No início dos anos 1980, uma brilhante leva de escritores e artistas britânicos invadiu os quadrinhos mainstream americanos e mudou a cara dessa indústria para sempre. Na dianteira desse movimento, dois nomes se destacaram: Alan Moore (autor de Watchmen) e Neil Gaiman (Sandman).
Hoje, os fãs caçam qualquer coisa que chegue as livrarias com a griffe deles. Neste caso, dois lançamentos colocam mais itens na lista de compras dos apreciadores: The Spirit: As Novas Aventuras e Sinal & Ruído.
The Spirit traz diversos autores criando novas histórias para o clássico personagem de Will Eisner surgido em 1940, incluindo Alan Moore e seu parceiro de Watchmen, Dave Gibbons, além do próprio Neil Gaiman e outros nomes importantes da invasão britânica, como os desenhistas David Lloyd (V de Vingança), Ed Campbell (Do Inferno) e Brian Bolland (Camelot 3000).
Mas o volume ainda apresenta outros artistas consagrados, como o espanhol Daniel Torres (Triton), Kurt Busiek (Marvels), John Wagner (Juiz Dredd), Brent Anderson (Astro City) e Moebius (Blueberry), entre outros.
O álbum da Devir reúne as quatro primeiras revistas lançadas em 1998 pela editora independente Kitchen Sink (já extinta, foi uma das principais editoras do movimento underground dos anos 1960, revelando gigantes do estilo como Robert Crumb, Gilbert Shelton e Spain Rodriguez).
O resultado chega a ser desigual, mas vale a aquisição só pelo fato de reunir a dupla Alan Moore e Dave Gibbons pela primeira e única vez (até o momento), depois da revolucionária parceria em Watchmen.
Recriar / reimaginar
A dupla assina três HQs de oito páginas cada (como era o padrão das HQs de Will Eisner) e, como de costume, Moore praticamente reimagina / recria todo o imaginário do personagem do zero – sem deixar de respeitar sua mitologia original.
Ao todo, Moore assina quatro HQs, sendo três com Gibbons e mais uma quarta, com desenhos espetaculares de Daniel Torres, arquiteto que leva para suas HQs todo o sentido arquitetônico futurista que é a marca de suas obras.
As quatro histórias de Moore são interligadas, indo da origem do personagem, ligada a um vilão clássico, o Doutor Cobra, até 500 anos no futuro – dizer mais seria estragar as surpresas preparadas pelo genial barbudo recluso de Northampton.
Já Neil Gaiman assina apenas uma HQ, O Retorno de Estola de Vison, com desenhos de Ed Campbell. É também uma das melhores do livro, e utiliza um recurso clássico das histórias de Will Eisner, no qual o herói de terno azul é reduzido a coadjuvante e a narrativa fica a cargo de um passante, um homem comum – provavelmente, um dos motivos por que suas HQs até hoje fazem tanto sucesso.
Nessa mesma levada, merece menção Grado, O Azarado, em: O Jogo da Vida, uma hilária HQ assinada por John Wagner e Carlos Ezquerra (Bloody Mary).
Ao longo do álbum, quase todas as muitas mulheres do Spirit – entre várias vilãs assanhadas e a eterna namorada, Ellen Dolan – dão as caras, mantendo a característica das HQs clássicas, assim como seu assistente juvenil, Ébano, e o comissário Dolan (pai de Ellen).
The Spirit - As Novas Aventuras / Vários autores / Devir Livraria / 112 p. / R$ 53 (capa dura) R$ 41 (brochura) / www.devir.com.br
Os últimos dias da vida do cineasta, pelos olhos de Gaiman & McKean
Muito cultuado pela série Sandman, que, há pouco mais de vinte anos, tem seus 75 números continuamente publicados e republicados no Brasil em encadernados cada vez mais caros e luxuosos, Neil Gaiman tem o último de seus três trabalhos iniciais pré-Sandman lançados em edição nacional.
Assim como Violent Cases (HQM Editora) e Mr. Punch (Conrad), Sinal & Ruído é assinado por Gaiman e pelo capista de Sandman, o artista plástico, designer e cineasta ocasional Dave McKean (Máscara da Ilusão, disponível em DVD no Brasil).
E é ele, McKean, que parece ter tido uma certa predominância autoral em Sinal & Ruído. É ele que assina três dos cinco textos de apresentação escritos desde 1992 – os outros dois são de Gaiman e do escritor Jonathan Carrol.
É ele que assina sozinho duas das três histórias curtas incluídas como bônus no álbum: Destrua e Descontrução, ambas criadas para a seminal revista britânica de arte e comportamento, The Face.
Isolamento e imaginação
Foi na própria The Face, aliás, que Sinal & Ruído começou a ser publicada em capítulos, em 1989. A história trata de um cineasta que descobre que tem poucos meses de vida.
A partir daí, se isola em seu apartamento para terminar o roteiro do seu último filme.
A HQ então se divide entre seu isolamento e as memórias de sua vida e a história dentro da história: no roteiro do seu último filme, acompanhamos a rotina de uma aldeia nos últimos dias do ano 999 DC, com o temor de que o fim do mundo se aproxima com a chegada do ano 1.000.
No fim das contas, uma curiosidade apenas razoável para os fãs da dupla.
Sinal & ruído / Neil Gaiman (roteiro), Dave McKean (arte) / Conrad Editora / 96 páginas / R$ 49,90 / www.lojaconrad.com.br
Blog (que, nos seus primórdios, entre 2004-05, foi de um programa de rádio) sobre rock e cultura pop. Hoje é o blog de Chico Castro Jr., jornalista formado pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia. Atualmente, é repórter do Caderno 2+ do jornal A Tarde, no qual algumas das matérias vistas aqui foram anteriormente publicadas. Assina a coluna Coletânea, dedicada à música independente baiana. Nossa base é Salvador, Bahia, a cidade do axé, a cidade do terror.
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