Blog (que, nos seus primórdios, entre 2004-05, foi de um programa de rádio) sobre rock e cultura pop. Hoje é o blog de Chico Castro Jr., jornalista formado pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia. Atualmente, é repórter do Caderno 2+ do jornal A Tarde, no qual algumas das matérias vistas aqui foram anteriormente publicadas. Assina a coluna Coletânea, dedicada à música independente baiana. Nossa base é Salvador, Bahia, a cidade do axé, a cidade do terror.
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sexta-feira, janeiro 29, 2010
O INVENTOR DA MOCIDADE
Uma das maneiras mais eficientes que um artista já estabelecido pode lançar mão para aparecer para o grande púbico, é, por incrível que pareça, desaparecer das vistas de todos – especialmente da imprensa (Belchior que o diga). J.D. Salinger foi outro que sentiu isso na pele.
Ao se isolar em uma casa na área rural de Cornish, New Hampshire, Salinger, inadvertidamente ou não, perpetrou seu golpe final em direção à imortalidade, criando uma bolha particular na qual, por curiosidade, muitos queriam entrar, mas apenas muito poucos tiveram acesso.
Quem penetrou na bolha de Salinger se viu obrigado a escrever seus próprios livros de memórias, tão mítico se tornou o autor e seu isolamento.
Assim o fez a escritora Joyce Maynard, com At home in the world (1998), detalhando seu romance com o escritor, bem como sua filha Margaret, com Dream Catcher (2000).
Esta última, por sinal, foi desmentida da primeira a última página pelo próprio irmão, Matthew, um ator fracassado, cujo papel de maior destaque foi, ironicamente, o Capitão América – um herói da 2ª Guerra, como seu pai – em um filme de quinta categoria de 1990, que volta e meia, é reprisado na Sessão da Tarde.
O legado de J.D. Salinger, contudo, é bem mais duradouro do que o do seu filho. Por ano, só nos Estados Unidos, são vendidas cerca de 200 mil cópias de seu livro mais famoso, O apanhador no campo de centeio. Com sua morte, esse número deverá, ao menos nos próximos anos, aumentar exponencialmente.
O segredo de tanto sucesso foi a forma terna e, ao mesmo tempo, sem firulas com que o escritor retratava seus personagens favoritos: adolescentes rebeldes e em eterno conflito com o mundo adulto que lhes esperavam logo ali, na esquina onde a adolescência cruza com as indesejadas responsabilidades da vida.
Romance de formação de linguagem ágil, dinâmica e irresistível, O apanhador definiu o gênero e formatou os romances de formação que viriam depois dele.
Coincidência ou não, O apanhador veio ao mundo na mesma época em que a juventude começava a ganhar relevo na sociedade americana do pós-guerra com diversas outras manifestações culturais da época, como o rock ‘n‘ roll, os filmes de Marlon Brando (O Selvagem) e James Dean (Juventude Transviada) e os livros da geração beat (On The Road de Jack Kerouac e Uivo, de Allen Ginsberg, especialmente).
Depois de Holden Caufield, protagonista de O apanhador no campo de centeio, a literatura – ou melhor, a cultura – americana e, por conseguinte, a cultura pop mundial, nunca mais foram as mesmas.
Holden, na sua imutável rabugice adolescente, concedeu os contornos que inspirariam todos os adolescentes sensíveis e inconformados.
Holden, assim como James Dean e Marlon Brando, foi o "template" definitivo do jovem rebelde – seja na década de 50 ou nos anos 2000.
Só por isso, seu criador já fez por merecer sua imortalidade. Nem precisava ter se isolado.
terça-feira, janeiro 26, 2010
A VINGANÇA DO CAPOEIRISTA
Ignorada na Bahia, Aú, HQ de Flávio Luiz, é adotada em SP
Lançado em outubro de 2008, o álbum em quadrinhos Aú, O Capoeirista, do cartunista e ilustrador baiano Flávio Luiz, foi adotado pela Fundação para o Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo.
Segundo o próprio Flávio Luiz, o órgão adquiriu, precisamente, 3.596 exemplares para serem distribuídos em escolas estaduais.
É a terceira edição da obra, que apresenta seu personagem Aú, um esperto menino capoeirista do Pelourinho, envolvido em diversas aventuras.
Números expressivos
A primeira edição, com dois mil exemplares e viabilizada graças a recursos captados pela Lei Rouanet, se esgotou rapidamente – mas apenas 50 exemplares foram vendidos na Bahia.
Uma segunda edição foi feita recentemente, “para atender a demanda de pedidos“, como informa o autor por email. Com a encomenda do governo paulista, “uma conta aproximada seria de quase 7 mil exemplares vendidos“, contabiliza Flávio.
O fato deixou o autor muito feliz, depois que, à moda Caymmi, foi embora da Bahia no ano passado, por conta do desprezo que lhe era dispensado por aqui. “Com isso, tornei viável a execução do Aú 2 sem precisar de terceiros“, comemorou, com razão.
Leia entrevista com Flávio Luiz por este repórter: www.popbaloes.com/bios/flavioluiz.htm
Leia resenha de Aú no Rock Loco:
http://rockloco.blogspot.com/2008/10/salvador-ganha-seu-heri.html
Lançado em outubro de 2008, o álbum em quadrinhos Aú, O Capoeirista, do cartunista e ilustrador baiano Flávio Luiz, foi adotado pela Fundação para o Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo.
Segundo o próprio Flávio Luiz, o órgão adquiriu, precisamente, 3.596 exemplares para serem distribuídos em escolas estaduais.
É a terceira edição da obra, que apresenta seu personagem Aú, um esperto menino capoeirista do Pelourinho, envolvido em diversas aventuras.
Números expressivos
A primeira edição, com dois mil exemplares e viabilizada graças a recursos captados pela Lei Rouanet, se esgotou rapidamente – mas apenas 50 exemplares foram vendidos na Bahia.
Uma segunda edição foi feita recentemente, “para atender a demanda de pedidos“, como informa o autor por email. Com a encomenda do governo paulista, “uma conta aproximada seria de quase 7 mil exemplares vendidos“, contabiliza Flávio.
O fato deixou o autor muito feliz, depois que, à moda Caymmi, foi embora da Bahia no ano passado, por conta do desprezo que lhe era dispensado por aqui. “Com isso, tornei viável a execução do Aú 2 sem precisar de terceiros“, comemorou, com razão.
Leia entrevista com Flávio Luiz por este repórter: www.popbaloes.com/bios/flavioluiz.htm
Leia resenha de Aú no Rock Loco:
http://rockloco.blogspot.com/2008/10/salvador-ganha-seu-heri.html
domingo, janeiro 24, 2010
CARTILHA ATIVISTA
O livro Não devemos nada a você, coletânea de entrevistas da extinta revista americana Punk Planet, reúne o melhor do pensamento independente e do ativismo de protesto radical
Quando se fala em “punk“ para um cidadão médio, aquele que assiste novela e curte um churrasquinho com sambão no fim de semana, ele certamente não terá muitas referências, além de um punhado de bandas ridículas na TV ou figuras estereotipadas com cabelos moicanos e roupas rasgadas – o clichê clássico do estilo.
