Blog (que, nos seus primórdios, entre 2004-05, foi de um programa de rádio) sobre rock e cultura pop. Hoje é o blog de Chico Castro Jr., jornalista formado pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia. Atualmente, é repórter do Caderno 2+ do jornal A Tarde, no qual algumas das matérias vistas aqui foram anteriormente publicadas. Assina a coluna Coletânea, dedicada à música independente baiana. Nossa base é Salvador, Bahia, a cidade do axé, a cidade do terror.
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terça-feira, março 30, 2010
NUNCA É TARDE PARA FALAR DE ALEX CHILTON E O BIG STAR
Alex Chilton, praticamente um desconhecido no Brasil – que dirá na Bahia –, era o líder da cult band americana Big Star e um dos heróis deste peão das palavras que vos escreve.
Ele morreu no último dia 17, em um hospital de Nova Orleans, onde vivia há alguns anos.
A banda que fez sua fama vinha de berço nobre: Memphis, um dos nascedouros do rock 'n' roll, terra de Elvis Presley.
O Big Star nunca alcançou o sucesso comercial enquanto existiu, entre 1971 e 1975. Lançou apenas três álbuns – todos clássicos: # 1 Record (1972), Radio City (1974) e Third / Sister Lovers.
Este último, depois dos fracassos de vendas dos dois anteriores, foi recusado pela gravadora, sendo lançado somente em 1994 – depois que todo o rock alternativo americano e inglês já havia se rendido à genialidade que poucos compreenderam nos anos 70. Em 2005, com novos membros, lançou In Space – que poucos ouviram.
Beatles + Who + Byrds
Uma piada sobre o Velvet Underground diz que pouquíssimas pessoas assistiram o grupo ao vivo enquanto ele existia, mas que quase todo mundo que foi a um show montou uma banda depois.
O mesmo nível de influência pode ser dito do Big Star.
Entre as bandas obviamente influenciadas pelo Estrelão pode-se citar: R.E.M., Teenage Fanclub (praticamente um Big Star 2), Lemonheads, The Replacements e todas as bandas do chamado power pop – movimento que sequer existiria sem o Big Star.
Na Bahia, podemos citar como influenciados (mesmo que de forma indireta): Cascadura, The Honkers, Pessoas Invisíveis, Berlinda e Brinde.
Uma pena que poucos na nova geração, pelo menos aparentemente, conheçam um trabalho tão encantador e fundamental como o desta banda, que conseguia fundir, de forma única, as melodias perfeitas dos Beatles, as guitarras faiscantes do The Who e as complexas harmonizações vocais dos Byrds.
No cenário do rock atual, devastado por uma tosquidão sem precedentes, a garotada teria muito a aprender ouvindo esta banda. E aí, galera, vamos comer Alex Chilton e o Big Star?
Ouça: www.myspace.com/bigstarband
quinta-feira, março 25, 2010
O DRAMA DA ESPIONAGEM
Inspirada em série da TV inglesa, Jogos de Poder traz abordagem adulta
Um dos subgêneros mais interessantes do gênero policial / aventura, o drama de espionagem é geralmente associado às charmosas estripulias de James Bond, e mais recentemente, à série Bourne, popularizada por uma série de filmes. O escritor americano Greg Rucka, porém, foi buscar referências mais obscuras para sua premiada série em quadrinhos, Jogos de Poder, lançada no Brasil pela Devir.
Ambientada na fictícia Divisão Especial do Ministério da Inteligência britânico, Jogos de Poder, lançada em março de 2001, foi premiada no ano seguinte com o Eisner Award de melhor nova série, com larga aclamação crítica.
Rucka, até então mais conhecido como autor de uma série de romances estrelados por um leão de chácara chamado Atticus Kodiak, foi buscar numa obscura série da TV inglesa do fim dos anos 70, chamado The Sandbaggers, a inspiração que precisava.
E aqui a expressão “drama de espionagem“ ganha mais significado do que nunca. Em The Sandbaggers – e por consequência, em Jogos de Poder – o que importa não é a missão em si, e sim, o efeito que estas causam nas vidas pessoais e profissionais dos agentes.
Excelente escritor de diálogos, Greg Rucka centra sua narrativa na agente Tara Chace. Quase sempre em conflito com seus superiores, Chace, logo no primeiro capítulo, não hesita em assassinar friamente um ex-general russo, agora envolvido com a máfia.
Consequências sombrias
O serviço, feito pelos britânicos como um favor aos americanos da CIA, gera uma série de retaliações e consequências sombrias para todos envolvidos.
No prefácio do Volume Um, o celebrado escritor inglês Warren Ellis (Planetary) observa que “Jogos de Poder é uma história de espionagem em um mundo complicado; um mundo real, onde cada bala tem consequência, e onde cada passo que você dá no seu trabalho voltará para te assombrar“.
No Brasil já foram publicados os dois primeiros encadernados, reunindo os sete primeiros capítulos da série americana. O primeiro, Operação: Terreno Partido, é a introdução ao mundo da série, com a agente Tara Chace sendo caçada em Londres pelo assassinato do mafioso russo, cometido no Kosovo.
Já o segundo, Operação: Estrela da Manhã, consegue ser ainda mais intrigante. Com três capítulos, ele mostrava os agentes da Divisão Especial às voltas com o assassinato de jornalistas estrangeiros em pleno Afeganistão dominado pelo Taleban.
Detalhe: apesar de o primeiro capítulo ter sido publicado em dezembro de 2001, ele havia sido todo escrito antes do 11 de setembro, garantiu Rucka.
O escritor, que teve uma outra obra adaptada para o cinema há pouco tempo, Terror na Antártida (Whiteout, 2009), talvez ainda veja Queen & Country (título original de Jogos de Poder) nas telas, já que há um roteiro pronto na Fox há algum tempo.
Outro excelente trabalho dele é a série Gotham City Contra o Crime, focado no dia a dia da Delegacia de Crimes Hediondos da cidade protegida pelo Batman, para a DC Comics.
Jogos de Poder Vol. 1 - OPERAÇÃO: TERRENO PARTIDO / Greg Rucka e Steve Rolston / 128 p. / R$ 19,50
JOGOS DE PODER VOL. 2 - OPERAÇÃO: ESTRELA DA MANHÃ / Greg Rucka e Brian Hurtt / 88 p. / R$ 19,95 / Devir Livraria - Oni Press
Um dos subgêneros mais interessantes do gênero policial / aventura, o drama de espionagem é geralmente associado às charmosas estripulias de James Bond, e mais recentemente, à série Bourne, popularizada por uma série de filmes. O escritor americano Greg Rucka, porém, foi buscar referências mais obscuras para sua premiada série em quadrinhos, Jogos de Poder, lançada no Brasil pela Devir.
