quinta-feira, outubro 16, 2014

COMO REVISIONISMO HISTÓRICO É ACANHADO, MAS COMO COMPÊNDIO DE HISTÓRIAS NÃO CONTADAS, PAVÕES MISTERIOSOS É ESPETACULAR


A narrativa de Barcinski é ano a ano, começando em 73, com Secos e Molhados...
A bibliografia musical brasileira, ainda que deficiente (por incrível que pareça) já deu bastante destaque a determinados artistas e períodos da nossa música popular, como a era do rádio, a bossa nova, a tropicália, a jovem guarda e o rock dos anos 1980.

Os anos 1970 e o início da década seguinte, contudo, meio que permaneceram à sombra desses períodos supostamente mais frutíferos.

Agora, o livro Pavões Misteriosos - 1973 - 1984: A explosão da música pop no Brasil,  do jornalista André Barcinski, tenta, de forma até despretensiosa, preencher essa lacuna e fazer justiça a um período comumente visto como menor por muitos críticos e músicos.

“Meu objetivo foi traçar um panorama geral da época e tentar responder algumas questões que sempre me intrigaram”, escreve André Barcinski, na introdução.

“Por que tantos discos bons foram lançados no Brasil no meio dos anos 1970 e por que a qualidade dos lançamentos caiu logo depois? Como o crescimento da indústria musical afetou nossa música? (...) Por fim, (...) como surgiram no país tantos ‘pavões misteriosos’ – Ney Matogrosso, Tim Maia, Pepeu Gomes, Raul Seixas, Ritchie e vários outros – artistas que, nas palavras de Raul Seixas, ‘não tinham nada a ver com a linha evolutiva da música popular brasileira’”, pergunta-se.

...passando pelas Frenéticas no fim dos anos 1970...
Para Barcinski, o período entre 1973 e 1975 foi um dos melhores da música brasileira em todos os tempos, quando foram lançadas obras-primas como Secos & Molhados, Gita (Raul Seixas), Racional Vol. 1 (Tim Maia), A Tábua de Esmeraldas (Jorge Ben), O Romance do Pavão Mysteriozo (Ednardo), Paebiru (Zé Ramalho e Lula Côrtes), Na Rua, na chuva, na fazenda (Hyldon), Sweet Edy (Edy Star) e outros.

Mas nem só de obras-primas de grandes artistas se apóia a pesquisa de Barcinski.

Dividido em capítulos dedicados a cada ano do período estudado, ele desvela histórias praticamente ignoradas da música pop brasuca, como a onda dos falsos gringos (Fábio Júnior, Morris Albert), a patrulha ideológica que perseguiu Guilherme Arantes e  Fafá de Belém, a explosão da discoteca (Frenéticas, Harmony Cats), ídolos fabricados (Sidney Magal, Gretchen), a MPB odara (Realce, de Gil), o mercado infantil (Turma do Balão Mágico, Xuxa) e, por fim, a espantosa história de ascenção e queda do cantor Ritchie.

Pau de guaraná

...e terminando com a derrocada de Ritchie, pós-Menina Veneno
Com seu texto enxuto, que dá ênfase aos fatos pesquisados e / ou narrados pelos seus quase 70 entrevistados, Barcinski escreveu um livro que se lê com gosto, dadas as muitas revelações de histórias de bastidores e o alto grau de loucura – própria da época e dos artistas, rendendo causos divertidíssimos.

Um desses está no capítulo 1977: Na nossa festa vale tudo, em que Barcinski faz um grande relato da era disco desde suas origens nos Estados Unidos, mas também traz  um causo inestimável de Leiloca, astróloga e cantora do grupo As Frenéticas, que, na época, teve um caso com Raul Seixas.

Em um hotel no Nordeste, “o Maluco Beleza foi ao quarto da ex e ficou curioso com um pedaço de pau que viu em cima da mesa: ‘Leiloca, que barato é esse?’ ‘É um galho de guaraná, trouxe lá de Manaus’. ‘E dá barato isso aí?’. ‘Não sei, mas vamos tirar a prova já’”.

Solicitado um ralador de queijo na recepção do hotel, “ralamos o toco de guaraná e cheiramos tudo. E não é que deu o maior barato?”, jura Leiloca.

Mais do que uma peça de revisionismo histórico (peso que o autor parece querer evitar), Pavões Misteriosos é um delicioso compêndio de histórias de bastidores não contadas de ídolos (muitos deles esquecidos) e  heróis ocultos de nossa música popular.

Alem disso, Barcinski ajuda a entender a própria evolução da indústria fonográfica brasileira, já que, foi justamente nesse período que esta começou a se profissionalizar, processo que desembocou no empoderamento dos  departamentos de marketing e subsequente derrocada da criatividade e liberdade artística.

Pavões Misteriosos - 1973 - 1984: A explosão da música pop no Brasil / André Barcinski / Três Estrelas / 256 páginas / R$ 42

Um comentário:

Franchico disse...

O dia das crianças já passou, mas nunca é tarde para presentear seu reacinha ou petralinha preferido:

http://www.brasilpost.com.br/2014/10/14/reacinha-petralinha-bonec_n_5983422.html?utm_hp_ref=brazil