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segunda-feira, dezembro 25, 2006

PHODCAST ROCKLOCO 14 (SAY GOODBYE TO THE BEAT)

NO AR! MANDO DIAO! ASH! MATIZ! PIPPETS! SPARKS! COLD WAR KIDS! NÃO TEM THE NEW LOU REEDS! MAS TEM DECEBERISTS! E COMO DIZEM OS MAEL BROS. AUF WIEDERSEHEN TO THE BEAT!
www.rockloco.podomatic.com

terça-feira, dezembro 19, 2006

ESTRADA PARA A DANAÇÃO

No segundo encadernado de Os Mortos Vivos, Robert Kirkman aprofunda o clima de desespero e desesperança dos personagens em narrativa enxuta e precisa

Quanta pressão um ser humano pode agüentar? Quantas perdas de entes queridos, visões do inferno e desgraças pelo caminho alguém pode suportar antes de enlouquecer completamente e se transformar numa besta selvagem, cujo único propósito é a sobrevivência?

Após os trágicos eventos de "Dias passados", o policial Rick Grimes, sua família e o pequeno grupo de sobreviventes liderado por ele caem na estrada, amontoados em um motor home. Cruzando um mundo deserto, com o perigo espreitando a cada quilômetro, com frio e com fome, uma nova (quase) tragédia acaba conduzindo-os a uma fazenda, onde um outro grupo de infelizes sobreviventes se abriga do perigo morto-vivo.

Convidados pelo seu líder para lá ficar por um tempo, Grimes e seu pessoal logo descobrem que o dono da casa guarda um segredo sinistro no celeiro...

Esse segredo e as relações cada vez mais neuróticas que se estabelecem aos poucos entre os dois grupos só fazem a tensão aumentar cada vez mais - até a inevitável ruptura.

Em Caminhos trilhados, segundo volume de Os Mortos Vivos, Robert Kirkman passa ao leitor toda a angústia de viver em um mundo onde nada mais será como antes, onde cada dia é uma batalha, cada refeição, uma vitória. Sua fluidez narrativa deixa pouco espaço para o leitor respirar - não que tenhamos zumbis putrefatos surgindo a cada instante transformando tudo numa gore fest sem fim. Aqui os zumbis são apenas o pretexto para o autor desfiar a odisséia de dor e transformações pessoais pelas quais seus personagens passarão.

Na verdade, os maiores conflitos que acontecem são entre os humanos, os vivos. Os mortos vivos são um problemão, claro. Mas são mais um, entre muitos outros que os personagens enfrentam. A civilização ruiu, não existe mais. Em dado momento, um dos sobreviventes comenta com Rick da falta que ele sente de assistir um jogo de futebol. A vida como eles conheciam não existe mais, e dificilmente voltará a existir. Esperança é artigo em falta no mundo d'Os Mortos Vivos, e esse clima pesado parece permear toda a série.

No posfácio desta edição, o ator Simon Pegg (de Todo mundo quase morto - Shaun of te dead, filmaço obrigatório), além de analisar muito bem o próprio conceito de zumbi, ainda lança uma outra luz sobre Os Mortos Vivos, ao notar que, "enquanto nossos filmes favoritos de zumbis sempre parecem acabar muito rápido, deixando-nos a imaginar o que acontece depois, Kirkman é capaz de saborear a jornada e explorar os muitos perigos e dilemas encontrados por seu decrescente grupo de sobreviventes em desvantagem numérica".

Tem um detalhe muito simples, mas que é fundamental e determinante no tom intenso que Robert Kirkman imprime a'Os Mortos Vivos, que é seu absoluto controle sobre o "elenco" que dá vida aos muitos personagens. Nenhum é "esquecido", deixado de lado. Todos têm sua personalidade trabalhada, aprofundada, conflitos pessoais, desafios. Não há personagens vazios. O leitor identifica e se vê um pouco em cada um deles, é envolvido no tom intimista da história e acaba temendo pelos seus destinos. Não é toda hora que eu leio quadrinhos capazes de tal feito - e olha que eu leio muito, às vezes até mais do que deveria...

Aos poucos, vemos mais uma obra prima dos quadrinhos se delineando diante de nossos olhos.

