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quinta-feira, janeiro 26, 2012

MESTRE PASTINHA GANHA BELÍSSIMO LIVRO ILUSTRADO POR CAU GOMEZ

 O período compreendido entre o fim de século XIX e os anos 1970 foi crucial para a Bahia. Foi nesse intervalo de tempo que o (hoje corrompido) conceito de baianidade surgiu e se consolidou no inconsciente coletivo.

E uma das figuras mais importantes na construção deste conceito foi Mestre Pastinha (1889- 1981), o maior praticante e divulgador de capoeira angola desde sempre.

Depois de contar a história do capoeirista no livro Pastinha, o Grande Mestre da Capoeira Angola (Série Gente da Bahia, editado pela Assembleia Legislativa em 2009), escrito em parceria com Otto Freitas, o jornalista José de Jesus Barreto volta ao personagem histórico no encantador Pastinha: O Menino que virou Mestre de Capoeira.

Dirigido ao público infanto-juvenil e espetacularmente ilustrado pelo artista Cau Gomez (da equipe de A TARDE), o livro sai pela editora local Solisluna e tem lançamento nesta sexta-feira em Salvador.

“O livro da série Gente da Bahia teve uma procura muito grande, por que ainda não havia nada sobre Pastinha. Aí o pessoal da Solisluna entrou em contato comigo com a ideia de um livro para crianças, em cima daquela história”, conta José.

Para encurtar a história, o autor extraiu o grosso da narrativa para o livro ilustrado de uma longa entrevista que Pastinha concedeu a Roberto Freire para a revista Realidade, em 1967.

“Foi nessa entrevista que ele contou como um velho capoeirista angolano, Benedito, lhe ensinou a capoeira, para  ele não ficar apanhando dos outros meninos no Pelourinho”, conta.

“O livro conta essa história quase na íntegra. Depois fala um pouco do que é a capoeira, o  berimbau, os principais golpes”, descreve.

“Depois  eu e Eneas Guerra (da Solisluna) escolhemos Cau Gomez, que é premiadíssimo e tem um trabalho fantástico,  para ilustrar”, diz.  “Graças aos desenhos de Cau, o livro se transformou numa pequena obra de arte”, elogia.

Para Zé de Jesus, Pastinha ainda foi muito mais que um mestre de capoeira. “Ele era um filósofo, um pensador. É um orgulho muito grande falar de Pastinha, um verdadeiro mito ao lado de Caymmi, Jorge Amado, Pierre Verger –  o pessoal que  fez a Bahia ser o que é”, afirma.

“Pastinha foi parte da Renascença Baiana, quando isso aqui  ainda era um celeiro cultural. Infelizmente, a Bahia é muito ingrata com seus filhos mais valorosos. O  baiano reconhece muito pouco os seus heróis. Hoje ele  só se interessa em remexer a bundinha”, dispara.

Esculpindo Pastinha

 Já Cau Gomez espera iniciar uma nova fase na carreira com mais este belo trabalho. “Esse livro é  meu xodó, eu o vejo como um passaporte para uma linguagem nova para mim, que é a literatura infanto-juvenil”, diz.

Para Cau, o mais difícil foi criar a imagem do Pastinha menino, devido a escassez de documentos dessa fase de sua vida. Como talento e inteligência não lhe faltam, logo o artista criou um método próprio.

“Como no You Tube tem muito material do Pastinha, eu dava pause na imagem dele e ia congelando o frame em vários ângulos diferentes”, conta.

 “Aí fui tentando achar a figura dele criança. Foi como esculpir com a imaginação, a partir dos diversos ângulos do rosto do Pastinha. Depois de alguns esboços, cheguei na imagem que está no livro. Foi um grande desafio”, descreve.

Cau, que já jogou capoeira regional, conta que outro atrativo para ele foi a sensibilidade artística.

“É uma história difícil, ele sofreu a perseguição que hoje é chamada de bullying, mas superou através da capoeira. Ele foi um exemplo de baiano lutador. É uma felicidade imensa compartilhar isto. E era muito sensível as artes, a pintura, estudou no Liceu de Artes & Ofícios, é uma história maravilhosa”, conclui.

Pastinha: O menino que virou Mestre de capoeira / de José de Jesus Barreto e Cau Gomez / Ed. Solisluna / 32 p. /  R$ 35 / Lançamento: Sexta-feira, 18 horas / Livraria Cultura do Salvador Shopping

PREVIEW:



terça-feira, janeiro 24, 2012

MARCELA BELLAS: NA HORA E NO LUGAR CERTOS

Não adianta: a estupidez, o mau-gosto absoluto e a ganância que regem o negócio da música popular em Salvador jamais darão conta de tolher ou intimidar os verdadeiros talentos que surgem espontaneamente aos borbotões, em todos os cantos desta bela e triste cidade.

Está aí  Marcela Bellas (foto de Dodi Conti), que não deixa este colunista mentir.

Popular sem ser vulgar, boa cantora sem precisar imitar ninguém, capaz de dialogar com o “alternativo” sem cair no  estereótipo, Marcela é parte de uma geração que aprendeu a crescer comendo pelas beiradas, apoiando-se na internet, no trabalho em rede e nas oportunidades que surgem via coletivos / projetos de incentivo.

O resultado é um trabalho que, três anos após seu primeiro CD, Será Que o Caetano Vai Gostar?, surge consistente, pronto para ganhar o  grande público.

E se você ainda não a conhece, este verão é a hora. Marcela cumpre temporada de três datas na adorável Arena do Teatro Sesc-Senac do Pelourinho.

O primeiro show já foi sexta-feira passada, mas ainda tem a sexta agora e a seguinte (dia 3).

“A  internet é surpreendente mesmo. Eu tava na  expectativa, que  eu não sabia se as pessoas lembravam de mim. Mas com o  download,  chegou no show e as pessoas cantam as músicas”, conta Marcela, feliz.

Para esta sexta, ela recebe ainda como convidados a banda Radiola, o duo Dois Em Um e o cantor paulista Daniel Cohen, com quem ela compartilha um dos seus muitos projetos.

Além do trabalho solo, ela integra o Undergrude (com Helson Hart e Jorge Papapá, de orientação pop-rock), o duo Cohen & Marcela (de canções românticas) e o trio TEM (com Tennyson Del Rey e Edu Casanova, dedicado a criar novas marchinhas de carnaval).



Após uma temporada em São Paulo, Marcela voltou a morar em Salvador. “Tá acontecendo muita coisa aqui. Eu acho que a cidade vive um momento crucial. A impressão é que estou no lugar certo na hora certa".

Ciente de que é na crise que se cresce, ela lamenta o triste estado da cidade e convida à reflexão: “O momento de mudar é esse e depende de nós. Não podemos ficar só reclamando da prefeitura que não recolhe o lixo, por que quem  joga o lixo na rua somos nós mesmos”.

 “Precisamos de numa nova consciência por que a cidade é maravilhosa, mas as vezes é preciso chegar neste ponto para poder reagir. Tenho muita esperança para Salvador”, conclui.

Marcela Bellas no show Achei Music / Sexta-feira e 3 de fevereiro, 21 horas / Arena SESC-SENAC Pelourinho / R$ 20 e R$ 10

Ouça / baixe: www.marcelabellas.com.br


NUETAS:

Vivendo do Ócio e The Honkers de Ray-Ban na praia

A marca de óculos Ray-Ban traz suas famosas Couch Sessions à Bahia neste fim de semana, com The Honkers e Vivendo do Ócio. As Couch Sessions se dão de fato em um sofá, no qual as bandas fazem um som e batem um papo com a plateia. Dia 28 (sábado): The Honkers, no Centro da Praia do Forte, das 14 às 20 horas. Dia 29 (domingo): Vivendo do Ócio, na Praia de Stella Maris, das 12h às 18h. Grátis. Mais informações no flyer ao lado. Clique para ampliar.

