Vinte anos depois de matar Rê Bordosa, Angeli afia a ponta do lápis e dá cabo do último comunista
Ele fez de novo. Depois de matar sua personagem Rê Bordosa, há 20 anos, o cartunista Angeli matou - aparentemente - mais uma de suas criações. No último dia 20 de julho, em sua tira diária no jornal Folha de S. Paulo, um caminhão da Coca-Cola atropelou - melhor dizendo, esmigalhou - Meiaoito, também conhecido como "o último dos barbichinhas". Morte cruel para alguém que ainda acreditava na tomada de poder via revolução armada.
O momento fatídico pode ser visto no primeiro veículo a noticiar o trágico acontecimento, o Blog dos Quadrinhos (http//blogdosquadrinhos.blog.uol.com.br/), ou mesmo no site da Folha, para assinantes do UOL. É só ir na edição da data em que a tira foi publicada, dia 20 de julho.
Nas suas últimas tiras antes do atropelamento, o personagem foi visto em plena crise existencial, trancado no banheiro. Via fantasmas de Stalin, Che Guevara e outros partidários de Karl Marx. Estes o exortavam a desistir da revolução.
O autor, personacida (sic) notório, foi procurado pela reportagem de A TARDE para saber as razões da aparentemente definitiva eliminação de Meiaoito. Porém, esbarrou na secretária eletrônica da casa do autor, que não atende ao telefone, nem dá resposta aos recados que a essa altura já devem ter abarrotado o aparelho, nem responde aos emails que foram enviados pela reportagem.
Restou consultar seu amigo de décadas e editor da extinta revista Chiclete com Banana, Toninho Mendes, que por email, respondeu: "Sequer tenho certeza que o Meiaoito morreu, apesar da tira do atropelamento pelo caminhão da Coca-Cola. Você, como leitor, sabe que no mundo dos quadrinhos e da imaginação tudo é possivel...", concluiu. Toninho tem razão. Nas HQs, a morte não costuma ser levada muito a sério. Especialmente nos casos dos quadrinhos de super-heróis - o que não é o caso do Meiaoito.
Muitos, mesmo não-leitores habituais de HQ, ainda se lembram da morte do Super-Homem, notícia em todos os jornais do mundo nos idos de 1993. Poucos meses depois, lá estava Kal-El, de volta à vida e às bancas, após um período no "outro lado".
Recentemente, o Capitão América também foi assassinado em meio a uma guerra civil que dividiu o Universo Marvel em dois lados. Essa história, justamente intitulada Guerra Civil, está sendo publicada agora no Brasil pela editora Panini Comics, apesar da surpresa reservada para o final já ter sido estragada (a morte do Capitão). Até agora não há sinais do retorno do Capitão América, mas este já é dado como certo - tanto pelos profissionais da indústria, quanto pelos fãs.
Mas isso é no universo dos super-heróis, âmbito dos quadrinhos publicamente desprezado pelo criador de Meiaoito. Angeli, como todo os que entendem um pouco de quadrinhos sabem, é fortemente influenciado pelo quadrinista underground americano Robert Crumb, criador de personagens como o Gato Fritz e Mister Natural, ícones da contracultura dos anos 1960.
Em 1973, irado pelo pífio resultado final do filme Fritz The Cat (disponível em DVD), dirigido por Ralph Bakshi (Heavy Metal - Universo em Fantasia e American Pop), Crumb decidiu matar o personagem. Depois de ser desprezada por Fritz, uma avestruz apaixonada o matou traiçoeiramente com uma facada na cabeça. Foi o fim definitivo de Fritz, que nunca mais foi retomado por Crumb.
Angeli, aluno aplicado da escola de quadrinhos sujos e underground de Crumb, também nunca ressuscitou sua Rê Bordosa, morta em 1987, no especial Rê Bordosa - A morte da porraloca. Ainda que a tenha trazido de volta em um especial publicado em 1995, intitulado Rê Bordosa - Memórias da porraloca. Outra aparição recente dela foi no filme de animação Wood & Stock - Sexo, Orégano e Rock 'n' Roll (disponível em DVD), magistralmente dublada por Rita Lee. Mas foram casos isolados, em que não houve um retorno, e sim, flashbacks de momentos da vida do personagem.
"Angeli é discípulo notório de Crumb. Duvido muito que ele traga Meiaoito de volta", aposta o jornalista especializado em quadrinhos Gonçalo Júnior, autor de diversos livros teóricos sobre o assunto, como A guerra dos gibis e O Homem-Abril. Gonçalo vai além: "Acho que o Angeli, assim como o Laerte [Piratas do Tietê], se acomodou muito com a fama. Eles se tornaram burocratas dos quadrinhos, aquela coisa 'funcionário público'".
Nem tudo está perdido, porém. No início deste ano, a revista Piauí publicou uma HQ autobiográfica de Angeli, na qual ele relata o impacto que teve, ainda na infância, ao ouvir o compacto de Satisfaction, dos Rolling Stones, então recém-lançado no Brasil. A HQ foi considerada pelos fãs e jornalistas especializados uma obra-prima do autor, um testemunho do seu amadurecimento como artista.
