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terça-feira, agosto 30, 2016

JOGOS DE GUERRA IMAGINÁRIOS

Lançamento: Enigmascope Volume 1, novo álbum dos Retrofoguetes após sete anos, reafirma busca sonora sofisticada do quarteto e supera obras anteriores

Morotas, Julio, Rex e Fábio: filme de espião na cabeça. Foto Uanderson Brittes
Imagine o filme de espião mais charmoso e ensandecido de todos os tempos, com direito a sequência de abertura, perseguições, lutas e sedução.

Cenas ambientadas em locações exóticas como Istambul, Moscou, Hong Kong, Rio de Janeiro, Roma e Havana.

Imagine agora a trilha sonora.

Ou melhor: não imagine. Os Retrofoguetes já fizeram isto por você.

Em Enigmascope - Volume 1, o grupo instrumental baiano partiu de um roteiro imaginário para um filme de espionagem ambientado nos anos 1960, para criar seu novo álbum – o primeiro desde Chá Chá Chá (2009).

E valeu a pena esperar, pois os Retrofoguetes se superaram, fazendo do 3º álbum sua melhor obra desde o CD demo Protótipo de Demonstração 1 (2002).

“Toda vez que a gente entra (em estúdio) pra fazer um trabalho novo, ele só faz sentido se for para ser melhor que o anterior. Se não for assim, pra que?”, afirma o baterista e membro fundador Rex.

"E essa relação com o cinema sempre esteve na essência da banda, desde o início. Vemos esse disco como um aprimoramento das experiências dos anteriores. Nos dois primeiros o conceito tinha essa ligação com o cinema, mas era mais como um viés. Tinha isso em Maldito Mambo, aí vinha um tango, uma polca, uma música de circo. Era mais uma investigação, sem uma ideia central. Desta vez, assumimos essa relação com o cinema e a ideia foi trilhar como se estivéssemos mesmo trilhando um filme de gênero. Escolhemos um filme de espionagem, por que esse estilo sempre foi muito forte no nosso trabalho, esses climas", relata Rex.

"Rolou um boom de filmes de espionagem na Guerra Fria, especialmente na Europa, foi o chamado eurospy. Foram produzidos centenas de filmes em um período de poucos anos. De 1963 a 66 o eurospy bombou muito. E os compositores nessa época, como os filmes tinha quem ser pop, eles partiam do que tocava no rádio: era surf music, bossa nova, música latina, rock. Pegavam isso e traziam para essa música os climas que o filme pedia: suspense, tensão, perseguição. Eram trilhas instrumentais, claro, e era perfeito para nós, pois já existia nos nossos trabalhos anteriores. Nunca fomos um banda de surf musico só. Então casou perfeitamente", avalia Rex.

"No nosso 'filme' não existe uma história, mas dentro dos filmes de espionagem, sempre tem essas sequências todas: o momento de tensão, a ação, o suspense, o romance. Aí quando sentamos para compor, essa era a direção, como se tiverssem encomendado essa trilha pra gente, como se o filme fosse real. Então criamos esse esqueleto do roteirto e partimos para as músicas. Aí foi tranquilo, pois as referências sao as mesmas, esse disco é quase um triubuto a esses compositores geniais, como Lalo Schifrin, Jerry Goldsmith, os italianos. Sempre ouvimos muito tudo isso. O que talvez mudou agora foi que aprofundamos a pesquisa", diz Rex.

Produzido pelo “Retrofoguete honorário” andré t., responsável por pilotar a mesa de gravação  do grupo desde 2002, Enigmascope  é também o primeiro registro após uma série de mudanças na formação, hoje estabilizada com os originais Rex e Morotó Slim (guitarra), mais Julio Moreno  (guitarra) e Fábio Rocha (baixo).

No disco, o quarteto ainda recebe um pequeno pelotão de músicos convidados de alto gabarito, enriquecendo um absurdo a sonoridade do álbum.

Nos metais, há Joatan Nascimento e João Teoria (trompetes), André Becker, Kiko Souza e Ito Bispo (saxofones), Mathias Traut e Gilmar Santos (trombones) – todos coordenados pelos arranjos de Jorge Solovera.

Pilotando teclados Hammond B3 e Wurlitzer está o gaúcho Luciano Leães, da banda Acústicos & Valvulados.

O produtor andré t. comparece com um Farfisa, e Rudson Daniel (percussão) repete a parceria que vem do Chá Chá Chá.

“Cara, se tivéssemos grana, iríamos além, com mais sopros, cordas, o escambau. Se pudéssemos,  gente teria a Osba (Orquestra Sinfônica da Bahia) no disco todo.  Talvez a gente consiga isso um dia, quem sabe?”, afirma Rex.

Missão quase impossível ao vivo

"Porra, Morotas já conquistou Ottawa e Moscou"! Ft Uanderson Brittes
A referência à Osba não é por acaso.

Pesquisadores do chamado spy jazz, subgênero surgido nos anos 1960 nas muitas trilhas sonoras de filmes e séries de espionagem da época da Guerra Fria, os Retrofoguetes sabem que o estilo é intrinsecamente ligado às formações orquestrais.

“Como a ideia para o disco era uma trilha, queríamos nos aproximar ao máximo de nossas referências, que são os maestros compositores que gravavam com orquestras”, diz Rex.

“Acho que esse disco foi o mais bem-sucedido nessa busca por esse som específico. Conseguimos andar mais, ousar mais. Quando gravamos, não economizamos no trabalho. Não nos satisfizemos com o segundo melhor resultado, sempre buscamos o melhor. No final, gravamos 17 músicas, mas só 13 entraram no disco”, afirma andré t.

"Em todos os sentidos, os caras trabalharam muito: nas composições, nos arranjos, tudo. As músicas que ficaram de fora são tão boas quanto. Rex comprou uma bateria original de 1960 para gravar. Tinha que ter cuidado, por que se batia muito forte, ela desmontava. Fomos buscando essas coisas mesmo. Fabinho foi fantástico, comprou um baixo acústico e saiu tocando, foi incrível. Julio e Morotó buscaram timbres exaustivamente. Não economizamos tempo", conta andré.

Uma pena é que esta sofisticação toda que o quarteto imprimiu ao álbum dificilmente será vista ao vivo: “Para o disco, não fizemos qualquer tipo de economia. Obviamente, para os palcos, é outro formato. Na maioria das vezes, será só o quarteto mesmo”, admite Rex.

Por esta e outras razões, o show de lançamento ainda não tem previsão de data. “Esta é a pergunta mais difícil. A gente gostaria de fazer com todos que gravaram, como fizemos no show do Chá Chá Chá, na Sala Principal do Teatro Castro Alves.  Seria realizar o mesmo sonho duas vezes”, diz Rex.

“Foi super bonito e obviamente desejamos repetir a façanha, mas não é fácil. Estamos trabalhando para isso. Inevitavelmente, (o show de lançamento do Enigmascope) vai ser em um teatro, mas ainda não sabemos qual, nem quando”, diz.

Continuação direta dos lendários The Dead Billies, os Retrofoguetes, apesar de todos os percalços e dificuldades, demonstram fôlego criativo de sobra para continuar produzindo por muitos anos ainda.

E como o “Volume 1” no título indica, os Retrofoguetes voltarão em breve.

“É como se fosse um franquia cinematográfica. A gente já partiu para esse disco pensando em dois ou três volumes. É que a gente passou por um hiato grande, foram sete anos entre o Chá Chá Chá e este, os últimos anos foram improdutivos por uma série de problemas. Nossa ideia agora é ter uma produção mais constante e não ficar mais cinco ou sete anos sem gravar”, conclui Rex.

O CD Enigmascope - Volume 1 está à venda nas lojas MídiaLouca, Pérola Negra, PHNX, Alvaro Tattoo, Companhia da Pizza e Portela Café.

Os Retrofoguetes retornarão.

Ouça Enigmascope.

ABRAM AS PORTAS DO INFERNO

Mystifier, monstros do black metal, partem para Europa após show no Dubliner’s

Armando Beelzeebubth conclama os servos de satã. Foto Mário Souza
Na próxima terça-feira (dia 6), todas as más vibrações – no bom sentido – vão para a gloriosa banda baiana de black / death metal Mystifier.

O grupo comemora 27 anos de atividades com um show no Dubliner’s e esquenta as turbinas  para, em outubro, partir para sua quarta turnê europeia.

Sim, o dileto leitor leu direito: quarta turnê gringa.

Entre maio e junho, o trio já cumpriu extensa agenda de shows, que começou em Maringá (PR) e terminou em Vancouver (Canadá), passando por Brasília, Rio, São Paulo, Baltimore e Calgary, entre outras cidades.

Em outubro, eles decolam para três datas no Peru e, de lá, é Europa na veia. Tudo isso, claro, dentro do esquema tradicional do metal, que é invisível na grande mídia e 100% independente.

"Quero que a tal grande mídia vá a merda!!", vocifera Armando Beelzeebubth, vocalista, guitarrista e atual único membro original.

"Hoje todo 'sucesso' é como um esquemão, protagonizado por empresários e produtoras gananciosas. Quando tal pseudo-artista não dá 'certo', é descartado de imediato (risos). Nunca precisamos disso", acrescenta.

"Sairei de Salvador no dia 05 de outubro e retornarei 17 de novembro. Talvez esta seja a maior turnê que já fizemos. Começando pelo Peru e terminando na Alemanha", conta.