OS MORTOS-VIVOS - VOLUME DOIS - CAMINHOS TRILHADOS
Roteiro: Robert Kirkman, Arte, arte-final: Charlie Adlard, Tons de cinza: Cliff Rathburn.
HQM Editora / Image Comics / R$ 28,90 - Edição especial, Formato americano - 140 páginas.

DEADWOOD: SERIADO SOBRE CIDADE NO VELHO OESTE É LABORATÓRIO SOCIAL DO AUTOR DAVID MILCH

Excelente produtora de seriados e filmes para a televisão, a americana HBO (Home Box Office, para quem interessar possa) já presenteou os telespectadores de todo mundo com clássicos instantâneos como A Sete Palmos, Família Soprano, Oz e outros menos cotados. Em Deadwood, a emissora manteve a tradição de localizar a ação de seus seriados em ambientes inóspitos. Se nos três primeiros citados os personagens viviam seus dramas pessoais em, respectivamente, uma funerária, na máfia de Nova Jersey e um presídio, Deadwood nos apresenta sua galeria de desajustados na cidade de mesmo nome, no oeste selvagem americano, por volta de 1888. Mesclando alguns poucos personagens históricos com os fictícios, David Milch, o criador da série, faz um grande levantamento de como uma sociedade se forma em ambientes não domesticados pela presença de um governo, leis, polícia, essas coisas (ou seja: em qualquer lugar). Atraídos pela febre do ouro, homens rudes e desajustados de todas as partes do mundo vão à Deadwood, tomar posse de algum veio de minério, trabalhar para as empresas de mineração que começam a se estabelecer e enriquecer. Isso é o só o pano de fundo para as muitas intrigas que rolam entre dois poderosos donos de puteiros locais, que, ardilosos como demônios, manipulam e dominam a cidade - que aliás, mais se assemelha à um chiqueiro, pois há lama por todo lado. Não há saneamento nem água encanada. Há o homem durão, silencioso, bom de briga e de coração, que acaba se tornando o xerife e protege uma viúva safadinha, dona de um belo garimpo. Bêbados, prostitutas, capangas cruéis de sangue frio, homens em busca de fortuna. Terreno fértil para um escritor de pena afiada tecer suas considerações e ainda faze-lo com estilo. Sintam só o drive shakespeareano desse diálogo, extraído do episódio "E.B. ficou de fora" (segunda temporada):

Homem no saloon: "Ouviu falar, Tom, que as prostitutas chinesas têm um modo antigo de livrar você de suas mágoas, sua solidão e do sentimento de sentir-se abandonado"?

Barman (intrometendo-se na conversa): "Parece que isso o deixaria sem nada". ("Seems like it would leave you with nothing", no original em inglês parece soar melhor ainda).

O destaque da série é Ian McShane, veterano ator inglês com vasta experiência na TV britânica, que domina a cena toda vez que aparece como Al Swearengen, dono do puteiro mais vagabundo da cidade e certamente, seu habitante mais maquiavélico, cruel e complexo. Nada do que ele fala é gratuito. Dono de uma personalidade magnética, de sua boca adornada pelo bigodón saem tanto palavrões em profusão (COCKSUCKER!), quanto observações extremamente sagazes - sobre basicamente tudo. Tranqüilamente é o personagem mais marcante da série - e da televisão em muito tempo. Nota dez também para a reconstituição do ambiente hostil e da época. A cidade cenográfica que foi erguida para fazer o papel de Deadwood, veículos, armas, roupas, tudo é muito convincente. Você quase sente o fedor de bosta (de cavalo e humana também) da cidade. Aliás, esse acabou sendo um dos motivos da série só ter durado até a terceira temporada. Os custos da ambientação caprichada e os cachês dos atores, que aumentaram com os prêmios acumulados (Emmy, essas coisas) acabaram inviabilizando Deadwood. Saiu uma entrevista de McShane onde ele fala sobre isso e conta que a HBO propôs ao autor a produção de dois especiais de duas horas, para ele fechar os destino dos personagens e encerrar a série. Isso ainda está sendo decidido, pelo jeito. Seja lá como for, Deadwood está sendo lançada no Brasil em DVD. A segunda temporada chegou há pouco tempo nas locadoras e é melhor ainda que a primeira - que já era sensacional. Milhões de outros adjetivos estão me vindo a cabeça. Portanto, antes que eu perca o controle e deite todos eles no juízo do leitor, é melhor encerrar aqui.