"A morte do Meiaoito, assim como a HQ da Piauí, pode ser um bom sinal de inquietação de Angeli, que está dando uma chacoalhada na sua própria existência. A morte do Meiaoito pode significar o renascimento do próprio Angeli como artista", conjectura Gonçalo.
Cartunista de A TARDE, Bruno Aziz é um exemplo de quadrinista que cresceu lendo Angeli. Para ele, “o autor deve ter motivos pessoais para fazer isto, mas o mais importante é dar um destino digno aos personagens que não se adaptam aos novos tempos. E Meia Oito é um dinossauro, o último dos moicanos. Sua morte reflete o tempo em que estamos vivendo“, conclui.
Matéria publicada no jornal A Tarde de 30 de julho de 2007.
Blog (que, nos seus primórdios, entre 2004-05, foi de um programa de rádio) sobre rock e cultura pop. Hoje é o blog de Chico Castro Jr., jornalista formado pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia. Atualmente, é repórter do Caderno 2+ do jornal A Tarde, no qual algumas das matérias vistas aqui foram anteriormente publicadas. Assina a coluna Coletânea, dedicada à música independente baiana. Nossa base é Salvador, Bahia, a cidade do axé, a cidade do terror.
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segunda-feira, julho 30, 2007
quinta-feira, julho 26, 2007
RONEI JORGE e MATHEUS ALELUIA SÃO OS MÚSICOS BAIANOS SELECIONADOS PELA PETROBRAS CULTURAL
O grupo Ronei Jorge & Os Ladrões de Bicicleta (foto) e o músico Matheus Aleluia (ex-Os Tincoãs) foram os contemplados baianos na seleção pública do Programa Petrobras Cultural (PPC) na área musical de Produção e Difusão, que também inclui cinema, artes cênicas e literatura.
Os resultados do PPC foram divulgados no último dia 11 e todos os projetos escolhidos, em música, cinema, literatura e outras categorias, estão listados no site Notícias Petrobras (http://www.noticiaspetrobras.com.br/).
Selecionados para a parte musical do projeto, Ronei e Matheus receberão verba para gravarem cada um, um CD inédito. A contrapartida é a realização de três shows de lançamento do CD: um na cidade onde vivem (Salvador), um em São Paulo e outro no Rio de Janeiro.
Os contemplados ainda não sabem direito quando receberão a verba ou entrarão em estúdio, mas ambos ficaram bem felizes com a notícia. "Ainda 'tá tudo muito de início, não temos todos os detalhes, por enquanto", conta Ronei Jorge, um dos contemplados. "Mas recebemos a notícia com grande alegria. Vamos ter uma grana para poder gravar nosso próximo disco de forma bacana, poderemos realizá-lo da forma como o imaginamos", acrescentou.
De certo, Ronei só tem o nome do produtor: Gilberto Monte (ex-Tara Code). "Se lá na frente vamos optar em ter um outro produtor para trabalhar com ele, ainda não sabemos. Mas por enquanto, é só Gilberto". Vale lembrar que o primeiro CD de Ronei Jorge & Os Ladrões de Bicicleta, foi produzido pelo guitarrista Luiz Brasil.
A banda, uma das melhores do rock baiano, com vários quilômetros rodados no circuito alternativo brasileiro e respeitabilidade crítica, tem passado, segundo seu líder, por várias mudanças no seu som, deixando-o mais próximo das influências de MPB que já marcavam seu trabalho desde o início.
"Estamos passando por uma reformulação grande no som da banda, o lado música brasileira está mais acentuado. Acho que esse segundo disco vai ser bem diferente do primeiro", aposta Ronei.
"Repertório nós já temos. Tem umas 12 músicas inéditas que praticamente não executamos ainda, estamos trabalhando os arranjos. Tem um trabalhão ainda pela frente", prevê.
Cinco sentidos - Já Matheus Aleluia, o outro contemplado local, tem uma estrada um pouco mais longa na música baiana. Ex-integrante do grupo Os Tincoãs, de grande sucesso nos anos 1970, Matheus permanece fiel às raízes afro-baianas que guiaram seu antigo grupo.
Seu projeto, intitulado Cinco Sentidos, mostrará "as várias tendências e sensibilidades artísticas que sempre me influenciaram", disse. O resultado, definido por ele mesmo, será "o somatório das culturas que representam a Bahia, mas sempre pensando em abrir isso para o mundo".
Até poucos dias atrás, Matheus sequer sabia que seu projeto havia sido selecionado, tendo sido avisado por um amigo que ligou dos Estados Unidos, parabenizando-o pela vitória. "O projeto já existe há alguns anos, é uma idéia antiga, tínhamos começado a produzir com Alê Cerqueira e uma amiga nossa resolveu propor o projeto à Petrobras Cultural", conta.
Com Os Tincoãs, Aleluia gravou um dos discos mais importantes da música afrobaiana em 1973. O disco é considerado um marco pela adaptação que os músicos fizeram a partir de canções de terreiros de candomblé, tendo como base apenas quatro instrumentos: violão, atabaque, agogô e cabaça.