Dão convida Bellas
Por falar em Marcela Bellas, a moça ainda participa, amanhã, do show de Dão & A Caravanablack no   Largo Tereza Batista (Pelourinho). Festão imperdível e de graça, às 21 horas.

E o Ilê convida Dão

Por falar em Dão, o rapaz se apresenta de novo sábado, na 33ª Noite da Beleza Negra do Ilê Aiyê, com  Band’Aiyê e Arlindo Cruz. Às 22 horas, na Senzala do Barro Preto. R$ 50 (pista).

Movidos a Álcool e os cearenses

O Templo do Rock faz prévia do Grito Rock 2012 (Carnaval Fora do Eixo) trazendo à Salvador  The Good Garden e Sátiros (ambas do Ceará). A impagável Eduardo Cachaça & Movidos à Álcool completa a night. Sexta, Boteco Ali do Lado (Rio Vermelho), 22 horas, R$ 10.

INOCENTES REEDITADOS


Em 1986, uma das principais bandas da primeira geração do punk rock brasileiro lançava seu debut fonográfico por uma gravadora major.

Com apenas seis faixas, o EP Pânico Em SP (Warner), foi a estreia da banda Inocentes (foto de Daniel Arantes) – e marcou época em um contexto hoje inimaginável, quando o movimento do rock brasuca (o chamado BRock) dava as cartas no mainstream.

O disquinho foi o começo de um contrato de quatro anos que rendeu ainda mais dois álbuns: os LPs completos Adeus Carne (1987) e Inocentes (1989).

Agora, depois de serem remasterizados e relançados sem grande alarde alguns anos atrás, eles retornam em edições comemorativas dos 30 anos da banda, com as capas originais.

Pânico em SP ganhou ainda seis faixas-bônus novas, gravadas para esta edição em meados do ano passado. Originalmente produzido pelo Titã Branco Mello e Pena Schmidt, o EP original foi gravado em apenas 70 horas de estúdio.

“Um custo ridículo para uma gravadora major”, lembra Clemente Nascimento, fundador da banda.

“Foi gravado praticamente  ao vivo no estúdio. O que foi estranho na época, afinal estávamos em  uma multinacional”, acrescenta.

“Aí para essa edição incluímos seis músicas atuais. E gastamos 30 horas de estúdio para gravar tudo. O que foi mais ridículo ainda”, ri o sempre bem-humorado Clemente.

Para ele, a inclusão das faixas atuais junto ao material antigo denota a coerência que caracteriza sua banda: “É legal fazer esse link ao comemorar 30 anos de banda e mostrar como ela está hoje. São cinco faixas inéditas e uma regravação de A Face de Deus. A original está no terceiro disco e é no violão. Aí a regravamos como tocamos hoje, na guitarra e acelerada”.

“As outras cinco faixas representam a  banda agora. Em retrospecto, tem muita coerência aí. Isso é importante”, vê.

Mesmo sem emplacar um grande hit nas rádios, a gravadora honrou o contrato com os Inocentes e, em 1987, botou os meninos de novo no estúdio para gravar o LP Adeus Carne.

É um álbum ambicioso, que traz o clássico punk Pátria Amada, Eu (poema de Vladimir  Maiakovsky musicado por Clemente) e Pesadelo (versão para o samba de Maurício Tapajós e Paulo César Pinheiro).

“Para mim  é o nosso melhor disco, nossa obra-prima, se posso falar assim”, afirma o band leader.

“Ele foi todo pensado, da primeira a última faixa, todas as letras, os arranjos. É um disco conceitual. Não lembro mais qual era o  conceito, mas enfim“, admite, rindo à larga.



Período confuso

A trinca de discos na fase Warner da banda se concluiu com o disco de título homônimo Inocentes, produzido por Roberto Frejat.

Colocar um potentado do rock carioca para produzir uma das bandas-símbolo do punk paulista deixou as coisas meio confusas no estúdio.

“Até me surpreendi ouvindo esse disco hoje em dia”, confessa Clemente. “Estávamos em uma fase confusa, prestes a sair da Warner e ainda tinha a pressão de ser popular como os Titãs. A gente ficou meio sem rumo,  a década de 1990 já estava começando e a gente já se sentia uma banda da década passada”, comenta.

“Hoje eu vejo que tem muitos bons momentos. É um disco  desigual, mas tem canções poderososas como  (a já citada ) A Face de Deus, uma das melhores letras que já fiz”.

Merece menção ainda o baião rock Promessas e o hino Garotos do Subúrbio, resgatado da coletânea Grito Suburbano (1982), marco zero do punk no Brasil.

Som on line e documentário

Em um balanço final, Clemente vê essa fase da banda em uma major como extremamente positiva: “Naquela época era muito mais difícil ser independente do que hoje em dia. Graças a distribuição de uma grande gravadora, esses discos  chegaram no Brasil de Norte a Sul. Isso permitiu que fôssemos o que somos hoje”, acredita.

“E também permitiu  fazer essa parceria com a Warner nessas edições comemorativas, incluindo faixas novas – mantendo nossa independência”, conta.

Filho de pai baiano, Clemente diz ter uma relação especial com a Bahia: "Tenho amigos aí, é o lugar que a gente mais tocou no Brasil (fora São Paulo) nos anos 1980 e 90. Tocamos também no Palco do Rock há pouco tempo. Até discotecar eu já discotequei aí (no Groove Bar). Volta e meia estou por aí. Sem falar que sou parceiro do Marcelo Nova. É, eu tenho que aturar ele aqui (risos). Aí quando eu quero fugir dele, eu vou pra Bahia!", diverte-se.

Em paralelo ao trabalho com os Inocentes, Clemente assumiu uma das guitarras na banda contemporânea Plebe Rude. "Em 2011, lançamos um DVD comemorativo dos 30 anos da banda. Aí concorremos ao Grammy Latino de Melhor DVD de rock brasileiro e adivinha? Perdemos para Caetano Veloso! Esses baianos me perseguem, rapaz! Quando não é Marcelo, é Caetano!", e cai no riso de novo.

Para 2012, Clemente planeja para breve um show transmitido on line, com a banda executando o Pânico Em SP (edição comemorativa) na íntegra. Em abril a banda também se apresenta no Lollapalooza Brasil.



Há ainda um documentário, Inocentes 30 Anos, de Carol Thomé e Duca Mendes, rolando no circuito de festivais. “É um curta, mas pretendemos lançar uma versão estendida em DVD”, conclui Clemente.

O punk continua vivo.

Pânico Em SP / Inocentes / Originalmente lançado em 1986 / Warner / R$ 16,90


Adeus Carne / Inocentes / Originalmente lançado em 1987 / Warner / R$ 16,90

Inocentes / Inocentes / Originalmente lançado em 1989 / Warner / R$ 16,90

sexta-feira, janeiro 20, 2012

SORRIA, OS BEACH BOYS VOLTARAM

Obra que levou Brian Wilson à loucura em 1967 é recuperada na forma mais próxima da original, 44 anos depois do não-lançamento


Se hoje em dia “artistas” competem entre si para ver quem mais tem mais seguidores no twitter, houve um tempo em que bandas de rock rivalizavam para ver quem fazia a obra de arte mais espetacular e ambiciosa.

