd player Nirvana e Beatles, Ramones e Pink Floyd, Sonic Youth e Radiohead, Smashing Pumpkins e Blur, Kyuss e Supergrass. Tentávamos assimilar de tudo, mas o resultado final ficava sempre em algo sujo mesmo, entre o punk e o psicodélico e isso sempre nos agradou. Imagine um bando de “punks” tentando tirar um som “Ok Computer”, ou um som “The Dark Side of the Moon”, não quero dizer que somos uma banda de punk, mas a dinâmica que a gente conseguiu aplicar seguiu esse caminho e funcionou para nós. Nunca tomamos sequer uma aula de música, tudo o que sabemos veio do “do it yourself”, então não poderia ser diferente. Na virada dos anos 2000 surgiram bandas como At the Drive-in e Trail of Dead, que ajudaram a fortalecer essa ideia na gente. Mas não nos prendemos só ao passado, ainda ficamos atentos aos passos dos nossos queridos clássicos sim (os novos do Deftones e do Massive Attack estão excelentes), porém sempre estamos atentos às novidades: Mastodon, Baroness, Vintage Trouble e Alabama Shakes aparecem com frequência nas nossas playlists. Tame Impala também, apesar do mais recente deles ser bem chato.
Quais os planos? Vocês estão para lançar (ou já lançaram) um álbum?
LC - Lançaremos um disco entre o final desse mês de abril e início de maio, nele estarão os dois singles que já disponibilizamos na web e mais quatro faixas. Todas as canções que estão no cd foram compostas antes de pararmos, tínhamos uma espécie de débito com elas e preferimos grava-las para firmar a existência de cada uma e porque acreditamos no potencial delas. Para esse debut, trabalhamos com o produtor e multi-instrumentista André Araújo, profissional competente que saca muito de som e tem um feeling muito bom para captar ideias musicais. Ele entendeu muito bem o que queríamos para as faixas e conseguimos extrair o melhor delas, não inventamos nada de última hora, não adicionamos nada a elas que não existia antes, não fizemos firulas, fomos muito fiéis às composições em sua sonoridade e ao contexto da época na qual foram feitas, e ainda assim o resultado soou bem atual. Pretendemos voltar ao estúdio no final do ano para gravar a outra metade do nosso repertório que ficou de fora, mas antes queremos tocar o quanto nós pudermos fazer isso, temos algumas datas marcadas dentro do que a gente apelidou como “The Grunge Days are Gone Tour”. Divulgar a nossa música e o disco, reencontrar os velhos amigos e fazer novos, e, quem sabe, atravessar a fronteira de Salvador e dar as caras pelo interior da Bahia e pela região metropolitana também estão dentro de nossas intenções. Novas composições estão nos nossos planos, já temos algumas engatilhadas, mas é só uma questão de tempo para investirmos nelas.
Nosso amigo Rodrigo Sputter adorna as capas de dois singles lançados por vocês. Por que? É uma homenagem ou uma declaração?
LC - Rodrigo é um grande amigo de muitos anos. Nos conhecemos há bastante tempo e, mesmo antes de formarmos nossas bandas, ele já era uma figura carimbada pelos bairros da cidade baixa e muito popular no colégio onde estudávamos, e sempre foi esse cara de grande coração que ele é. É uma homenagem? Sim. Quando decidimos colocar em prática tudo o que não havíamos feito antes, pensamos em trazer todos aqueles que nos apoiaram para participar de alguma forma. Ele sempre nos incentivou, nos deu força, sempre nos cobrou um registro de nossas músicas, isso sem pedir nada em troca. Sputter foi umas das poucas pessoas que, durante todo o tempo que estivemos parados, cobrava o nosso retorno e quando soube desse fato comemorou muito e ressaltou a importância de uma gravação. Ao fecharmos o conceito das capas dos singles, a primeira pessoa que veio à nossa cabeça para ser o nosso modelo nelas foi ele, que aceitou o convite para participar sem pensar duas vezes. Ele se saiu muito bem como top model diante do olhar fantástico e sensível do fotógrafo Fernando Fernandes e o resultado superou as nossas expectativas. É uma declaração? Sim, podemos considerar também. É uma declaração de respeito e de amor a essa amizade de tantos anos. É falta de educação deixar os amigos para trás, esquece-los. É sempre bom retribuir de alguma forma o apoio que lhe foi dado um dia e essa foi uma maneira, mesmo que pequena, de fazer isso. Acho até que ele merece mais, da G.O.R. e de muita banda que está por aí!
Você também faz um site que cobre a cena rock local, o Soterock (ex-Soterockpolitano). Como consegue mante-lo? Como vê a cena atual?