Em 1983, Os Tincoãs foram para Angola, onde participaram de projetos da Secretaria de Cultura daquele país. Infelizmente, Aleluia é hoje o único integrante do grupo ainda vivo após a morte de Dadinho, em 2000.
Cinema - Além da música, outros artistas baianos tiveram projetos selecionados. Um dos destaques é a área de cinema, com pelo menos dois diretores baianos contemplados e mais alguns projetos relacionados à Bahia entre eles.
Edgard Navarro (Eu Me Lembro) foi selecionado com seu projeto O Homem que Não Dormia. Sérgio Machado, diretor de Cidade Baixa, também produzirá A Morte e a Morte de Quincas Berro D'Água, baseado na obra de Jorge Amado, com a ajuda do PPC.
Capitães da Areia, outro filme baseado no autor também será produzido, com direção de Guy Gonçalves (RJ). Outro projeto interessante é o documentário Raul - O Início, o Fim e o Meio, sobre o falecido Raul Seixas.
Matéria publicada no Caderno 2 do jornal A Tarde, de 24 de julho de 2007. Texto sem a edição do jornal.
Os resultados do PPC foram divulgados no último dia 11 e todos os projetos escolhidos, em música, cinema, literatura e outras categorias, estão listados no site Notícias Petrobras (http://www.noticiaspetrobras.com.br/).
Selecionados para a parte musical do projeto, Ronei e Matheus receberão verba para gravarem cada um, um CD inédito. A contrapartida é a realização de três shows de lançamento do CD: um na cidade onde vivem (Salvador), um em São Paulo e outro no Rio de Janeiro.
Os contemplados ainda não sabem direito quando receberão a verba ou entrarão em estúdio, mas ambos ficaram bem felizes com a notícia. "Ainda 'tá tudo muito de início, não temos todos os detalhes, por enquanto", conta Ronei Jorge, um dos contemplados. "Mas recebemos a notícia com grande alegria. Vamos ter uma grana para poder gravar nosso próximo disco de forma bacana, poderemos realizá-lo da forma como o imaginamos", acrescentou.
De certo, Ronei só tem o nome do produtor: Gilberto Monte (ex-Tara Code). "Se lá na frente vamos optar em ter um outro produtor para trabalhar com ele, ainda não sabemos. Mas por enquanto, é só Gilberto". Vale lembrar que o primeiro CD de Ronei Jorge & Os Ladrões de Bicicleta, foi produzido pelo guitarrista Luiz Brasil.
A banda, uma das melhores do rock baiano, com vários quilômetros rodados no circuito alternativo brasileiro e respeitabilidade crítica, tem passado, segundo seu líder, por várias mudanças no seu som, deixando-o mais próximo das influências de MPB que já marcavam seu trabalho desde o início.
"Estamos passando por uma reformulação grande no som da banda, o lado música brasileira está mais acentuado. Acho que esse segundo disco vai ser bem diferente do primeiro", aposta Ronei.
"Repertório nós já temos. Tem umas 12 músicas inéditas que praticamente não executamos ainda, estamos trabalhando os arranjos. Tem um trabalhão ainda pela frente", prevê.
Cinco sentidos - Já Matheus Aleluia, o outro contemplado local, tem uma estrada um pouco mais longa na música baiana. Ex-integrante do grupo Os Tincoãs, de grande sucesso nos anos 1970, Matheus permanece fiel às raízes afro-baianas que guiaram seu antigo grupo.
Seu projeto, intitulado Cinco Sentidos, mostrará "as várias tendências e sensibilidades artísticas que sempre me influenciaram", disse. O resultado, definido por ele mesmo, será "o somatório das culturas que representam a Bahia, mas sempre pensando em abrir isso para o mundo".
Até poucos dias atrás, Matheus sequer sabia que seu projeto havia sido selecionado, tendo sido avisado por um amigo que ligou dos Estados Unidos, parabenizando-o pela vitória. "O projeto já existe há alguns anos, é uma idéia antiga, tínhamos começado a produzir com Alê Cerqueira e uma amiga nossa resolveu propor o projeto à Petrobras Cultural", conta.
Com Os Tincoãs, Aleluia gravou um dos discos mais importantes da música afrobaiana em 1973. O disco é considerado um marco pela adaptação que os músicos fizeram a partir de canções de terreiros de candomblé, tendo como base apenas quatro instrumentos: violão, atabaque, agogô e cabaça.
Em 1983, Os Tincoãs foram para Angola, onde participaram de projetos da Secretaria de Cultura daquele país. Infelizmente, Aleluia é hoje o único integrante do grupo ainda vivo após a morte de Dadinho, em 2000.
Cinema - Além da música, outros artistas baianos tiveram projetos selecionados. Um dos destaques é a área de cinema, com pelo menos dois diretores baianos contemplados e mais alguns projetos relacionados à Bahia entre eles.
Edgard Navarro (Eu Me Lembro) foi selecionado com seu projeto O Homem que Não Dormia. Sérgio Machado, diretor de Cidade Baixa, também produzirá A Morte e a Morte de Quincas Berro D'Água, baseado na obra de Jorge Amado, com a ajuda do PPC.