Ambientada na fictícia Divisão Especial do Ministério da Inteligência britânico, Jogos de Poder, lançada em março de 2001, foi premiada no ano seguinte com o Eisner Award de melhor nova série, com larga aclamação crítica.
Rucka, até então mais conhecido como autor de uma série de romances estrelados por um leão de chácara chamado Atticus Kodiak, foi buscar numa obscura série da TV inglesa do fim dos anos 70, chamado The Sandbaggers, a inspiração que precisava.
E aqui a expressão “drama de espionagem“ ganha mais significado do que nunca. Em The Sandbaggers – e por consequência, em Jogos de Poder – o que importa não é a missão em si, e sim, o efeito que estas causam nas vidas pessoais e profissionais dos agentes.
Excelente escritor de diálogos, Greg Rucka centra sua narrativa na agente Tara Chace. Quase sempre em conflito com seus superiores, Chace, logo no primeiro capítulo, não hesita em assassinar friamente um ex-general russo, agora envolvido com a máfia.
Consequências sombrias
O serviço, feito pelos britânicos como um favor aos americanos da CIA, gera uma série de retaliações e consequências sombrias para todos envolvidos.
No prefácio do Volume Um, o celebrado escritor inglês Warren Ellis (Planetary) observa que “Jogos de Poder é uma história de espionagem em um mundo complicado; um mundo real, onde cada bala tem consequência, e onde cada passo que você dá no seu trabalho voltará para te assombrar“.
No Brasil já foram publicados os dois primeiros encadernados, reunindo os sete primeiros capítulos da série americana. O primeiro, Operação: Terreno Partido, é a introdução ao mundo da série, com a agente Tara Chace sendo caçada em Londres pelo assassinato do mafioso russo, cometido no Kosovo.
Já o segundo, Operação: Estrela da Manhã, consegue ser ainda mais intrigante. Com três capítulos, ele mostrava os agentes da Divisão Especial às voltas com o assassinato de jornalistas estrangeiros em pleno Afeganistão dominado pelo Taleban.
Detalhe: apesar de o primeiro capítulo ter sido publicado em dezembro de 2001, ele havia sido todo escrito antes do 11 de setembro, garantiu Rucka.
O escritor, que teve uma outra obra adaptada para o cinema há pouco tempo, Terror na Antártida (Whiteout, 2009), talvez ainda veja Queen & Country (título original de Jogos de Poder) nas telas, já que há um roteiro pronto na Fox há algum tempo.
Outro excelente trabalho dele é a série Gotham City Contra o Crime, focado no dia a dia da Delegacia de Crimes Hediondos da cidade protegida pelo Batman, para a DC Comics.
Jogos de Poder Vol. 1 - OPERAÇÃO: TERRENO PARTIDO / Greg Rucka e Steve Rolston / 128 p. / R$ 19,50
JOGOS DE PODER VOL. 2 - OPERAÇÃO: ESTRELA DA MANHÃ / Greg Rucka e Brian Hurtt / 88 p. / R$ 19,95 / Devir Livraria - Oni Press
terça-feira, março 23, 2010
FREDDIE MERCURY, MENSAGEIRO ENTRE DOIS MUNDOS
O pavão do rock tem biografia em português lançada no Brasil
O bigodão estilo bofe, os dentes protuberantes, o gestual melodramático, a voz poderosa e o domínio absoluto do palco perfazem as características imediatamente reconhecíveis de Freddie Mercury, morto em 1991, por complicações decorrentes da Aids. O líder do Queen, porém, era muito mais complexo do que se pode imaginar, segundo o biógrafo francês Selim Rauer, autor do livro Freddie Mercury, que chegou recentemente às livrarias.
Para Rauer, um filósofo formado pela Sorbonne, a principal característica de Mercury era ser um homem profundamente marcado por uma espécie de dualidade que se estendia por praticamente todos os aspectos de sua personalidade.
Nascido Farrokh Pluto Bulsara em 5 de setembro de 1946, Mercury veio ao mundo no longínquo arquipélago de Zanzibar, um antigo domínio britânico, localizado na costa da Tanzânia. A origem de sua família é bem intrincada. Seu pai, Bomi Bulsara, era um pársi (ou persa), o povo das Mil & Uma Noites que vivia no Irã, antes que este fosse invadido pelos islamitas.
Os pársis, cuja religião era o zoroastrismo (do profeta Zaratustra), refugiou-se na Índia. Foi lá que Bomi conheceu Jer, indiana com quem se casou e teve 2 filhos: Farrokh e Kashmira.
Após uma primeira infância feliz na paradísiaca Stone Town, principal província de Zanzibar, Farrokh, aos sete anos, foi abruptamente separado da família e enviado para um colégio interno britânico na distante Panchgani, na Índia.
O trauma de, ainda criança, se ver sozinho num país distante durante nada menos que oito anos marcou para sempre o jovem Farrokh. Aos 16, após anos se destacando como um aluno brilhante, foi expulso e enviado de volta para Zanzibar, depois que boatos de um caso dele com o filho do jardineiro se espalharam pela escola.
Poucos anos depois, Farrokh e a família imigraram para Londres, depois que revoltas em Zanzibar tornaram impossível a vida em família na ilha.
Foi lá, no ambiente permissivo e vibrante da Swingin‘ London, que a personalidade de Freddie Mercury floresceu. Formado em design, vestia-se de forma extravagante, fazendo sua irmã ter vergonha de andar com ele pelas ruas.
Ainda assim, era um rapaz atormentado pelos desejos contraditórios que o consumiam. Mercury não apenas nunca assumiu sua homossexualidade para os pais, como fazia questão de esconder os fatos de sua infância e adolescência, além de suas origens persas, do público e da imprensa.
Na verdade, Mercury só assumiu para si mesmo gostar de homens após um casamento fracassado (com Mary Austin, que foi sua principal herdeira) e quando o Queen já havia lançado seu quarto (e mais genial) álbum, A Night At The Opera (1975).
E apesar de ter tido muitos homens, Mercury também sentia necessidade de se relacionar com mulheres – possivelmente, devido à carência traumática de ter sido separado da mãe aos sete anos –, como atestam seus casos com Austin e a atriz alemã Barbara Valentin.
E aí pode-se traçar o drama da dualidade que consumia Mercury. Dividido entre o Oriente e o Ocidente, entre a homo e a heterossexualidade, o rock e a ópera, a exposição no palco e o recolhimento público (ele detestava dar entrevistas), o cantor, sob uma ótica afrobaiana, era, na verdade, um exú, um mensageiro entre dois mundos.
Seu próprio nome artístico, "Mercury", não foi por acaso. Na mitologia romana, Mercúrio era o mensageiro dos deuses, encarregado de levar as mensagens de Júpiter. Freddie tinha plena consciência do seu perfil – e isso o marcou para sempre.