Pois agora é a hora de pegar todos esses estereótipos e joga-los em seu merecido lugar: o lixo. Ainda que não se proponha a ser uma cartilha, o livro Não devemos nada a você - Coletânea de entrevistas Punk Planet (Edições Ideal), bem que serve como uma, ao juntar em um só volume o pensamento de diversos luminares do ativismo e da música underground.
Organizada por Daniel Sinker, ex-editor da revista independente Punk Planet, que circulou nos Estados Unidos entre 1994 e 2007, o livro traz entrevistas de nomes tão díspares quanto Jello Biafra, o ultra-politizado ex-líder dos Dead Kennedys (uma das bandas mais perigosas do mundo em sua época) ao pensador Noam Chomsky; de Ian MacKaye, líder do pilar independente Fugazi, às líderes do Central Ohio Abortion Access Fund (ONG que apóia o aborto); de Beth Ditto, a ativista homossexual da banda The Gossip (antes da fama), ao Vozes do Deserto (outra ONG, que promove ações para deter a guerra no Iraque). E ainda há mais, muito mais.
Abaixo os símbolos
Toda essa diversidade de ideias (e ideais) ilustra o que, na realidade, é o punk: uma filosofia de vida apartidária que estimula o individualismo, o pensamento independente e condena a busca pelo lucro a qualquer custo. Para ser punk, portanto, ninguém precisa usar símbolos – de resto, desmoralizados pela mídia mainstream – como cabelos espetados, roupas rasgadas ou ouvir música hardcore.
Para assumir posturas que podem ser consideradas ativistas (mais do que simplesmente “punk“), basta começar a pensar por si mesmo, e, quem sabe, tomar atitudes simples e, certamente, bem civilizadas.
Como, por exemplo, separar o lixo reciclável, privilegiar o comércio solidário, não pagar uma fortuna por aqueles tênis de marcas supostamente bacanas que são fabricados por escravos (seja no Oriente, Paraguai ou Bolívia) e – especificamente, aqui em Salvador – boicotar o carnaval comercial dos grandes blocos e camarotes que exploram de forma escravagista a mão-de-obra das classes D e E, além de privatizarem o espaço público – com a conivência dos governos.
Ou, como diz o editor Daniel Sinker na introdução do livro, “se você for ao âmago do punk e tirar toda a tinta de cabelo, power chords, máquinas de escrever, vinil colorido, jaquetas de couro, bastões de cola, cartazes de show e coturnos, a questão ‘por que não podemos fazer isso?‘ é o que sobrou no fundo da panela. O punk sempre foi sobre perguntar ’por quê’? e fazer algo a respeito“, escreve.
“É sobre pegar uma guitarra e perguntar: ’por que não posso tocar isso?’. É sobre pegar uma máquina de escrever e perguntar: ‘por que minhas opiniões não contam?‘. É sobre olhar o mundo à sua volta e perguntar: ’por que as coisas estão fodidas como estão’?. E então é sobre olhar para dentro de si e perguntar: ’por que não estou fazendo nada a respeito’?“, continua Sinker.
Foi pensando assim que pessoas como Jello Biafra, Thurston Moore (Sonic Youth), Henry Rollins, Ian MacKaye, Porcell (Shelter) e tantos outros mudaram o mundo a sua volta e influenciaram milhares de outras a fazer o mesmo.
Um exemplo bem prático foi o movimento riot girl, detonado nos Estados Unidos em 1991, por bandas de garotas como Bikini Kill e Bratmobile. Não mais que de repente, essas garotas começaram a fazer shows rabiscando as palavras ”vadia” e ”estupro” nas suas barrigas enquanto vociferavam hardcore com letras feministas.
Em pouco tempo, toda a mídia mainstream americana – veículos como o jornal New York Times e as revistas Newsweek e Rolling Stone – queria saber o que era todo aquele rebuliço.
Mesmo em alguns fanzines punks, essas garotas eram odiadas e chamadas de ”sapatões”, entre outros termos pouco lisonjeiros.
Desta forma, desmascararam o sexismo e o machismo que havia dentro do próprio movimento punk – o que já foi um grande feito.
Confrontamento ao vivo
Mas as entrevistas da Punk Plante não se limitaram a artistas e bandas do gênero, estendendo-se a líderes de movimentos sociais, designers, cineastas, filófosos e até mesmo ativistas destemidos como Jon Strange.
Conhecido como ”o senhor de camiseta branca”, Strange interrompeu, em 1998, uma audiência pública na Universidade Estadual de Ohio, transmitida ao vivo pela CNN, confrontando a então Secretária de Estado Madeleine Albright com perguntas para as quais ela simplesmente não tinha resposta.
A audiência pública, uma jogada da administração Clinton para conceder uma aura democrática à decisão (já tomada) de bombardear o Iraque, acabou tendo como resultado o adiamento do bombardeio por dez meses. Graças a um único homem – no lugar certo, com as perguntas certas na ponta da língua.
Mais famoso, o professor de linguística do MIT (Massachusetts Institute of Technology) Noam Chomsky (cujos artigos atmbém aparacem no jornal A TARDE), é outro entrevistado essencial do livro de Sinker.
Um senhor distinto que nada lembra um punk, Chomsky denuncia na sua entrevista a forma como o sistema educacional é projetado para impedir que as pessoas ”liguem pontos”. ”Uma coisa importante é manter as pessoas espalhadas e a outra evitar que elas vejam como as coisas estão ligadas entre si”, diz Chomsky.
Para Noam Chomsky, os próprios ativistas costumam cair nessa armadilha, tornando-se especialistas em questões específicas como “o apartheid na África do Sul, a guerra do Vietnã ou a América Central“. “Você não deve perceber o fato de que está tudo aqui“, atenta.
Acontece que “ligar pontos“ e unir ativistas é justamente a especialidade de outra entrevista de destaque do livro: Han Shan, diretor de programas do grupo Ruckus Society.
Quando se vê no noticiário da televisão aqueles ativistas encarando cassetetes, gás lacrimogêneo, jatos d‘água, spray de pimenta e outras formas de controle de multidões, é bem capaz que a Ruckus esteja por trás daquela movimentação toda.
Especializada em treinar ativistas para ação direta, ela ensina, em campos de treinamento, “as pessoas a escalarem prédios e colocarem faixas, algemarem-sem umas às outras – ou à barricadas, árvores e estradas”, escreve Sinker na introdução à entrevista.