HERMANOS CHICANOS UNIDOS - Dois símbolos da moderna cultura chicana finalmente se uniram. Trata-se da bela capa do novo disco dos Los Lobos, The town and the city, assinada por ninguém menos que o mestre Jaime Hernandez, de Love and Rockets. Para quem ainda não sabe, Love and Rockets é uma das melhores séries do quadrinho underground de todos os tempos, parca e porcamente publicada no Brasil. E os Los Lobos, para quem só conhece daquela versão ultra surrada de La Bamba, também é uma puta banda bacana. Não conheço a fundo, mas recomendo o álbum Colossal head, de 1998. Discaço. E só pela linda capa, esse novo CD já merece uma boa conferida.

AGENDA

FÁBIO CASCADURA ROCK´N ROLL SOUL - Após temporada de show com o Cascadura pelo Sudeste do país, Fábio Cascadura e Thiago Trad voltam a se apresentar com o projeto FÁBIO CASCADURA ROCK´N ROLL SOUL.Em formato acústico eles apresentam grandes sucessos dos anos 50, 60 e 70 que influenciaram o CASCADURA, além de músicas do repertório próprio. Balcão Botequim (Curva da Paciência, Rio Vermelho). Horário: 21h Ingresso: R$ 6.

NATAL EM FAMÍLIA - Com as bandas: Cissa Guimarães, Fracassados do Underground, Glauco Neves, Intervalos: DJ Boris, Horário: 22hs, R$ GRÁTIS! Nhô Caldos - (rua da Paciência - Rio Vermelho)

O Maravilhoso Natal dos Retrofoguetes - O ano está chegando ao fim e, como não podia deixar de ser, os fabulosos Retrofoguetes vão comemorar promovendo sua tradicional e flamejante festinha natalina. Como de costume, ao invés do peru com farofa, um repertório recheado pelas animadas canções da banda além dos clássicos natalinos registrados no compacto de vinil "O Maravilhoso Natal dos Retrofoguetes", lançado pela Monstro Discos no ano passado. Pra completar a bagunça, vão participar da festa grandes vocalistas da atual cena roqueira da cidade como Mauro Pithon, Fábio Cascadura, Nancyta, Jorginho King Cobra, Lucas Ferraz e Alex Pochat. Quer mais? Escreva pro Papai Noel, quem sabe ele não te atende? Casa da Dinha (largo da Dinha - Rio Vermelho), Sábado 23/12, Horário: 22h, R$15 (R$12 até meia-noite), Apoio: Se Ligue, Companhia da Pizza, Álvaro Tattoo, Livraria Berinjela, Music Hall Instrumentos Musicais, Red Pigs, Santo Design, Mortini Stand com: Cd e vinil dos Retrofoguetes camisetas da Mortini

Pré Revellion a Fantasia dos "Os Mizeravão" - Vejam depoimentos sobre o "Os Mizeravão":
"...ainda não fui, mas no próximo vou com certeza" - Kurt Cobain
"é Rock pra se fuder!!!" - Irmã Dulce
"Já não consigo contar nos dedos as vezes que fui e gostei" - Presidente Lula
"quando eu chegar na Nicarágua... vou ficar com saudade do show deles" - Fábio Cascadura
Pois é, e ainda assim vc se nega a participar dessa festa, vai nos dizer que vai romper anos no show da Xinelada?... vai nada, vc vai é dançar na festa a fantasia do "Os Mizeravão, então toma no acento ai: Casa da Dinha
(Largo da Dinha Cons - Rio Vermelho), Sábado 30/12, Horário :22:00 horas. Ingresso: 10 reais com fantasia e 15 reais sem fantasia.

terça-feira, dezembro 12, 2006

ROCK BAIANO

" aqui em Salvador, a cidade do axé
a cidade do terror" Complete Control pelo Camisa de Venus