Para ter uma ideia da moral do Mystifier, outro dia mesmo o site inglês Team Rock (do grupo editorial que publica revistas respeitadas como Classic Rock e Metal Hammer) listou os 20 melhores álbuns de black metal dos anos 1990.

Lá está  Göetia, lançado pelo grupo em 1993, descrito como “um dos discos mais sinistros do catálogo do black metal”.

“Nosso respeito no underground mundial foi devido aos nossos primeiros álbuns e ao fato de nos mantermos fiéis a nossa ideologia e determinação”, afirma.

"Falar em underground é meio difícil... Vejo muita gente falando asneiras e sem nem saber o significado real da palavra. E depois, vem me perguntar como conseguimos. Como se tudo fosse um truque mágico ou algo assim. Envolve sacrifício, gana, autenticidade, dentre tantas outras coisas ausentes nos músicos que vejo hoje em dia", dispara Armando.

Moleques da Cidade Baixa

Death metal ao sol da Bahia. Foto Mystifier / Divulgação
Fundada em 1989, o Mystifier saiu de Salvador para conquistar o mundo, algo que ainda espanta o próprio Armando: “Éramos moleques da Cidade Baixa, fãs de metal extremo. Perdemos as contas de quantas tretas com merdas de carecas metidos a nacionalistas e punks, que hoje são nossos amigos. Foi algo tão natural que, quando nos demos conta, estávamos assinando contrato com um selo da França. Incrível”, relata.

"Na Europa, principalmente, assim como nos States, o publico é vidrado em metal. Já é parte da cultura deles. Maior carinho por mim e pelo Mystifier - respeito. Coisa quase rara em nossa terra natal. Essa será nossa quarta ida a Europa, onde só tocamos na costa oeste, nos países com condição para bancar toda nossa estrutura. Foda demais!!", conta.

E como será que os europeus fãs de death metal, especialmente os alemães e nórdicos reagem ao se depararem com uma banda brasileira, liderada por um homem negro?

"Os alemães, assim como os nórdicos e britânicos são os mais fanáticos - os mais aficionados e leais. Powrra, Eu sou quase uma 'lendia' (risos) para eles, como só ando de couro e cercado de amigos, muitos olhos se viram e se perguntam: 'Quem é aquele cara? Jogador de football, basquetebol, cantor...?' E que se fodam!! Nunca sofri discriminação gratuita, também", relata Armando.

Sobre o satanismo inerente ao estilo que praticam, Armando explica que se trata de uma opção filosófica existencialista: “Meu nobre, por mais duro que seja, o Satanismo foi protagonizado pelos Existencialistas.Como disse Nietzsche: ‘O Diabo é o Pai do Conhecimento’. Como todo antagonismo vigente, é algo que quer contrastar, ser o oposto. Quando se estuda o mínimo do Conhecimento Universal (Gnosis), vemos o mundo com outro prisma. Nada é mais ASSOMBROSO (caps lock do entrevistado) a nossos olhos, a não ser dos que não querem ver a verdade. Pois estamos diante de pessoas tão 'dormentes', que elas jamais vão desejar ver a verdade. É como o mito do crucificado disse: '... jogar pérolas aos porcos'", afirma.

"Eu uso a  ‘imagem’ de Lúcifer para aterrorizar os alienados. Sou um mero estudante existencialista, curioso pelo Ocultismo. Leio sobre Anton LaVey, Aleister Crowley, Levi, Papus, Blake etc. Viva a Alexandria!”, conclui.

Viva o Mystifier!

Mystifier e Martyrdom / Terça-feira (6), 21 horas / R$ 25 (Sympla) ou R$ 30  (na porta, somente em espécie)



NUETAS


Giramente com Manada

As bandas Giramente e Efeito Manada são as atrações do Quanto Vale o Show? de hoje. Dubliner’s, 19 horas, pague quanto quiser / puder.

Mombojó sábado

A banda recifense Mombojó, que tem muitos fãs na cidade, traz o show do seu disco Alexandre ao Largo Tereza Batista neste sábado, às 20 horas. R$ 20 (meia, 1º lote), R$ 25 (meia,  2º lote).

Help Radioca 2016

Realizado com grande sucesso no ano passado, o Festival Radioca (da mesma galera que faz o programa homônimo da Rádio Educadora) lança financiamento coletivo para viabilizar a segunda edição, prevista para dezembro. Cotas a partir de R$ 30. Vamos nessa? www.catarse.me/festivalradioca.

quinta-feira, agosto 25, 2016

ELES VOLTARAM PARA BOTAR

Com um show dia 18 na Concha com o Ira!, o Camisa de Vênus lança primeiro álbum em 20 anos. Marcelo Nova fala sobre disco e show

Camisa 2016: Drake, Marcelo, Robério, Leandro e Célio. Foto Livia Lamana
Foi uma longa caminhada, mas ele finalmente conseguiu: o maior iconoclasta do rock brasileiro é hoje uma unanimidade crítica.

Dançando na Lua, primeiro álbum de inéditas do Camisa de Vênus em 20 anos, tem angariado resenhas favoráveis dos críticos de norte a sul do país.

“Achei bem curiosa essa unanimidade (da  crítica)”, admira-se Marcelo Nova. “Até falei com Drake (Nova, filho e guitarrista): ‘Velho, será que fiz alguma coisa errada?’”, ri.

Como se vê, o tempo passou, mas Marcelo e o Camisa seguem numa boa. Em plena turnê de lançamento, a banda nascida na Bahia há 36 anos – radicada em São Paulo há 30 – se apresenta na cidade com a contemporânea Ira! na Concha Acústica do TCA no dia 18, prometendo, como sempre, botar pra você sabe o quê.

“Os discos do Camisa, todos, sem exceção, sempre foram controversos, mas as críticas eram dirigidas a mim. Ninguém falava do disco. Era sempre 'Marcelo Nova, o arrogante'. E como eu ironizava os crÍticos, criei algumas inimizades. Me lembro de um, de um grande jornal paulista, que fez uma critica devastadora de um show. Mas o alvo era eu, não falava da banda. Mas eu comi a namorada dele então... é engraçado! Eles andavam juntos nos anos 80, uma galera de críticos 'in', era bem engraçado, sabe? Eram todos paulistas e todos tinham bandas, e eles andavam com umas meninas bonitas ao redor e tal, mas quem comeu elas fui eu, enquanto eles fracassaram e viraram críticos, então eu entedia que eles não gostassem de mim, eu não fazia disso um problema. Eu dizia que critico é como a torre Eiffel: são muito bonitinhos, mas não servem pra nada”, dispara.

Em todo caso, a rendição da crítica também mostrou a Marcelo que o tempo se encarregou de botar os pingos nos is.

”Aconteceu que aquele menino chato e sarcástico tornou-se um senhor de 65 anos. O tempo passou e ninguém conseguiu me calar“, afirma.

“O que eu ouvia dos produtores em Salvador e de empresários paulistanos foi que eu fechava muitas portas com minha postura. Só que, na medida em que fechei vinte portas, abri outras 30. A verdade é inegável: o cara do rock (no Brasil) sou eu mesmo”, diz.

E assim, o inevitável aconteceu: veio o reconhecimento.

Botando pra você sabe o que. Foto do Facebook da banda
“A essa altura, eles (críticos) tiveram que tirar o chapéu e dizer: ‘o cara sabe o que faz’. O reconhecimento por um lado é bom. O Camisa finalmente é apreciado pela sua música, e não pelos óculos escuros ou  o topete de Marcelo Nova. Por outro lado, fico pensando, ‘porra, não tô me divertindo tanto’ (gargalhadas). 36 anos fazendo o que eu faço, tem que tirar o chapéu e bater palma mesmo, entendeu?”, afirma.

De fato, em um cenário onde o rock nacional foi varrido do mainstream pelo sertanejo e pelos melosos herdeiros dos Los Hermanos, Dançando na Lua é notícia alvissareira.

Disco de rock ortodoxo, o novo do Camisa é tradicional até no número de canções: dez cravadas, como nos antigos LPS com lado a e lado b.

Nenhuma delas longa demais, e todas são baseadas em riffs matadores da dupla de guitarristas formada por Drake Nova e Leandro Dalle.

Arte interna do CD, por Miguel Cordeiro
O baixista fundador Robério Santana e o baterista veterano Celio Glouster erguem aquela base firme sobre a qual Marcelo se eleva para disparar suas letras, que não são mais impropérios espirituosos, povoados por personagens pitorescos como Silvia ou Primo Zé.

Em outra fase desde o álbum O Galope do Tempo (2005), um marco em sua carreira, as letras de Marcelo são hoje reflexões ora malcriadas (Raça Mansa, desde já um clássico do Camisa), ora irônicas (Chamada a Cobrar), ora enigmáticas (O Estrondo do Silêncio).

Não deixa de ser um grande feito para Marcelo & Cia, que poderiam muito bem viver da nostalgia dos fãs, fazendo shows de hits por tempo indefinido.

“No fim da turnê de 2015, as possibilidades eram duas: prosseguir e fazer mais um ano de shows ou gravar um novo álbum”, conta Marcelo.

“Eu poderia ficar tranquila e serenamente deitado sobre os louros de minhas conquistas, tocando uma lista sem fim de hits. Sorte minha, que construí esse corpo de trabalho que me permite ter canções conhecidas por todos em todas as faixas etárias“, afirma.

