Um ditador sanguinário e uma elefoa cor-de-rosa não teriam nada em comum a princípio – além da predisposição à comicidade involuntária. Talvez isso mesmo tenha favorecido o lançamento simultâneo, pela mesmo editora, dos álbuns de cartuns Rei Emir Saad - O Monstro de Zazanov e Uma Patada Com Carinho: As Histórias Pesadas da Elefoa Cor-de-Rosa.
O primeiro, de André Dahmer – o mesmo dos impiedosos Malvados – reúne as tiras publicadas no site G1 com as aventuras do governante supremo do Ziniguistão, país fictício que lembra um cruzamento do Irã com a Líbia (Era Kadhafi) e umas pitadas de Coreia do Norte.
Escolado no humor cruel, sem amarras ideológicas ou pudores moralistas, Dahmer recheia as tiras do Rei Emir Saad não apenas da crítica óbvia aos ditadores – chutar cachorro morto nunca foi sua especialidade – mas também da absoluta descrença no ser humano, seja ele de que procedência for: reis, servos, forças armadas, opositores, jornalistas, gente comum.
Mas a estrela do Ziniguistão é mesmo o Bom Emir, com seus revigorantes banhos de sangue pela manhã e vídeos de atropelamento no You Tube pela noite – para “dar um soninho” ao adorado Regente.
Com sua espada sempre em punho e bigodes cujos fios chegam até o chão, o Bom Emir é o antídoto perfeito aos incômodos movimentos Occupy.
Sob seu tacão, essa inconveniente Primavera Árabe logo se tornaria um longo, rigoroso – e hilariante – inverno.
Feminismo paquidérmico
Já a Elefoa Cor-de-Rosa veio para esmagar preconceito contra os quadrinhos femininos. A cartunista Chiquinha, pseudônimo da gaúcha Fabiane Bento Langona, passa longe das HQs fofinhas de melancolia indie que costumam ser associada aos cartuns produzidos por moças.
Ferozmente feminista, a Elefoa provoca risos e também reflexão – evitando o mero panfletarismo quase sempre – abordando assuntos caros às mulheres, como homens (claro), moda, consumo, sexo e amizade no tempo das redes sociais, entre outras atualidades.
Ao lado de suas melhores amigas, Gisbelle (descrita como “uma vaidosa girafa loura natural”) e Janete (“uma ursa com tendências sócio-ambientais”), a personagem desanca, sutil como... uma elefoa em uma loja de louças, a futilidade das revistas femininas, o machismo generalizado e a baixa autoestima das próprias mulheres.
Em cena antológica, a Elefoa surta e dá uma bronca brutal em uma atendente que tenta lhe vender um sutiã com enchimento: “Você e as consumidoras desse tipo de produto me constrangem profundamente”, dispara. Grande Chiquinha.
Rei Emir Saad - O Monstro de Zazanov / André Dahmer / LeYa - Barba Negra / 128 p. / R$ 34,90 / editorabarbanegra.com.br
Uma Patada com Carinho: As Histórias Pesadas da Elefoa Cor-de-Rosa / Chiquinha / LeYa - Barba Negra / 128 p. / R$ 34,90 / editorabarbanegra.com.br
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