“Você não pode ter uma coisa sem a outra“, diz Han Shan. “Todas as lutas por justiça e sustentabilidade, por direitos humanos e por justiça social estão profundamente ligadas. (...) Metalúrgicos e tibetanos, ativistas pelos direitos animais, hippies e anarquistas, todos precisam perceber que estamos trabalhando com um objetivo em comum. Podemos ter visões diferentes de como ele se concretiza, mas basicamente estamos tentando reverter a tomada de poder das corporações sobre nosso planeta“, exorta o ativista.
Jello Biafra e o Grateful Dead
Igualmente estimulante é a entrevista de Jello Biafra. Um verdadeiro pilar de pedra do movimento punk americano, suas palavras podem ter um efeito equivalente a um litro de café bebido todo de uma vez.
Longe de qualquer radicalismo rocker, Biafra aponta os velhos hippies da banda Grateful Dead como ativistas muito mais eficientes e organizados do que muitos punks uniformizados.
“Um modelo para se examinar é o que o Grateful Dead – justo eles – fez com boa parte do seu dinheiro, que foi criar uma fundação chamada Rex Foundation. Todo ano eles faziam shows beneficentes. Começou com uma doação de 30 mil dólares. Da última vez que tocaram, a Rex recebeu 1,2 milhão de dólares. (...) Isso ajudou a realizar sopões, centros de apoio a vítimas de estupro, os protestos Redwood Summer, do Earth First! (ONG ecologista) e ajudou escolas no distrito rural da Califórnia que não têm dinheiro para programas musicais por que os Republicanos roubaram tudo através de fraude fiscal“, denuncia Biafra.
NÃO DEVEMOS NADA A VOCÊ
Organização e edição: Daniel Sinker
Edições Ideal
308 p. / R$ 40
www.idealshop.com.br
Quando se fala em “punk“ para um cidadão médio, aquele que assiste novela e curte um churrasquinho com sambão no fim de semana, ele certamente não terá muitas referências, além de um punhado de bandas ridículas na TV ou figuras estereotipadas com cabelos moicanos e roupas rasgadas – o clichê clássico do estilo.
Pois agora é a hora de pegar todos esses estereótipos e joga-los em seu merecido lugar: o lixo. Ainda que não se proponha a ser uma cartilha, o livro Não devemos nada a você - Coletânea de entrevistas Punk Planet (Edições Ideal), bem que serve como uma, ao juntar em um só volume o pensamento de diversos luminares do ativismo e da música underground.
Organizada por Daniel Sinker, ex-editor da revista independente Punk Planet, que circulou nos Estados Unidos entre 1994 e 2007, o livro traz entrevistas de nomes tão díspares quanto Jello Biafra, o ultra-politizado ex-líder dos Dead Kennedys (uma das bandas mais perigosas do mundo em sua época) ao pensador Noam Chomsky; de Ian MacKaye, líder do pilar independente Fugazi, às líderes do Central Ohio Abortion Access Fund (ONG que apóia o aborto); de Beth Ditto, a ativista homossexual da banda The Gossip (antes da fama), ao Vozes do Deserto (outra ONG, que promove ações para deter a guerra no Iraque). E ainda há mais, muito mais.
Abaixo os símbolos
Toda essa diversidade de ideias (e ideais) ilustra o que, na realidade, é o punk: uma filosofia de vida apartidária que estimula o individualismo, o pensamento independente e condena a busca pelo lucro a qualquer custo. Para ser punk, portanto, ninguém precisa usar símbolos – de resto, desmoralizados pela mídia mainstream – como cabelos espetados, roupas rasgadas ou ouvir música hardcore.
Para assumir posturas que podem ser consideradas ativistas (mais do que simplesmente “punk“), basta começar a pensar por si mesmo, e, quem sabe, tomar atitudes simples e, certamente, bem civilizadas.
Como, por exemplo, separar o lixo reciclável, privilegiar o comércio solidário, não pagar uma fortuna por aqueles tênis de marcas supostamente bacanas que são fabricados por escravos (seja no Oriente, Paraguai ou Bolívia) e – especificamente, aqui em Salvador – boicotar o carnaval comercial dos grandes blocos e camarotes que exploram de forma escravagista a mão-de-obra das classes D e E, além de privatizarem o espaço público – com a conivência dos governos.
Ou, como diz o editor Daniel Sinker na introdução do livro, “se você for ao âmago do punk e tirar toda a tinta de cabelo, power chords, máquinas de escrever, vinil colorido, jaquetas de couro, bastões de cola, cartazes de show e coturnos, a questão ‘por que não podemos fazer isso?‘ é o que sobrou no fundo da panela. O punk sempre foi sobre perguntar ’por quê’? e fazer algo a respeito“, escreve.
“É sobre pegar uma guitarra e perguntar: ’por que não posso tocar isso?’. É sobre pegar uma máquina de escrever e perguntar: ‘por que minhas opiniões não contam?‘. É sobre olhar o mundo à sua volta e perguntar: ’por que as coisas estão fodidas como estão’?. E então é sobre olhar para dentro de si e perguntar: ’por que não estou fazendo nada a respeito’?“, continua Sinker.
Foi pensando assim que pessoas como Jello Biafra, Thurston Moore (Sonic Youth), Henry Rollins, Ian MacKaye, Porcell (Shelter) e tantos outros mudaram o mundo a sua volta e influenciaram milhares de outras a fazer o mesmo.
Um exemplo bem prático foi o movimento riot girl, detonado nos Estados Unidos em 1991, por bandas de garotas como Bikini Kill e Bratmobile. Não mais que de repente, essas garotas começaram a fazer shows rabiscando as palavras ”vadia” e ”estupro” nas suas barrigas enquanto vociferavam hardcore com letras feministas.
Em pouco tempo, toda a mídia mainstream americana – veículos como o jornal New York Times e as revistas Newsweek e Rolling Stone – queria saber o que era todo aquele rebuliço.
Mesmo em alguns fanzines punks, essas garotas eram odiadas e chamadas de ”sapatões”, entre outros termos pouco lisonjeiros.
Desta forma, desmascararam o sexismo e o machismo que havia dentro do próprio movimento punk – o que já foi um grande feito.
Confrontamento ao vivo
Mas as entrevistas da Punk Plante não se limitaram a artistas e bandas do gênero, estendendo-se a líderes de movimentos sociais, designers, cineastas, filófosos e até mesmo ativistas destemidos como Jon Strange.
Conhecido como ”o senhor de camiseta branca”, Strange interrompeu, em 1998, uma audiência pública na Universidade Estadual de Ohio, transmitida ao vivo pela CNN, confrontando a então Secretária de Estado Madeleine Albright com perguntas para as quais ela simplesmente não tinha resposta.
A audiência pública, uma jogada da administração Clinton para conceder uma aura democrática à decisão (já tomada) de bombardear o Iraque, acabou tendo como resultado o adiamento do bombardeio por dez meses. Graças a um único homem – no lugar certo, com as perguntas certas na ponta da língua.