Obrigado é o caralho, pode ir abaixando as calcinhas. Foto Facebook Camisa
“Mas isso não é suficiente para um cara como eu, aos 65 anos. Artisticamente, eu tenho que estar motivado. Quando começa a ser um exercício de repetição, vou perdendo o interesse”, conta.

Sobre o show do Camisa na Concha, Marcelo adianta que os fãs poderão ouvir músicas de todas as fases da banda.

“Uma preocupação que eu e Robério tivemos ao escolher o repertório (da turnê) foi contemplar canções de todos os álbuns, sem exceção: os de estúdio e os ao vivo”, conta.

“Mas também vamos tocar várias desse novo, até por ser o primeiro em 20 anos. E ele está bom mesmo, por que vou esconder? De jeito nenhum. O disco tem sido muito bem recebido pelos fãs”, conclui.

Ira! e Camisa de Vênus / 18 de setembro (domingo) / Concha Acústica do Teatro Castro Alves / 19 horas /  R$ 50 e R$ 100 / Camarote: R$ 125 e R$ 250 / 14 anos

Dançando na Lua / Camisa de Vênus / Produzido por Marcelo Nova e Drake Nova /  Radar Records / R$ 29,90

terça-feira, agosto 23, 2016

EMMANUEL MANZI, FRANCO-SUÍÇO RESIDENTE EM SALVADOR, GRAVOU NA BAHIA UM ÁLBUM DE FOLK POP CELESTIAL

Emmanuel Manzi dá uma dedilhada. Fotos do blogueiro
A Bahia, como sabemos, é um ímã para artistas estrangeiros. Para músicos então, nem se fala.

Neste momento, Emmanuel Manzi, franco-suíço de Lausanne, deve ser um dos mais incomuns a viver em solo soteropolitano.

Sua história tem lances de drama pessoal que dariam um filme.

Órfão, Manzi foi criado em um orfanato católico.

Na igreja, aprendeu a tocar violão e piano. Era fã tanto de Beatles e bandas de rock progressivo, quanto dos cânticos religiosos, temente a Deus que é.

“Eu transformava cânticos religiosos em música pop. Gostava de Beatles, Bob Dylan e rock progressivo”, conta.

Adulto, formado jornalista, casou-se e passou a trabalhar em veículos suíços como repórter de cultura e crítico de música, dança e teatro.

Em paralelo, desenvolveu uma carreira de músico na banda Atlantide, nos anos 1980.

"A maioria dos músicos suíços não vive de música. Estudei psicologia, pedagogia e depois, jornalismo. Mas sempre fazendo música. Fui integrante de um grupo de rock progressivo chamado Atlantide, nos anos 80. Também trabalhei 12 anos na Radio Suisse como locutor de notícias. Depois de quatro anos, fui enviado pra Radio Suisse Internacional, em Berna", relata.

"Com o fim da banda, iniciei uma pequena carreira solo. Lancei três singles e dois álbuns. Um deles era inspirado no filme Asas do Desejo, de Wim Wenders. Entrou no Top 50 suíço", afirma.

A vida foi boa para Emmanuel por vários anos – até começar a ficar ruim, quando sua mulher pediu o divórcio.

Na sequência, por intervenção do sogro, homem influente, perdeu seu emprego.

Sem mulher, sem casa (que era dela) e sem emprego, Emmanuel passou a viver do seguro-desemprego suíço e freelances.

"Depois, foi meu apartamento em Sion (Suíça) que pegou fogo, por causa de um cigarro que eu mesmo não apaguei", conta.

"Tudo isso aconteceu em aproximadamente três meses. Fiquei deprimido, claro. Passei mais ou menos um ano e meio desempregado, sobrevivendo de freelances", relata.

E foi em um freela desses que ele veio ao Brasil. “Fui enviado ao Brasil para fazer reportagens em São Paulo, Recife, Rio e Minas”, conta.

Após fazer contato com uma baiana por um site de relacionamentos, Manzi veio à Bahia. Depois de dois anos, a relação terminou.

Diagnosticado com depressão, Manzi seguiu as ordens médicas, planejando sua nova investida: retomar a carreira musical.

Folk pop chanson e fé

Senhor Emmanuel, compareça à gerência

Morador de Itapoan, Manzi diz adorar o bairro. "Ah, sim, eu adoro morar na Itapoan de Dorival e Vinicius. Moro em uma pousada desde 2011", conta.

"Vivo de forma discreta. Não bebo, não uso drogas. Só fumo um cigarrinho de vez em quando. Vivo de minhas economias. Tenho depressão crônica, e me trato com o melhor psiquiatra do Brasil, o Dr. William Azevedo Dunningham. Ele me daignosticou como triste de natureza, até pela orfandade, melancólico como muitos poetas", relata.

"Foi o médico que me aconselhou a retomar a música".

Após pesquisar, ele chegou ao Estúdio WR. “Apu Tude, gerente do WR, perguntou se eu queria gravar o disco da minha vida. Respondi que sim. Aí ele chamou um time de músicos espetaculares”, conta.

Entre eles estão nomes como  Ivan Oliveira (arranjos e baixo) e seu irmão, Paulinho (guitarra), Miguel Freitas (bateria), Danny Nascimento (backing vocals) e Fernanda Monteiro (violoncelo).

"Foi legal demais gravar com todos esses músicos maravilhosos, especialmente Ivan, Paulo e Miguel, que foram muito gentis comigo. Eu acho que eles gostaram de verdade da minha música", elogia.

O resultado foi o álbum Sublime, que Manzi quer lançar em algum teatro da cidade e em seguida, leva-lo à Europa.

Louvando Jesus, mas sem carolices ou gritaria, Sublime é um delicado (e sofisticado) manifesto folk / pop / chanson de fé e amor ao próximo, com letras em inglês e francês.

"O mundo vai mal. Penso que estamos no início do fim dos tempos, como descrito na Bíblia. Hoje acredito verdadeiramente nisto. Posso ver pela minha experiência de vida, que todos, homens e mulheres, todos desejam o poder e a riqueza. Todos são egocêntricos. O caminho incondicional para encontrar a paz e o amor é só através do amor a Jesus Christ. Ele deu o exemplo mais maravilhoso de todos, o do amor e compaixão. Ele vai voltar, e aí talvez tenhamos uma verdadeira mudança social com a queda desta sociedade capitalista judaico-cristã", discursa.

"Por isso, desejo cantar Jesus Christ. Por que a coisa que mais gosto na vida é la musique. La musique é a melhor ligação entre o ser humano e Jesus Christ. Você pode rezar, mas cantar Jesus é sublime. Para você entender melhor: nenhum músico com quem gravei, aqui ou na Europa, me perguntou por que canto Jesus. É natural”, conclui Manzi.



NUETAS

Torture Squad hoje

Hoje não tem Quanto Vale o Show? no Dubliner’s, mas por uma ótima razão: a banda paulista Torture Squad está na cidade para lançar seu novo álbum, Return of Evil. Uma das melhores bandas atuais do metal brasileiro, em horário decente e preço idem: 20 horas, R$ 20. No Dubliner’s.

NHL é 10! Dez anos!

Baia volta a Bahia neste domingo. Foto Duda Simões
A produtora / coletivo NHL comemora dez anos de atividades com um super festival, trazendo duas bandas de fora: Bike (SP) e Enema Noise (DF), mais as locais Ivan Motosserra, Ricardo Elétrico e Rosa Idiota. Sábado, no Dubliners, 19 horas, R$ 15.

Baia na Varanda

Um dos compositores brasileiros preferidos da coluna, Maurício Baia volta à Salvador para show de lançamento de seu último álbum, A Fúria Do Mar, no esquema voz e violão. Varanda do SESI, domingo, 17 horas. R$ 35 e  R$ 25 (via baianavaranda@gmail.com).

sexta-feira, agosto 19, 2016

BEN-HUR SÉCULO 21

Estreia: O novo Ben-Hur faz jogada inteligente ao fugir de comparações com o clássico de William Wyler, constituindo peça de entretenimento bem acabada 

Messala (Kebbell) e Ben-Hur (Huston) na corrida de bigas
Antes de qualquer coisa, é bom deixar claro: esta nova versão de Ben-Hur não deve ser comparada de forma alguma ao clássico vencedor de doze Oscars dirigido por William Wyler em 1959.

É outro século, outra tecnologia, outro roteiro, outras intenções, outro estilo de interpretação, enfim: a comparação não faz sentido.

Não a toa, os atores tem declarado à exaustão que não se trata de um remake, e sim, de um filme baseado no livro Ben-Hur: Uma História dos Tempos de Cristo (1880), de Lew Wallace.

Este Ben-Hur se inscreve na categoria de outros filmes de época mais recentes, como Êxodo: Deuses e Reis (2014, de Ridley Scott), Noé (2014, de Darren Aronofsky), ou Pompeia (2014, de Paul W.S. Anderson).

Dirigido por Timur Bekmambetov, um russo de origem cazaque especializado em filmes de ação altamente adrenalizados, como Procurado (2008) e Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros (2012), o Ben-Hur do século 21 tem duas características marcantes: demarca razoavelmente bem a questão política da ocupação romana em Jerusalém na época de Jesus Cristo e, ao contrário do clássico de 1959, faz uma opção  filosófica pelo perdão, ao invés da vingança.