Capitães da Areia, outro filme baseado no autor também será produzido, com direção de Guy Gonçalves (RJ). Outro projeto interessante é o documentário Raul - O Início, o Fim e o Meio, sobre o falecido Raul Seixas.
Matéria publicada no Caderno 2 do jornal A Tarde, de 24 de julho de 2007. Texto sem a edição do jornal.
segunda-feira, julho 23, 2007
OS ORGASMOS CEREBRAIS DO SR. MOORE
Atire a primeira pedra o garoto que nunca foi apaixonado pela Branca de Neve. Ou a menina que nunca suspirou pelo Príncipe Encantado. Os contos de fadas que embalam a infância na cultura ocidental, defendem alguns, não passam de metáforas suavizadas - e distorcidas ao longo dos séculos - para um certo imaginário de despertar sexual. Não a toa, o Lobo Mau queria comer a Chapeuzinho Vermelho, o nariz do Pinóquio crescia quando ele mentia e a Bela Adormecida foi despertada para a vida pelo beijo de um belo rapaz.
Sob esta ótica, não causa tanto espanto a abordagem erótico-pornográfica utilizada pelo escritor inglês Alan Moore em sua obra Lost Girls, sobre três personagens clássicas da literatura infantil anglo-saxônica, cujo primeiro volume (de três) acaba de ser lançado no Brasil pela Devir Livraria. A polêmica HQ flagra Dorothy, de O Mágico de Oz (de L. Frank Baum e W.W. Denslow), Alice, de Alice no País das Maravilhas e Através do Espelho (de Lewis Carroll) e Wendy, de Peter Pan (de J. M. Barrie) nas mais diversas e exóticas situações - e posições.
Lost Girls é um antigo projeto de Moore e sua esposa, a artista Melinda Gebbie, que assina os desenhos do livro iniciado em 1989 com a intenção expressa do autor de, em suas próprias palavras, "colocar a pornografia e o erotismo em local digno dentro da cultura contemporânea". Fichinha para quem, desde o início dos anos 80, tem sido um dos grandes responsáveis por garantir um lugar nobre na cultura contemporânea para outra forma proscrita de arte - as próprias HQs - ao assinar obras geniais do porte de Watchmen (atualmente em pleno processo de adaptação para o cinema), V de Vingança, Do Inferno, A Liga dos Cavalheiros Extraordinários e Monstro do Pântano - para ficar só nas mais populares.
Neste primeiro volume, acompanhamos as três protagonistas já adultas chegando a um hotel na Áustria em 1916, época da 1ª Guerra Mundial, o que gera um grande plano de fundo, um clima de "viva agora, amanhã sabe-se lá". Por meio de uma série de encontros fortuitos e pequenas conversas no restaurante do hotel, as três acabam se conhecendo e se reconhecendo entre si, através das suas extraordinárias experiências em comum. Ainda que estas experiências não sejam exatamente aquelas vistas nos desenhos animados clássicos da Disney ou lidas nas obras originais em si.
Na visão de Moore para as personagens, Alice sofreu abuso sexual na infância por um amigo de seu pai - corroborando as suspeitas de pedofilia que até hoje pairam sobre o vulto de Lewis Carrol, que adorava fotografar menininhas. Na HQ, bêbada pelo vinho oferecido pelo velho safado, Alice teve um delírio sexo-etílico durante o ato praticado defronte ao espelho de sua casa, mergulhando, através dele, para uma outra realidade. Já Peter Pan era um moleque safado que zanzava pelo Hyde Park de Londres e iniciou sexualmente Wendy - e também seus irmãos Miguel e João. Daí o vôo dos Garotos Perdidos na obra original, uma metáfora para a descoberta do sexo. O que aliás, como Alice nota em certa passagem, bate perfeitamente com a então recente noção freudiana de que o sonho de voar nada mais é do que uma referência ao desejo sexual. Quanto à Dorothy, a caipira do Kansas, esta descobriu o prazer lúbrico ao se ver encurralada em casa por um tornado. Se for para morrer, que seja com um sorriso nos lábios. Em O Mágico de Oz, é um tornado que leva a pequena Dorothy para o país de Oz.
Se em suas obras anteriores Moore nos mostrou que os quadrinhos podiam ser muito mais do que uma diversão ligeira e pueril, em Lost Girls ele faz o mesmo não só pelos quadrinhos eróticos, mas pela própria pornografia em si, demonstrando-a apta a receber roteiros consistentes, coalhados com as mais diversas referências que, aliás, ele sempre distribuiu com generosidade pelos seus quadrinhos. Parece que em Lost Girls, Moore quer elevar a arte dos quadrinhos eróticos ao nível da melhor literatura do gênero, de autores como D.H. Lawrence e Anaïs Nïn. Resta esperar que a obra seja lançada em sua totalidade, já que restam dois volumes, para que os leitores brasileiros descubram se o autor atingiu o seu intento.