Mais famoso, o professor de linguística do MIT (Massachusetts Institute of Technology) Noam Chomsky (cujos artigos atmbém aparacem no jornal A TARDE), é outro entrevistado essencial do livro de Sinker.
Um senhor distinto que nada lembra um punk, Chomsky denuncia na sua entrevista a forma como o sistema educacional é projetado para impedir que as pessoas ”liguem pontos”. ”Uma coisa importante é manter as pessoas espalhadas e a outra evitar que elas vejam como as coisas estão ligadas entre si”, diz Chomsky.
Para Noam Chomsky, os próprios ativistas costumam cair nessa armadilha, tornando-se especialistas em questões específicas como “o apartheid na África do Sul, a guerra do Vietnã ou a América Central“. “Você não deve perceber o fato de que está tudo aqui“, atenta.
Acontece que “ligar pontos“ e unir ativistas é justamente a especialidade de outra entrevista de destaque do livro: Han Shan, diretor de programas do grupo Ruckus Society.
Quando se vê no noticiário da televisão aqueles ativistas encarando cassetetes, gás lacrimogêneo, jatos d‘água, spray de pimenta e outras formas de controle de multidões, é bem capaz que a Ruckus esteja por trás daquela movimentação toda.
Especializada em treinar ativistas para ação direta, ela ensina, em campos de treinamento, “as pessoas a escalarem prédios e colocarem faixas, algemarem-sem umas às outras – ou à barricadas, árvores e estradas”, escreve Sinker na introdução à entrevista.
“Você não pode ter uma coisa sem a outra“, diz Han Shan. “Todas as lutas por justiça e sustentabilidade, por direitos humanos e por justiça social estão profundamente ligadas. (...) Metalúrgicos e tibetanos, ativistas pelos direitos animais, hippies e anarquistas, todos precisam perceber que estamos trabalhando com um objetivo em comum. Podemos ter visões diferentes de como ele se concretiza, mas basicamente estamos tentando reverter a tomada de poder das corporações sobre nosso planeta“, exorta o ativista.
Jello Biafra e o Grateful Dead
Igualmente estimulante é a entrevista de Jello Biafra. Um verdadeiro pilar de pedra do movimento punk americano, suas palavras podem ter um efeito equivalente a um litro de café bebido todo de uma vez.
Longe de qualquer radicalismo rocker, Biafra aponta os velhos hippies da banda Grateful Dead como ativistas muito mais eficientes e organizados do que muitos punks uniformizados.
“Um modelo para se examinar é o que o Grateful Dead – justo eles – fez com boa parte do seu dinheiro, que foi criar uma fundação chamada Rex Foundation. Todo ano eles faziam shows beneficentes. Começou com uma doação de 30 mil dólares. Da última vez que tocaram, a Rex recebeu 1,2 milhão de dólares. (...) Isso ajudou a realizar sopões, centros de apoio a vítimas de estupro, os protestos Redwood Summer, do Earth First! (ONG ecologista) e ajudou escolas no distrito rural da Califórnia que não têm dinheiro para programas musicais por que os Republicanos roubaram tudo através de fraude fiscal“, denuncia Biafra.
NÃO DEVEMOS NADA A VOCÊ
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Edições Ideal
308 p. / R$ 40
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terça-feira, janeiro 19, 2010
NOVO ANO, NOVOS SONS, NOVOS PLANOS
André Mendes (ex-Maria Bacana e Os Culpados) e a banda industrial gótica Modus Operandi chegaram em 2010 cheias de ideias. Confira na sequência...
Em nova fase, ANDRÉ MENDES só quer saber de sol, mar, violão e amor
Se ano-novo é a oportunidade de começar vida nova, o cantor e compositor André Mendes (em foto de Ricardo Rabello) começou 2010 com o pé direito. Não, ele não ganhou na Mega-Sena, nem nada assim.
O rapaz, conhecido no cenário rocker baiano por ter sido o band-leader da Maria Bacana, banda que marcou época nos anos 90 ao ser apadrinhada por Dado Villa-Lobos, largou seu último grupo, Os Culpados, por “diferenças criativas“ e resolveu se dedicar à carreira solo.
Surpreendentemente, sacudiu a poeira e deixou de lado o peso e a angústia adolescente que marcou sua produção nas ex-bandas, descobrindo-se solar, praieiro, pop mesmo.
Os primeiros resultados de sua nova fase já estão disponíveis no seu MySpace, com cinco faixas recentemente gravadas e produzidas por andré t.
Beach Boys no Porto
“Todas essas músicas foram compostas dentro do carro“, conta André.
“Minha mulher é professora universitária, e muitas noites eu ficava no estacionamento, esperando ela voltar. Aí eu levava o violão e ia gravando as composições no celular. E de repente, me vi numa fase legal. Pela primeira vez eu saquei que nunca tive uma fase solar. Era sempre uma coisa de angústia, de perturbação. E aí eu me permiti fazer esse som assim: guitarra limpa e vocalizações estilo Beach Boys, graças a andré t, que produziu e fez os backing vocals também“, relata o músico.
No MySpace estão disponíveis cinco faixas. O CD inteiro, só quando sair o disquinho físico, que ele faz questão de lançar ainda no primeiro semestre. “Quero lançar aqui, no Rio e em São Paulo, correr festivais e tudo mais“, conta.
Outra coisa que permitiu André a entrar nessa nova fase foi o fim da sua antiga locadora (“Graças a pirataria“, reclama), onde passava seus dias atendendo aos clientes.
Com mais tempo livre, passou a frequentar o Porto da Barra (uma das melhores praias do mundo, segundo o The Guardian). A mítica enseada acabou virando fonte de inspiração: “O disco começa com o barulho das ondas do mar. Essa é a moldura do disco. Tá relax total. Só tem um momento mais tenso, existencialista. É um disco essencialmente solar, inspirado no Porto da Barra“, garante.
Ouça o novo som de andré mendes: www.myspace.com/andremendesmusica
MODUS OPERANDI abre show de atração internacional em São Paulo e tem planos mil
Meio marginal até no marginalizado (ainda que este cenário esteja mudando) rock baiano, a banda de industrial / gótico Modus Operandi (em foto de Caroline Micheli Epstein) não se rende e volta a esta coluna com boas notícias.
A primeira é que, em março, no dia 13, eles abrem, em São Paulo, o show da banda belga The Klinik, uma expoente do subgênero EBM (Eletronic Body Music), contemporânea do lendário Front 242.
Quem quiser conferir mais detalhes, é só acessar o site da produtora responsável: http://www.projetoferrovelho.com.br/.
DVD, CD duplo
Nos planos do band leader David Giassi (baixo e vocais), está ainda um DVD ao vivo, trazendo um show gravado em 2008, na Zauber, durante o evento Assembleia das Sombras.