LIVRO TEM RITMO E FLUÊNCIA
Nas primeiras páginas de Freddie Mercury, o filósofofo da Sorbonne Selim Rauer pode assustar um pouco o leitor desavisado com um texto poético-filosófico sobre a personalidade tortuosa e a trajetória fulgurante do seu biografado, dando a entender que o resto do livro poderia ser uma sonolenta masturbação acadêmica sobre a natureza trágico-barroca de Mercury e sua relação com o showbiz.
Felizmente, logo a porção "biógrafo" do francês se impõe e o texto ganha ritmo e fluência, facilitando a leitura de quem está mais interessado na história do astro em si do que em suas implicações filosóficas.
Há até mesmo trechos apimentados – e nem poderia ser diferente, dada a natureza libertina do biografado: "(Mercury) Fumava dois maços de cigarro por dia e, àquela época, apreciava em particular a vodca Stolichnaya e tônico de laranja, assim como cocaína. Sua sexualidade era bulímica. Ele gostava de ir para o quarto com um companheiro que o tivesse escolhido, mas que, afinal, não o queria. Não o verdadeiro ele. (Itálicos do autor). A pessoa reconhecia Freddie Mercury, a estrela do Queen. Onde sua celebridade aparecesse, deixava de haver lugar para Farrokh. Ele se contentava com o que podia obter: sexo".
Para os fãs do Queen, uma das bandas mais importantes da história do rock, vale a leitura para saber mais sobre a trajetória do grupo, seus outros integrantes e até mesmo sobre as estripulias de Mercury nas duas ocasiões em que a banda tocou no Brasil: em 1981 e 1985.
Na primeira (e última) turnê sul-americana, com o subcontinente dominado por ditaduras militares cruéis, coube ao empresário Jim Beach fazer circular malas de dinheiro para "tranquilizar" os generais de que não se tratava de um evento que pudesse ameaçar os regimes.
Já nos shows do Rock in Rio, Mercury mandou formar uma fila de rapazes nus no seu quarto no Copacabana Palace. Um a um, eles iam para cama com o astro. Depois de se saciar, mandou todos embora com um gesto de mão. A porta então se fechou, deixando-o solitário.
Freddie Mercury / de Selim Rauer / 319 p. / R$ 49.90 / Editora Planeta
O bigodão estilo bofe, os dentes protuberantes, o gestual melodramático, a voz poderosa e o domínio absoluto do palco perfazem as características imediatamente reconhecíveis de Freddie Mercury, morto em 1991, por complicações decorrentes da Aids. O líder do Queen, porém, era muito mais complexo do que se pode imaginar, segundo o biógrafo francês Selim Rauer, autor do livro Freddie Mercury, que chegou recentemente às livrarias.
Para Rauer, um filósofo formado pela Sorbonne, a principal característica de Mercury era ser um homem profundamente marcado por uma espécie de dualidade que se estendia por praticamente todos os aspectos de sua personalidade.
Nascido Farrokh Pluto Bulsara em 5 de setembro de 1946, Mercury veio ao mundo no longínquo arquipélago de Zanzibar, um antigo domínio britânico, localizado na costa da Tanzânia. A origem de sua família é bem intrincada. Seu pai, Bomi Bulsara, era um pársi (ou persa), o povo das Mil & Uma Noites que vivia no Irã, antes que este fosse invadido pelos islamitas.
Os pársis, cuja religião era o zoroastrismo (do profeta Zaratustra), refugiou-se na Índia. Foi lá que Bomi conheceu Jer, indiana com quem se casou e teve 2 filhos: Farrokh e Kashmira.
Após uma primeira infância feliz na paradísiaca Stone Town, principal província de Zanzibar, Farrokh, aos sete anos, foi abruptamente separado da família e enviado para um colégio interno britânico na distante Panchgani, na Índia.
O trauma de, ainda criança, se ver sozinho num país distante durante nada menos que oito anos marcou para sempre o jovem Farrokh. Aos 16, após anos se destacando como um aluno brilhante, foi expulso e enviado de volta para Zanzibar, depois que boatos de um caso dele com o filho do jardineiro se espalharam pela escola.
Poucos anos depois, Farrokh e a família imigraram para Londres, depois que revoltas em Zanzibar tornaram impossível a vida em família na ilha.
Foi lá, no ambiente permissivo e vibrante da Swingin‘ London, que a personalidade de Freddie Mercury floresceu. Formado em design, vestia-se de forma extravagante, fazendo sua irmã ter vergonha de andar com ele pelas ruas.
Ainda assim, era um rapaz atormentado pelos desejos contraditórios que o consumiam. Mercury não apenas nunca assumiu sua homossexualidade para os pais, como fazia questão de esconder os fatos de sua infância e adolescência, além de suas origens persas, do público e da imprensa.
Na verdade, Mercury só assumiu para si mesmo gostar de homens após um casamento fracassado (com Mary Austin, que foi sua principal herdeira) e quando o Queen já havia lançado seu quarto (e mais genial) álbum, A Night At The Opera (1975).
E apesar de ter tido muitos homens, Mercury também sentia necessidade de se relacionar com mulheres – possivelmente, devido à carência traumática de ter sido separado da mãe aos sete anos –, como atestam seus casos com Austin e a atriz alemã Barbara Valentin.
E aí pode-se traçar o drama da dualidade que consumia Mercury. Dividido entre o Oriente e o Ocidente, entre a homo e a heterossexualidade, o rock e a ópera, a exposição no palco e o recolhimento público (ele detestava dar entrevistas), o cantor, sob uma ótica afrobaiana, era, na verdade, um exú, um mensageiro entre dois mundos.
Seu próprio nome artístico, "Mercury", não foi por acaso. Na mitologia romana, Mercúrio era o mensageiro dos deuses, encarregado de levar as mensagens de Júpiter. Freddie tinha plena consciência do seu perfil – e isso o marcou para sempre.
LIVRO TEM RITMO E FLUÊNCIA
Nas primeiras páginas de Freddie Mercury, o filósofofo da Sorbonne Selim Rauer pode assustar um pouco o leitor desavisado com um texto poético-filosófico sobre a personalidade tortuosa e a trajetória fulgurante do seu biografado, dando a entender que o resto do livro poderia ser uma sonolenta masturbação acadêmica sobre a natureza trágico-barroca de Mercury e sua relação com o showbiz.
Felizmente, logo a porção "biógrafo" do francês se impõe e o texto ganha ritmo e fluência, facilitando a leitura de quem está mais interessado na história do astro em si do que em suas implicações filosóficas.
Há até mesmo trechos apimentados – e nem poderia ser diferente, dada a natureza libertina do biografado: "(Mercury) Fumava dois maços de cigarro por dia e, àquela época, apreciava em particular a vodca Stolichnaya e tônico de laranja, assim como cocaína. Sua sexualidade era bulímica. Ele gostava de ir para o quarto com um companheiro que o tivesse escolhido, mas que, afinal, não o queria. Não o verdadeiro ele. (Itálicos do autor). A pessoa reconhecia Freddie Mercury, a estrela do Queen. Onde sua celebridade aparecesse, deixava de haver lugar para Farrokh. Ele se contentava com o que podia obter: sexo".