Briga de irmãos

Jesus (Santoro) dá água para Ben-Hur
Na trama, acompanhamos a saga de Judah Ben-Hur (Jack Huston), membro de uma família da nobreza judaica de Jerusalém.

Ele cresceu ao lado do seu irmão adotivo, Messala Severo (Toby Kebbell), de origem romana, povo que invadiu e tomou o poder da cidade.

Crescido, Messala se torna oficial do exército romano. Em campos opostos, Messala condena a família que o criou à escravidão.

Após muito penar, Ben-Hur consegue se libertar e volta à cidade para desafiar o irmão traidor para uma corrida de bigas.

Em suas muitas idas e vindas, Ben-Hur cruza algumas vezes com um certo cabeludo cheio de ideias que provavelmente seria dispensado como “esquerdopata” nas redes sociais de hoje: Jesus Cristo (Rodrigo Santoro, em atuação serena).

Como se pode imaginar, Ben-Hur 2016 é um bom filme de entretenimento, com orçamento de blockbuster – aposta arriscada para o estúdio Paramount, que tem que enfrentar nas bilheterias os filmes de super-herói.

A favor, uma direção equilibrada do russo, que guardou as câmeras alucinadas para duas cenas: a icônica corrida de bigas e a sequência do protagonista escravizado na galera. Toda vista da perspectiva do escravo, ou seja, do porão do navio, esta ficou tão boa que ofuscou as bigas.

O pior do filme é o final. Sem entregar spoiler, a opção pelo perdão poderia ser melhor explorada. Do jeito que ficou, lembra novela global.

Ben-Hur / Dir.: Timur Bekmambetov / Com Jack Huston, Toby Kebbell, Rodrigo Santoro, Morgan Freeman, Nazanin Boniadi / Cinemark, Cinépolis Bela Vista, Cinépolis Shopping Salvador Norte, Espaço Itaú de Cinema - Glauber Rocha, UCI Orient Shopping Barra, UCI Orient Shopping da Bahia, UCI Orient Shopping Paralela / 14 anos

quinta-feira, agosto 18, 2016

ENCAIXOTANDO MARCEL PROUST

Lançamento: Box com os sete romances que compõem Em busca do tempo perdido é nova chance para encarar a olímpica obra

Atire a primeira madeleine quem nunca hesitou diante do esplendor literário de Em busca do tempo perdido, de Marcel Proust (1871-1922).

A mera visão de suas quase 2.500 páginas já fizeram muitos pretensos leitores tremerem em suas polainas – por mais boa vontade que tenham.

Catedral gótica monumental em forma de literatura, a obra definitiva do gênio francês ganha nova chance de apreciação com a chegada às livrarias de uma caixa com os sete romances que a compõem distribuídos em três volumes de capa dura, pelo selo Nova Fronteira, da Ediouro.

O acabamento de luxo é mais do que adequado à classe da obra e marca os 145 anos de nascimento de Proust.

Nesta edição, a tradução é do  poeta e crítico Fernando Py, que também assina um prefácio para cada livro.

No volume um estão No caminho de Swann e À sombra das moças em flor.

O volume dois apresenta O caminho de Guermantes e Sodoma e Gomorra.

E o terceiro fecha com A prisioneira, A fugitiva e O tempo recuperado.

“Proust revolucionou a história da literatura quando escreveu Em busca do tempo perdido, que é hoje considerado ‘o maior romance do século XX’ e até ‘o maior romance de todos os tempos’”, afirma  Ana Carla Sousa, editora de clássicos da Nova Fronteira.

“Seu valor e sua beleza vão se revelando mais impactantes com o passar do tempo. Como disse William C. Carter, especialista em Proust, ‘apesar de ter 100 anos, é uma obra muito moderna. Quem lê sempre reconhece, nos personagens, pessoas do seu convívio ou a si mesmo’”, acrescenta.

Como dito no primeiro parágrafo, suas caudalosas 2 mil e tantas páginas, aliadas à fama de “difícil” ou “denso”, já espantaram muitos possíveis leitores, que provavelmente, seguiram em direção á seção de autoajuda, em busca de inspiração para a futura leitura.

Leitora experiente, Ana Carla aconselha respirar fundo e exercitar o ponto fraco da chamada Geração Y: foco.

“Diria que é preciso repensar o ritmo da leitura, pois a obra exige concentração. Mas é um desafio que sem dúvida nenhuma compensa”, garante.

Um truque para botar o pé no caminho – seja o de Swann ou Guermantes – é escolher livremente um dos sete livros de acordo com a conveniência (leia-se número de páginas) ou interesse temático para iniciar a leitura, já que não há uma ordem cronológica rígida nos romances.

“Como os episódios da obra não foram dispostos em uma ordem cronológica rígida, é possível, sim, ler os volumes fora da ordem”, diz Ana.

O gatilho da memória

Escrito entre 1908 e 1922 e publicado entre 1913 e 1927, Em busca do tempo perdido é a saga do Narrador, como é conhecido o protagonista. Na  verdade, ele se chama Marcel, como o autor. Seu nome só aparece  duas vezes na obra.

Não há quem até hoje resumiu Em busca... e seus muitos temas em poucas palavras. Mas um que certamente é central é a questão da memória.

Daí a madeleine citada no primeiro parágrafo. O tradicional bolinho francês foi eternizado por Proust ao servir como uma espécie de “gatilho de memória” para um personagem, que mergulha em um devaneio involuntário rumo ao próprio passado, ao degustar uma madeleine.

A cena está entranhada no inconsciente coletivo ocidental e já teve referência até no desenho animado Ratatouille (2007), na cena em que um antipático crítico gastronômico é transportado para a infância, ao provar um prato do ratinho chef do filme.

Outro tema marcante é a homossexualidade, pioneiramente investigada por Proust em Sodoma e Gomorra.

“Ele aborda a homossexualidade abertamente, gerando polêmica numa época em que o assunto ainda era um tabu. Essa abordagem, no entanto, precisa ser relativizada, pois a obra foi escrita em um contexto social bem diferente, mas é inegável a importância que ela teve ao tratar do assunto de forma tão direta e explícita”, observa Ana.

Nesta edição, Fernando Py ficou a cargo da olímpica tarefa da tradução, sucedendo gigantes como  Mário Quintana, Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade.

“Mas não há dúvida de que é uma aventura intelectual largamente compensadora, um trabalho altamente gratificante. Desde que se adotem critérios seguros e sejam obedecidas o mais fielmente possível as peculiaridades essenciais do autor”, afirma Py.

“No caso, a fluência musical da frase, a por vezes enorme extensão desta e dos parágrafos, sem dividi-los em blocos retalhados, o movimento ondulatório dos períodos etc. E mais, tratando-se de uma edição brasileira, construir frases e períodos à nossa maneira, sem lusitanismos nem regionalismos de qualquer espécie”, conclui o tradutor.

Em busca do tempo perdido / Marcel Proust / Tradução:  Fernando Py / Nova Fronteira / 752 p. (vol. 1), 888 (vol. 2) e 832 (vol. 3) / R$ 189,90

terça-feira, agosto 16, 2016

100% INDEPENDENTE, FESTIVAL SOTEROROCK MOBILIZA 26 BANDAS E TRÊS CASAS DE SHOW

Sério Moraes, Shinna e Kall Moraes, organizadores. Faltou Léo Cima
Quem faz o rock de Salvador não são as rádios, nem a  TV, nem os jornais.

Quem faz o rock de Salvador não é sequer o público.

Quem faz o rock de Salvador é o rock de Salvador.

A primeira edição do Festival Soterorock apenas confirma isto.

Organizado por membros de bandas e do site Soterorock (www.soterorock.com), o festival terá sete dias de apresentações em três diferentes casas de shows, começando  sexta-feira, no Taverna Music Bar, com Os Jonsóns, Game Over Riverside, Invena e Jato Invisível.

Daí, até o fim de setembro, haverá mais seis datas, envolvendo uma pá de bandas do cenário (boa parte já vista na coluna) e mais duas casas: The Other Place (Brotas) e Bukowski Porão Bar (Pelourinho).

Vai ter Vandex, Duda Spínola, Ronco, Declinium, Pancreas, Theatro de Seraphin, Rivermann e muitas outras.

“(O festival) É uma forma de integrar a cena e também de avisar: o rock tá vivo”, afirma Shinna, líder da banda Pancreas e um dos organizadores, ao lado de Sérgio Moraes, Léo Cima e Kall Moraes, responsáveis pelo site Soterorock.

Shinna conta que a ideia do festival surgiu durante conversas em um grupo de WhatsApp reunindo membros do site e de bandas locais.

"O site www.soterorock.com está no ar há 10 anos e sempre se atualiza nas ferramentas de comunicação. Então, um dos comandantes do site, Sérgio Moraes, criou um grupo no WhatsApp só com músicos que ele conhece. Alguns também foram 'promovidos' a administradores desse grupo e aí cada um chamou mais amigos. Um esquema bem 'pirâmide'. Muita conversa rolou, sempre sobre rock e sobre a cena baiana, claro", conta.

