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segunda-feira, janeiro 08, 2018

QUADRINHOS QUENTES

De férias ou não, o verão também é tempo de botar a leitura de quadrinhos autorais em dia. Aqui, cinco excelentes opções entre o drama familiar,  a biografia histórica, o realismo fantástico e o humor escrachado

Bem-vindo a Palomar
Coisa boa para quem está de férias no período que ora nos torra o juízo – leia-se verão –, é botar a leitura em dia.

Se for história em quadrinhos então, é juntar o útil ao delicioso.Aqui, selecionamos cinco opções, todas lançadas recentemente e aptas ao mais estrito prazer estético e literário.

Sim, porque HQ é literatura também. Sabia não? Se não sabia, acompanhe e comprove.

O destaque desta leva é uma das obras mais espetaculares já produzidas para esta mídia.

Diastrofismo Humano é o livro dois da saga Crônicas de Palomar, do quadrinista californiano Gilbert Hernandez.

Gilbert, ao lado do seus irmãos Jaime e Mario, criou nos anos 1980 uma revista independente chamada Love & Rockets.

Nela, cada um deles criou  um universo ficcional próprio (exceto Mário, que logo pulou fora).

Jaime criou o universo conhecido como Locas, onde o título da série (Amor & Foguetes) fazia sentido em torno de Maggie, uma mecânica de foguetes vivendo aventuras amorosas em um contexto chicano e punk rock.

Já Gilbert, meio inspirado no realismo fantástico  de Garcia Márquez, criou a cidadezinha de Palomar, um recanto esquecido em um país indefinido da América Latina.

Ele povoou essa cidade de um dos conjuntos mais inesquecíveis de personagens em qualquer genero ficcional.

E contou a história deles atravessando gerações. Nas suas histórias, vemos esses personagens nascendo, crescendo, enlouquecendo, indo e voltando da cidade grande, tendo filhos – vivendo, enfim.

As maravilhosas mulheres de Palomar 
Há o grupo de amigos em torno de Heráclio, um homem de família com um filho fora do casamento,  os quais acompanhamos desde crianças.

Há Luba, a voluptuosa bañadora de Palomar que tem uma tropa de sete filhos – e que se torna prefeita.

Há Tonantzin, a bela vendedora de quitutes exóticos que se politiza ao extremo e acaba cometendo um ato de autoflagelação. E por aí vai.

Neste volume, um assassino serial ataca na humilde cidadezinha, o que é visto como um sinal da mudança dos tempos.

Como os habitantes de Palomar reagirão? Quem é o assassino? Cativante, Diastrofismo Humano pode ser lido isoladamente sem prejuízos para o entendimento da trama.

Se quiser começar do início, busque Sopa de Lágrimas, o livro um de Palomar. Mundialmente aclamada, as Crônicas de Palomar são uma aula de narrativa sequencial que transcende gêneros literários.

Lester, o alter ego de Jeff Lemire em Condado de Essex
Essex e Rosa Vermelha

Similar à Diastrofismo  é Condado de Essex, do canadense Jeff Lemire.

Hoje mais conhecido por assinar HQs mainstream como Arqueiro Verde (DC) e Velho Logan (Marvel), Lemire tem em Essex seu breakthrough, a obra que o revelou ao público, abrindo caminho para HQs autorais como O Soldador Subaquático (Mino) e Sweet Tooth (Vertigo).

Apontada pelo Canadian Broadcasting Corporation (TV pública), como um dos “cinco romances canadenses essenciais da década de 2010”, Essex é a obra mais pessoal de Lemire, ambientada na comunidade rural em que ele cresceu.

Rosa L. desfralda suas ideias em Rosa Vermelha
A edição lançada no Brasil pela Mino traz a obra completa em seus três volumes: Contos da Fazenda, Histórias de Fantasmas e Enfermeira do Interior.

Outra leitura densa é Rosa Vermelha, a biografia em quadrinhos de Rosa Luxemburgo (1871-1919), filósofa, economista e revolucionária alemã.

Com uma história de vida dramática e riquíssima, Rosa é retratada por Kate Evans como uma pessoa extremamente passional, mas também de grande capacidade intelectual – como de fato, o era.

Com o feminismo (novamente) em alta, leitura altamente recomendada para se iniciar na vida e obra desta grande mulher.

Em tempo: a estudiosa Isabel Loureiro, autora do livro Rosa Luxemburgo e o dilema da ação revolucionária (Unesp, 2005) assina o ótimo texto de apresentação da edição lançada aqui pela Martins Fontes.



Bar e Tabloide

A sensacional artes tresloucada de Bar, do Coletivo Miolos Fritos
Mas chega de falar de HQ gringa. Faz tempo que o Brasil não deve nada ao resto do mundo – que aliás, tem importado (e premiado) muitas obras e quadrinistas brasileiros.

Duas das melhores HQs brasileiras lançadas em 2017 são Bar (Mino) e Tabloide (Veneta).

A primeira é um primor de estética underground, coisa de deixar a turma da inesquecível Chiclete Com Banana (a HQ, não a banda) orgulhosa.

Exalando paulistanidade, Bar reúne diversos episódios ambientados em um boteco pé-sujo do centro de São Paulo.

Samantha, a destemida repórter de Tabloide
Com personagens típicos deste tipo de cenário, a HQ assinada pelo coletivo Miolos Fritos tem na arte enlouquecida e ultradetalhada seu ponto forte, além do domínio do palavrório paulistano na boca dos personagens, um mais engraçado que o outro.

Já Tabloide, apesar de trazer proposta totalmente diferente, tem em comum a ambientação paulistana.

Thriller policial com toques surrealistas, traz uma destemida jornalista investigativa, Samantha Castello, obcecada em descobrir a verdade sobre o estranho caso de um cadáver vestido de noiva, encontrado à beira de uma represa.

Na sua busca, Samantha mergulha no que há mais bizarro na marginalidade paulistana, incluindo escravos bolivianos, assassinos pagos e uma sociedade secreta.

Ágil, a trama se desenrola cheia de detalhes que prendem o leitor página após página. Aguardamos agora  uma merecida e bem produzida adaptação para o cinema.

Diastrofismo humano / Gilbert Hernandez / Tradução: Chris Siqueira / Veneta / Tradução: / 256 páginas/ R$89,90

Rosa Vermelha / Kate Evans / Tradução: Marcelo Brandão Cipolla / WMF Martins Fontes / 232 páginas/ R$ 44,90

Bar / Breno Ferreira, Benson Chin e Adriano Rampazzo / Mino/ 176 páginas/ R$ 64,90

Condado de Essex / Jeff Lemire / Mino / Tradução: Dandara Palankof / 512 páginas/ R$ 98

Tabloide /  Leandro Melite / Veneta/ 136 páginas/ R$ 74,90

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