Para os fãs do Queen, uma das bandas mais importantes da história do rock, vale a leitura para saber mais sobre a trajetória do grupo, seus outros integrantes e até mesmo sobre as estripulias de Mercury nas duas ocasiões em que a banda tocou no Brasil: em 1981 e 1985.
Na primeira (e última) turnê sul-americana, com o subcontinente dominado por ditaduras militares cruéis, coube ao empresário Jim Beach fazer circular malas de dinheiro para "tranquilizar" os generais de que não se tratava de um evento que pudesse ameaçar os regimes.
Já nos shows do Rock in Rio, Mercury mandou formar uma fila de rapazes nus no seu quarto no Copacabana Palace. Um a um, eles iam para cama com o astro. Depois de se saciar, mandou todos embora com um gesto de mão. A porta então se fechou, deixando-o solitário.
Freddie Mercury / de Selim Rauer / 319 p. / R$ 49.90 / Editora Planeta
quarta-feira, março 17, 2010
AULA DE CATECISMO: ESPECIAL DAS SEIS COM NEIL YOUNG
Ajoelhai-vos, hereges! Nesta sexta-feira, 19 de março do ano da graça de 2010, nao deixareis de ouvir o Especial das Seis da Educadora FM, com uma edição de caráter sacro, inteiramente dedicada à Vossa Santidade Neil Young de Albuquerque Lins e Silva. Sim, serão cerca de quarenta minutos de puro deleite celestial nas ondas do éter radiofônico ao som de cânticos sagrados como Cinnamon Girl, Don't Cry No Tears, Walk On, Powderfinger e Hey Baby, entre outras que o redator esqueceu e por isso mesmo amargará dois dias inteiros ajoelhado sobre tampinhas de refrigerante - com a parte interna virada para cima, claro. O único porém é que o programa terá apresentação daquele detestável vigário de segunda categoria, aquele tal de Dom Franchico Evaristo de Alcântara. Mas não vos deixeis desanimar: ainda que sua voz absolutamente desagradável e sua pregação desconexa conspurquem vossas vias auditivas por poucos segundos, o estrago não se compara ao efeito elevatório que as canções de Neil Young são capazes de proporcionar às vossas (e nossas) pobres almas. Palavras de salvação.
ESPECIAL DAS SEIS: NEIL YOUNG
NESTA SEXTA-FEIRA, 19 DE MARÇO, 18 HORAS NA EDUCADORA FM 107,5 OU PELO SITE http://www.educadora.ba.gov.br/
ESPECIAL DAS SEIS: NEIL YOUNG
NESTA SEXTA-FEIRA, 19 DE MARÇO, 18 HORAS NA EDUCADORA FM 107,5 OU PELO SITE http://www.educadora.ba.gov.br/
CASCADURA: POR UM DIÁLOGO COM A CIDADE
No dia 4 de março último, a banda Cascadura, por meio de um comunicado publicado em seu site, oficializou a saída de dois membros: Cândido Soto Jr. (guitarra solo) e Tiago Aziz (baixo). A notícia, que já corria em off pelo meio roqueiro local dias antes, surpreendeu os fãs.
Passado esse primeiro momento, o band leader e fundador Fábio Cascadura justifica a decisão: “Depois de três anos e meio de trabalho em torno do CD Bogary (2006), nós meio que fechamos um ciclo“, diz.
“Foi um processo muito natural, pois aquela formação estava intimamente atrelada à divulgação do Bogary. Assumimos isso (o afastamento de Cândido e Tiago) por que precisávamos passar para uma nova etapa. Produzimos, além do próprio disco, uma outra obra em cima dele (o DVD Efeito Bogary, 2009)“, lembra.
O que Fábio (e Thiago Trad, bateria) mais querem agora é olhar para frente: ”Bogary passa para a história e nós nos voltamos para um outro momento artístico. Mas não temos nenhuma ilusão comercial. Sabemos o lugar que ocupamos e acho que podemos até ter mais espaço. Mas nossa maior preocupação no momento é dar prosseguimento a obra e a história da banda”, garante.
Diálogo com a cidade
A mesma equipe que produziu e gravou o CD anterior, formada por Fábio, Thiago, andré t. e Jô Estrada, deverá iniciar as gravações do próximo álbum em breve. O processo será documentado e partilhado com os fãs através de um blog no próprio site do grupo (www.bandacascadura.com), a exemplo do que Caetano Veloso e Pitty fizeram nos últimos discos.
”Ainda não há uma data exata, ‘vai começar a gravar dia tal‘, mas estamos correndo atrás. O lance do blog é uma forma de manter o canal aberto, além de ser uma ‘tendência‘ (aspas de Fábio) de comunicação. Nunca fizemos isso, nunca abrimos (esse processo). Íamos para o estúdio meio escondido, até por que não havia tanto interesse pelo que o Casca andava fazendo, quanto há hoje”, observa.
Sobre o que se pode esperar do próximo CD, o próprio Fábio ainda parece meio incerto, mas tem ao menos uma certeza: ”Estamos em busca de um diálogo com a cidade. Não vamos evocar a Bahia de Caymmi, Raul ou Camisa de Vênus. Queremos falar da Bahia da Vivendo do Ócio, de Messias, da chacina do Pero Vaz, do Samhop. Queremos dialogar com suas referências culturais, com uma Salvador ampla e completa, queremos dialogar com público do subúrbio ferroviário, até a orla, com a classes média e alta. Queremos nos posicionar dentro dessa cidade.Como isso vai se traduzir em música, ainda não sabemos. Agora estamos no momento de resgatar lembranças, questionamentos. Também não temos nenhuma intenção de repetir o que já foi feito – seja pelo Casca ou por qualquer outro artista”.
Fábio lamenta a pouca atenção que uma banda como a Vivendo do Ócio recebe em sua própria cidade: "A Vivendo do Ócio é uma banda que diz muito da Bahia. Fico chateado com as pessoas que ainda não se atentaram para isso, o quanto eles tem de baiano. Mas ninguém fala. Se fosse esquema de empresário do axé, ia tá bombando, mas os caras sairam daqui sozinhos, e tão levando essa Salvador atual para todo o Brasil", elogia.
Outro ponto importante levantado por Fábio é o intercâmbio de influências – e provocações – entre os artistas, prática pouco comum no rock local: "A gente se sente provocado por todos esses artistas (que ele citou) e queremos contribuir, provocando-os também – e manter o ciclo de conversação", diz.