A Ronco toca no Other Place dia 02.09
“Num dado momento, Sérgio falou que estava pensando em montar o Soterorock Festival de novo. Todos se animaram e as ideias começaram a surgir. Só que,parece uma regra na cena baiana, de falar muito e pouco fazer quando se fala em GRUPO! Daí, Sérgio resolveu falar comigo em separado e eu passei minhas ideias. Ele e os outros comandantes do Soterorock, Léo Cima e Kall Moraes, gostaram das ideias e, lógico, as complementaram. Nesse momento, nos tornamos os 4 pilares da organização do festival. Nas nossas cabeças, teríamos que buscar um diferencial, que seria justamente a total independência. Tudo teria que ser feito pelas bandas”, relata.

Sem caciques

Não houve curadoria. Os organizadores definiram um prazo de inscrição. Quem o cumpriu, foi incluído.

“Lançamos a proposta no grupo e dissemos que no período de uma semana, todas as bandas que mandassem e-mail querendo participar, participariam! Foram 26 bandas que mandaram e-mail nesse período e mais 20 que mandaram depois. Todos que cumpriram o prazo foram contemplados”, conta.

"Em relação às casas de shows, buscamos também descentralizar a cena, ou pelo menos plantar uma semente dessa ideia. Começamos no Rio Vermelho (Taverna), vamos pra Brotas (The Other Place), depois pro Pelourinho (Buk Porão) e voltamos pra Brotas", acrescenta Shinna.

Na lista, há bandas de Catu, Camaçari, Alagoinhas, Serrinha, Feira e Lauro de Freitas.

“Essas bandas estão aí para mostrar que realmente somos independentes, que não precisamos seguir ‘cartilhas’ ou ‘mendigar’ apoio. Somos fortes! A tal da união que um monte de gente fala que não tem, existe. E nós vamos provar isso. Haverá  encontros incríveis de bandas renomadas, haverá músico prestigiando músico, haverá dono da casa de show vendendo bastante, haverá pluralidade geral nesse festival! É isso tudo, sem caciques, sem donos da verdade! Tudo feito pelas bandas”, conclui Shinna.

Festival Soterorock / Até o fim de setembro, 20 horas / Taverna Music  Bar,  The Other Place e Buk Porão / R$ 10 (por dia) / Programe-se: www.soterorock.com 

NUETAS

Grantz com SuRRmenage

As bandas Grantz e SuRRmenage são as atrações do Quanto Vale o Show? de hoje. Dubliners Irish Pub, 19 horas, pague quanto quiser.

Tarde Vazia NHL

Sábado (20), o evento Tarde Vazia NHL bota as bandas Soft Porn, Aurata, Peito de Planta e Bagum no palco do  Oliveira’s (Rua Direita de Santo Antônio, 110). 16h20, R$ 5. Instrumental, pós-rock, eletrônica e free jazz, tudo quase na fita.

Matanza no sábado

A banda carioca Matanza traz o show do álbum Pior Cenário Possível (2015) para o Salvador Music Place (Rua Manoel Antonio Galvão, 1075, Pituaçu). Sábado, 21 horas. Ingressos no Sympla: R$ 100  (mais R$ 10 de taxa) e R$ 50 (mais R$ 5 de taxa).

sábado, agosto 13, 2016

SPACE OPERA PREMIADA

HQ: Saga, a aclamada epopeia espacial de Brian K. Vaughan e Fiona Staples, lança segundo volume e segunda edição do primeiro. Entenda o sucesso da obra, que mistura FC, política, temas familiares, sexo e violência

Um dos segredos para o sucesso de uma ficção popular, seja cinema, HQ ou literatura, é saber embalar bem o seu produto com uma aura de novidade, mesmo que, por baixo dela, exista toda uma estrutura familiar, tornando esta ficção nova e antiga ao mesmo tempo. Reconhecível, porém excitante. Saga, a premiada HQ de Brian K. Vaughan e Fiona Staples, é um exemplo bem claro do êxito dessa estratégia, quando bem aplicada.

Com o segundo volume em capa dura chegando às livrarias, a Devir aproveita e lança uma segunda edição do primeiro, atendendo a demanda dos leitores que o perderam na ocasião do lançamento, em 2015. Lendo os dois volumes juntos, fica fácil entender por que a HQ se tornou um dos destaques da indústria desde 2012, quando saiu pela primeira vez nos EUA e ganhou uma montanha de prêmios Eisner, Harvey e Hugo, em diversas categorias.

Saga é um bem preparado cozidão, feito com um monte de ingredientes saborosos e largamente apreciados da cultura pop ocidental, que vai de Romeu & Julieta a Star Wars, passando por Flash Gordon, Bonnie & Clyde, Guerra dos Tronos, Senhor dos Aneis, ficção pulp, sitcoms e desenhos animados da Hanna-Barbera.

Na trama, acompanhamos a epopeia vivida pelo casal Marko e Alana. Quando os encontramos pela primeira vez, Alana está dando à luz o bebê dos dois, Hazel, que aliás, é a narradora da história.

Até aí tudo bem, não fossem Alana e Marko soldados de lados opostos em uma guerra entre Aterro, o planeta de Alana, e Grinalda, lua de Aterro e lar de Marko.

Logo após o parto clandestino de Hazel em uma oficina mecânica do planeta Fenda, um dos muitos que acabaram envolvidos na guerra, a família é atacada por agentes de Aterro em busca da desertora Alana, mas consegue fugir.

A partir daí, a HQ se desenvolve basicamente em duas frentes: a fuga alucinada de Marko, Alana e Hazel, e a busca dos seus perseguidores, a mando dos manda-chuvas de Aterro, que querem botar as mãos na criança de qualquer jeito, por razões ainda não bem explicadas.

Do lado da estranha família – Alana tem asas de inseto, Marko tem chifres e Hazel, ambas as características – o leitor acompanhará todos os monstros, seres estranhos, lugares esquisitos e eventos misteriosos que eles encontrarão pelo caminho.

Do lado dos seus algozes, acompanhamos personagens muito interessantes como o Príncipe Robô IV, que usa trajes militares do século XIX e tem uma televisão no lugar da cabeça – e os mercenários que ele contratra para perseguir o casal fugitivo.

Um deles se chama O Querer, e ele é rápido, mortal, silencioso e meio amargurado. Ah, O Querer anda acompanhado de uma gata Sphynx (aquela raça sem pelos) do tamanho de um tigre, que detecta mentiras. Toda vez que alguém mente perto dela, ela mia "Mentira" – a versão em inglês, "Lying", soa mais como um miado.

Há uma outra mercenária, chamada A Espreita, que é basicamente uma aranha humana com direito a oito olhos e igual número de braços – cada um segurando uma arma diferente. Ela e O Querer tiveram um relacionamento que não deu muito certo para ele – o que explica um pouco o estilo meio depressivo do rapaz.

Tudo isso seria apenas mais do mesmo para fãs de fantasia e ficção científica se não viesse embalado pela característica comum à dos melhores trabalhos de Brian K. Vaughan, como Y: O Último Homem, Ex-Machina ou Os Fugitivos: apesar de toda a bizarrice, Saga é uma HQ extremamente humana, calorosa e bem-humorada.

Descontados os detalhes caros à trama, os diálogos de Alana e Marko poderiam ser travados por qualquer jovem casal terráqueo com uma filha recém-nascida. Ele reclama das fraldas sujas de Hazel. Ela tem ciúmes de uma antiga namorada dele e por aí vai. Esses diálogos, tanto entre o casal protagonista quanto entre os seus perseguidores, em nada devem aos de uma boa série de TV moderna, com direito a chistes, tiradas e reflexões.

Por falar em moderno, Alana é com certeza uma personagem feminina adequada ao nosso tempo: forte e desbocada, a morena de cabelo verde e asas não leva desaforo pra casa e bota Marko na linha o tempo todo. Alana diz a que veio já na sua primeira fala, durante o parto: "Eu estou cagando? É a sensação que eu tenho", dispara, entre dentes cerrados e pingando suor.

Conjugando temas como família, guerra, política e sexo, Saga é uma HQ adulta como poucas: tanto no texto, quanto na arte de Fiona Staples, que apesar de deslumbrante, limpa e muito criativa, não se furta a mostrar de forma explícita decapitações, desmembramentos e sexo.

Por fim, que ninguém espere ver Saga adaptada em um filme blockbuster ou série badalada de TV: Brian K. Vaughan já avisou que a criou especificamente para os quadrinhos e as possibilidades épicas (e ultrajantes) que só essa mídia pode proporcionar.

De fato, Saga é forte demais – e "família" de menos – para Hollywood. Ainda bem.

Saga Volume 1 / Brian K. Vaughan (roteiro) e Fiona Staples (desenhos) / Devir / 168 páginas / R$ 65

Saga Volume 2 / Brian K. Vaughan e Fiona Staples / Devir / 152 páginas / R$ 65

quinta-feira, agosto 11, 2016

IÊ IÊ IÊ BAIANO APROFUNDADO

O livro A Jovem Guarda na Bahia, pesquisa de Zezão Castro, tem lançamento hoje, na Tropos, com show da banda Ivan Motosserra

Raulzito & Os Panteras
O rock baiano é quase tão antigo quanto o rock ‘n’ roll.

Irmã Dulce foi uma de suas principais incentivadoras.

Salvador teve uma febre de bandas de rock nos anos 1960.

Esses e outros fatos pouco lembrados estão no livro A Jovem Guarda na Bahia, do jornalista e mestre em Cultura e Sociedade pela Ufba, Zezão Castro.