Deve ser uma coisa extremamente estranha para um americano observar o rock n roll em um pais como o Brasil.Mais estranho ainda ver suas ramificações e sua disseminação em lugares tão pouco prováveis como na Bahia. O livro escrito por Ednilson Sacramento, "Rock Baiano- historia de uma cultura subterrânea", é o primeiro(que eu saiba) a se propor a contar a historia de um ritmo(cultura?, estilo de vida?, nada disso?), estranho numa terra estranha. Estranha e hostil.
Logo na introdução, Ednilson, se refere as reações que a dedicação a tal tema suscita nesta terra: perda de tempo com a xérox da xérox?, Desperdício de papel? Para a maioria certamente, mas para uma minoria extremamente apaixonada, se trata de um "labor of love" ou seja um trabalho de e por amor.
E Ednilson, traça um painel e um relato, no mínimo emocionante, de uma cultura subterrânea, fora das atenções centrais da cultura oficial da Bahia, que vai frequentemente na contramão do que se convencionou chamar de "baianidade", alem de alargar a perspectiva cultural do fenômeno, abrindo espaço também para outras manifestações artísticas fundamentais que compõem o espectro do rock, tais como programas de rádios, imprensa, grafitti, e fanzines.Segundo ele mesmo diz, não existiu a intenção de sua parte de ter feito a biblia do rock baiano. Foram entre 10 a 12 anos de pesquisas, leituras, e muita vivencia com o rock local.Mais 11 anos foram necessários para que o livro fosse lançado.Obstinação, determinação e muita, mas muita paixão pelo assunto, o tal "labor of love".
Como explicar a sobrevivência do rock"n"roll na Bahia, resistente desde o fim dos anos 50, quando através do cinema(agente imperialista?) a baianada tomou contato com o rock?n?roll, quando no Cine Excelsior passou ?Sementes da Violência?, e desde, segundo consta, Raul Seixas trocou cigarros por discos de rock com americanos lotados no consulado dos USA, do qual era vizinho. A partir daí, Raulzito se encontraria com Valdir Serrao( o Big Ben), outro que tinha travado contato com o rock, mas este de forma totalmente intuitiva.Ednilson da uma geral do momento em diante em que Raul e Big Ben passam a andar juntos e praticamente forjam do nada o rock na Bahia. Fundam o Elvis Rock Club, no bairro da Calçada, e a essa altura do campeonato envolvidos com uma turma (Thildo Gama, David Barouh e outros) que foi pioneira do rock na Bahia, formariam conjuntos(não se chamavam bandas então) como Os Relâmpagos do Rock, The Black Cats, Os Cinco Loucos, e outros. Já a partir de 1963/64 o estouro dos Beatles ia tomando conta do mundo, e a Bahia sentia os reflexos, com conjuntos como Os Sombras, Quadrante 6, e outros se apresentando na TV Itapoan no programa "Poder Jovem", tocando em bailes e shows no Cine Roma, Clube Mesbla,e dando rolé na Praça da Sé. O rock foi continuado na Bahia durante o restante dos anos 60 pela Jovem Guarda, o movimento capitaneado por Roberto Carlos, que a partir do programa de televisão homônimo, que realmente popularizou o rock no Brasil. Bandas locais como Os Mustangs se destacavam em bailes estilo Jovem Guarda. Note-se que desde sempre o rock?n?roll nunca foi a musica considerada de bom gosto pela elite intelectual brasileira, sempre teve a bossa nova e a depois a MPB para arrebanhar nossos melhores rebentos.Alias a Tropicália foi forjada pela MPB ou pelo rock?
Raul, o maior e mais importante nome do rock"n"roll a sair da Bahia( prestem bem atenção aos adjetivos), se mandou para o Sul Maravilha, uma vez que, fazer e viver de rock na Bahia era(era?) impossível. Raul ressurgiria para a Bahia em 1972 ,com umas das mais impactantes performances ja feitas em terra brasilis, em pleno Festival Internacional da Canção, com Let Me Sing Let Me Sing. Mas há muito já deixara a Bahia para trás e o rock baiano, da qual era um dos seus principais agitadores.