E encerra surpreendendo: ”Queremos fazer na música o que Izolag e Ananda Nahu fazem no grafite urbano. São os melhores gafiteiros que eu já vi. Eles tem uma abordagem temática muito característica. Visualmente, eles conseguem traduzir essa proposta já acabada que o Casca busca, de alcançar a uma linguagem universal no seu espaço, na sua realidade – e também como dialogar com sua gente”, conclui.
Conheça o trabalho de Izolag e Ananda Nahu: http://www.flickr.com/photos/izolag/
Passado esse primeiro momento, o band leader e fundador Fábio Cascadura justifica a decisão: “Depois de três anos e meio de trabalho em torno do CD Bogary (2006), nós meio que fechamos um ciclo“, diz.
“Foi um processo muito natural, pois aquela formação estava intimamente atrelada à divulgação do Bogary. Assumimos isso (o afastamento de Cândido e Tiago) por que precisávamos passar para uma nova etapa. Produzimos, além do próprio disco, uma outra obra em cima dele (o DVD Efeito Bogary, 2009)“, lembra.
O que Fábio (e Thiago Trad, bateria) mais querem agora é olhar para frente: ”Bogary passa para a história e nós nos voltamos para um outro momento artístico. Mas não temos nenhuma ilusão comercial. Sabemos o lugar que ocupamos e acho que podemos até ter mais espaço. Mas nossa maior preocupação no momento é dar prosseguimento a obra e a história da banda”, garante.
Diálogo com a cidade
A mesma equipe que produziu e gravou o CD anterior, formada por Fábio, Thiago, andré t. e Jô Estrada, deverá iniciar as gravações do próximo álbum em breve. O processo será documentado e partilhado com os fãs através de um blog no próprio site do grupo (www.bandacascadura.com), a exemplo do que Caetano Veloso e Pitty fizeram nos últimos discos.
”Ainda não há uma data exata, ‘vai começar a gravar dia tal‘, mas estamos correndo atrás. O lance do blog é uma forma de manter o canal aberto, além de ser uma ‘tendência‘ (aspas de Fábio) de comunicação. Nunca fizemos isso, nunca abrimos (esse processo). Íamos para o estúdio meio escondido, até por que não havia tanto interesse pelo que o Casca andava fazendo, quanto há hoje”, observa.
Sobre o que se pode esperar do próximo CD, o próprio Fábio ainda parece meio incerto, mas tem ao menos uma certeza: ”Estamos em busca de um diálogo com a cidade. Não vamos evocar a Bahia de Caymmi, Raul ou Camisa de Vênus. Queremos falar da Bahia da Vivendo do Ócio, de Messias, da chacina do Pero Vaz, do Samhop. Queremos dialogar com suas referências culturais, com uma Salvador ampla e completa, queremos dialogar com público do subúrbio ferroviário, até a orla, com a classes média e alta. Queremos nos posicionar dentro dessa cidade.Como isso vai se traduzir em música, ainda não sabemos. Agora estamos no momento de resgatar lembranças, questionamentos. Também não temos nenhuma intenção de repetir o que já foi feito – seja pelo Casca ou por qualquer outro artista”.
Fábio lamenta a pouca atenção que uma banda como a Vivendo do Ócio recebe em sua própria cidade: "A Vivendo do Ócio é uma banda que diz muito da Bahia. Fico chateado com as pessoas que ainda não se atentaram para isso, o quanto eles tem de baiano. Mas ninguém fala. Se fosse esquema de empresário do axé, ia tá bombando, mas os caras sairam daqui sozinhos, e tão levando essa Salvador atual para todo o Brasil", elogia.
Outro ponto importante levantado por Fábio é o intercâmbio de influências – e provocações – entre os artistas, prática pouco comum no rock local: "A gente se sente provocado por todos esses artistas (que ele citou) e queremos contribuir, provocando-os também – e manter o ciclo de conversação", diz.
E encerra surpreendendo: ”Queremos fazer na música o que Izolag e Ananda Nahu fazem no grafite urbano. São os melhores gafiteiros que eu já vi. Eles tem uma abordagem temática muito característica. Visualmente, eles conseguem traduzir essa proposta já acabada que o Casca busca, de alcançar a uma linguagem universal no seu espaço, na sua realidade – e também como dialogar com sua gente”, conclui.
Conheça o trabalho de Izolag e Ananda Nahu: http://www.flickr.com/photos/izolag/
terça-feira, março 16, 2010
TRÊS VEZES MESSIAS
A expressão serena no rosto de Messias Guimarães Bandeira não reflete sua (já longa e suada) trajetória como músico na banda brincando de deus, agitador cultural e pesquisador acadêmico na área da Comunicação. Conhecido pela ousadia e pioneirismo que imprime em suas ações, ele agora parte para mais um desafio que poucos teriam coragem de encarar: o lançamento de um CD triplo.
Intitulado escrever-me, envelhecer-me, esquecer-me (um título para cada disco), o álbum, que conta com um verdadeiro who‘s who de músicos baianos convidados, foi produzido por andré t., que também assinou a produção do último CD da brincando de deus, lançado dez anos atrás.
Sua banda original, que retornou à atividade em dezembro último, após quatro anos parada, é considerada uma das mais importantes do gênero indie rock / guitar band. Ao lado de grupos como Pelvs (RJ), Low Dream (DF) e Pin Ups (SP), a brincando de deus formou a linha de frente da primeira geração do indie rock brasileiro.
Em paralelo, Messias se notabilizou ainda como um agitador “cyber cultural“, por assim dizer. Graças às suas pesquisas realizadas no âmbito da internet – via Faculdade de Comunicação da Ufba – quando a rede mundial de computadores ainda era apenas um sonho molhado na cabeça dos nerds, “a brincando de deus“ – salvo engano do próprio Messias – “foi a a primeira banda brasileira a ter um site, ainda em 1993“, garante.
A brincando de deus lançou seu primeiro CD em 1995, de forma totalmente independente. Naquela época pré-mp3, pré-desmantelamento da indústria fonográfica, as bandas de rock ainda sonhavam em assinar contrato com gravadora.
A decisão de Messias em ignorar este caminho se mostraria mais do que acertada: seria profética.
Naquela época em que a brincando de deus gravou seu primeiro álbum, tinha gente importante interessada em lançar a banda no mercado: “O Rock It!, que era o selo de Dado Vila-Lobos (Legião Urbana) e André X (Plebe Rude) queria lançar o disco, mas tivemos problemas de agenda. A deles não casava com a nossa. Como eu achava que o nosso disco não podia esperar, criei um selo independente, o Self Records, e lancei o disco eu mesmo“, lembra Messias.
Algum tempo depois, em 1996, organizou, na Concha Acústica do TCA, o primeiro Festival Boom Bahia, um verdadeiro mostruário do que havia de mais significativo na cena roqueira local, reunindo bandas importantes, como Doutor Cascadura, The Dead Billies, Penélope e Dois Sapos e Meio.