E a rivalidade mais famosa (e frutífera) entre todas que marcaram o rock se deu nos anos 1960,  entre os Beatles e a californiana The Beach Boys (foto de Guy Webster).

É uma história já bem conhecida entre  apreciadores. Quando os Beatles lançaram o genial Revolver (1966), os Beach Boys responderam, no mesmo ano, com uma obra-prima: Pet Sounds, LP que Paul McCartney diz conter a única canção que já o fez chorar: God Only Knows.

Pet Sounds instigou os Fab Four, levando a briga para outro nível ainda  mais complexo, adicionando ao caldeirão psicodélico vigente à época recursos sofisticados, como arranjos orquestrais, experimentações de vanguarda, referências literárias e folclóricas.

Foi a senha para os Beatles e seu mentor, o maestro  Sir George Martin, despirocarem de vez no estúdio Abbey Road. O resultado foi o mítico, o insuperável  Sargeant Pepper’s Lonely Hearts Club Band (1967).

Foi demais para o juízo de Brian Wilson, líder dos Beach Boys. Empenhado em criar, ao lado do letrista Van Dyke Parks,  o que ele definiu como uma “sinfonia adolescente para Deus”, Wilson se debatia entre conceitos cada vez mais ambiciosos, a pressão da gravadora Capitol (que aliás, não estava gostando nada da ideia deles criarem, em paralelo a tudo isso, um selo independente) e a própria loucura que permeou o zeitgeist da segunda metade da década.

Também não ajudou muito   costume de Wilson de ingerir ácido lisérgico (o famoso LSD) como se fossem pastilhas Tic Tac. Resultado: o gênio dos Beach Boys, seu principal compositor, saiu do ar. Pirou o cabeção, como se diz hoje em dia.

Entre outras estripulias, ele exigiu que os músicos usassem chapéus de bombeiro na gravação da faixa Fire. Em outra ocasião, mandou afundar um piano na piscina para ver o som que sairia dali.

Wilson estava tão confuso, as ideias estavam tão desconexas e o resultado das sessões de gravação, tão fora do normal, que, em maio de 1967, o assessor de imprensa da banda anunciou que Smile não seria mais lançado.

Para tapar o buraco com a Capitol, a facção da banda que ainda conseguia pensar objetivamente soltou às presas o LP Smiley Smile (1967), que trazia algumas faixas aproveitadas de Smile em arranjos mais simples, como Good Vibrations, Heroes and Villains e Wind Chimes.

O disco foi recebido com frieza, e, depois desse episódio, a banda nunca mais foi a mesma. Engavetado, Smile teve diversas faixas lançadas em bootlegs (discos piratas) ao longo das décadas.

Em 2004, recuperado dos problemas mentais, Brian Wilson regravou o disco ao vivo, com sua banda solo, no CD Brian Wilson Presents Smile, para aclamação crítica.

Agora, finalmente, as sessões originais de Smile chegam à tona, em diversos formatos: CD simples (lançado no Brasil), LP duplo e os lucrativos  box sets com trocentos CDs, LPs, compactos, livro em capa dura,  memorabilia e demais frescuras.

O que importa é que a música de Smile, finalmente, resplandece em uma longa sinfonia de melodias iluminadas como uma tarde de verão à beira-mar.

É um álbum fácil? Não exatamente. Algumas faixas soam como uma colagem de trechos sem muita conexão entre si.

 

Mas canções centrais do álbum, como Surf’s Up, Good Vibrations, Heroes and Villains e Cabin Essence transcendem o complexo conceito geral, encantando o ouvinte à primeira audição.

Smile talvez não seja o melhor disco dos Beach Boys (Pet Sounds, mais fluido e objetivo, ainda é o campeão), mas, no fim das contas, merece sim, figurar entre os LPs míticos do rock.

Para completar o pacote, em dezembro, os membros remanescentes dos Beach Boys, Brian Wilson, Mike Love, Al Jardine, Bruce Johnston e David Marks anunciaram que voltarão aos palcos e estúdios em 2012, comemorando os 50 anos da banda.

É primeira vez em décadas que Wilson se juntará aos antigos companheiros. No dia 12 de fevereiro, a banda dá o chute inicial, se apresentando na cerimônia do prêmio Grammy.

Smile / The Beach Boys / Capitol - EMI / edição nacional (CD simples): R$ 26,90 (preço médio) / LP importado: R$ 124,90 / The Smile Sessions Box Set (inclui cinco Cds, 2 Lps, 2 compactos de sete polegadas, poster 24 x 36 cm com arte de capa assinada pelo artista plástico  Frank Holmes e livreto de 60 páginas com notas de produção): US$ 130.49

quinta-feira, janeiro 19, 2012

JOE & A GERÊNCIA EM SSA E CONQUISTA

No final dos anos 1980, uma adorável turma de malucos, alunos da Escola Técnica (ETFBA), se juntava todo santo dia, depois das aulas, para ouvir rock, trocar ideias e compor. Dessa turma nasceu a lendária  Os Feios, embrião do Cascadura e Dead Billies. O resto é  história.

O tempo passou e aquelas canções iniciais d’Os Feios ficaram engavetadas. Pelo menos, até outro dia. Por que agora elas ganharam uma segunda chance com a banda Joe & A Gerência (foto: Alexandra Spalicci), liderada por um dos remanescentes da turma, Joe Gomes.

Para quem ainda não se ligou, trata-se de Silvano Gomes –  que, nos anos 1990, atendia por Joe Tromondo, baixista dos insuperáveis The Dead Billies. Desde 2003, ele mora em São Paulo e é baixista de Pitty.

Com a patroa dando um tempo para cuidar do projeto paralelo Agridoce, em parceria com o guitarrista Martin Mendonça, Joe está adiantando o lado com seu próprio projeto paralelo, Joe & A Gerência.

Turma da pesada

“Essa história tem muito tempo. Eu formei a banda ainda em Salvador, há uns dez anos”, relata Joe. “Eu queria tocar as músicas que a gente tinha feito no tempo da Escola Técnica – eu, Fábio (Cascadura), Rex (Retrofoguetes), Nei Bahia”, conta.

Na época, a intenção era só tocar as músicas no velho Calypso: “Não tinha ainda essa facilidade toda para gravar”.

Os anos tocando com Pitty passaram. Aí um dia, dedilhando o violão em casa, Joe sentiu aquelas velhas (e boas) canções coçando nos seus dedos.

Ele não teve dúvidas: entrou no estúdio e gravou duas faixas com Duda Machado (baterista de Pitty) e aqui em Salvador, com andré t. e o velho companheiro de Dead Billies e Retrofoguetes, Rex.

Na sequência, intimou três músicos de São Paulo e formou A Gerência: Brunno Cunha (baixo), Rafael Mimi (guitarra) e Rick (bateria).

“Agora estamos gravando um EP com as versões definitivas, que representam o que eu queria para essas músicas”, conta Joe. O disco deve sair ainda neste semestre, mas no sábado você já pode ouvi-las em primeira mão. “Espero encontrar os amigos todos lá”, chama Joe. Vamos nélson?

Joe & A Gerência / Com Distintivo Blue: Quinta-feira (19), 20 horas / Viela Sebo Café (Vitória da Conquista) / R$ 5 / com Autoreverso e Maglore: sábado,  22 horas /  Groove Bar / R$ 15 e R$ 30

Ouça: www.soundcloud.com/joe_eagerencia




NUETAS

Wado na city, sexta
O catarinense / alagoano Wado, um dos bons nomes atuais da música brasileira que não se pauta pelo mero comercialismo, faz show em Salvador nesta sexta-feira. O músico vem lançar Samba808, seu mais recente álbum (o sexto!), disponível para download gratuito. Dia 20, 22 horas, Portela Café (Rua Itabuna, 304, Pq. Cruz Aguiar, Rio Vermelho), R$ 20 (antecipado na Companhia da Pizza) ou R$ 30, na hora.