ATRAVÉS DO ESPELHO - Nada é gratuito em Lost Girls. O roteiro não é, como nas obras de outros mestres do erotismo nas HQs como Manara e Crepax, uma mera desculpa para mostrar em seqüência cenas e mais cenas de sexo sem que haja muita ligação entre elas. Em Lost Girls, a história segue uma bem amarrada progressão dramática que faz o leitor realmente se interessar pelo destino das personagens naquele cenário de ruptura da sociedade européia - no caso, a 1ª Guerra.
Outra característica notável do autor - não só na obra em questão, mas em todas as suas HQs - é conceder igual importância para forma e conteúdo, o que aqui originou a primeira história (supostamente) pornográfica que prende pela narrativa e não pelas apenas pela excitação sexual. Moore tem uma capacidade inaudita de explorar ao máximo as possibilidades narrativas e gráficas da mídia, leiautando páginas como se fossem quadros, que tanto podem ser apreciados individualmente, quanto causam maravilhamento quando observados (mais até do que "lidos") em seqüência. Ele mesmo já se auto-definiu como um formalista, alguém que explora, expande e estica tanto quanto possível a forma.
Um exemplo é a seqüência de abertura, onde a "câmera" focaliza apenas o espelho de Alice, e através dele, acompanhamos a jornada da personagem, desde seu exílio na África do Sul até sua volta à Europa. Sua reaproximação com o espelho - e o mundo da fantasia sexual - é plenamente simbolizada através daquelas 8 páginas, onde no início ela mal aparece. No final do capítulo, seu retorno é selado com um beijo em si mesma – através do vidro do espelho.
NÃO PARE AGORA - Em todas as entrevistas que deu para falar de Lost Girls, Moore sempre enfatizou que se tratava de pornografia mesmo, cenas explícitas e coisa e tal. Um exagero proposital do autor para causar um auê e chamar a atenção da mídia. Serviu tanto para engordar as vendas dos livros, que afinal, saíram por uma editora pequena, independente (Top Shelf) e também para ele lançar seu debate sobre pornografia na sociedade britânica - existe um longo e incrível ensaio de sua autoria abordando a questão na revista on line Arthur, facilmente localizável na internet em formato pdf.
A verdade é que Lost Girls pode ser tudo, menos pornografia. E olha que tem sexo de tudo que é categoria e nas mais variadas posições ao longo de seus três volumes. Só no primeiro, há lesbianismo, adoração dos pés, voyerismo, exibicionismo, incesto, sexo infantil e pedofilia. Moore explicou em entrevista recente que sua intenção e de Gebbie era abordar o sexo em todas a suas facetas, formas e cores, das mais gloriosas às mais sórdidas. E eles conseguem.
Só que é tudo mostrado com muita delicadeza - de uma forma que, apesar de sempre parecer plasticamente muito bonita, é incapaz de causar o efeito básico da boa pornografia: excitação sexual genuína. A narrativa é tão persuasiva, elegante e sofisticada, que o que importa é continuar lendo e acompanhando a história, sem se deixar “distrair” pelo sexo ali praticado.
Dirigida pelos famosos roteiros obsessivamente detalhados - e as orientações sempre a mão - do maridão, Melinda Gebbie se utilizou das melhores referências e influências da arte da época em que se passa a história, como ilustradores pornográficos obscuros da era vitoriana e a art noveau do início do século XX. As cores são esplendidamente aplicadas, da forma mais careta possível nestes tempos cibernéticos: com guache, à mão. Não dá para sair mais bonito do que isso com photoshop.
O resultado é lindo de se ver. Mas isso é arte - artes plásticas, para ser mais exato. Não é sacanagem da boa, como os quadrinhos de Milo Manara, Giovana Casotto ou mesmo os catecismos do brasileiro Carlos Zéfiro.
Como pornografia, Lost Girls é incapaz de provocar uma ereção que seja - mesmo no mais doentio dos tarados - ainda que como arte seja um tesão. Ou, pelo menos, mais um orgasmo cerebral do senhor Moore.
Lost Girls - Livro Um: Meninas Crescidas. Formato: 21,0 cm X 28,0cm. 112 páginas. Capa dura (entendi o código!). R$ 65,00.
Matéria publicada no Caderno 2 do jornal A Tarde de 22 de julho de 2007.
Sob esta ótica, não causa tanto espanto a abordagem erótico-pornográfica utilizada pelo escritor inglês Alan Moore em sua obra Lost Girls, sobre três personagens clássicas da literatura infantil anglo-saxônica, cujo primeiro volume (de três) acaba de ser lançado no Brasil pela Devir Livraria. A polêmica HQ flagra Dorothy, de O Mágico de Oz (de L. Frank Baum e W.W. Denslow), Alice, de Alice no País das Maravilhas e Através do Espelho (de Lewis Carroll) e Wendy, de Peter Pan (de J. M. Barrie) nas mais diversas e exóticas situações - e posições.
