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Herdeiros da tradição libertária e aventureira de escritores do século XIX, como Walt Whitman (1819-1892) e Jack London (1876- 1916), nomes como Jack Kerouac (1922-1969), Allen Ginsberg (1926-1997) e William S. Burroughs (1914- 1997) se tornaram sinônimo de uma literatura frenética e alucinada, veloz como os carros com os quais eles cruzavam os Estados Unidos do pós-guerra de costa a costa, repetidas vezes, ao ritmo do jazz be bop de músicos contemporâneos, como Charlie Parker e Dizzy Gillespie.
Em 2011, essa rapaziada periga se tornar mais popular do que nunca (até por que pop eles já são, até demais), já que, pelo menos dois filmes baseados em suas vidas e obras estreiam no Brasil: On The Road, dirigido pelo brasileiro Walter Salles e Uivo (Howl), sobre Allen Ginsberg.
O segundo estreou em setembro nos Estados Unidos, com boas resenhas da crítica, enquanto o primeiro, baseado no livro-símbolo do movimento, ainda sem data de estreia, é uma superprodução de Francis Coppola e um dos filmes mais aguardados do ano.
Nas prateleiras
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Dos três livros recém-chegados às prateleiras, o mais importante é, sem dúvida, Anjos da desolação, o qual captura os últimos momentos de Kerouac como um maluquete anônimo, antes que o lançamento de On the road, em 1957, o catapultasse à fama que o incomodou até morrer, doze anos depois.
Já Despertar: Uma história de Buda, lançado em formato pocket, é o resgate de um texto engavetado do autor, só lançado em seu país em 2008.
Trata-se da versão de Kerouac para a biografia de Sidarta Gautama, o príncipe indiano que se tornou a divindade Buda após rejeitar a riqueza e encontrar a iluminação – um tema mais do que caro à geração beatnik.
Por fim, Os Beats - Graphic Novel, é uma coletânea com várias histórias em quadrinhos biografando as figuras (e cenas) mais significativas do movimento. As HQs são assinadas por conceituados quadrinistas da cena underground , com Harvey Pekar (do filme O Anti-herói Americano, sucesso nos circuitos de arte) à frente.
Confronto com o Vazio
Com Anjos da desolação, fãs e leitores de Kerouac tem à disposição uma peça importante na montagem do complexo quebra-cabeças que é a visualização de sua obra / persona (instâncias que sempre se confundem no velho Jack).
Basicamente, a primeira parte é o relato dos 63 dias que ele passou no isolamento, como vigia de incêndios no Desolation Peak, montanha no estado de Washington (noroeste dos Estados Unidos). Na segunda parte, intitulada Passando, ele retoma suas andanças mundo afora, entre bebedeiras descontroladas, mulheres e poetas.
A edição da L&PM traz dois bônus importantes para o entendimento da obra e seu autor. O primeiro é uma longa e apaixonada apresentação do escritor e crítico Seymour Krim, produzido no calor do lançamento original de Anjos da desolação, em 1965.
O outro é um depoimento de Joyce Johnson, escritora que foi uma das (muitas) namoradas de Kerouac, e que aparece no livro como a personagem Alyce Newman.
Extremamente pessoal – e nem poderia ser diferente – seu texto contextualiza, com a vantagem da perspectiva do tempo, o momento de Kerouac no livro: “O confronto deliberado com o Vazio no verão de 1956 foi o ato de um homem que não admitia estar exausto, mas que tampouco havia perdido a coragem ou a liberdade necessária para ir aonde quer que a imaginação o levasse”, escreve.
“A temporada como vigia de incêndios foi uma das últimas aventuras de Kerouac na estrada; em 1957 a fama indesejada de ‘avatar da Geração Beat’ acabaria para sempre com seu anonimato”, nota Johnson.
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Assim como presta um grande serviço aos neófitos ao contar, organizada e didaticamente, as trajetórias dos nomes mais (e até dos menos) importantes do movimento, a HQ, na sua maior parte, peca pela forma pouco ousada com que o faz, com exceção de poucos capítulos, como os desenhados por Peter Kuper e Trina Robbins.
Ainda assim, vale a leitura pela amplitude do volume, que vai fundo nas origens remotas e ramificações do movimento, chegando até as artes plásticas.
LEIA "O CHAMADO DA ESTRADA", ÓTIMO ARTIGO DO JORNALISTA PAULO SALES SOBRE JACK KEROUAC E A GERAÇÃO BEAT: http://caderno2mais.atarde.com.br/?p=2467
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