A maior Zona. Mundi

 A Zona Mundi promove seu segundo evento neste mês. Desta vez, o projeto leva ao Museu de Arte Moderna  BNegão Sistema de Som, a grande Mariella Santiago e a dupla Finlandia (ARG / BR). Nas projeções visuais e performances, VJ Gabiru, VJ Curumin e a mostra Zona Mobile. Sexta-feira, a partir das 20 horas, no Solar do Unhão, R$ 4 e R$ 2. Vanguarda pop, avante!

UMA ELEFOA COR-DE-ROSA E UM DITADOR SANGUINÁRIO INCOMODAM MUITA GENTE

Rei Emir Saad - O Monstro de Zazanov e Uma Patada com Carinho trazem o humor inteligente de André Dahmer e Chiquinha

Um ditador sanguinário e uma elefoa cor-de-rosa não teriam nada em comum a princípio – além da predisposição à  comicidade involuntária. Talvez isso mesmo tenha favorecido o lançamento simultâneo, pela mesmo editora, dos álbuns de cartuns Rei Emir Saad - O Monstro de Zazanov e Uma Patada Com Carinho: As Histórias Pesadas da Elefoa Cor-de-Rosa.

O primeiro, de André Dahmer – o mesmo dos impiedosos Malvados –   reúne as tiras publicadas no site G1 com as aventuras do  governante supremo do Ziniguistão, país fictício que lembra  um cruzamento do Irã com a Líbia (Era Kadhafi) e umas pitadas  de Coreia do Norte.

Escolado no humor cruel, sem amarras ideológicas ou pudores moralistas, Dahmer recheia as tiras do Rei Emir Saad não apenas da crítica óbvia aos ditadores – chutar cachorro morto nunca foi sua especialidade – mas também da absoluta descrença no ser humano, seja ele de que procedência for: reis, servos, forças armadas, opositores, jornalistas, gente comum.

Mas a estrela do Ziniguistão é mesmo o Bom Emir, com seus revigorantes banhos de sangue pela manhã e vídeos de atropelamento no You Tube pela noite – para “dar um soninho” ao adorado Regente.

Com sua espada sempre em punho e bigodes cujos fios chegam até o chão, o Bom Emir é o antídoto perfeito aos incômodos movimentos Occupy.

Sob seu tacão, essa inconveniente Primavera Árabe logo se tornaria um longo, rigoroso – e hilariante – inverno.

Feminismo paquidérmico

Já a Elefoa Cor-de-Rosa veio para esmagar preconceito contra os quadrinhos femininos. A cartunista Chiquinha,  pseudônimo da gaúcha Fabiane Bento Langona, passa longe das HQs fofinhas de melancolia indie que costumam ser associada aos cartuns produzidos por moças.

Ferozmente feminista, a Elefoa provoca risos e também reflexão – evitando o mero panfletarismo quase sempre – abordando assuntos caros às mulheres, como homens (claro), moda, consumo, sexo e amizade no tempo das redes sociais, entre outras atualidades.

 Ao lado de suas melhores amigas, Gisbelle (descrita como “uma vaidosa girafa loura natural”) e Janete (“uma ursa com tendências sócio-ambientais”), a personagem desanca, sutil como... uma elefoa em uma loja de louças, a futilidade das revistas femininas, o machismo generalizado e a baixa autoestima das próprias mulheres.

Em  cena antológica, a Elefoa surta e  dá  uma bronca brutal em uma  atendente que tenta lhe vender um sutiã com enchimento: “Você e as consumidoras desse tipo de produto me constrangem profundamente”, dispara. Grande Chiquinha.

Rei Emir Saad - O Monstro de Zazanov / André Dahmer / LeYa - Barba Negra / 128 p. / R$ 34,90 / editorabarbanegra.com.br





Uma Patada com Carinho: As Histórias Pesadas da Elefoa Cor-de-Rosa / Chiquinha / LeYa - Barba Negra / 128 p. / R$ 34,90 / editorabarbanegra.com.br

segunda-feira, janeiro 16, 2012

SILVIA MACHETE E MANUELA RODRIGUES NO ESCURINHO DO CINEMA


Uma das cantoras mais originais surgidas nos últimos anos, a carioca Silvia Machete (em foto de Lipe Borges) volta a Salvador para duas apresentações, hoje e amanhã, no projeto Música no Cinema. Além de Silvia, a cantora baiana Manuela Rodrigues também faz seu show.

Ambas vão interagir com as projeções na tela grande a cargo do VJ Gabiru, um dos mais ativos do cenário local.

Silvia, que já foi artista de rua, ficou conhecida pela performance meio circense, meio cabaré, além da boa música que produz, claro.

“O repertório traz um pouquinho dos meus dois últimos discos, Extravaganza (2010) e o ao vivo Eu Não Sou Nenhuma Santa (2008)”, conta a artista.

O caráter diferenciado das apresentações, porém, instigou Silvia, que diz ter selecionado as canções mais a ver com a ocasião: “Como é um show em um cinema, tô meio que me inspirando nesse clima, com músicas mais cinematográficas e referências visuais”,conta.

“Acredito que vai ser uma experiência interessante pra mim e para o público, deixar as projeções contribuírem com a música, deixar o VJ se inspirar”, acrescenta Silvia.

Isso não a impede, contudo, de executar no palco os números de acrobacia que já se tornaram a assinatura da sua performance: “Com certeza, vou levar o bambolê, a peruca, os espelhos e mais   algumas coisas. Mas vou conversar com o VJ também, até  para rolar uma interação. Vai ser uma super experiência”, diz, entusiasmada.

No palco, Silvia se apresenta com sua banda, Os Chuchuzinhos – “eu  que batizei”, apressa-se, aos risos – formada pelos músicos Fabiano Krieger (guitarra), Bruno Delullo (baixo), João de Sábato (bateria) e Arthur Dutra (vibrafone).

Instrumento incomum em formações de música popular, a opção pelo o vibrafone merece uma declaração da artista: “Ele é climático, misterioso, adoro. E é tão raro alguém bancar a ideia de viajar com vibrafonista pra cima e pra baixo. Arthur  é uma das pessoas mais talentosas que eu conheço e tá lançando um CD solo que tá lindo. Mas minha banda toda é maravilhosa”.

“É um trabalho muito pessoal, e eu vivo pra isso. Só quero poder crescer com meu trabalho”, conclui Silvia Machete.

O projeto Música no Cinema volta em fevereiro, nos dias 6 e 7, com a cantora paulista Tiê, o duo local Dois Em Um e o artista visual Marcondes Dourado no posto de VJ da rodada.


Foto do lustre: André Mantelli / Divulgação.

Música no cinema com Silvia Machete, Manuela Rodrigues e VJ Gabiru / hoje e amanhã, 20 horas / Cine Cena Unijorge (Shopping Itaigara) / R$ 40 e R$ 20

sábado, janeiro 14, 2012

CHEGA DE SINHÔZINHO!

 
Não sei se vou poder ir - estou trabalhando hoje - mas dou o maiorrapoio!

