Em 1986, uma das principais bandas da primeira geração do punk rock brasileiro lançava seu debut fonográfico por uma gravadora major.
Com apenas seis faixas, o EP Pânico Em SP (Warner), foi a estreia da banda Inocentes (foto de Daniel Arantes) – e marcou época em um contexto hoje inimaginável, quando o movimento do rock brasuca (o chamado BRock) dava as cartas no mainstream.
O disquinho foi o começo de um contrato de quatro anos que rendeu ainda mais dois álbuns: os LPs completos Adeus Carne (1987) e Inocentes (1989).
Agora, depois de serem remasterizados e relançados sem grande alarde alguns anos atrás, eles retornam em edições comemorativas dos 30 anos da banda, com as capas originais.
Pânico em SP ganhou ainda seis faixas-bônus novas, gravadas para esta edição em meados do ano passado. Originalmente produzido pelo Titã Branco Mello e Pena Schmidt, o EP original foi gravado em apenas 70 horas de estúdio.
“Um custo ridículo para uma gravadora major”, lembra Clemente Nascimento, fundador da banda.
“Foi gravado praticamente ao vivo no estúdio. O que foi estranho na época, afinal estávamos em uma multinacional”, acrescenta.
“Aí para essa edição incluímos seis músicas atuais. E gastamos 30 horas de estúdio para gravar tudo. O que foi mais ridículo ainda”, ri o sempre bem-humorado Clemente.
Para ele, a inclusão das faixas atuais junto ao material antigo denota a coerência que caracteriza sua banda: “É legal fazer esse link ao comemorar 30 anos de banda e mostrar como ela está hoje. São cinco faixas inéditas e uma regravação de A Face de Deus. A original está no terceiro disco e é no violão. Aí a regravamos como tocamos hoje, na guitarra e acelerada”.
“As outras cinco faixas representam a banda agora. Em retrospecto, tem muita coerência aí. Isso é importante”, vê.
Mesmo sem emplacar um grande hit nas rádios, a gravadora honrou o contrato com os Inocentes e, em 1987, botou os meninos de novo no estúdio para gravar o LP Adeus Carne.
É um álbum ambicioso, que traz o clássico punk Pátria Amada, Eu (poema de Vladimir Maiakovsky musicado por Clemente) e Pesadelo (versão para o samba de Maurício Tapajós e Paulo César Pinheiro).
“Para mim é o nosso melhor disco, nossa obra-prima, se posso falar assim”, afirma o band leader.
“Ele foi todo pensado, da primeira a última faixa, todas as letras, os arranjos. É um disco conceitual. Não lembro mais qual era o conceito, mas enfim“, admite, rindo à larga.
Período confuso
A trinca de discos na fase Warner da banda se concluiu com o disco de título homônimo Inocentes, produzido por Roberto Frejat.
Colocar um potentado do rock carioca para produzir uma das bandas-símbolo do punk paulista deixou as coisas meio confusas no estúdio.
“Até me surpreendi ouvindo esse disco hoje em dia”, confessa Clemente. “Estávamos em uma fase confusa, prestes a sair da Warner e ainda tinha a pressão de ser popular como os Titãs. A gente ficou meio sem rumo, a década de 1990 já estava começando e a gente já se sentia uma banda da década passada”, comenta.
“Hoje eu vejo que tem muitos bons momentos. É um disco desigual, mas tem canções poderososas como (a já citada ) A Face de Deus, uma das melhores letras que já fiz”.
Merece menção ainda o baião rock Promessas e o hino Garotos do Subúrbio, resgatado da coletânea Grito Suburbano (1982), marco zero do punk no Brasil.
Som on line e documentário
Em um balanço final, Clemente vê essa fase da banda em uma major como extremamente positiva: “Naquela época era muito mais difícil ser independente do que hoje em dia. Graças a distribuição de uma grande gravadora, esses discos chegaram no Brasil de Norte a Sul. Isso permitiu que fôssemos o que somos hoje”, acredita.
“E também permitiu fazer essa parceria com a Warner nessas edições comemorativas, incluindo faixas novas – mantendo nossa independência”, conta.
Filho de pai baiano, Clemente diz ter uma relação especial com a Bahia: "Tenho amigos aí, é o lugar que a gente mais tocou no Brasil (fora São Paulo) nos anos 1980 e 90. Tocamos também no Palco do Rock há pouco tempo. Até discotecar eu já discotequei aí (no Groove Bar). Volta e meia estou por aí. Sem falar que sou parceiro do Marcelo Nova. É, eu tenho que aturar ele aqui (risos). Aí quando eu quero fugir dele, eu vou pra Bahia!", diverte-se.
Em paralelo ao trabalho com os Inocentes, Clemente assumiu uma das guitarras na banda contemporânea Plebe Rude. "Em 2011, lançamos um DVD comemorativo dos 30 anos da banda. Aí concorremos ao Grammy Latino de Melhor DVD de rock brasileiro e adivinha? Perdemos para Caetano Veloso! Esses baianos me perseguem, rapaz! Quando não é Marcelo, é Caetano!", e cai no riso de novo.
Para 2012, Clemente planeja para breve um show transmitido on line, com a banda executando o Pânico Em SP (edição comemorativa) na íntegra. Em abril a banda também se apresenta no Lollapalooza Brasil.
Há ainda um documentário, Inocentes 30 Anos, de Carol Thomé e Duca Mendes, rolando no circuito de festivais. “É um curta, mas pretendemos lançar uma versão estendida em DVD”, conclui Clemente.
O punk continua vivo.
Pânico Em SP / Inocentes / Originalmente lançado em 1986 / Warner / R$ 16,90
Adeus Carne / Inocentes / Originalmente lançado em 1987 / Warner / R$ 16,90
Inocentes / Inocentes / Originalmente lançado em 1989 / Warner / R$ 16,90
Eu e meu ex-parceiro de crimes Emerson Cabelo já tínhamos o vinil em 1987. Ano passado, eu comprei o CD.
ResponderExcluirA diferença?
Em 87, a gente caminhava do Colégio Dois de Julho até a Praça Castro Alves e comprávamos direto na loja Not Dead da punkette machona Jardel e tínhamos CENTENAS de vinis de punk rock de vários países.
Em 2011, precisei ENCOMENDAR na porra da Livraria (arrghhh...) e correr pra comprar a ÚNICA cópia antes de alguém furar a fila.
Abominável mundo novo.