Mais adiante em 2010, ele pretende lançar um CD duplo, conceitual. “As letras seguem um conceito sobre a incomunicabilidade do ser humano nos tempos atuais, já que hoje as pessoas preferem o Twitter ao invés de se falar por telefone, enviar um e-mail, ao invés de escrever uma carta“, nota.
“Achamos que essas ferramentas estão meio que – dizendo de uma forma meio grosseira – emburrecendo as pessoas. José Saramago disse que, com o Twitter, o homem está regredindo ao grunhido“. Coerentemente, a banda não tem Twitter.
Outra possibilidade é um festival de som gótico / industrial no Pelourinho. “Estamos concorrendo a um edital Tô No Pelô. Se rolar, traremos bandas inéditas de Recife, São Paulo e também do interior da Bahia“, conclui David.
Ouça a Modus Operandi: www.myspace.com/modusweb
NUETAS
Trio elétrico sábado
Quer ver um dos melhores shows de música brasileira hoje? Então não perca Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicleta neste sábado (23), na Boomerangue. A banda ainda recebe o badalado grupo carioca Do Amor (formada por músicos de Caetano Veloso e Lucas Santtana) e a boa local Pessoas Invisíveis, com seu som pesado e melodioso. Night que promete muita animação e altos sons. 23 horas, R$ 20. R$ 15 (pela lista amiga das bandas no Orkut).
Black music no japa food
A banda Enio & A Maloca se apresenta todas as quintas-feiras no restaurante japonês / boate Yoko Dance. Ótimo guitarrista, Enio faz uma fusão de black music com rock. Suingadão, é som para se acabar de dançar até altas horas. A birita é dobrada e a farra sai por R$ 15. 22 horas, no Rio vermelho.
Em nova fase, ANDRÉ MENDES só quer saber de sol, mar, violão e amor
Se ano-novo é a oportunidade de começar vida nova, o cantor e compositor André Mendes (em foto de Ricardo Rabello) começou 2010 com o pé direito. Não, ele não ganhou na Mega-Sena, nem nada assim.
O rapaz, conhecido no cenário rocker baiano por ter sido o band-leader da Maria Bacana, banda que marcou época nos anos 90 ao ser apadrinhada por Dado Villa-Lobos, largou seu último grupo, Os Culpados, por “diferenças criativas“ e resolveu se dedicar à carreira solo.
Surpreendentemente, sacudiu a poeira e deixou de lado o peso e a angústia adolescente que marcou sua produção nas ex-bandas, descobrindo-se solar, praieiro, pop mesmo.
Os primeiros resultados de sua nova fase já estão disponíveis no seu MySpace, com cinco faixas recentemente gravadas e produzidas por andré t.
Beach Boys no Porto
“Todas essas músicas foram compostas dentro do carro“, conta André.
“Minha mulher é professora universitária, e muitas noites eu ficava no estacionamento, esperando ela voltar. Aí eu levava o violão e ia gravando as composições no celular. E de repente, me vi numa fase legal. Pela primeira vez eu saquei que nunca tive uma fase solar. Era sempre uma coisa de angústia, de perturbação. E aí eu me permiti fazer esse som assim: guitarra limpa e vocalizações estilo Beach Boys, graças a andré t, que produziu e fez os backing vocals também“, relata o músico.
No MySpace estão disponíveis cinco faixas. O CD inteiro, só quando sair o disquinho físico, que ele faz questão de lançar ainda no primeiro semestre. “Quero lançar aqui, no Rio e em São Paulo, correr festivais e tudo mais“, conta.
Outra coisa que permitiu André a entrar nessa nova fase foi o fim da sua antiga locadora (“Graças a pirataria“, reclama), onde passava seus dias atendendo aos clientes.
Com mais tempo livre, passou a frequentar o Porto da Barra (uma das melhores praias do mundo, segundo o The Guardian). A mítica enseada acabou virando fonte de inspiração: “O disco começa com o barulho das ondas do mar. Essa é a moldura do disco. Tá relax total. Só tem um momento mais tenso, existencialista. É um disco essencialmente solar, inspirado no Porto da Barra“, garante.
Ouça o novo som de andré mendes: www.myspace.com/andremendesmusica
MODUS OPERANDI abre show de atração internacional em São Paulo e tem planos mil
Meio marginal até no marginalizado (ainda que este cenário esteja mudando) rock baiano, a banda de industrial / gótico Modus Operandi (em foto de Caroline Micheli Epstein) não se rende e volta a esta coluna com boas notícias.
A primeira é que, em março, no dia 13, eles abrem, em São Paulo, o show da banda belga The Klinik, uma expoente do subgênero EBM (Eletronic Body Music), contemporânea do lendário Front 242.
Quem quiser conferir mais detalhes, é só acessar o site da produtora responsável: http://www.projetoferrovelho.com.br/.
DVD, CD duplo
Nos planos do band leader David Giassi (baixo e vocais), está ainda um DVD ao vivo, trazendo um show gravado em 2008, na Zauber, durante o evento Assembleia das Sombras.
Mais adiante em 2010, ele pretende lançar um CD duplo, conceitual. “As letras seguem um conceito sobre a incomunicabilidade do ser humano nos tempos atuais, já que hoje as pessoas preferem o Twitter ao invés de se falar por telefone, enviar um e-mail, ao invés de escrever uma carta“, nota.
“Achamos que essas ferramentas estão meio que – dizendo de uma forma meio grosseira – emburrecendo as pessoas. José Saramago disse que, com o Twitter, o homem está regredindo ao grunhido“. Coerentemente, a banda não tem Twitter.
Outra possibilidade é um festival de som gótico / industrial no Pelourinho. “Estamos concorrendo a um edital Tô No Pelô. Se rolar, traremos bandas inéditas de Recife, São Paulo e também do interior da Bahia“, conclui David.
Ouça a Modus Operandi: www.myspace.com/modusweb
NUETAS
Trio elétrico sábado
Quer ver um dos melhores shows de música brasileira hoje? Então não perca Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicleta neste sábado (23), na Boomerangue. A banda ainda recebe o badalado grupo carioca Do Amor (formada por músicos de Caetano Veloso e Lucas Santtana) e a boa local Pessoas Invisíveis, com seu som pesado e melodioso. Night que promete muita animação e altos sons. 23 horas, R$ 20. R$ 15 (pela lista amiga das bandas no Orkut).
Black music no japa food
A banda Enio & A Maloca se apresenta todas as quintas-feiras no restaurante japonês / boate Yoko Dance. Ótimo guitarrista, Enio faz uma fusão de black music com rock. Suingadão, é som para se acabar de dançar até altas horas. A birita é dobrada e a farra sai por R$ 15. 22 horas, no Rio vermelho.
terça-feira, janeiro 12, 2010
ACCELERATORRRR!!!!!