Até por que um acinte destes não cabe mais na cidade que queremos.

quinta-feira, janeiro 12, 2012

SOFISTICAÇÃO ACÚSTICA

Na linha do She And Him e do local Dois Em Um, chega às lojas Agridoce, duo de Pitty e Martin

A menina punk que pulava pra galera nos velhos tempos do rock baiano dos anos 1990 e foi embora no início da década passada em busca do seu destino no Sudeste, definitivamente, cresceu.

Não que sinais desta passagem para a maturidade já não estivessem evidentes desde o álbum Chiaroscuro (2009), mais ambicioso em suas pretensões artísticas do que tudo que ela tinha feito antes em sua carreira.

Agora, com o álbum homônimo do projeto paralelo Agridoce (acima, em foto de Caroline Bittencourt), tocado em parceria com o guitarrista Martin Mendonça, ela dá (na verdade, eles dão) vazão à outras facetas criativas de sua musicalidade, investindo em uma sonoridade acústica rica e à beira de uma certa sofisticação pop.

Gravado durante temporada de isolamento em uma casa na Serra da Cantareira, Agridoce, o disco, poderá surpreender quem ainda vê Pitty como uma “cantora de rock adolescente”, rótulo muitas vezes colado à artista – ainda que não sem alguma razão, é verdade.

Cantando melhor do que nunca, ela deita a voz de forma suave e emocionada na cama de sons acústicos arrumada por Martin e o produtor / mentor Rafael Ramos.

Se ainda não chega a ser algo 100% original, Agridoce é o testemunho definitivo de que a baiana é sim, uma artista relevante.

ENTREVISTA: AGRIDOCE

Soteropolitana de nascimento (em 7 de outubro de 1977), Priscilla Novaes Leone passou a infância em Porto Seguro, aonde começou a ouvir rock via Raul Seixas e o BRock dos anos 1980. Logo evoluiu em direção ao punk rock / hardcore, gêneros que abraçou com sua primeira banda, Inkoma, já em 1995 e morando em Salvador. Em 2002, a convite de Rafael Ramos, da Deckdisc, partiu para São Paulo. O resto é história.

Já Martin Mendonça, também de Salvador, começou a tocar guitarra em bandas de heavy metal locais, como Malefector e Gridlock. Depois de um período na Cascadura, foi convocado em 2004 para assumir a guitarra na banda de Pitty.

O que motivou o Agridoce surgir como projeto paralelo? O estilo das canções não combinavam com o som de Pitty?

PITTY - O Agridoce já nasceu como uma coisa diferente, na verdade. Desde o embrião, quando nem sabíamos o que ia ser, as músicas já brotavam dentro desse conceito mais minimalista e utilizando elementos diferentes de uma banda de rock – no caso, piano e violão. Foi natural que virasse algo paralelo.

Que bandas / artistas influenciaram na criação do som do Agridoce, durante a temporada na Serra da Cantareira?

P - Lá a gente ouvia praticamente só vinil. Cada um levou os seus e juntamos todos numa pilha enorme perto da vitrola. Ouvíamos desde John Lennon e Neil Young até Black Keys e Arcade Fire. Serge Gainsbourg, Sean Lennon e o Ghost Of A Saber Tooth Tiger, Charlotte Gainsbourg e coisas de Johnny Cash. E cada um desses trazia uma pontinha de inspiração. Cash pelo timbre de violão, Arcade Fire pelas texturas, Lennon pelos timbres de voz dobrada com slap delay. Por temos essa coisa com os vinis e estarmos tão abertos à experimentações acabamos sampleando coisas dos Beach Boys, Gainsbourg e até Led Zeppelin. Tá tudo diluído ali no meio.

Aliás, os violões estão matadores. Deu muito trabalho buscar esses timbres específicos?

MARTIN - Tive dois trunfos fundamentais nessa gravação, que foram os violões e microfones incríveis que descolei com Rafel Ramos (produtor) e Marcelo Gross (Cachorro Grande), aliados a  experiência e habilidade de Jorge Guerreiro, nosso engenheiro de som. Usei como referência principal os discos do Johnny Cash produzidos por Rick Rubin, que tem alguns dos melhores sons de violão que eu já ouvi.

E como foi a montagem do estúdio em uma casa na Serra (abaixo, foto de Otávio Sousa)? Foi complicada? Vocês levaram muito material de gravação e instrumentos ou foi uma operação mais simples, graças às técnicas de gravação digitais?

M - Apesar das facilidades promovidas pelas técnicas de gravação digital, ainda dá um puta trabalho montar um estúdio numa casa que não foi preparada pra isso. Tivemos que improvisar espaços e nos virar como podíamos. Mas esse desafio era algo que estávamos procurando quando optamos por gravar lá. Queríamos que o som do disco tivesse, acima de tudo, personalidade – e gravar fora do esquema asséptico de um estúdio profissional acaba conferindo uma sonoridade muito peculiar.

P - Foi um tiro no escuro, uma aventura. Não sabíamos qual seria a acústica da sala, nem como montaríamos os equipamentos. Tudo foi descoberto lá. Levamos ferramentas para transformar aquilo num laboratório. Até um gravador de rolo estava no pacote e acabou sendo usado de rompante numa gravação na piscina, com apenas um microfone. De instrumentos, catamos tudo o que podia em casa. Tudo que produzisse algum barulhinho interessante ou que pudesse somar e texturizar de alguma forma.

A  voz de Pitty em sua banda principal parece estar cada vez mais similar à voz da Pitty do Agridoce. Você está se "agridocificando"?

P - Hahaha, será? Nunca pensei por esse ângulo. Talvez a coisa esteja caminhando para uma identidade mais coesa, mesmo os dois trabalhos sendo tão diferentes. De qualquer forma, como cantora, penso que é um trabalho de descoberta que nunca cessa. Sempre vou querer saber de quantos jeitos eu posso usar esse instrumento (a voz), buscar formas diferentes de emissão. E é um campo muito, muito amplo. Foi um mega desafio cantar desse jeito no Agridoce, com menos volume, controlando minuciosamente a saída de ar, as sílabas. E me surpreendi com a descoberta de que cantar suavemente é mais difícil do que gritar– pra mim pelo menos, pela minha vivência. Pro grito, pro brado, é necessário explosão, potência. Pra esse outro tipo de canto é preciso muito mais controle. A base tem mais “espaço” e qualquer nota que você emita com um pouco mais ou menos de ar fica evidente.

Que outros instrumentos você  tocou no disco, Martin? Tem algum que achou mais difícil ou que deu mais trabalho para achar os timbres ideais?

(Foto: Otavio Sousa)
M - Além do violão, toquei dobro, ukulele, bandolim, baixo e guitarra, sendo que esta última, sempre de uma maneira não-ortodoxa. Os maiores desafios foram o bandolim, com o qual não fiz as pazes até hoje, e as experimentações com E-Bow e slide, duas abordagens da guitarra que nunca tinha tentado até então e pelas quais me apaixonei.

Haverá shows do Agridoce, uma turnê de divulgação? Se houver,  passa por Salvador?

P - Estão pintando alguns shows, tô sentindo que vai rolar uma tourzinha, sim. Espero MUITO que passe por Salvador, é uma pena aparecerem tão poucas oportunidades de tocar na nossa terra natal. Saibam que queremos loucamente, mas que não depende só da gente.

Vocês dividiram os vocais em algumas faixas do CD. Foi aquele “esquema Beatles”, tipo quem escreve a letra canta a canção – ou alguém fazia questão de cantar essa ou aquela música?

M - Esquema Beatles, quem fazia a letra cantava a música, ou trechos dela.