Lost Girls é um antigo projeto de Moore e sua esposa, a artista Melinda Gebbie, que assina os desenhos do livro iniciado em 1989 com a intenção expressa do autor de, em suas próprias palavras, "colocar a pornografia e o erotismo em local digno dentro da cultura contemporânea". Fichinha para quem, desde o início dos anos 80, tem sido um dos grandes responsáveis por garantir um lugar nobre na cultura contemporânea para outra forma proscrita de arte - as próprias HQs - ao assinar obras geniais do porte de Watchmen (atualmente em pleno processo de adaptação para o cinema), V de Vingança, Do Inferno, A Liga dos Cavalheiros Extraordinários e Monstro do Pântano - para ficar só nas mais populares.
Neste primeiro volume, acompanhamos as três protagonistas já adultas chegando a um hotel na Áustria em 1916, época da 1ª Guerra Mundial, o que gera um grande plano de fundo, um clima de "viva agora, amanhã sabe-se lá". Por meio de uma série de encontros fortuitos e pequenas conversas no restaurante do hotel, as três acabam se conhecendo e se reconhecendo entre si, através das suas extraordinárias experiências em comum. Ainda que estas experiências não sejam exatamente aquelas vistas nos desenhos animados clássicos da Disney ou lidas nas obras originais em si.
Na visão de Moore para as personagens, Alice sofreu abuso sexual na infância por um amigo de seu pai - corroborando as suspeitas de pedofilia que até hoje pairam sobre o vulto de Lewis Carrol, que adorava fotografar menininhas. Na HQ, bêbada pelo vinho oferecido pelo velho safado, Alice teve um delírio sexo-etílico durante o ato praticado defronte ao espelho de sua casa, mergulhando, através dele, para uma outra realidade. Já Peter Pan era um moleque safado que zanzava pelo Hyde Park de Londres e iniciou sexualmente Wendy - e também seus irmãos Miguel e João. Daí o vôo dos Garotos Perdidos na obra original, uma metáfora para a descoberta do sexo. O que aliás, como Alice nota em certa passagem, bate perfeitamente com a então recente noção freudiana de que o sonho de voar nada mais é do que uma referência ao desejo sexual. Quanto à Dorothy, a caipira do Kansas, esta descobriu o prazer lúbrico ao se ver encurralada em casa por um tornado. Se for para morrer, que seja com um sorriso nos lábios. Em O Mágico de Oz, é um tornado que leva a pequena Dorothy para o país de Oz.
Se em suas obras anteriores Moore nos mostrou que os quadrinhos podiam ser muito mais do que uma diversão ligeira e pueril, em Lost Girls ele faz o mesmo não só pelos quadrinhos eróticos, mas pela própria pornografia em si, demonstrando-a apta a receber roteiros consistentes, coalhados com as mais diversas referências que, aliás, ele sempre distribuiu com generosidade pelos seus quadrinhos. Parece que em Lost Girls, Moore quer elevar a arte dos quadrinhos eróticos ao nível da melhor literatura do gênero, de autores como D.H. Lawrence e Anaïs Nïn. Resta esperar que a obra seja lançada em sua totalidade, já que restam dois volumes, para que os leitores brasileiros descubram se o autor atingiu o seu intento.
ATRAVÉS DO ESPELHO - Nada é gratuito em Lost Girls. O roteiro não é, como nas obras de outros mestres do erotismo nas HQs como Manara e Crepax, uma mera desculpa para mostrar em seqüência cenas e mais cenas de sexo sem que haja muita ligação entre elas. Em Lost Girls, a história segue uma bem amarrada progressão dramática que faz o leitor realmente se interessar pelo destino das personagens naquele cenário de ruptura da sociedade européia - no caso, a 1ª Guerra.
Outra característica notável do autor - não só na obra em questão, mas em todas as suas HQs - é conceder igual importância para forma e conteúdo, o que aqui originou a primeira história (supostamente) pornográfica que prende pela narrativa e não pelas apenas pela excitação sexual. Moore tem uma capacidade inaudita de explorar ao máximo as possibilidades narrativas e gráficas da mídia, leiautando páginas como se fossem quadros, que tanto podem ser apreciados individualmente, quanto causam maravilhamento quando observados (mais até do que "lidos") em seqüência. Ele mesmo já se auto-definiu como um formalista, alguém que explora, expande e estica tanto quanto possível a forma.
Um exemplo é a seqüência de abertura, onde a "câmera" focaliza apenas o espelho de Alice, e através dele, acompanhamos a jornada da personagem, desde seu exílio na África do Sul até sua volta à Europa. Sua reaproximação com o espelho - e o mundo da fantasia sexual - é plenamente simbolizada através daquelas 8 páginas, onde no início ela mal aparece. No final do capítulo, seu retorno é selado com um beijo em si mesma – através do vidro do espelho.
NÃO PARE AGORA - Em todas as entrevistas que deu para falar de Lost Girls, Moore sempre enfatizou que se tratava de pornografia mesmo, cenas explícitas e coisa e tal. Um exagero proposital do autor para causar um auê e chamar a atenção da mídia. Serviu tanto para engordar as vendas dos livros, que afinal, saíram por uma editora pequena, independente (Top Shelf) e também para ele lançar seu debate sobre pornografia na sociedade britânica - existe um longo e incrível ensaio de sua autoria abordando a questão na revista on line Arthur, facilmente localizável na internet em formato pdf.