Show de 2006 da banda Primal Scream chega ao mercado em DVD e serve de consolo para quem viu o fraco show de novembro último
Relatos de quem assistiu à última apresentação da banda britânica Primal Scream no Brasil, no festival Planeta Terra (novembro de 2009, em São Paulo), deram conta de uma performance desinteressada, que resultou num show frio. O consolo – tanto para quem viu, quanto para quem não esteve lá – está neste DVD, Riot City Blues Tour (Coqueiro Verde), lançado há pouco tempo no mercado.
O vídeo apresenta um empolgante show gravado em novembro de 2006, diante de cinco mil fãs – entusiasmadíssimos – no Hammersmith Apollo de Londres, durante a turnê do penúltimo álbum da banda, Riot City Blues (2006).
Uma das bandas mais inconstantes do rock inglês, o Primal Scream reflete muito o que vai pela cabeça do seu líder, um sensível chapadão escocês, chamado Bobby Gillespie.
A partir do seu terceiro – e provavelmente, melhor – álbum, o caleidoscópico Screamadelica (1991), a banda, que até então se limitava a reproduzir o som guitar band do The Jesus and Mary Chain (onde Gillespie iniciou a carreira, tocando bateria), passou a ‘excursionar“ pelos mais diversos estilos da música pop, com resultados quase sempre interessantes.
Em Give Out But Don't Give Up (1994), partiram para o classic rock (estilo Rolling Stones ou Black Crowes, dependendo da idade do ouvinte) e soul.
Em Vanishing Point (1997), viajaram legal no dub jamaicano.
Já nos CDs XTRMNTR (2000) e Evil Heat (2002) misturaram electronica com punk (meio na linha Atari Teenage Riot, mas sem tanta gritaria).
E por fim, em Riot City Blues (2006) e Beautiful Future (2008) parecem ter chegado num saudável equilíbrio, fazendo rock ‘n‘ roll básico, com toques de eletrônica aqui e ali.
Passeio pop
O show reflete todas essas fases da banda, tornando-se um verdadeiro passeio pelas mais diversas vertentes da música pop, mas sempre com uma boa roupagem rock ‘n‘ roll, condizente ao CD da turnê.
A festa começa em velocidade máxima com Accelerator, uma paulada que, ao vivo, chega a lembrar o Mötorhead: bateria galopante e uma muralha de guitarras distorcidas desabando sobre a plateia enlouquecida.
A partir da segunda música, o show entra num clima mais maneiro, com o rock ‘n‘ roll Dolls. No palco, Gillespie e o baixista Mani, que entrou depois da separação de sua antiga banda, a lendária Stone Roses, dividem a atenção da plateia.
O primeiro porque, afinal de contas, é o band leader. E o segundo, por que é, de fato, uma figura carismática, com seu cabelinho de cuia e a cara amassada, testemunha dos excessos vividos na mítica Madchester.
Numerosa, a banda ainda conta com dois guitarristas, um tecladista / programador, baterista e duas vocalistas negras de vozeirão potente – para segurar a onda, já que Gillespie nunca foi lá esse cantor todo.
A cada música, um clima diferente se instala no ambiente, para alegria da plateia, que canta junto quase todas as músicas. Em algumas músicas, o pique é punk garageiro de Detroit, linha MC-5 e The Stooges.
Não a toa, encerram o show com Kick Out The Jams (da primeira) e citam I Wanna Be Your Dog (da segunda banda) em The 99th Floor.
Já em Swastika Eyes, o clima de rave toma conta do Hammersmith Odeon, apenas para voltar ao rock ‘n‘ roll stoneano de Country Girl, que vem em seguida. Um belo show, captado com câmeras de alta definição, que deve consolar que se decepcionou com apresentação de novembro último.
Pole dancing
Nos extras, pode-se ver todos os clipes produzidos entre 1991 e 2006, incluindo o imperdível Some Velvet Morning (que não consta do set list do show), com participação da musa junkie Kate Moss.
Além de cantar na faixa, ela aparece no clipe fazendo um número quentíssimo de pole dancing, coisa de deixar Flávia Alessandra parecendo uma freira de convento. Dá pra pedir mais que isso de um DVD de rock?
Primal Scream
DVD Riot City Blues Tour
Coqueiro Verde
R$ 29,90
Relatos de quem assistiu à última apresentação da banda britânica Primal Scream no Brasil, no festival Planeta Terra (novembro de 2009, em São Paulo), deram conta de uma performance desinteressada, que resultou num show frio. O consolo – tanto para quem viu, quanto para quem não esteve lá – está neste DVD, Riot City Blues Tour (Coqueiro Verde), lançado há pouco tempo no mercado.
O vídeo apresenta um empolgante show gravado em novembro de 2006, diante de cinco mil fãs – entusiasmadíssimos – no Hammersmith Apollo de Londres, durante a turnê do penúltimo álbum da banda, Riot City Blues (2006).
Uma das bandas mais inconstantes do rock inglês, o Primal Scream reflete muito o que vai pela cabeça do seu líder, um sensível chapadão escocês, chamado Bobby Gillespie.
A partir do seu terceiro – e provavelmente, melhor – álbum, o caleidoscópico Screamadelica (1991), a banda, que até então se limitava a reproduzir o som guitar band do The Jesus and Mary Chain (onde Gillespie iniciou a carreira, tocando bateria), passou a ‘excursionar“ pelos mais diversos estilos da música pop, com resultados quase sempre interessantes.
Em Give Out But Don't Give Up (1994), partiram para o classic rock (estilo Rolling Stones ou Black Crowes, dependendo da idade do ouvinte) e soul.
Em Vanishing Point (1997), viajaram legal no dub jamaicano.
Já nos CDs XTRMNTR (2000) e Evil Heat (2002) misturaram electronica com punk (meio na linha Atari Teenage Riot, mas sem tanta gritaria).
E por fim, em Riot City Blues (2006) e Beautiful Future (2008) parecem ter chegado num saudável equilíbrio, fazendo rock ‘n‘ roll básico, com toques de eletrônica aqui e ali.
Passeio pop
O show reflete todas essas fases da banda, tornando-se um verdadeiro passeio pelas mais diversas vertentes da música pop, mas sempre com uma boa roupagem rock ‘n‘ roll, condizente ao CD da turnê.
A festa começa em velocidade máxima com Accelerator, uma paulada que, ao vivo, chega a lembrar o Mötorhead: bateria galopante e uma muralha de guitarras distorcidas desabando sobre a plateia enlouquecida.
A partir da segunda música, o show entra num clima mais maneiro, com o rock ‘n‘ roll Dolls. No palco, Gillespie e o baixista Mani, que entrou depois da separação de sua antiga banda, a lendária Stone Roses, dividem a atenção da plateia.
O primeiro porque, afinal de contas, é o band leader. E o segundo, por que é, de fato, uma figura carismática, com seu cabelinho de cuia e a cara amassada, testemunha dos excessos vividos na mítica Madchester.
Numerosa, a banda ainda conta com dois guitarristas, um tecladista / programador, baterista e duas vocalistas negras de vozeirão potente – para segurar a onda, já que Gillespie nunca foi lá esse cantor todo.