Como surgiu a parceria da dupla com Ricardo Spencer (cineasta baiano, diretor de diversos clipes e vídeos para Pitty e sua banda), na faixa Say?

P - Surgiu do nada, numa madrugada dessas em que ele e Martin ficaram cantarolando coisas e registraram no gravador do celular. Martin me mostrou depois e eu achei lindo, achei (e achamos) que renderia uma música. Aí fomos desenvolvendo. Eu e Martin criamos um arranjo, Spencer mandou uma letra, eu lapidei a melodia. Foi bem inusitado o jeito que essa música surgiu, e foi uma ótima surpresa pra gente.

Quais os planos de Pitty para 2012? Disco novo, turnê? Ou será um ano mais reservado, com férias etc?

P - Agora encerramos a turnê do DVD Trupe Delirante, e vamos nos dar uma férias para arrumar a casa, realinhar as ideias e deixar brotar algo novo. Imagino que em 2012 role um disco, mas não sei quando ainda. Vou fazendo à medida em que aconteça tempo-vontade. Enquanto isso não rola, faço shows com Agridoce.

Cantar em uma língua estrangeira não é nada fácil. Na verdade, é bem difícil. Mas ainda assim, você foi bem corajosa ao cantar uma faixa em francês (Ne Parle Pas, lançada em compacto de vinil, além de duas outras em inglês). Não deu frio na barriga de, de repente, pagar um mico em francês? Você contou com alguma assessoria aí, um professor de francês para ajudar na pronúncia, ou foi na cara e na coragem, mesmo?

 
P - Foi na minha boa e velha cara-de-pau mesmo (risos). Contei com a percepção de que palavras em outras línguas são sons. Uma vez que seu ouvido os capta, eles podem ser reproduzidos. É difícil principalmente porque não domino o idioma, mas acho que o que vale nessa hora não é a pronúncia matematicamente perfeita. É o feeling, a interpretação, o fato de combinar com a sonoridade. É necessário se arriscar artisticamente. Se existe mico, é para aquelas pessoas que acham que tudo tem que ser perfeito e asséptico e só enxergam a rigidez, e estão aquém da arte. Estão mais preocupados com a forma do que com o conteúdo. Obviamente cuidei para que fosse o melhor possível, mas tenho consciência de que sempre será um francês falado por um estrangeiro, que existe o sotaque. E o sotaque é bom, é o que você é, de onde veio.

Seu primeiro álbum como Pitty, o Admirável Chip Novo, saiu em 2003. De lá para cá, já se vão quase nove anos. Seu público, que era majoritariamente adolescente, cresceu. Já os adolescentes de hoje em dia parecem mais ligados em bandas mais recentes, como Restart e Cine, ou por outro lado, em artistas de perfil menos ligado ao imaginário roqueiro, como Luan Santana etc. Como você se vê posicionada no mercado da música pop brasileira dos próximos anos, Pitty? Cada vez mais roqueira, mais para o radical? Ou buscando uma mudança de perfil?

P - Eu não sei se “busco” nada conscientemente, não é tão pragmático assim. Eu só quero gravar discos que eu goste, fazer músicas nas quais eu possa me expressar, que eu ouça e fique feliz por tê-las feito. Música não é encomenda, não é para suprir regras de mercado, para atingir de forma calculista este ou aquele (público). É pra gente transcender, se revelar, se conhecer. Parece papo hippie, mas é que é muito estranho quando eu vejo a arte sendo tratada de forma tão pequena e mundana, quando eu sinto que é algo maior. Enfim, o que vai ser eu não sei. Mas sei que vou continuar gravando os discos que eu quero gravar. E aí só me resta torcer para que as pessoas se identifiquem com eles.

Martin, você é o cara dos projetos paralelos na banda da Pitty, correto? Além do Agridoce, tem ainda o Martin & Eduardo, projeto seu com o baterista de Pitty, Duda Machado, que lançou o disco Dezenove Vezes Amor (2010). Esse projeto ainda está rolando? Se sim, quais são os planos para ele?


M - O projeto com Duda está de férias. Gravamos o disco, fizemos uma mini-turnê e acho que esse ciclo já fechou, agora é esperar pra ver no que vai dar. Ainda não fiz planos mas já tenho todas as músicas prum próximo disco então tudo pode acontecer.

Agridoce / Vigilante - Deckdisc / R$ 21,90 / LP em vinil Polysom: R$ 79,90 / Compacto Vinil de Ne Parle Pas Polysom: R$ 34,90

terça-feira, janeiro 10, 2012

MUNDO LIVRE S/A EVOCA ETNIA ANCESTRAL DA HUMANIDADE

A trupe de Fred Zeroquatro volta com um dos melhores álbuns de 2011 em Novas Lendas da Etnia Toshi Babaa, disco borbulhante de música criativa, ousada e dançante



Parece incrível, mas em um ano (2011) em que a maioria dos lançamentos de artistas badalados pela crítica sulista parecia mais interessada em botar o ouvinte para dormir, coube a veteranos como Erasmo Carlos, Autoramas e, por fim,  Mundo Livre S/A (foto de Rodrigo Valença), dar sinais de vida com ótimos discos inéditos.

A trupe pernambucana de Fred Zeroquatro, depois de alguns anos na independência total, retorna com o novo disco, Novas Lendas da Etnia Toshi Babaa, lançado em parceria com a gravadora Coqueiro Verde – de Leo Esteves, filho do já citado Tremendão.

E mesmo tendo chegado às lojas no apagar das luzes de 2011, o novo CD do Mundo Livre não deixa dúvidas: é um dos melhores do ano que passou e está pau a pau com os grandes discos da banda, como a estreia Samba Esquema Noise (1994) e Carnaval na Obra (1998).

O próprio Fred Zeroquatro, líder do grupo criado em 1984 e um dos fundadores do movimento Manguebit, deixa a falsa modéstia de lado ao falar do novo trabalho: “Sou suspeito para falar, mas acho que chegamos num grau de excelência em termo de composição, de aprimoramento, melodia e harmonia que é bem ousado, um nivel muito superior a todos os outros discos da banda”.

“Em nenhum outro álbum nosso atingimos esse grau de composição das faixas  Constelação C.A.R.I.N.H.O.C.A 7.3.2.4. ou Ela é Indie. Me sinto muito mais realizado nesse disco do que em todos os outros que fizemos”, afirma Fred.

Comunhão profana

De fato, o álbum esbanja uma sonoridade vibrante e rica como pouco se vê nos dias de hoje. A referência principal continua sendo a  mesma desde o início – Jorge Benjor – mas acrescida de linhas de baixo funk (de James Brown, não do carioca), levadas  disco music, texturas new wave, melodias de marchinhas de carnaval, batidas de frevo e muitas outras influências, citações e ingredientes, tudo fervido em um caldeirão cibernético que é a cara da banda – mescla de alta & baixa tecnologia, alta ciência & sabedoria popular em comunhão profana, sem concessão.

“Foi o disco que demoramos mais para concluir. Tem música aí que vínhamos tocando desde 2009, sempre de forma diferente, aprimorando a interpretação, o jeito de cantar”, conta.

A democratização dos meios de produção digital também teve sua parte nisso, claro. “Antigamente você entrava no estúdio com data certa para sair. Agora não, você tem esse ganho de ficar muito mais tempo maturando a música”, admite.

Deuses astronautas
Mesmo com toda essa carga, Zeroquatro & Cia conseguiram cometer um disco que soa quase sempre leve, solar – com exceção de uma ou duas faixas mais sombrias, como o eletrossamba deprê Soneto do Envelhecido Sem Pretexto e Cabôcocopyleft, bossa abolerada de protesto contra o movimento Creative Commons / Copyleft: “Pois na era da internética / o capeta se transfigurou / numa assombração pseudoacadêmica / que me deixa atordoado só de pensar”, canta Zeroquatro.