A verdade é que Lost Girls pode ser tudo, menos pornografia. E olha que tem sexo de tudo que é categoria e nas mais variadas posições ao longo de seus três volumes. Só no primeiro, há lesbianismo, adoração dos pés, voyerismo, exibicionismo, incesto, sexo infantil e pedofilia. Moore explicou em entrevista recente que sua intenção e de Gebbie era abordar o sexo em todas a suas facetas, formas e cores, das mais gloriosas às mais sórdidas. E eles conseguem.
Só que é tudo mostrado com muita delicadeza - de uma forma que, apesar de sempre parecer plasticamente muito bonita, é incapaz de causar o efeito básico da boa pornografia: excitação sexual genuína. A narrativa é tão persuasiva, elegante e sofisticada, que o que importa é continuar lendo e acompanhando a história, sem se deixar “distrair” pelo sexo ali praticado.
Dirigida pelos famosos roteiros obsessivamente detalhados - e as orientações sempre a mão - do maridão, Melinda Gebbie se utilizou das melhores referências e influências da arte da época em que se passa a história, como ilustradores pornográficos obscuros da era vitoriana e a art noveau do início do século XX. As cores são esplendidamente aplicadas, da forma mais careta possível nestes tempos cibernéticos: com guache, à mão. Não dá para sair mais bonito do que isso com photoshop.
O resultado é lindo de se ver. Mas isso é arte - artes plásticas, para ser mais exato. Não é sacanagem da boa, como os quadrinhos de Milo Manara, Giovana Casotto ou mesmo os catecismos do brasileiro Carlos Zéfiro.
Como pornografia, Lost Girls é incapaz de provocar uma ereção que seja - mesmo no mais doentio dos tarados - ainda que como arte seja um tesão. Ou, pelo menos, mais um orgasmo cerebral do senhor Moore.
Lost Girls - Livro Um: Meninas Crescidas. Formato: 21,0 cm X 28,0cm. 112 páginas. Capa dura (entendi o código!). R$ 65,00.
Matéria publicada no Caderno 2 do jornal A Tarde de 22 de julho de 2007.
terça-feira, julho 10, 2007
EVERYTHING MUST GO MESMO!
Depois de um disco meio oitentista, Lifeblood (2005), a banda galesa Manic Street Preachers retorna com Send Away the Tigers, onde sinaliza a retomada de uma sonoridade mais próxima à do início da carreira, mais rock de arena e conduzida por pegadas fortes e riffs cortantes. Um disco, diga-se de passagem, bem melhor que Lifeblood. O teor político e social das letras de Nicky Wire (baixo) ainda é o mesmo, esse nunca mudou - ainda bem. O disco abre com a maravilhosa faixa-título, riff enviesado e refrão sing-along, lembrando até o melhor disco de sua careira, Everything Must Go (1998). Dá até pra ver as veias saltadas da garganta de James Dean Bradfield (vocal e guitarra) - aliás, um dos meus vocalistas preferidos de uns 10 anos para cá. Underdogs, apesar de ser quase um hardcore melódico, é outra faixa que você imagina logo no show. A grande surpresa do CD vem na terceira faixa, Your Love Alone Is Not Enough, cantada em dueto por Bradfield e a adorada e adorável Nina Persson, dos Cardigans. Hit certeiro, traz um clima anos 90 para o CD, muito agradável. Ouvinte definitivamente ganho, o restante do disco segue em alto nível. Destaque para Indian Summer, Rendition (essa é demais), Autumnsong (linda também), Imperial Bodybags (o hard-rockabilly de Cardiff para o mundo) e a ótima cover de Working Class Hero (John Lennon) escondida alguns minutos depois do fim da última faixa, Winterlovers. Para mim, um dos melhores discos do ano desde já.
Send Away the Tigers
Manic Street Preachers
Epic
À beira do stoner rock
Fãs do hard rock, regozijai-vos! Ainda há vida inteligente dentro deste estilo, tão maltratado dentro e fora do Brasil. Além da carioca Mustang de Carlos Lopes, São Paulo apresenta sua armas com a banda The 3, um power trio (duh!) composto por Marcelo Canal (voz e guitarra), Paulo Moreira (baixo) e o baiano Ordep Lemos (bateria). Este último é velho conhecido do rock local desde os anos 80, com passagens por bandas como Utopia, Orelha de Van Gogh e Lampirônicos, entre outras que não lembro agora (soube que hoje em dia ele toca com Kiko Zambianchi). Não é uma banda de meninos, vê-se que todos são músicos profissionais, desenvolvendo ali seu trabalho autoral. E o resultado está à altura da maturidade dos caras como macacos velhos que são. O rock pesado de sabor setentista, esbarrando aqui e ali num stoner rock mais atual é como posso melhor descrever a The 3. Às vezes também lembra um Helmet - só que menos pesado. Fãs de Queens of The Stone Age poderão ouvir com prazer algumas faixas de Volume 1, como A barreira do som, Correria e Agora é tarde pra você. Apesar do som ser até bem direto, predomina no disco um clima meio contemplativo, mais para o introspectivo mesmo, como nas faixas Não sei e Distorções. Boa banda e bom começo, mas parece precisar cavar mais para encontrar sua forma definitiva. O material que recebi da The 3 pelo correio (bandas, não se acanhem, entrem em contato pelo email aí do lado) é claramente dirigido ao mercado, ou melhor, às gravadoras: super caprichado, com direito a um DVD com um documentário de cerca de meia hora apresentando a banda, seu produtor americano (Roy Cicala), depoimentos dos integrantes e de Apollo 9, dono do estúdio onde o CD foi gravado, o clima nas gravações etc. O produtor gringo Roy Cicala (pelo DVD, um coroa muito doido, aliás) soube captar bem a sonoridade dos instrumentos e equipamentos vintage adotada pelo trio. Segundo o release, o homem já trabalhou com um verdadeiro A a Z de monstros sagrados, de AC/DC a Frank Zappa, passando por Frank Sinatra, Elvis Presley, Queen, David Bowie e The Who.