Durante os anos 70 o rock baiano viveria sob uma influencia distante da psicodelia e da contra-cultura tardia. A Bahia, muito por causa da Tropicália, viveria seus "Summers of Love" , num misto de Hendrix, Caetano e Arempebe, uma peculiaridade geográfica que se tornou Meca hippie. Bandas como Os Cremes, Banda do Companheiro Mágico e principalmente o Mar Revolto tentavam emular de alguma forma aqueles tempos. A primeira metade dos 70 foram "dias estranhos". Passei a acompanhar o rock nesta época antes mesmo da adolescência (11 anos). Ouvia o programa do Big Ben na radio Bahia( que ficava perto do campo da Graça), e ia comprar discos promocionais que o mesmo vendia por de baixo do pano. Uma vez comprei na mão dele um Doors( o péssimo Full Circle, sem Morrison!), e um colega meu levou o espetacular School?s Out de Alice Cooper, fiquei anos achando que Doors era aquilo . As rádios Cruzeiro e Bahia( ambas AM), tocavam no meio da sua programação hits do rock?n?roll( Beatles, Credence, Stones) , mas o programa do Big Ben tocava Hendrix, Sly & The Family Stone, J. Gueils Band, misturado com outras coisas sem muito critério(ie suas próprias musicas). Aos 13 comecei a ir em shows na Concha Acústica e logo aos 14 ia ao ICBA. Vi shows dos sudestinos Terço, Made In Brasil, do expatriado Raul e do local Mar Revolto. Se a diferença entre a copia com a matriz era gritante, a copia da copia era foda( de ruim). Só Raul era que fazia frente, Raul fazia agente acreditar num tal de rock brasileiro.
Importante notar, que ate então, não se configurava na Bahia uma cena rock, as informações, que agora aparecem de forma organizada e de forma cronológica, não estavam disponíveis, nem articuladas, nos períodos mencionados ate então, e muito menos os movimentos do rock baiano eram articulados, com uma geração sucedendo a outra.Pelo contrario um movimento começava, depois acabava, depois surgia outro do nada, sem ter a menor noticia que tinha existido banda tal, com tal estilo em outra época. E? por isso que o rock baiano sempre foi ciclotimico , indo pra frente, depois para trás, e frequentemente para lugar nenhum. Apenas para constar( e isto não resolve o NOSSO problema), este é um problema da questão cultural brasileira como um todo, apenas aplique o grau adequado para cada setor cultural correspondente.
Nesta altura chegamos ao ponto crucial do livro de Ednilson, a década de 80 e a explosão do Rock Brasil e da construção de uma incipiente cena rock na Bahia, devido ao advento do punk. Ednilson cobre exaustivamente o período com a explosão do Camisa de Vênus que gerou uma cena que traria na sua esteira um movimente punk(!!!) na Bahia, mas que teve sua gestação e doutrinação a partir do momento que Marcelo Nova , o maior(eu disse o maior) colecionador e conhecedor de rock?n?roll da Bahia ever,fechou uma loja de discos chamada Nektar e foi trabalhar como programador de musica internacional na Aratu FM. Radio FM era uma puta novidade na Bahia, com audiência elitizada, uma coisa de ponta. Em pouco tempo Marcelo estava colocando Zepellin, Lennon e Hendrix na programação. Nesta época, Marcelo, segundo o próprio Kid Vinil(vejam o DVD Botinada), foi o primeiro cara a programar punk rock numa radio brasileira. Naquela época, Marcelo, um dos caras mais antenados(desculpem, foi mal) em rock, começou a travar contato com o punk rock que estava começando lá fora. Esqueçam as referências de hoje .Não tinha internet, nem MTV, muito menos You Tube. Ninguém sabia que porra era aquela.As noticias demoravam meses, as vezes 1 ano para chegar. Ao mesmo tempo Marcelo convencera seu chefe na Aratu, Linsmar Lins, a fazer um programa especial sobre bandas de rock, o Rock Special. No inicio apenas um programa didático sobre bandas consagradas de Rock, como Zepellin, Hendrix, contando a historia de forma cronológica, o Rock Special cresceu de tal forma a sua audiência, que Marcelo em pouco tempo estava tocando bandas totalmente desconhecidas e da vanguarda do punk e da New Wave , mudando a dinâmica da cidade.Ao mesmo tempo, já incorporando o espírito do faça você mesmo do punk, começava a formar o Camisa de Vênus.Marcelo, com o Rock Special, educou e doutrinou toda uma geração de rock baiano.Quando o Camisa veio, as pessoas, que sexta a noite paravam mesmo para ouvir um programa de radio(vejam só), já sabiam do que se tratava. Tiveram acesso a informação de ponta por parte de um agendador cultural( copiraite Marcos Rodrigues!), que conspirou e montou uma cena de um posto privilegiado, onde pela primeira vez na Bahia, o rock era o prato principal. O discurso anti baianidade do Camisa é por demais conhecido de todos, só que a agressividade e a articulação de Marcelo pegou o status quo de surpresa.Um dos principais méritos de Marcelo foi evidenciar a faceta urbana da cidade da Bahia, de forma contundente, explodindo os clichês sobre uma pretensa ?baianidade? dos soteros, que viveriam num eterno estado de graça num paraíso tropical em permanente estado de festa. Não eram questões novas, alias elas iriam recrudecer no futuro. Por uma única vez, o rock foi protagonista da questão cultural, e para surpresa total de muitos, ditou a pauta cultural.