O tema, um dos preferidos do compositor na atualidade, faz parte do conceito geral do álbum, a tal Etnia Toshi Babaa: “Resumindo,  o conceito junta a coisa tribal com o espacial, cósmico. Tem a ver com deuses astronautas, a cyber selva e o novo fundamentalismo”.

“É uma construção metafórica, um eixo narrativo fio condutor para todos os ecossistemas que abordamos no disco: biopirataria, direito autoral,  aquecimento global. Tudo isso pode ser amarrado por esse fio metafórico da etnia Toshi Babaa”, viaja o músico.

Um exemplo dessa adorável complexidade que reveste a música do Mundo Livre é a já citada Constelação C.A.R.I.N.H.O.C.A 7.3.2.4.

“Essa faixa retrata uma musa de Copacabana, mas também é uma senha para discutir, de forma enviesada, o aquecimento global. Não foi a toa que gente optou por ela para abrir o CD. Não só a batida foge do compasso convencional do samba, por isso o 7324 do titulo, mas também discute a malícia da azaração de praia bem carioca e o aquecimento global, sugerindo a hipótese de que o sol está muito mais violento, descontrolado e tarado”, ri.

Novas Lendas da Etnia Toshi Babaa / Mundo Livre S/A / Zero Ponto Um - Coqueiro Verde  / R$ 20 / www.coqueiroverderecords.com

quinta-feira, janeiro 05, 2012

APOSTA ROCK LOCO PARA 2012: ERIC ASSMAR TRIO

O Rock Loco orgulhosamente antecipa aquele que promete ser um dos melhores trabalhos do rock / música independente baiana este ano: o primeiro CD do Eric Assmar Trio.

Filho do patrono do blues baiano, o grande Álvaro Assmar, Eric, claro, partilha do amor pelo blues rock desde o berço, está no DNA do rapaz. Diabos, até o nome dele, Eric, é homenagem a vocês sabem quem.

Seu trabalho com uma banda própria começou em outubro de 2009, quando, a convite do então produtor do Groove Bar, João Carlos, ele montou o power trio para um show semanal de standards de blues.

“A partir disso, resolvemos tocar adiante como banda”, conta Eric. “Depois dos primeiros shows, com o tempo eu fui escrevendo e foi surgindo o material autoral, com   algumas coisas que resolvemos gravar no nosso primeiro CD”, relata.

Som de power trio

Ao lado de Rafael Zumaeta (baixo) e Thiago Gomes (bateria), Eric desenvolveu e arranjou 11 composições autorais que estarão no disco, produzido pelo seu próprio pai, Álvaro.

“O som tomou um direcionamento mais rock, mas também reggae e o blues que está sempre na veia, e é meu ponto de partida para tudo”, conta.

“Agora estamos na pós-produção e a previsão é que saia ainda neste primeiro semestre. Estamos trabalhando muito pra isso”, acrescenta.

Jovem guitar hero de talento natural e impressionante, Eric só falta soltar faísca quando sola na sua Fender Stratocaster.

E, a exemplo daquele outro Eric (no seu trio Cream), Jimi Hendrix (com o Experience) Stevie Ray Vaughan (& Double Trouble) e até mesmo Andy Summers (no Police), ele define a proposta de sua banda (e do disco) como “som de power trio”.

“Vai ser essencialmente um disco de power trio, aquela sonoridade característica de guitarra, baixo e bateria que veio do Cream e passou por muita gente, até desembocar, mais recentemente, no Gov’t Mule, no John Mayer e outros”, define.

Sobre trabalhar no estúdio com seu pai, ele conta que “a gente discute bastante, até batemos cabeça, mas é uma experiência bem intensa, uma fonte de grande aprendizado. Meu pai é o grande tutor da minha vida. E em muitas coisas, não só na música”, conclui.

Crédito foto: Pedro Coelho

Ouça: www.myspace.com/ericassmartrio

NUETAS

Templo de Ano-Novo
O evento Templo do Rock saúda a chegada do Ano-Novo com shows de Reverendo T (ao lado, em foto de Fátima Berbert) & Os Discípulos Descrentes, Tronica, Os Normandos e Os Clandestinos. Sexta-feira (dia 6), no Ali do Lado Boteco Musical, às 21 horas, R$ 10. R$ 15 com CD.

E sábado que vem tem mais...
Tentrio, Hessel, Peito de Planta e Jonas: mais quatro bandas tocam logo no primeiro fim de semana de 2012. As três primeiras, da cena instrumental. A última segue a linha stoner. Sábado,  22 horas,  Dubliners Irish Pub (Rio Vermelho),  R$ 10.

Zona Mundi 2012
O evento rola sexta-feira 6, com Radio Mundi e Nsista, Zona Mobile, Ambulante Original e projeções de Gabiru e Quetzal. MAM,  20 horas, R$ 4  e R$ 2.

O RETORNO DE DREADSTAR, O GUERREIRO ESPACIAL MAIS FODÃO DOS QUADRINHOS

Dreadstar, publicada no Brasil entre os anos 1980 e 90, volta em graphic de luxo e confirma status de obra-prima de Jim Starlin

Sagas cósmicas não são novidade nos quadrinhos desde 1928, quando Buck Rogers hibernou  quinhentos anos em sua nave e acordou no século 25. Mas poucas foram tão marcantes e ousadas quanto Dreadstar, personagem criado por Jim Starlin nos anos 1980 para o selo Epic da Marvel Comics e cuja primeira aparição – inédita no Brasil – chega agora às livrarias  no álbum de luxo A Odisseia da Metamorfose (Devir).

Marco inicial da longa trajetória do guerreiro espacial de capuz, A Odisseia, a despeito de ter sido publicada a partir de 1982,  é um dos mais bem-acabados e icônicos produtos da FC dos anos 1970, pós-Star Wars e Heavy Metal (a clássica revista de ficção e fantasia).

Quando os zygoteanos, uma raça altamente beligerante dos confins da Via Láctea, ataca e destrói o planeta Orsiros (aonde, curiosamente, tudo lembra o antigo Egito), um mago tomado pelo ódio cria a arma definitiva do juízo final: a Trombeta do Infinito, que só pode ser “tocada” por três seres escolhidos (um deles, uma terráquea).

Para protege-los, o mago, Aknaton, convoca o furioso guerreiro Dreadstar, do planeta gelado Byfrexia – uma espécie de Luke Skywalker mal-encarado, amargurado, dono de uma espada mística altamente mortal e pronto para fatiar qualquer um que se aventure a enfrentá-lo.

Entre batalhas em cenários espetaculares, a busca pelo armamento, encontros com deuses espaciais e o apocalipse, Jim Starlin constrói uma fábula eletrizante com forte mensagem anti-imperialista e anti-religião – um marco da HQ de FC.

Trajetória editorial agitada

E o melhor é constatar que, passadas três décadas desde sua publicação, Dreadstar continua uma leitura tão impactante quanto nos anos 1980 – fãs com mais de 35 anos devem lembrar do guerreiro de capuz.

Em 1985, a Editora Abril publicou os seis primeiros números do seu título próprio (HQs pós-Odisseia) como carro-chefe da revista Epic Marvel, dedicada a publicar os títulos do então ainda ativo “selo adulto” da Casa das Ideias.