O festival teria mais uma edição (ampliada com artistas de fora do estado) em 97, antes de parar e só retornar dez anos depois.
Na última edição, em 2008, a Praça Pedro Archanjo (Pelourinho), lotada, chacoalhou ao som da banda americana Mudhoney, numa rara oportunidade para os roqueiros baianos terem acesso a uma atração estrangeira de qualidade reconhecida. Detalhe: a entrada para o show era um livro usado. Veio gente do interior do estado e até de Aracaju para conferir.
“Essa obsessão por independência continua comigo até hoje“, nota. E pelo visto, não larga dele tão cedo.
Seu CD triplo, que já tem shows de lançamento agendados em São Paulo e Belo Horizonte, foi 100% bancado do próprio bolso. “Em Salvador, ainda falta confirmar a data, mas deve ser no final de abril“, avisa.
“Este CD foi gravado por conta própria. Não foi por edital, lei de incentivo e muito menos por gravadora. Até por que, ainda mais hoje em dia, em que gravadora eu teria autonomia para gravar e lançar um CD triplo?“, pergunta, com toda razão.
Com 32 músicas, escrever-me, envelhecer-me, esquecer-me é um trabalho de fôlego, que exigiu muito do seu autor e do seu produtor. Como se pode imaginar, a gravação de um projeto dessa envergadura não foi um processo simples.
“Não que tenha sido doloroso, mas (gravar um disco assim) é um investimento pessoal que exige um certo rigor com você mesmo“, conta Messias.
Trata-se de um projeto sofisticado, que reflete tanto o imaginário musical de Messias – passeando pelo indie e lo-fi, com direito a programações eletrônicas e muitos instrumentos de cordas –, bem como suas inquietações filosóficas, como o passar do tempo, algo explicitado no próprio título do trabalho, e sua difícil relação com o lugar aonde vive: Salvador.
Um exemplo disso é Avenida Contorno, faixa 7 do disco 1, na qual destila sua angústia diante do belo cenário da Baía de Todos os Santos: ”A Avenida atravessa a madrugada, a baía é um espelho atrás de mim / toda noite aquela curva me espera e segue reto que se cansa de estar só”, canta, numa das poucas faixas em português do álbum (assim como nos discos da brincando de deus, maior parte de suas canções é em inglês).
”Olha, eu subo e desço aquela avenida todos os dias há muitos anos, então ela para mim meio que sintetiza a cidade, além de ligar a Cidade Baixa e a Cidade Alta. Ela simboliza Salvador muito mais do que a Avenida Paralela, por exemplo. E também é a minha passagem de todos os dias”, explica.
Além das gravações convencionais no Estúdio T, Messias realizou diversos registros no silêncio da madrugada, em sua própria casa, como atestam as anotações feitas a caneta no encarte do álbum. Isto concedeu um caráter bem intimista em faixas como Curva Loxodrômica, Escrever-me e Envelhecer-me.
”Outras faixas eu criei a partir de ideias gravadas no celular. Depois eu pegava e levava para andré t processar no estúdio, adicionando percussão etc”, conta.
Outro fator importante no disco é a quantidade – e a qualidade – dos músicos convidados para participar do álbum.
Além de Cézar Vieira (guitarra), Tiago Aziz (baixo) e Ricardo Cury (bateria), seus companheiros da brincando de deus, o álbum apresenta músicos do calibre de Guimo Migoya (bateria), Junix 11 e Gabriel Pettenatti (guitarras), Alex Pochat (trumpete, sitar, baixo), Joatan Nascimento (trumpete), Fernanda Monteiro e Kayami Freitas (violoncelo), Jorge Solovera (arranjos de cordas), Mário Soares e Davi Guima (violinos), Saulo Gama (acordeon) e Alexandre Montenegro (baixo acústico).
Sem contar o próprio andré t., que pilotou teclados, programações, percussões e instrumentos de cordas diversos ao longo do trabalho de produção.
”Messias passou uma vida inteira fazendo música e gravando basicamente com as mesmas pessoas (a brincando de deus). Então, acredito que foi um belo processo de aprendizado a produção deste trabalho – para todos nós”, observa andré.
Não há como negar que foi um processo rigoroso. E se tem uma coisa que Messias entende é de rigorosidade.
Nascido em um ambiente humilde, Messias (ao lado, em foto de Sora Maia) deve à sua mãe a educação privilegiada a que teve acesso – algo que foi decisivo em sua vida.
“Nasci no bairro do Pero Vaz (próximo à Liberdade), de uma família pobre. Minha educação foi muito centralizada na figura da minha mãe, que era professora. Graças a ela, estudei no (Colégio) Anísio Teixeira e, depois, no Colégio Militar da Pituba, onde fiquei sete anos. Tudo isso estabeleceu um certo rigor nas coisas que eu faço“, concluiu.
OUÇA MESSIAS:
www.reverbnation.com/messias
www.messias.art.br
Intitulado escrever-me, envelhecer-me, esquecer-me (um título para cada disco), o álbum, que conta com um verdadeiro who‘s who de músicos baianos convidados, foi produzido por andré t., que também assinou a produção do último CD da brincando de deus, lançado dez anos atrás.
Sua banda original, que retornou à atividade em dezembro último, após quatro anos parada, é considerada uma das mais importantes do gênero indie rock / guitar band. Ao lado de grupos como Pelvs (RJ), Low Dream (DF) e Pin Ups (SP), a brincando de deus formou a linha de frente da primeira geração do indie rock brasileiro.
Em paralelo, Messias se notabilizou ainda como um agitador “cyber cultural“, por assim dizer. Graças às suas pesquisas realizadas no âmbito da internet – via Faculdade de Comunicação da Ufba – quando a rede mundial de computadores ainda era apenas um sonho molhado na cabeça dos nerds, “a brincando de deus“ – salvo engano do próprio Messias – “foi a a primeira banda brasileira a ter um site, ainda em 1993“, garante.
A brincando de deus lançou seu primeiro CD em 1995, de forma totalmente independente. Naquela época pré-mp3, pré-desmantelamento da indústria fonográfica, as bandas de rock ainda sonhavam em assinar contrato com gravadora.
A decisão de Messias em ignorar este caminho se mostraria mais do que acertada: seria profética.
Naquela época em que a brincando de deus gravou seu primeiro álbum, tinha gente importante interessada em lançar a banda no mercado: “O Rock It!, que era o selo de Dado Vila-Lobos (Legião Urbana) e André X (Plebe Rude) queria lançar o disco, mas tivemos problemas de agenda. A deles não casava com a nossa. Como eu achava que o nosso disco não podia esperar, criei um selo independente, o Self Records, e lancei o disco eu mesmo“, lembra Messias.
Algum tempo depois, em 1996, organizou, na Concha Acústica do TCA, o primeiro Festival Boom Bahia, um verdadeiro mostruário do que havia de mais significativo na cena roqueira local, reunindo bandas importantes, como Doutor Cascadura, The Dead Billies, Penélope e Dois Sapos e Meio.