Editado pela Assembleia Legislativa do Estado da Bahia, o livro tem noite de autógrafos hoje, na Tropos, com pocket-show da banda de surf music instrumental Ivan Motosserra.

Fã de Elvis Presley na infância, Zezão começou a pesquisar o assunto há cerca de vinte anos, quando descobriu que o padrasto de sua então esposa era pai do guitarrista Luciano Souza.

“Junto com o irmão Ricardo, mais os irmãos Pepeu  e Jorginho Gomes, eles tinham um grupo em 1966, chamado Os Príncipes do Yé Yé Yé, depois Os Minos”, conta.

“Comecei a pesquisá-o enquanto era repórter de A TARDE, ocasião em que fiz matérias sobre o assunto e comecei a colher dados. Era um assunto praticamente virgem em termos literários. Antes que algum aventureiro chegasse, eu disse ‘A Jovem Guarda Baiana é minha’”, ri o pesquisador.

Fruto de sua dissertação de mestrado, o livro, em certos trechos, pode ficar meio duro para quem não está familiarizado com as pesquisas de identidade cultural de autores como Stuart Hall, por exemplo.

O autor diz que aliviou até demais: “Algo foi feito neste sentido de torná-lo menos acadêmico, mais suave. Acontece que não quis fazer concessões demais. O mundo já tá ralo demais”, afirma.

Mesmo assim, o livro pode ser lido sem grandes dificuldades para qualquer um que tenha interesse no assunto – e mais: redimensiona o fenômeno do rock na Bahia, que foi muito maior e mais abrangente do que se pode pensar.

“É uma pesquisa de fôlego, não para enclausurar, mas para abrir a discussão. Foi quase uma década de pesquisa. Pra quem disser que, na Bahia, só Raul, Big Ben & Cia faziam rock, tem aí uns 70 nomes de artistas locais. Tenho um indisfarçável orgulho de ter compilado esta singela lista”, diz.

Lançamento: hoje, 20 horas / Com Ivan Motosserra / Tropos (Rua Ilhéus, 214, Rio Vermelho) / gratuito

A Jovem Guarda na Bahia / Zezão Castro / Assembleia Legislativa do Estado da Bahia / 172 p. / Distribuição gratuita

ENTREVISTA COMPLETA: ZEZÃO CASTRO

Seu livro preenche uma lacuna importante na historiografia cultural da Bahia, especialmente para aqueles que renegam o rock enquanto expressão significativa da cultura baiana. O que te moveu na direção deste assunto e deste período em questão?

José Carlos Castro Jr., o Zezão
Zezão Castro: Quando eu era guri, com uns 12 anos, caiu em minha mão um disco de Raul chamado Raul Seixas – 20 Anos de rock, onde ela cantava clássicos do rock 50 (Blue Suede Shoes, Rock Around the Clock, Tutti Frutti) outros da pré-Jovem Guarda (Rua Augusta, Estúpido Cupido, Marcianita) e ainda algumas músicas da própria Jovem Guarda (O Bom, Vem Quente que Eu Estou Fervendo). Nesse ínterim, eu descubro que o cara é baiano. Um Elvis brasileiro! E, melhor, baiano!! Eu adorava este disco, que era do meu irmão mais velho e eu adorava o clima dos nos 50, topete, jaqueta preta, Elvis na Sessão da Tarde e também um disco com a trilha da novela Estúpido Cupido, com o filé do rock 50 nacional. Pouco tempo depois o carimbador maluco morre. A obra de Raul é relançada e muitas pessoas começam a falar que ele tinha uma banda chamada Raulzito e Seus Panteras (depois Raulzito e os Panteras) aqui em Salvador. A partir de sua morte, emerge então a ponta do iceberg de um mundo alagado pelo dendê e pela manemolência: a Jovem Guarda baiana, o rock baiano dos anos 60. Fiquei curioso sobre o assunto. Quando vim para Salvador, casei-me com uma moça e o padrasto dela era o pai de Luciano Souza, que, junto com o irmão Ricardo mais os irmãos Pepeu Gomes e Jorginho Gomes, tinham um grupo em 1966 chamado Os Príncipes do Yé Yé Yé (depois Os Minos). Ouvia o coria falar falar que o filho era um gênio e,quando o vi tocar em 1995 na Jam do Mam confirmei. Isto só pra você ver que o assunto foi meio que se achegando até mim. Comecei a pesquisá-o enquanto era repórter de A Tarde, ocasião em que fiz matérias sobre este assunto e comecei a colher dados. Era um assunto praticamente virgem em termos literários. Antes que algum aventureiro chegasse eu disse A Jovem Guarda Baiana é minha (rs). Nossa.

Sabemos que seu livro é fruto de uma tese de mestrado, daí seu perfil, em diversos trechos, de estudo social e identitário. Ao publica-lo para o grande público, você não considerou "suavizar" esta parte, para torna-lo mais palatável ao leitor médio sem nível universitário?

ZC: Algo foi feito neste sentido de torná-lo menos acadêmico, mais suave, como você sugere. Acontece que não quis fazer concessões demais. O mundo já tá ralo demais. Além disso, o google ta aí. Não conhece a palavra não? Joga no oráculo, descubra o significado e siga em frente. Foi um exercício enorme, entretanto, tratar do assunto sob este viés academicista. Quando me apropriei do conceito de “folclore mundial” ou “imaginário internacional-popular” (Renato Ortiz) comecei a desfiar “a coisa”, juntando com os conceitos de identidades de Stuart Hall, sugerindo novos conceitos de identidade, mais desarraigados do iluminismo e de outras correntes. Uma pessoa da Finlândia pode ser mais parecida com você (com o seu gosto, suas roupas, seus discos ou as suas atitudes) do que o seu vizinho soteropolitano, pitubano. Fiz uma pesquisa de fôlego nas colunas de cultura da época entre 65 e 68 em Salvador,( mesmo período em que o programa Jovem Guarda foi veiculado e foram descobertas interessantes sobre festivais , prêmios , a invasão da Jovem Guarda nos cadernos de cultura locais . Teve gente que matou a noiva porque a mesma usou minissaia, o rock como caso de polícia. Pire aí...

Uma das informações mais divertidas do seu livro (citada do livro Anjo Bom da Bahia)  é que Irmã Dulce foi praticamente uma padroeira do rock local. 

ZC: O rock chega, enquanto evento massivo, quando Ao Balanço das Horas, de Fred Sears, entra em cartaz em Salvador em fevereiro de 1957 nos cines Guarany e Tupi. Quando Waldir Serrão, depois Big Ben, e seus comparsas quiseram fazer os festivais de rock do Cinema Roma, na Cidade Baixa, já nos anos 60, precisavam do aval de Irmã Dulce, que era o coração, e do Frei Hidelbrando Kruthaup, mais cerebral. Ambos eram do Círculo Operário, uma espécie de associação que congregava os operários daquelas fábricas da Cidade Baixa. Então, Waldir, filho de Seo Edmundo, que era circulista pediu a irmã Dulce e ela liberou. O Frei, claro, sacando que rolava bilheteria, cobrava a ponta dele pois bestas não entram no céu e as Obras Sociais precisavam de fôlego. Os shows aconteciam, preferencialmente, em horários em que não havia filmes em cartaz, pra não atrapalhar a grana certa das bilheterias cinematográficas. Geralmente de manhã. Outros espaços também se consolidaram como o Ginásio Balbibinho, a Fonte Nova, onde as estrelas andavam num trio em constante movimento pelo espaço e, depois, na Concha e nos clubes sociais”. Uma febre.

Fatos como este e os muitos artistas da época parecem simplesmente desaparecer da historiografia oficial baiana - ironicamente, agora resgatados em um livro publicado por uma editora oficial. Por que você acha que isto acontece? O baiano não tem memória ou só a tem para o que interessa no momento?

ZC: A maioria dos textos sobre a música produzida na Bahia paga pau pro dendê ou pro samba, a chamada música genuína ou de raízes. A Jovem Guarda baiana sempre foi refugo, nem apêndice da Tropicália ela foi. Se Raul fosse vivo ela, provavelmente, ainda estaria no baú. O mais interessante nesta pesquisa foi descobrir que aqui na Bahia, em 1966, tinha um guri de 9 anos que tocava com a guitarra nas costas, Luciano Souza, recentemente falecido, e que o mesmo também tocava também com os pés. Tudo isto antecede Jimi Hendrix que só emerge no Brasil a partir do Festival de Woodstock, em 1969. Além disso, artistas da música reconhecidos em todo o Brasil começaram no rock n roll sessentista da Bahia: Pepeu e Jorginho Gomes eram dOs Príncipes do Yé, Yé, Yé; Armandinho e Betinho Macêdo eram Hell´s Angels, Gereba e Vicente Barreto pertenciam aOs Deuses (de Serrinha) , Wadinho Marques, do Chiclete com Banana, integrava Os Eletrons, Wilson Aragão pertencia a Os Feios (de Piritiba). Havia também uma banda só de mulheres chamava-se As Gatinhas Manhosas, de Itapetinga. Tem também o José Roberto, que teve um relativo sucesso no time b da Jovem Guarda nacional. E ainda Lenici e Soninha, nossas wanderléas. Tentei achar estas duas para entrevistá-las (e ainda tento) mas não consegui contato. Tinha também um primo do Ronnie Von que morava em Salvador, o Peter Ron. A mãe do Ronnie Von era baiana, assim como o pai do Erasmo, que era delegado. A Bahia tá em (quase) todas. A memória do baiano, assim com a dos outros gentílicos, se não for alimentada, some. A historiografia oficial precisa sair da prateleira, precisa ser promovida. Acho que a Internet já fura um pouco esse lacre. Um passo dado para amortizar este débito foi a sensibilização, por parte da Assembléia Legislativa e da sua assessoria de cultura, sobre esta publicação, originalmente oriunda de mestrado em Comunicação e Sociedade.