A despeito da excelente qualidade, porém, a revista foi cancelada (sem aviso aos leitores) no número seis.

A interpretação é que o mercado de  HQ da época não estava preparado para absorver um material tão “pesado”

Em seis meses, Dreadstar, a série, tocou, sem sutileza, em assuntos como incesto, pedofilia, intriga política, religião como instrumento de manipulação das massas, midia corrupta, holocausto nuclear e outros tópicos não muito comuns em gibis.

Levou uns quatro anos para Dreadstar voltar às HQs  no Brasil, quando a Editora Globo lançou um gibi em formatinho retomando de onde a Abril tinha parado. Sob o comando do editor Leandro Luigi Del Manto (o mesmo de Odisseia), Dreadstar publicou todas as edições da Epic, encerrando no número 10.

A Globo lançou ainda duas graphic novels, ambientadas logo depois de Odisseia: Dreadstar (1990) e O Preço (1993).

Pois bem. Essa foi a última vez que Dreadstar deu as caras no Brasil, até agora. A Odisseia da Metamorfose é justamente o início de tudo, a graphic novel de origem – e o melhor: é inédita no Brasil.

Agora é torcer pela republicação completa.

Dreadstar: A Odisseia da Metamorfose / Jim Starlin / Devir / 128 p. / R$ 53 / www.devir.com.br

terça-feira, janeiro 03, 2012

MÁRCIO MELLO NO OLHO DA RUA



Cantor lança DVD gravado ao vivo na rua, em plena festa de Iemanjá, no Rio Vermelho - e dispara a metralhadora verbal contra o estado das coisas em Salvador

Márcio Mello dispensa apresentações. O cantor / compositor, que já namorou com o mainstream (na época de Nobre Vagabundo, hit na voz de Daniela Mercury), iniciou sua carreira no underground local, na banda Rabo de Saia. E é ali que ele, orgulhosamente, continua.

O testemunho inegável desta afirmação está no DVD independente  que ele acaba de soltar: Márcio Mello Ao Vivo no Rio Vermelho. De cara, o que se pode dizer é que se trata do mais precioso documento audiovisual  a sair do cenário do rock / música independente local.

Gravado no dia 2 de fevereiro de 2010, em plena festa de Iemanjá, o vídeo é o documento definitivo do show gratuito que ele faz todos os anos, desde 1998 (data que ele mesmo lembra, mas não tem certeza)  na varanda da empresa gráfica Venture, no Rio Vermelho.

É um vídeo primoroso nos quesitos espontaneidade / verdade. Com diversas câmeras espalhadas em cima do palco e no meio da plateia, ele capta todo o clima de bagunça do evento, transportando o espectador para o meio do povo, entre  doidões, gatinhas, roqueiros, malucos de rua, ônibus, carros e caminhões abrindo caminho no meio da multidão a todo momento – além de convidados inusitados, como o ator Fábio Lago (dando uma canja no pandeiro) e o ex-baixista do Camisa de Vênus, Robério Santana.

Porém, mesmo feliz com o resultado do DVD, Márcio anda muito descontente com Salvador – e com todo direito. No DVD, o baterista é seu amigo Paulo Perrone, que respira por aparelhos desde julho, após ser baleado durante um assalto.

Márcio já queria gravar um DVD ao vivo há muito tempo. Mas faltava uma oportunidade realmente bacana, com a sua identidade, para a coisa andar. “Cheguei a pensar em fazer de forma careta, em um teatro. Mas também tinha esse show no Rio Vermelho, que é demais”, diz.

Seus sócios foram contra. “Acharam a ideia ruim, o lugar sem estrutura e tal, até por que a gente não faz passagem de som para esse show”, conta.

”Mas, pô, nos anos 1970 era assim mesmo. Se ficasse ruim, não tinha essa de tocar a mesma música de novo e de novo. Era a coisa real. E é isso que eu quero. Se ficar ‘bagunçado’, dane-se”, acrescenta Márcio.

A  coisa ficou tão divertida e espontânea que o espectador corre o risco de achar que certas passagens do vídeo foram “combinadas”, mas não: era só o caos conspirando a favor. “Tem uma hora que a lâmpada de um poste estoura, você acha que é fogo de artífício”, ri.


Ele conta que já fez shows de divulgação do DVD em São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba e Porto Alegre com o Bizarromóvel, um caminhãozinho adaptado para shows.

“O executivo de marketing de uma operadora de telefonia viu o Bizarromóvel no Rio Vermelho e pirou. Detalhe: do marketing de Belo Horizonte. Os caras da mesma operadora daqui de Salvador não estão nem aí”, diz.

No dia 2 de fevereiro ele faz o show de lançamento do DVD, no mesmo lugar. A nota triste é que este deverá ser o último ano do evento que já rolava há mais ou menos 15 anos, já que a Venture, empresa dona do “palco improvisado”, já avisou a Márcio que está deixando o local.

Em 2012, Márcio pensa em gravar um álbum com músicas inéditas, seguindo o mesmo padrão despojado: “Vou fazer um acústico. Voz, violão e só. Hoje é tanta ‘mistura’ indigesta,  tudo tem que ter DJ, VJ, toneladas de percussão, mas a verdade é que tudo começa ali, no violão”.

“Tá na hora de ter coragem, de fazer guerrilha. Salvador tá careta demais”, constata. “A cidade toda está em crise total faz tempo. E é crise artística. Tá na hora de expulsar a meia dúzia de mauricinhos que produzem o mercado e ditam o que todo mundo vai ouvir”, dispara.

“Chega da música baiana com cara de jingle da Bahiatursa, essa caricatura do negão feliz rebolando de óculos escuros. A verdade é que o negro baiano continua sendo vendido como escravo, só que em outro patamar. Se antes eram escravos do senhor de engenho, hoje eles tem de rebolar pra enriquecer os donos de bloco e das bandas, que são todos meninos branquinhos, ex-alunos de escola particular. Nada mudou”, diz.

“Outro dia um cara me perguntou se eu ouvia pagode. Eu disse que não. Ele estranhou: ‘E você ouve o quê?’, como se só existisse isso. Percebeu o nível da mediocridade?”, pergunta.

Márcio acredita que essa mediocridade já contaminou todas as instâncias da sociedade. “O axé não deixou nada para cidade, só destruição. Acabou com o Carnaval, a noite, até a arquitetura. A cidade está  feia. A conclusão que eu tiro é que uma cidade com música ruim é uma cidade ruim de se viver”, afirma.

“Aí fica todo mundo com cara de Carlinhos Brown. Tem uns 15 anos que aturamos um cataclisma de Carlinhos Browns, todo mundo igual. Ninguém pensa em fazer um trabalho artístico. Só pensa em se dar bem”, lamenta.

Márcio confessa que não tem mais prazer em estar na cidade, ainda mais depois do que aconteceu com o baterista Paulo Perrone.

“O cara tá semimorto no hospital por que foi tirar 300 contos no banco. Poderia ser eu ou você. A música que as pessoas insistem em ouvir de forma ensurdecedora nas ruas é estressante. Você não consegue tomar uma cerveja em paz nessa cidade. A gente tem que ficar trancado em casa, por que Salvador nos tortura o dia inteiro”, desabafa.

Com isto, só resta desejar boa sorte aos desavisados turistas...

Crédito fotos: www.flickr.com/photos/solitariopunk/

DVD AO VIVO NO RIO VERMELHO / MÁRCIO MELLO / Macaco Gordo / R$ 25 / À venda na Mídia Louca (3334-2077) / www.midialouca.com.br / Baixe / ouça: www.marciomello.com.br