O festival teria mais uma edição (ampliada com artistas de fora do estado) em 97, antes de parar e só retornar dez anos depois.
Na última edição, em 2008, a Praça Pedro Archanjo (Pelourinho), lotada, chacoalhou ao som da banda americana Mudhoney, numa rara oportunidade para os roqueiros baianos terem acesso a uma atração estrangeira de qualidade reconhecida. Detalhe: a entrada para o show era um livro usado. Veio gente do interior do estado e até de Aracaju para conferir.
“Essa obsessão por independência continua comigo até hoje“, nota. E pelo visto, não larga dele tão cedo.
Seu CD triplo, que já tem shows de lançamento agendados em São Paulo e Belo Horizonte, foi 100% bancado do próprio bolso. “Em Salvador, ainda falta confirmar a data, mas deve ser no final de abril“, avisa.
“Este CD foi gravado por conta própria. Não foi por edital, lei de incentivo e muito menos por gravadora. Até por que, ainda mais hoje em dia, em que gravadora eu teria autonomia para gravar e lançar um CD triplo?“, pergunta, com toda razão.
Com 32 músicas, escrever-me, envelhecer-me, esquecer-me é um trabalho de fôlego, que exigiu muito do seu autor e do seu produtor. Como se pode imaginar, a gravação de um projeto dessa envergadura não foi um processo simples.
“Não que tenha sido doloroso, mas (gravar um disco assim) é um investimento pessoal que exige um certo rigor com você mesmo“, conta Messias.
Trata-se de um projeto sofisticado, que reflete tanto o imaginário musical de Messias – passeando pelo indie e lo-fi, com direito a programações eletrônicas e muitos instrumentos de cordas –, bem como suas inquietações filosóficas, como o passar do tempo, algo explicitado no próprio título do trabalho, e sua difícil relação com o lugar aonde vive: Salvador.
Um exemplo disso é Avenida Contorno, faixa 7 do disco 1, na qual destila sua angústia diante do belo cenário da Baía de Todos os Santos: ”A Avenida atravessa a madrugada, a baía é um espelho atrás de mim / toda noite aquela curva me espera e segue reto que se cansa de estar só”, canta, numa das poucas faixas em português do álbum (assim como nos discos da brincando de deus, maior parte de suas canções é em inglês).
”Olha, eu subo e desço aquela avenida todos os dias há muitos anos, então ela para mim meio que sintetiza a cidade, além de ligar a Cidade Baixa e a Cidade Alta. Ela simboliza Salvador muito mais do que a Avenida Paralela, por exemplo. E também é a minha passagem de todos os dias”, explica.
Além das gravações convencionais no Estúdio T, Messias realizou diversos registros no silêncio da madrugada, em sua própria casa, como atestam as anotações feitas a caneta no encarte do álbum. Isto concedeu um caráter bem intimista em faixas como Curva Loxodrômica, Escrever-me e Envelhecer-me.
”Outras faixas eu criei a partir de ideias gravadas no celular. Depois eu pegava e levava para andré t processar no estúdio, adicionando percussão etc”, conta.
Outro fator importante no disco é a quantidade – e a qualidade – dos músicos convidados para participar do álbum.
Além de Cézar Vieira (guitarra), Tiago Aziz (baixo) e Ricardo Cury (bateria), seus companheiros da brincando de deus, o álbum apresenta músicos do calibre de Guimo Migoya (bateria), Junix 11 e Gabriel Pettenatti (guitarras), Alex Pochat (trumpete, sitar, baixo), Joatan Nascimento (trumpete), Fernanda Monteiro e Kayami Freitas (violoncelo), Jorge Solovera (arranjos de cordas), Mário Soares e Davi Guima (violinos), Saulo Gama (acordeon) e Alexandre Montenegro (baixo acústico).
Sem contar o próprio andré t., que pilotou teclados, programações, percussões e instrumentos de cordas diversos ao longo do trabalho de produção.
”Messias passou uma vida inteira fazendo música e gravando basicamente com as mesmas pessoas (a brincando de deus). Então, acredito que foi um belo processo de aprendizado a produção deste trabalho – para todos nós”, observa andré.
Não há como negar que foi um processo rigoroso. E se tem uma coisa que Messias entende é de rigorosidade.
Nascido em um ambiente humilde, Messias (ao lado, em foto de Sora Maia) deve à sua mãe a educação privilegiada a que teve acesso – algo que foi decisivo em sua vida.
“Nasci no bairro do Pero Vaz (próximo à Liberdade), de uma família pobre. Minha educação foi muito centralizada na figura da minha mãe, que era professora. Graças a ela, estudei no (Colégio) Anísio Teixeira e, depois, no Colégio Militar da Pituba, onde fiquei sete anos. Tudo isso estabeleceu um certo rigor nas coisas que eu faço“, concluiu.
OUÇA MESSIAS:
www.reverbnation.com/messias
www.messias.art.br
quarta-feira, março 10, 2010
CONFIRMADO: BAHIA DE TODOS OS ROCKS 2010
Realizado pela primeira – e única – vez em 2008, o Prêmio Bahia de Todos os Rocks volta a acontecer em 2010, confirmou seu idealizador, o jornalista Emmanuel Mirdad.
O projeto, coordenado por Marcus Ferreira, é viabilizado graças ao patrocínio da Oi Futuro, via Fazcultura.
As inscrições para o Prêmio se iniciarão em agosto, com a cerimônia marcada para novembro.
Estão previstas duas novas categorias: Artes Visuais (capas de CD, sites) e Melhor Veículo, para os meios de comunicação que cobrem o rock local.
A ideia é que o Prêmio seja mesmo bianual. Até por que, como se sabe, ainda não há uma produção suficiente para fazer jus a uma regularidade anual.
O projeto, coordenado por Marcus Ferreira, é viabilizado graças ao patrocínio da Oi Futuro, via Fazcultura.
As inscrições para o Prêmio se iniciarão em agosto, com a cerimônia marcada para novembro.
Estão previstas duas novas categorias: Artes Visuais (capas de CD, sites) e Melhor Veículo, para os meios de comunicação que cobrem o rock local.
A ideia é que o Prêmio seja mesmo bianual. Até por que, como se sabe, ainda não há uma produção suficiente para fazer jus a uma regularidade anual.
terça-feira, março 09, 2010
ENTRE O MERCHANDISING, O ESTÚDIO E OS PALCOS
Vendo 147 investe em produtos com a marca da banda, enquanto se prepara para entrar em estúdio e para tocar no Abril Pro Rock 2010
No ano passado eles surgiram com um trunfo difícil de se conseguir hoje em dia: novidade. No caso, as clone drums: dois bateristas partilhando o mesmo bumbo e criando levadas diversas para uma música instrumental pesada, com influências de Queens of The Stone Age, Stooges e Led Zeppelin. Lançaram um EP de quatro faixas , que, se não trazia lá grandes composições, também não fazia feio.