A construção de uma cena era fundamental para a sustentação do furacão que veio depois, da explosão de bandas e da comoção que causou na cidade de Todos os Santos. Lógico que os tempos conspiraram a favor, os meios de comunicação tinha elegido o rock como bola da vez e o Rock Brasil em breve estouraria com a Blitz e Ritchie. E principalmente uma certa juventude baiana estava esperando um momento como aquele, e longe de ser marionete do Camisa, aproveitou o momento e fez acontecer por conta e brilho próprio.Ai entram Gonorréia, Espírito de Porco, Trem Fantasma, Delirium Tremens , mais uma pa de bandas.O Camisa ainda demorou mais de 1 ano morando na cidade, depois de ter estourado nacionalmente, o que o diferencia dos outros dois grandes do rock baiano, Raul e Pitty, que já tinham saído da cidade quando estouraram. Então, na minha opinião, se Raul foi indiscutivelmente o nosso maior rocker, Marcelo foi o principal articulador e figura central do estabelecimento da ?cena rock? baiano.
Depois da saída do Camisa, a incipiente cena entrou num vácuo, que depois foi preenchido por bandas importantíssimas como Via Sacra e Dever de Classe (principalmente). Estamos ai em 86, o rock dava as cartas no hit parade nacional, mas na Bahia rapidamente voltava a condição de marginal. Não obstante a cidade fervilhava com bandas como Doutrina Decadente, AI 5, Razão Social, Jesus Bastardus, ect, gangues de punks, a cena do PABX, a galera do Moto Lanches, ect. Fanzines como o Espunk pipocavam. O grafiteiro(e artista plástico) Miguel Cordeiro era Faustino, um acido critico da clase merdia baiana, que chegou ao ponto de fazer o vestuto jornal A Tarde pedir a atenção das autoridades ao ?tal do Faustino?. Só que o discurso punk trazia no seu radicalismo uma falta de consistência na sua práxis, que esvaziava a cena rock, alem de expor a questão da cidade dividida, tão bem focalizada por Ednilson. Os punks de verdade eram os de bairros proletários? O que era ser punk? E o rock nisso, é arte pura ou engajada? A arte engajada é melhor só por causa disto, independente da sua qualidade artística? Foi fácil para o status quo empurrar o rock baiano para o subterrâneo de novo.
Mas a esta altura o estrago estava feito, a quantidade de publicações alternativas, lojas alternativas e outras manifestações correlatas ao rock,pela primeira vez configurava uma ?cena rock? na cidade da Bahia .
Com todos os seus defeitos, inconsistências e contradições , a "cena rock" da cidade começou a se firmou. Porque o pior estava por vir. Passado o auge do Rock Brasil, a cena baiana iria se defrontar com um monstro gestado pela política cultural do estado associado a agentes de uma emergente industria cultural(donos de blocos e gravadoras), a axé music. Nao vou discutir de quem é a culpa(alo Toni Lopes!). Mas os agentes da axé music foram extremamente competentes em capitalizar elementos da cultura popular baiana de carnaval, rentabilizando-o ao zenith. E ai chegamos a parte final do livro de Ednilson, que fala de bandas que estão ai ate hoje como o Cascadura, outras em estado de hibernação com a brincando de deus, e outras já extintas, mas que foram determinantes para a cena atual , como a mitológica Úteros Em Fúria. A Úteros, foi a inspiração maior para o maior nome do rock do Brasil atualmente, Pitty. Acho, que esta cena , talvez tenha escrito os momentos mais heróicos do Rock Baiano, porque, poucas vezes uma geração de artistas foi ignorada de forma tão brutal como esta.Um exemplo de amor ao rock, porque só gostando muito para aturar anos e anos de isolamento e falta de reconhecimento. Então parabéns Ednilson, sua iniciativa, numa terra pobre de pessoas fazedoras, é um exemplo, alem de esclarecer e possivelmente iluminar alguns dos novos rockers da cidade. E mesmo contra sua vontade, é por enquanto é a biblia do Rock Baiano. Keep on Rockin!