A cada música, um clima diferente se instala no ambiente, para alegria da plateia, que canta junto quase todas as músicas. Em algumas músicas, o pique é punk garageiro de Detroit, linha MC-5 e The Stooges.
Não a toa, encerram o show com Kick Out The Jams (da primeira) e citam I Wanna Be Your Dog (da segunda banda) em The 99th Floor.
Já em Swastika Eyes, o clima de rave toma conta do Hammersmith Odeon, apenas para voltar ao rock ‘n‘ roll stoneano de Country Girl, que vem em seguida. Um belo show, captado com câmeras de alta definição, que deve consolar que se decepcionou com apresentação de novembro último.
Pole dancing
Nos extras, pode-se ver todos os clipes produzidos entre 1991 e 2006, incluindo o imperdível Some Velvet Morning (que não consta do set list do show), com participação da musa junkie Kate Moss.
Além de cantar na faixa, ela aparece no clipe fazendo um número quentíssimo de pole dancing, coisa de deixar Flávia Alessandra parecendo uma freira de convento. Dá pra pedir mais que isso de um DVD de rock?
Primal Scream
DVD Riot City Blues Tour
Coqueiro Verde
R$ 29,90
quinta-feira, janeiro 07, 2010
TOQUE O TERROR
No ano em que os vampiros voltaram com tudo, diversos álbuns de terror provam que gênero está vivo e muito bem, obrigado
Se os vampiros voltaram com tudo em 2009, com uma verdadeira avalanche de novos filmes, livros e HQs, é sinal de que o gênero terror está entrando em um novo ciclo de alta na indústria do entretenimento – ou, ao menos, de uma estável produção em grande escala. Não a toa, uma recente onda de álbuns de quadrinhos de horror tem chegado às livrarias e comic shops.
As opções vão desde clássicos imortais fielmente quadrinizados, como Frankenstein de Mary Shelley (Ed. Salamandra) e O Corvo, de Edgar Allan Poe (Editora Peirópolis), a revisões, como Estação Luz, inspirado em Fausto, de Goethe, passando ainda por novas visões de monstros lendários, como Sasquatch - A Lenda do Pé-Grande.
Há ainda espaço para os novos vampiros modernos na continuação 30 dias de noite - Eben & Stella, terror infanto-juvenil em Courtney Crumrin & o pacto dos místicos (Devir) e ainda o horror urbano independente do Almanaque Gótico (Terror S/A).
Enfim, há terror em quadrinhos para todos os gostos, idades, bolsos e perversões.
Começando pelos clássicos, as presentes quadrinizações de Frankenstein de Mary Shelley e O Corvo são dois lançamentos de editoras diferentes, mas que partilham das mesmas intenções editoriais.
Explica-se: ambos foram lançados com um olho no crescente mercado de álbuns de luxo para livrarias e outro, maior ainda, na lista do Programa Nacional Biblioteca nas Escolas (PNBE) do Ministério da Educação, que todos os anos, compra milhares de exemplares de livros infanto-juvenis – álbuns de HQs incluídos – para sem distribuídos nas bibliotecas de escolas públicas.
Adaptado por Marion Mousse – pseudônimo de um artista que prefere ficar anônimo – este Frankenstein de Mary Shelley é parte de uma grande coleção de clássicos vertidos para os quadrinhos da editora francesa Delcourt, publicados aos poucos no Brasil pela Salamandra.
Só dois álbuns foram lançados até agora: Frankenstein e Robinson Crusoé, de Daniel Defoe, adaptado por Christophe Gautier. A editora promete novos títulos para 2010.
Angústia monstruosa
De forma adequada, Marion Mousse mantém na sua adaptação o tom sombrio do romance gótico original de Mary Shelley com desenhos, que, por incrível que pareça, ainda têm algo de infantil nos seus traços quase cartunescos. A angústia da criatura criada a partir de restos de cadáveres pelo Doutor Frankenstein também se sobrepõe ao que se costuma ver no cinema – geralmente, um mero monstro sanguinário.
A angústia é também o sentimento predominante no clássico poema O corvo, de Edgar Allan Poe, quadrinizado pelo mineiro Luciano Irrthum. Com um estilo de desenho exuberante, que lembra a arte do mestre underground Hunt Emerson (o Robert Crumb inglês), Irrthum, porém, não primou pela sutileza, retratando passagens de forma bastante literal.
Ainda assim, adaptação mantém seus méritos, como os belos desenhos e a tradução utilizada, de Machado de Assis. Fora o poema em si, uma alucinante viagem noturna de um homem isolado em sua casa, assombrado por um enigmático corvo que entrou pela janela e o encara impiedosamente.
FAUSTO EM SP - Fascinado pela arquitetura de São Paulo, o curitibano Guilherme Fonseca uma vez imaginou um demônio residindo dentro do relógio da Estação da Luz. Desse insight nasceu a inspiração para a graphic novel Estação Luz, em parceria com o desenhista Renoir Santos.
Livremente inspirado em Fausto de Goethe, a história do homem que vendeu a alma ao diabo é aqui retomada na São Paulo contemporânea, recheada de personagens tipicamente urbanos e potencialmente perigosos. Fausto aqui é Wagner, um professor de meia-idade que se envolve com um estranho andarilho na estação de metrô do título. Muito bem produzida, a HQ se passa em diversos locais reconhecíveis da cidade, como o bairro da Luz, a Galeria do Rock e o centro velho.
Horrores vários
Criatura mítica e com similares no folclore de diversas partes do mundo, o Pé-Grande é mais conhecido na América do Norte como Sasquatch, na língua indígena Halkomelen, do Canadá.
Coube ao roqueiro e cineasta Rob Zombie (Rejeitados Pelo Diabo e o remake de Helloween) trazer o bicho de volta em Sasquatch - A Lenda do Pé-Grande, contando com o auxílio luxuoso do roteirista Steve Niles (30 Dias de Noite) e do lendário desenhista underground Richard Corben.
Sanguinário e sem concessões, Sasquatch é uma boa história de vingança e terror, com o mesmo ritmo dos filmes de Zombie. Quem já é fã vai gostar.
O parceiro de Zombie, Steve Niles, também assina a 3ª parte da saga iniciada na já clássica HQ 30 Dias de Noite, em Eben & Stella. O álbum retoma o destino dos personagens principais depois dos trágicos eventos da primeira parte, quando um grupo de vampiros promove um banquete numa cidadezinha do Alasca que fica isolada durante um mês inteiro de escuridão, em pleno inverno.
Bem mais leve (e indicada a crianças e pré-adolescentes), Courtney Crumrin& o pacto dos místicos, de Ted Naifeh, é o segundo volume da história iniciada em Courtney Crumrin& as criaturas da noite, sobre as aventuras uma menina do título, que bem poderia ser a irmã mais nova de Harry Potter.