Passado esse período, a Vendo 147 (em foto de Bruno Sarraf) entra em nova fase agora em 2010. A banda está, sem pressa, atuando em três frentes para trabalhar ao longo do ano.
A primeira é que, logo na primeira semana de abril, Dimmy, Glauco (baterias), Pedro, Duardo (guitarras) e Caio (baixo) entram em estúdio para começar a gravar seu primeiro álbum, sob a batuta experiente do produtor andré t.
No momento, a banda se reúne todo fim de semana na casa de Dimmy para trabalhar as composições coletivamente – o que não foi feito na época do EP – aparando arestas e cortando excessos. O processo é acompanhado por andré, que dá sugestões aqui e ali pros caras.
"Logo quando começamos, nego começou a falar, 'ah, é a aposta para 2010' e tal. Aí a gente pensou, se a gente não gravar um disco agora que corresponda as expectativas, vamos virar piada, né? Então estamos trabalhando bem as composições, por qure música instrumental é muito diferente, tem uma dinâmica totalmente diversa a começar por não ter refrão, digamos assim", reflete Dimmy, mais pé no chão impossível.
Merchandising e festivais
Em paralelo, o grupo criou uma linha de produtos com a marca da Vendo 147, como palhetas de guitarra, baquetas (claro), chaveiros e camisetas, para ajudar a levantar uma grana. “Banda independente não vive de venda de disco, então você tem utilizar o material de divulgação como produto pra isso também“, conta Dimmy.
Ainda em abril, o grupo embarca para Recife, onde se apresenta, no dia 17, no festival Abril Pro Rock – uma grande oportunidade, já que o APR é uma das principais vitrines para bandas de todo o Brasil. “Vamos mostrar um pouco do que será o disco. E vamos chegar já com nossa banquinha de produtos“, avisa o batera.
Antes disso, a V147 toca dia 26, na Boomerangue, com os potiguares da Camarones Orquestra Guitarrística e os locais TenTrio, em noite puramente instrumental. O ano promete.
Vendo 147 na Noite Fora do Eixo - Rock Instrumental / Com Camarones Orquestra Guitarrística (RN) e Tentrio / 26 de março / Boomerangue / R$ 5 e R$ 10
Ouça: myspace.com/vendo147
NUETAS
Flamenco de graça
A dupla espanhola Pedro Sierra (violão) e La Tobala (canto) fazem o concerto Guitarrísimo no Teatro Moliere da Aliança Francesa (Ladeira da Barra), nesta quinta-feira (dia 11), às 20 horas. O evento, oferecido pelo Instituto Cervantes - Centro de Cultura Espanhola, traz essas duas feras da música flamenca para se apresentar de graça em Salvador. Vamos prestigiar?
Punks gringos em Vitória da Conquista
A banda americana de hardcore War Cry se apresenta nesta quarta-feira (dia 10) no Teatro Carlos Jeovah (Praça da Bandeira, s/n), na aprazível Vitória da Conquista, com a veterana banda local Cama de Jornal fazendo as honras da casa. A festa punk começa às 19h30, com ingressos por R$ 5. Salvador, pelo visto, ficou de fora da turnê...
No ano passado eles surgiram com um trunfo difícil de se conseguir hoje em dia: novidade. No caso, as clone drums: dois bateristas partilhando o mesmo bumbo e criando levadas diversas para uma música instrumental pesada, com influências de Queens of The Stone Age, Stooges e Led Zeppelin. Lançaram um EP de quatro faixas , que, se não trazia lá grandes composições, também não fazia feio.
Passado esse período, a Vendo 147 (em foto de Bruno Sarraf) entra em nova fase agora em 2010. A banda está, sem pressa, atuando em três frentes para trabalhar ao longo do ano.
A primeira é que, logo na primeira semana de abril, Dimmy, Glauco (baterias), Pedro, Duardo (guitarras) e Caio (baixo) entram em estúdio para começar a gravar seu primeiro álbum, sob a batuta experiente do produtor andré t.
No momento, a banda se reúne todo fim de semana na casa de Dimmy para trabalhar as composições coletivamente – o que não foi feito na época do EP – aparando arestas e cortando excessos. O processo é acompanhado por andré, que dá sugestões aqui e ali pros caras.
"Logo quando começamos, nego começou a falar, 'ah, é a aposta para 2010' e tal. Aí a gente pensou, se a gente não gravar um disco agora que corresponda as expectativas, vamos virar piada, né? Então estamos trabalhando bem as composições, por qure música instrumental é muito diferente, tem uma dinâmica totalmente diversa a começar por não ter refrão, digamos assim", reflete Dimmy, mais pé no chão impossível.
Merchandising e festivais
Em paralelo, o grupo criou uma linha de produtos com a marca da Vendo 147, como palhetas de guitarra, baquetas (claro), chaveiros e camisetas, para ajudar a levantar uma grana. “Banda independente não vive de venda de disco, então você tem utilizar o material de divulgação como produto pra isso também“, conta Dimmy.
Ainda em abril, o grupo embarca para Recife, onde se apresenta, no dia 17, no festival Abril Pro Rock – uma grande oportunidade, já que o APR é uma das principais vitrines para bandas de todo o Brasil. “Vamos mostrar um pouco do que será o disco. E vamos chegar já com nossa banquinha de produtos“, avisa o batera.
Antes disso, a V147 toca dia 26, na Boomerangue, com os potiguares da Camarones Orquestra Guitarrística e os locais TenTrio, em noite puramente instrumental. O ano promete.
Vendo 147 na Noite Fora do Eixo - Rock Instrumental / Com Camarones Orquestra Guitarrística (RN) e Tentrio / 26 de março / Boomerangue / R$ 5 e R$ 10
Ouça: myspace.com/vendo147
NUETAS
Flamenco de graça
A dupla espanhola Pedro Sierra (violão) e La Tobala (canto) fazem o concerto Guitarrísimo no Teatro Moliere da Aliança Francesa (Ladeira da Barra), nesta quinta-feira (dia 11), às 20 horas. O evento, oferecido pelo Instituto Cervantes - Centro de Cultura Espanhola, traz essas duas feras da música flamenca para se apresentar de graça em Salvador. Vamos prestigiar?
Punks gringos em Vitória da Conquista
A banda americana de hardcore War Cry se apresenta nesta quarta-feira (dia 10) no Teatro Carlos Jeovah (Praça da Bandeira, s/n), na aprazível Vitória da Conquista, com a veterana banda local Cama de Jornal fazendo as honras da casa. A festa punk começa às 19h30, com ingressos por R$ 5. Salvador, pelo visto, ficou de fora da turnê...