LC - Mantemos ele na cara e na coragem, com muito gosto pelo que realizamos por lá e sem ganhar um centavo por isso. Tudo começou com Kall Moraes, irmão de Sérgio, há quase dez anos atrás e que é o grande cara por trás do site, que se chamava Musikall FM Online. Ele fazia podcasts sobre música em geral, tocando discos clássicos do rock e outros com programação diversificada. Com o tempo ele convidou Sérgio para participar do site, também com podcasts, mas acrescentando artistas baianos na programação e cuidando do layout da página. Em 2012 fui convidado pelos dois para fazer parte da equipe e completar o time em um podcast chamado Rota Alternativa, que tratava só de bandas locais. Na época, foi bem interessante fazer esse podcast, era uma mesa redonda divertida e contava também com a participação de quase toda banda (foi mais uma atividade do grupo nesse hiato). Por coincidência, em meados de 2013, a frequência desse programa foi ficando menor na medida em que fui me arriscando nos primeiros textos, fui pegando o gosto pela coisa e acabei decidindo que em todo show de rock no qual eu estivesse, ele se transformaria em uma resenha. Daí para escrever sobre discos e fazer entrevistas foi um pulo, e tem sido assim até hoje. Os podcasts ainda existem no site e são realizados em temporadas, para este ano estamos preparando algo novo para os moldes que vínhamos fazendo. Quanto a cena, a vejo com muito respeito e acredito que vivemos um bom momento, apesar das dificuldades que todos sabem que existem. Foi nesse exercício do Soterorock que percebi que estava começando a acontecer algo novamente por aqui. O cenário hoje tem bandas com melhor qualidade sonora, com material mais bem gravado, pensando melhor as suas composições e apresentações, formando público, mais disciplinadas, mais comprometidas com seus compromissos e de estilos mais variados, o que é bem interessante e característico daqui. Os últimos anos têm sido bem agitados por aqui, com festivais do gênero acontecendo na capital e no interior, que por sinal vem se fortalecendo cada vez mais ao longo do tempo. Ainda existe um baixo número de casas que abriga a música rock e isso é um problema em vários sentidos? Sim, mas pelo menos elas têm uma estrutura melhor para receber os grupos que lá se apresentam. Me considero inserido na cena desde a década de noventa e experimentei os seus altos e baixos nos mais diversos pontos de vista, como público, músico e comunicador, portanto não há um entusiasmo vazio quando digo acreditar que essa boa fase se mantenha firme por muito tempo.
Bicho, pode dizer aqui o que você quiser, mas eu não perguntei.
LC – Gostaria de deixar dois recados, mas primeiro gostaria de te agradecer pelo espaço que você nos deu para divulgar a música da G.O.R., fico grato por termos passado por aqui e contente em ver você abrindo espaço para a música independente local. O primeiro recado vai para as bandas. Mãos à obra! Se você que está lendo essa entrevista tem uma banda de rock, se faça a seguinte pergunta: A Bahia é o pior lugar no país para se fazer rock? Pense, só pense a respeito. Não precisa se responder agora, somente reflita sobre essa questão. Pode não ser o melhor, mas será que é mesmo o pior? Realizar algo nesse sentido por aqui é difícil mesmo, a labuta é pesada, conseguir pauta não é uma das coisas mais fáceis de realizar da forma que se deseja, formar um público é um exercício contínuo e árduo. É necessário um pouco de paciência. É bom também, depois de você fazer a sua apresentação, ficar no recinto e prestigiar a banda com a qual você está dividindo o palco. Isso faz bem e fortalece os laços, nunca se sabe quando e onde uma boa oportunidade pode surgir. Levante da cadeira e vá além da música, faça o merchan da sua banda, empreenda mesmo e faça contato com outros grupos. Se você não sabe, você faz parte de um exército. Costumo dizer para as pessoas que aqui na Bahia tem mais bandas de rock do que de qualquer outro gênero e isso é um fato. Enquanto você lê essas linhas com certeza tem alguém fazendo um barulho bom por aí. O segundo recado vai para o público. Vá aos shows! Se você gosta do gênero, seja curioso(a), seja testemunha ocular da música do seu tempo, tenho certeza que você vai se esbarrar com algum som foda em uma simples investida descompromissada a um show de rock local. Se você descobriu e gostou de verdade de uma banda daqui no seu serviço de streaming favorito, vá atrás dela e compre o cd que ela fez com tanta dedicação ao ponto de mexer com a sua emoção. É certo dela estar te esperando de braços abertos dando o melhor de si para te receber.