É notório no rock local o desconhecimento que uma geração tem das anteriores. É assim desde os anos 80, cuja geração desprezava a dos anos 70. Já a dos 80 foi desprezada pelos dos 90, que por sua vez foi desprezada pela dos anos 2000. Seu livro, que resgata a gênese de todo esse movimento, poderia ajudar essa galera a entender que ninguém está sozinho nessa, que há um legado a honrar. Seria essa maior contribuição do seu livro ao rock local? Como você vê essa questão?

ZC: Todo movimento “novo” surge com a intenção de negar o anterior, de ser melhor ou mais revolucionário, de alguma forma. De fazer o seu e fuck off pro antecessor, até um certo ponto. O arcadismo nega o barroco, pregando a simplicidade bucólica em lugar de conflitos e por aí vai. Da mesma forma os novos modismos musicais surgem, às vezes incorporando o velho, às vezes se opondo radicalmente. Há também tem horas em que, se chega numa radicalização tão grande que a subversão volta ao simples, Nescau com bolacha. Sacou? A juventude não sabe do que rolou no rock 60 porque não dá Ibope mostrar e porque é dela, inicialmente, afastar tudo que “é do tempo do meu pai” ou “do btempo de minha vó” e porque as construçõea culturais a acerca da Bahia ou da “baianidade” privilegia no que nos diferenciamos e não no que nos iguala. Há tabém o velho choque de gerações até rolar um amadurecimento estético e as pessoas descobrem que Chiquinha Gonzaga ou Leadbelly ou Gordurinha tem algo a dizer, independente do período. Hoje em dia predomina a cultura do hype. Um filme aparece onde o personagem, um tipo Cult, adora, vamos dizer, Leonard Cohen ou, pra ficar por aqui, o Made in Brazil. No outro dia o camaradinha baixa 18 terabaites (sic) dessa galera e diz: “tenho tudo, de Leonard Cohen” ou posta no facebook que a melhor banda da vida é o Made in Brazil. Tudo bem, democracia e tal mas... me bata uma abacatada, please. Para quem quiser saber de onde viemos, no rock baiano taí uma pesquisa de fôlego, não para enclausurar mas para abrir a a discussão. Foi quase uma década de pesquisa. Pra quem disser disser que, na Bahia, só Raul, Big Bem & Cia faziam rock nos anos 60 tem aí uns 70 nomes de artistas locais. Tenho um indisfarçável orgulho de ter compilado esta singela lista.

Uma questão muito presente no seu livro é a patrulha ideológica da época, que taxava roqueiros de "alienados" e "entreguistas". Agora vivemos novamente uma polarização política que remete muito àquele tempo. Essa tensão da época TVV vs. Cine Roma chegou às vias de fato em algum momento? O que ela nos diz sobre o que acontece hoje?

Raulzito & Panteras com Roberto Carlos
ZC: Não encontrei nenhuma notícia que desse conta de que bossanovistas e roqueiros tivessem saído no pau. Se Raul era fã de Elvis, Carleba o baterista de seu grupo era fã de Edson Machado, para muitos o melhor baterista da chamada afro-bossa. Não creio que houvesse espancamento como nos encontros entre punks e os carecas na Salvador dos anos 80 ou entre os carecas e os metaleiros. Os colunistas de cultura sim, num primeiro momento, antes de Roberto Carlos ser coroado, batiam, sem pena. Para se ter uma ideia, Sylvio Lamenha da coluna Hi So, do Diário de Notícias em 27/10/66 dizia “É mais um vigarista a nos atormentar musicalmente o tal de Ronnie Jan, ou Ronnie Von ou Ronnie Jan, ou que diabo for”. O baiano Waldick Soriano, em matéria entitulada “Cantor popular condena iê-iê- iê” no Jornal da Bahia em 1967 dizia ”Na maioria das vezes ocorre que os compositores de iêíê´`e nunca botam uma letra que preste. Ficam assim composições sem poema e sem valor artístico”. Havia um bombardeio, principalmente 65,66 nos jornais. Nas ruas, nem preciso falar. Se até hoje cabeludo é chamado de viado, imagine naquele tempo.

Que artistas da época pesquisada você diria que merecem ser definitivamente resgatados do limbo a que foram relegados pela indústria cultural local? Você tem planos de resgatar a produção fonográfica do período, ou mesmo homenageá-los de alguma forma?

ZC: Resgate por resgate eu acho que todos deveriam ser resgatados. O assunto desperta curiosidade e prazer em muitas pessoas que estudam a cultura pop e suas representações em nosso solo ou que estavam lá tomando seu crush, sua fratelli. O problema é que quase ninguém gravou rock na Bahia nos anos 60. Só havia um selo aqui, o lendário JS Discos. E não há arquivo. Pelo menos até agora.. Pode ser que alguém nos leia e algo aconteça. Só quem gravou foram Raulzito e Seus Panteras, Os Minos, Thildo Gama e Seus Bossas, todos no eixo Sudeste, e os Trogloditas, de Feira de Santana pelo JS  já em 1969. Cheguei a iniciar uma pesquisa sobre direitos autorais para montar algo mas tive que parar e estou retomando agora.

Como você vê o fenômeno do rock local - como um todo? Sua resiliência e vigor artístico, que até hoje não entregou os pontos, não importa a moda do momento?

ZC: Penso que, desde Dodô e Osmar, eletricidade por aqui nunca assustou ninguém. Ao contrário. O rock local, em parte, copia as tendências mundiais, nacionais, em seus vários subestilos e, em parte faz uma fusão com algo daqui, nativo. A fórmula é velha, os resultados geram produtos novos, muitos desagradáveis, alguns muito bons. Gosto de rock com pegada rockabilly, psicobilly, ou anos 60, 70, o chamado rock clássico. O mercado de rock é hoje consolidado. Tem 60 anos. Não desaparecerá, penso eu. O Camisa de Vênus, pra mim, foi o maior soco no estômago da pasmaceira musical. Escatológicos. Pitty esta aí em uma carreira exitosa, representando a Bahia. O rock representa um estilo de vida, mesmo sendo cooptado pelas propagandas ou pelas marcas de surfwear. Tem axezeiro por aí com farda de roqueiro, eu tô ligado. Pagando pra tocar suas lenga-lengas nas rádios. Mas é assim mesmo. De olho neles tem os ´orêa seca’ que sabem que rock é rock. E vice-versa.

quarta-feira, agosto 10, 2016

DOIS EM UM SAI DE CENA EM ALTO ESTILO

Duo baiano faz quatro shows na CAIXA Cultural para lançar DVD gravado pela Natura Musical e se despedir do público

O Dois Em Um ao cair da tarde no Museu WP. Foto Mayra Lins
Gravado à beira da Baía de Todos os Santos em uma tarde mágica de setembro do ano passado, o DVD Dois Em Um Ao Vivo no Museu do Recôncavo Wanderley Pinho (Natura Musical) tem shows de lançamento em Salvador em quatro sessões, de amanhã até domingo, na CAIXA Cultural.

No palco, o duo formado por Luisão Pereira (guitarra, voz e programações) e Fernanda Monteiro (voz e violoncelo) atuará em formato reduzido, sem contar com a numerosa banda que a acompanhou nas gravações – exceção feita ao  pernambucano Zé Manoel.

“Pois é, só tem fera (no DVD). Felipe (Dieder, bateria), Tadeu (Mascarenhas, baixo) e Livia (Nery, teclados) fizeram todos os shows da turnê do DVD da Natura. Fizemos São Paulo, Belo Horizonte e Rio de janeiro , que foi o último e foi incrível”, conta Luisão.

“Mas, neste show da CAIXA Cultural, a gente resolveu fazer um formato e conceito diferentes. Seremos eu e Fernanda, como no início da banda, mais Zé Manoel junto com a gente quase que o show inteiro. Tá muito especial”, diz.

Na CAIXA, Luisão, Fernanda e Zé desfiarão o repertório do DVD, todo de autoria do Dois Em Um: “Todas as canções são dos dois discos que lançamos: Dois Em Um (2009) e Agora (2013). Foi bem difícil (selecionar o repertório), pois queríamos fazer um DVD enxuto, mas que representasse bem a essência da banda”, afirma.

Fim de um ciclo

Com o convidado no DVD e nos shows Zé Manoel (último à dir.)
A má notícia é que este shows, muito provavelmente, serão os últimos da Dois Em Um, um dos projetos musicais mais bonitos surgidos na Bahia nos últimos dez anos.

“Eu e Fernanda temos conversado bastante sobre isto. Nossas vidas fecharam um ciclo e a gente acha que o Dois Em Um também fechou o dele”, afirma Luisão.

