Sammliz, foto Júlia Rodrigues |
Obra de afirmação, Mamba conjuga com habilidade a voz poderosa da cantora ao stoner rock contemporâneo, mais letras pessoais e até um namoro com características brasileiras, como referências às religiões de matriz africanas (Oyá, Lupita) e (mais sutilmente) ao som brega do Pará (Quando Chegar o Amanhã).
Um dos poucos discos realmente interessantes do rock brasileiro de 2016, Mamba também traz a artista mais livre para se expressar como mulher do que em sua antiga banda, abordando temas como o amor, a morte e a própria feminilidade como uma força.
“É claro o distanciamento do que fazia em meu antigo projeto, ainda que esteja inserida entre muitas camadas de guitarras e dramaticidade. Distanciamento para mim natural. O que eu fazia antes tinha a ver com minhas influências do metal dos anos 1970 e 80, em comum com meus antigos parceiros”, afirma Sammliz.
“O que acontece a partir de agora é que deixo vir à tona outras influências. Questão de liberdade e de deixar meu som ser o que sou e vou sendo. O que eu fazia antes não me resumia, o que faço agora também não. Na música, busco experimentar as sonoridades que me influenciam, gosto, pesquiso e me desafiam”, acrescenta a cantora.
Sombrio no clima e na sonoridade, a estética de Mamba chega dialogar com referências do rock pálido, como Nick Cave e PJ Harvey.
“Era como eu estava sonoramente no momento, refletindo e exorcizando algumas sombras interiores. Nick Cave está entre artistas que me influenciam, certamente, mas não bebi especificamente dessa ou aquela fonte. Não busquei nada. Deixei fluir. É um disco de fechamento de ciclo e abertura de novos trabalhos”, afirma Sammliz.
Curiosa, Sammliz não nega que tem lido as resenhas de Mamba. E tem ficado feliz com o que lê: "Sim, tenho lido algumas resenhas, até pra saber como o trabalho vem sendo recebido e olha, tem sido muito boas. Fico feliz, claro. Nos shows que fiz até então, tenho sido muito bem recebida com esse trabalho novo e quero muito conseguir levá-lo muito mais por aí. Tenho total consciência que estou partindo novamente do zero e tem por aí muita estrada e batalha nova pela frente".
Caldeirão sonoro maluco
Sammliz ao vivo em BH, foto Liliane Pelegrini |
“O Pará é uma vastidão cultural e Belém é uma metrópole onde essa vastidão está de uma forma ou outra conectada. Acho natural que perguntem logo pelo brega, carimbó e que isso seja tido como cara da cidade, até por que é. Mas em uma observação que nem precisa ser profunda, em uma visita à cidade, ou escutando playlists do povo daqui, você constata o quanto tem de cosmopolita na música que é feita em Belém, inclusive por músicos e artistas que se utilizam dos tais elementos tidos como estereotipados, dando uma linguagem mais pop e até experimental”, afirma.
“Veja bem, até eu com meu som faço isso de uma maneira sutil. Mas muita gente também não faz e mantém seus trabalhos em linguagens fora de qualquer coisa ligada ao lance regional. Acho ótimo também. Não acho que dificulte me enxergarem aqui por não fazer o que talvez muita gente espere encontrar de som vindo do Pará, nem quando tinha uma banda de metal sentia isso. Sinto-me contemplada e incluída nesse caldeirão sonoro maluco que temos na região. O Pará é brega, carimbó, guitarrada, rock, eletrônico, tambor, pop, encantarias de sons. A cena está de novo em uma daquelas fases ótimas, com muita gente boa produzindo, como: Lucas Estrela, Orquestra Pau e Cordista, Strobo, Molho Negro, Aíla, Felipe Cordeiro, Jaloo, D. Onete, Zimba Groove, Arthur Espíndola, Pelé do Manifesto. Muitas bandas de rock em atividade,muitas festas de tambores e carimbó, festivais etc”, acrescenta.
Ciente das dificuldades que assomam no horizonte para os artistas independentes, Sammliz agradece o apoio da Natura, mas sabe que isso é só o início de mais uma longa batalha.
"Artistas independentes vão continuar produzindo de qualquer forma. De qualquer maneira, sempre foi assim. plataformas sensacionais como a Natura Musical não abarcam a imensa produção musical, em várias frentes que ocorrem no Brasil. Não cabe nem o começo nesse funil. E aí, vai fazer o que? Esperar ser aprovado em uma Natura, Skol Music da vida? Não dá, nunca deu. Tem sim, que lutar por políticas públicas culturais, se inscrever também nos editais que houver e onde seu trabalho se enquadrar, e continuar no corre da sua própria carreira da melhor maneira que conseguir. Mercado independente é corre, luta e adaptação e vejo ele continuar mais assim ainda, em tempos sombrios para a cultura", analisa.
Ainda sem data para show em Salvador, Sammliz espera voltar em breve à cidade: “Ah, quero muito voltar, adoro essa cidade, tenho amigos e ótimas recordações. Vamos ver o que rola esse ano, vou trabalhar pra isso”, conclui.
Mamba / Sammliz / Natura musical - Doutromundo Discos / Baixe, ouça: www.sammliz.com.br
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