Depois de um disco meio oitentista, Lifeblood (2005), a banda galesa Manic Street Preachers retorna com Send Away the Tigers, onde sinaliza a retomada de uma sonoridade mais próxima à do início da carreira, mais rock de arena e conduzida por pegadas fortes e riffs cortantes. Um disco, diga-se de passagem, bem melhor que Lifeblood. O teor político e social das letras de Nicky Wire (baixo) ainda é o mesmo, esse nunca mudou - ainda bem. O disco abre com a maravilhosa faixa-título, riff enviesado e refrão sing-along, lembrando até o melhor disco de sua careira, Everything Must Go (1998). Dá até pra ver as veias saltadas da garganta de James Dean Bradfield (vocal e guitarra) - aliás, um dos meus vocalistas preferidos de uns 10 anos para cá. Underdogs, apesar de ser quase um hardcore melódico, é outra faixa que você imagina logo no show. A grande surpresa do CD vem na terceira faixa, Your Love Alone Is Not Enough, cantada em dueto por Bradfield e a adorada e adorável Nina Persson, dos Cardigans. Hit certeiro, traz um clima anos 90 para o CD, muito agradável. Ouvinte definitivamente ganho, o restante do disco segue em alto nível. Destaque para Indian Summer, Rendition (essa é demais), Autumnsong (linda também), Imperial Bodybags (o hard-rockabilly de Cardiff para o mundo) e a ótima cover de Working Class Hero (John Lennon) escondida alguns minutos depois do fim da última faixa, Winterlovers. Para mim, um dos melhores discos do ano desde já.
Send Away the Tigers
Manic Street Preachers
Epic
À beira do stoner rock
Fãs do hard rock, regozijai-vos! Ainda há vida inteligente dentro deste estilo, tão maltratado dentro e fora do Brasil. Além da carioca Mustang de Carlos Lopes, São Paulo apresenta sua armas com a banda The 3, um power trio (duh!) composto por Marcelo Canal (voz e guitarra), Paulo Moreira (baixo) e o baiano Ordep Lemos (bateria). Este último é velho conhecido do rock local desde os anos 80, com passagens por bandas como Utopia, Orelha de Van Gogh e Lampirônicos, entre outras que não lembro agora (soube que hoje em dia ele toca com Kiko Zambianchi). Não é uma banda de meninos, vê-se que todos são músicos profissionais, desenvolvendo ali seu trabalho autoral. E o resultado está à altura da maturidade dos caras como macacos velhos que são. O rock pesado de sabor setentista, esbarrando aqui e ali num stoner rock mais atual é como posso melhor descrever a The 3. Às vezes também lembra um Helmet - só que menos pesado. Fãs de Queens of The Stone Age poderão ouvir com prazer algumas faixas de Volume 1, como A barreira do som, Correria e Agora é tarde pra você. Apesar do som ser até bem direto, predomina no disco um clima meio contemplativo, mais para o introspectivo mesmo, como nas faixas Não sei e Distorções. Boa banda e bom começo, mas parece precisar cavar mais para encontrar sua forma definitiva. O material que recebi da The 3 pelo correio (bandas, não se acanhem, entrem em contato pelo email aí do lado) é claramente dirigido ao mercado, ou melhor, às gravadoras: super caprichado, com direito a um DVD com um documentário de cerca de meia hora apresentando a banda, seu produtor americano (Roy Cicala), depoimentos dos integrantes e de Apollo 9, dono do estúdio onde o CD foi gravado, o clima nas gravações etc. O produtor gringo Roy Cicala (pelo DVD, um coroa muito doido, aliás) soube captar bem a sonoridade dos instrumentos e equipamentos vintage adotada pelo trio. Segundo o release, o homem já trabalhou com um verdadeiro A a Z de monstros sagrados, de AC/DC a Frank Zappa, passando por Frank Sinatra, Elvis Presley, Queen, David Bowie e The Who.
Volume 1
The 3
Independente
www.myspace.com/bandathe3