“Mas sempre entramos em estúdio, como nestes dias em que estamos ensaiando, sentimos que as músicas tomaram vida própria, como um filho que cresceu, aprendeu a andar e a gente não tem mais tanto controle dos seus passos, caminhos e escolhas. Apenas um orgulho danado daquilo que criamos”, observa.

Ainda assim, até segunda ordem, o  show de domingo é mesmo o último do duo: “Realmente, neste momento, não sabemos responder se ainda faremos mais shows”, diz.

A boa notícia é que o legado deixado pela banda é mais do que positivo: dois álbuns e um DVD bonitos de doer, de dar orgulho a todos que ainda valorizam a beleza na Bahia.

O DVD é, desde já, um dos mais originais lançados no Brasil: gravado em um cenário deslumbrante, aproveitando a luz natural do Museu do Recôncavo Wanderley Pinho.

“A direção de arte de Mayra Lins é uma coisa primorosa. Ela sempre entendeu a vibe do dois em um (é dela a capa do segundo disco) e dai quando ela nos mostrou a foto do local, parecia que ela tinha lido o nosso imaginário. ​O local é incrível. Deu muito trabalho, pois tivemos que levar caminhão de equipamentos e também gerador de energia, pois o lugar estava deserto. Mas o cenário é todo de lá, as conchas que ambientam, as folhas, tudo”, conta.

Luisão e Fernanda: fim de um ciclo na vida e na música
“A equipe toda foi maravilhosa e a captação tanto das imagens quanto do som ficou incrível. conseguimos captar ate os grilos, pássaros e toda fauna daquele lugar. Foi realmente mágico. Todos estavam trabalhando encantados. ​(A locação) É a cara do Dois Em Um e Mayra sabia disto. (O artista plástico) Joãozito levou ela e Gilberto (Monte, produtor executivo) lá, daí eles ficaram encantados, tiraram fotos e foram nos mostrar. A mata atlântica, uma casa e o mar. Era o dois em um em forma de lugar.​ E ter ganho o edital do Natura Musical proporcionou pra gente toda estrutura e condição pra gravar lá naquele lugar mágico. Foi realmente incrível”, observa.

Concluída esta fase do Dois Em Um, o músico parte para tocar seus projetos pessoais.

"​Estou sempre produzindo, compondo e gravando... Tenho reunido um monte de parceiros novos e experimentado coisas. Me arrisquei até como baixista, fiz shows com Zé Manuel e até gravei o MultiShow com ele. Neste mês, estou envolvido com a direção musical do projeto de Acervo e Memória do meu tio Ederaldo Gentil, finalizando o primeiro disco aos sessenta anos do meu irmão mais velho, Tatau Pereira, que é um compositor e cantor genial, fazendo uma trilha pra um diretor na Inglaterra e ainda tem rolado um tempinho pr'eu compor coisas pra um disco solo que estou pensando gravar em 2017", conclui Luisão.

Circuito Música Bahia: Dois em Um / De amanhã a domingo, às  20h e  19 horas (domingo) / CAIXA Cultural Salvador (Rua Carlos Gomes, 57) / R$ 10 e R$ 5 / Informações: (71) 3421-4200 / Estacionamento gratuito ao lado

Dois Em Um Ao Vivo no Museu do Recôncavo Wanderley Pinho / Dois em Um / Natura Musical / Preço não informado

ENTERPRISE SEGUE EM VELOCIDADE DE DOBRA

Já nas telas dos Estados Unidos, Star Trek: Sem Fronteiras, teve sessão para jornalistas em São Paulo. A TARDE esteve lá e conta o que viu. A estreia no Brasil é dia 1º de setembro

Scotty, a aliada de ocasião Jailah e Kirk: constrangimento na cadeira do capitão
Em uma friorenta manhã de quarta-feira em São Paulo, o multiplex do Shopping Iguatemi JK foi invadido por uma verdadeira horda de jornalistas, blogueiros, trekkies (fãs novatos) e trekkers (fãs veteranos) vestidos a caráter.

Era a pré-estreia do novo filme da série Star Trek: Sem Fronteiras, que teve uma exibição especial, com direito a pipoca e refrigerante grátis para os convidados.

A exibição (ou screening, no jargão do meio) foi mesmo de gala, no telão IMAX e em 3D, tudo para aumentar a sensação de imersão no filme.

Na saída, ação promocional da Editora Aleph, especializada em ficção científica, distribuiu exemplares do livro Star Trek: Portal do Tempo, de A. C. Crispin, o primeiro da franquia que a Aleph publica.

Rumo à estação espacial

Krall (Idris Elba) levanta o Dr. McCoy pelo pescoço
Já nas telas dos Estados Unidos, Star Trek: Sem Fronteiras, que só chega aos cinemas brasileiros no dia 1º de setembro, tem angariado ótimas críticas na imprensa internacional.

Este é o terceiro filme desde o bem-sucedido reboot da franquia pelas mãos de JJ Abrams, em 2009.

Com a debandada de Abrams para comandar a badalada nova sequência de Star Wars, a direção ficou a cargo do taiwanês Justin Lin, famoso por ter comandado quatro filmes da série Velozes & Furiosos.

Quando Sem Fronteiras começa, vemos o Capitão Kirk (Chris Pine) em missão diplomática junto a um povo alienígena, representando uma outra raça com a qual este povo tem diferenças.

A missão não dá muito certo e Kirk retorna a nave com um certo presente que a raça que pedia paz oferecia ao povo beligerante.

A Enterprise segue então para Yorktown, uma gigantesca estação espacial da Federação dos Planetas Unidos, onde a tripulação deve descansar e Kirk, se reportar à sua oficial superior.

Os problemas começam quando a estação recebe um pedido de socorro de um módulo de fuga e a Enterprise é despachada para interceptá-lo.

Encurtando a história: a Enterprise é ferozmente atacada por um enxame de naves minúsculas e a tripulação é obrigada a abandona-la nos seus próprios módulos, caindo em um planeta selvático.

Com o desenvolvimento da trama, o espectador fica sabendo quem está por trás do ataque, por que ataca e qual sua relação com o presente mencionado anteriormente.

McCoy, Spock e Scott

O Doutor McCoy de Karl Urban é um destaque do filme, com ótimos momentos
Apesar de cumprir com louvor a missão de manter a franquia em alta – especialmente com os fãs –, Star Trek: Sem Fronteiras tem algo em seu cerne que lembra o filme anterior, Além da Escuridão (2013) – e também o mundo hoje: o inimigo é um terrorista, disposto a matar o maior número possível de inocentes.

O tom, felizmente, é um pouco mais leve do que em Além da Escuridão, chegando a lembrar, em alguns momentos, a série original dos anos 1960, com muita interação e tiradas humorísticas entre os carismáticos personagens.

Três deles merecem destaque. O Dr. Leonard McCoy (Karl Urban) tem seus melhores momentos de heroísmo nesta série, fazendo uma boa dupla com Spock no planeta em que caem juntos.

A dupla vira trio quando eles encontram a invocada Jailah (Sofia Boutella), uma guerreira local com a qual se aliam.

Spock, cada vez melhor na pele de Zachary Quinto, não brilha tanto quanto em filmes anteriores, mas também tem ótimos momentos em relação à sua pretendente, Nyota Uhura (Zoë Saldaña) e os sentimentos que tem por ela, mas com os quais não consegue lidar, dada a sua natureza vulcana.

Já o comediante e co-roteirista inglês Simon Pegg parece ter reservado alguns dos momentos mais divertidos do filme para si mesmo, na pele do engenheiro Montgomery Scott.

Idris Elba, irreconhecível na pele de Krall, o vilão da vez, surpreende e convence.

Entre cenas de ação grandiosas, alucinantes e muita correria, há ainda espaço para uma tocante homenagem ao elenco original. Mesmo quem não é trekkie corre o risco de se emocionar.

Star Trek: Sem Fronteiras estreia no Brasil em  1º de setembro

O repórter viajou a São paulo a convite da Paramount Pictures



Novo filme é senha para Aleph lançar seu primeiro livro da franquia no País

Assim como faz com Star Wars, os livros ambientados no universo de Star Trek passam a ser publicados no Brasil pela Aleph, que aproveita o burburinho entre os fãs com a chegada do novo filme para lançar Portal do Tempo, seu primeiro lançamento da franquia.

Originalmente publicado nos EUA em 1983, Portal não foi escolhido por acaso: trata-se de um dos romances mais bem avaliados  desde a início da publicação de romances da franquia, lá em 1968.

Assinado pela escritora norte-americana A.C. Crispin (1950-2013), Portal tira partido do personagem mais querido da franquia, Spock, ao confronta-lo com uma das mais básicas emoções humanas: a paternidade.

Como os fãs sabem, Spock é um vulcano, raça que aboliu as emoções em favor da lógica.

Há ainda uma questão de viagens no tempo e eventos que fazem referência direta a um episódio  da série clássica dos anos 1960, Todos os Nossos Ontens (All Our Yesterdays), da 3ª temporada  – daí o título original do livro, Yesterday's Son (O Filho de Ontem).

Com este belo romance inaugural, espera-se que a Aleph dê aos livros de Star Trek os mesmo tratamento que tem  dado aos de Star Wars, inundando prateleiras e esvaziando os bolsos dos felizes fãs.

Star Trek: Portal do Tempo / A. C. Crispin / Tradução: Norberto de Paula Lima/ Aleph / 256 p. / R$ 39,90