Em dificuldades financeiras, Courtney e seus pais se mudam para a casa do seu tio, uma enorme mansão em estilo vitoriano. Claro que a casa é mal-assombrada e cheia de segredos, gerando uma divertida história que tem seus desdobramentos neste segundo volume. Ótimos desenhos do americano Naifeh.
Defendendo os quadrinhos nacionais independentes, o Almanaque Gótico, editado em Vitória (ES) pelo professor de filosofia Felipe Cazelli, chega ao seu segundo número. Divertido e de leitura rápida, reúne boas HQs curtas, artigos a fins e contos.
Destaque para Segunda-Feira, uma boa HQ de zumbis, assinada pelo próprio Cazelli e pelo desenhista Fábio Turbay.
Se os vampiros voltaram com tudo em 2009, com uma verdadeira avalanche de novos filmes, livros e HQs, é sinal de que o gênero terror está entrando em um novo ciclo de alta na indústria do entretenimento – ou, ao menos, de uma estável produção em grande escala. Não a toa, uma recente onda de álbuns de quadrinhos de horror tem chegado às livrarias e comic shops.
As opções vão desde clássicos imortais fielmente quadrinizados, como Frankenstein de Mary Shelley (Ed. Salamandra) e O Corvo, de Edgar Allan Poe (Editora Peirópolis), a revisões, como Estação Luz, inspirado em Fausto, de Goethe, passando ainda por novas visões de monstros lendários, como Sasquatch - A Lenda do Pé-Grande.
Há ainda espaço para os novos vampiros modernos na continuação 30 dias de noite - Eben & Stella, terror infanto-juvenil em Courtney Crumrin & o pacto dos místicos (Devir) e ainda o horror urbano independente do Almanaque Gótico (Terror S/A).
Enfim, há terror em quadrinhos para todos os gostos, idades, bolsos e perversões.
Começando pelos clássicos, as presentes quadrinizações de Frankenstein de Mary Shelley e O Corvo são dois lançamentos de editoras diferentes, mas que partilham das mesmas intenções editoriais.
Explica-se: ambos foram lançados com um olho no crescente mercado de álbuns de luxo para livrarias e outro, maior ainda, na lista do Programa Nacional Biblioteca nas Escolas (PNBE) do Ministério da Educação, que todos os anos, compra milhares de exemplares de livros infanto-juvenis – álbuns de HQs incluídos – para sem distribuídos nas bibliotecas de escolas públicas.
Adaptado por Marion Mousse – pseudônimo de um artista que prefere ficar anônimo – este Frankenstein de Mary Shelley é parte de uma grande coleção de clássicos vertidos para os quadrinhos da editora francesa Delcourt, publicados aos poucos no Brasil pela Salamandra.
Só dois álbuns foram lançados até agora: Frankenstein e Robinson Crusoé, de Daniel Defoe, adaptado por Christophe Gautier. A editora promete novos títulos para 2010.
Angústia monstruosa
De forma adequada, Marion Mousse mantém na sua adaptação o tom sombrio do romance gótico original de Mary Shelley com desenhos, que, por incrível que pareça, ainda têm algo de infantil nos seus traços quase cartunescos. A angústia da criatura criada a partir de restos de cadáveres pelo Doutor Frankenstein também se sobrepõe ao que se costuma ver no cinema – geralmente, um mero monstro sanguinário.
A angústia é também o sentimento predominante no clássico poema O corvo, de Edgar Allan Poe, quadrinizado pelo mineiro Luciano Irrthum. Com um estilo de desenho exuberante, que lembra a arte do mestre underground Hunt Emerson (o Robert Crumb inglês), Irrthum, porém, não primou pela sutileza, retratando passagens de forma bastante literal.
Ainda assim, adaptação mantém seus méritos, como os belos desenhos e a tradução utilizada, de Machado de Assis. Fora o poema em si, uma alucinante viagem noturna de um homem isolado em sua casa, assombrado por um enigmático corvo que entrou pela janela e o encara impiedosamente.
FAUSTO EM SP - Fascinado pela arquitetura de São Paulo, o curitibano Guilherme Fonseca uma vez imaginou um demônio residindo dentro do relógio da Estação da Luz. Desse insight nasceu a inspiração para a graphic novel Estação Luz, em parceria com o desenhista Renoir Santos.
Livremente inspirado em Fausto de Goethe, a história do homem que vendeu a alma ao diabo é aqui retomada na São Paulo contemporânea, recheada de personagens tipicamente urbanos e potencialmente perigosos. Fausto aqui é Wagner, um professor de meia-idade que se envolve com um estranho andarilho na estação de metrô do título. Muito bem produzida, a HQ se passa em diversos locais reconhecíveis da cidade, como o bairro da Luz, a Galeria do Rock e o centro velho.
Horrores vários
Criatura mítica e com similares no folclore de diversas partes do mundo, o Pé-Grande é mais conhecido na América do Norte como Sasquatch, na língua indígena Halkomelen, do Canadá.
Coube ao roqueiro e cineasta Rob Zombie (Rejeitados Pelo Diabo e o remake de Helloween) trazer o bicho de volta em Sasquatch - A Lenda do Pé-Grande, contando com o auxílio luxuoso do roteirista Steve Niles (30 Dias de Noite) e do lendário desenhista underground Richard Corben.
Sanguinário e sem concessões, Sasquatch é uma boa história de vingança e terror, com o mesmo ritmo dos filmes de Zombie. Quem já é fã vai gostar.
O parceiro de Zombie, Steve Niles, também assina a 3ª parte da saga iniciada na já clássica HQ 30 Dias de Noite, em Eben & Stella. O álbum retoma o destino dos personagens principais depois dos trágicos eventos da primeira parte, quando um grupo de vampiros promove um banquete numa cidadezinha do Alasca que fica isolada durante um mês inteiro de escuridão, em pleno inverno.
Bem mais leve (e indicada a crianças e pré-adolescentes), Courtney Crumrin& o pacto dos místicos, de Ted Naifeh, é o segundo volume da história iniciada em Courtney Crumrin& as criaturas da noite, sobre as aventuras uma menina do título, que bem poderia ser a irmã mais nova de Harry Potter.
Em dificuldades financeiras, Courtney e seus pais se mudam para a casa do seu tio, uma enorme mansão em estilo vitoriano. Claro que a casa é mal-assombrada e cheia de segredos, gerando uma divertida história que tem seus desdobramentos neste segundo volume. Ótimos desenhos do americano Naifeh.
Defendendo os quadrinhos nacionais independentes, o Almanaque Gótico, editado em Vitória (ES) pelo professor de filosofia Felipe Cazelli, chega ao seu segundo número. Divertido e de leitura rápida, reúne boas HQs curtas, artigos a fins e contos.
Destaque para Segunda-Feira, uma boa HQ de zumbis, assinada pelo próprio Cazelli e pelo desenhista Fábio Turbay.