Mark Ronson e sua guitarra com design inspirado na capa |
De rachar o assoalho – como se dizia antigamente – Uptown Funk está em alta rotação nas rádios, serviços de streaming e TVs do mundo.
Até mesmo em algumas estações da (erroneamente) autossuficiente Salvador é possível ouvir o hit, um funk pop lascado, de deixar Michael Jackson branco de inveja (ops).
E é puxado pelo sucesso estrondoso da faixa que chegou ao mercado nacional Uptown Special, quarto álbum de Mark Ronson, no qual ele faz o que sabe melhor: reembala estilos e sonoridades musicais do passado em reluzentes arranjos contemporâneos.
E não foi nenhum jornalista quem disse isso. Foi o próprio Ronson, durante sua palestra no TED (fundação americana dedicada à disseminação de ideias em Tecnologia, Entretenimento e Design - TED).
Disse Ronson: “Não se pode utilizar a nostalgia por atacado, isso causa uma sensação de enjoo no ouvinte. Você pega um elemento do passado e aí adiciona algo novo”.
É essa receita que ele segue desde seu primeiro grande sucesso, o multiplatinado LP Back to Black, que ele produziu e apresentou ao mundo Amy Winehouse (1983-2011).
Turma boa
Em Uptown Special, gravado ao longo de 18 meses em quatro cidades, Ronson não fez por menos: se cercou de uma legião de gente talentosa para garantir o sucesso da empreitada – até por que seu último álbum antes deste, Record Collection (2010) não foi lá essas Coca-Colas todas.
E quem veio em socorro do bom Mark? Além do onipresente Bruno Mars, Stevie Wonder, Kevin Parker (band leader da cultuada banda australiana Tame Impala) o rapper Mystikal, os cantores Andrew Wyatt, Jeff Bhasker, Keyone Starr, Trombone Shorty, Carlos Alomar (ex-guitarrista de David Bowie) e por aí vai.
A cereja no bolo é o romancista Michael Chabon (As Incríveis Aventuras de Kavalier & Clay), encarregado de escrever as letras. Um luxo, pois não?
Som limpo para as rádios
O resultado é um álbum que pode ser apontado como o Random Access Memories (álbum do Daft Punk que trouxe o hit Get Lucky) de 2015 – e deve certamente figurar nas listas de melhores do ano.
Com onze faixas, Uptown Special realmente cativa o ouvinte com um clima alto astral e uma boa diversidade entre os estilos das canções, indo dos anos 1960 (como em Summer Breaking) até a contemporaneidade (com Daffodils, a faixa mais abstrata do disco), passando pelas pistas de dança da década de 80 (I Can’t Lose).
Mas além das óbvias influências de R&B, psicodelia, soul, funk, disco e synth funk, fica claro o peso do estilo de gravação AOR (Album Oriented Rock) em Uptown Special: o som é limpo e em camadas, exatamente como se fazia na Califórnia nos anos 1970 e ainda hoje se ouve nas rádios.
Diante da pobreza franciscana da música pop atual, um cara de fato talentoso como Ronson faz a diferença e lança alguma luz em um cenário desanimador.
Uptown Special / Mark Ronson / Columbia - Sony Music / R$ 24,90
Faixa a Faixa
Mark Ronson, o dândi |
Summer Breaking: É uma manhã ensolarada na Califórnia. Embalada nesta bossa psicodélica na voz de Kevin Parker, fica ainda mais bonita
Feel Right: O sol está alto e o rapper Mystikal brinca – a sério – de emular James Brown neste funk. Hilário
Uptown Funk: É meio-dia, a hora mais quente. Bruno Mars e seus homies estão na rua, cantando e quebrando tudo enquanto alguém abre um hidrante pra refrescar a galera. Bruno parece cada vez mais com Michael Jackson, mas isso é coisa dele, ninguém se mete, tá?
I Can't Lose: A cantora Keyone Starr vem de lá com um synth funk que poderia ter sido gravado pelas Pointer Sisters em 1982
Daffodils: O sol começa a descer no horizonte e Kevin Parker sai da sombra com um funk pop tranquilão
Crack in the Pearl: O por do sol é o cenário perfeito para esta balada na voz de Andrew Wyatt
In Case of Fire: A noite chega na manha. Ligue o rádio e ouça o aviso: “Em caso de incêndio, quebre o vidro”, canta Jaff Bhasker
Leaving Los Feliz: Kevin Parker entre a psicodelia e o easy listening
Heavy and Rolling: A noite na Califórnia é puro AOR. O pessoal da rádio está inspirado hoje
Crack in the Pearl, Pt. II: A gaita do Stevie quebra o silêncio da madrugada. Fim de festa, vão dormir, vão!
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