E eis que nosso repórter especial Zezão Castro surge ontem à noite via telefonema para este rockloquista: "McCoy" (como ele me chama), "fiz uma matéria sobre o show dos Stones, publica lá no blog!" Eu: "sim, claro, Zé, com prazer. Você gostou?", perguntei, já sabendo a resposta. "Pooorrra, man, foi demais ver o velho Keith cantando 'Happy' mais uma vez"... Só aí caiu a ficha: "Você tava lá, maluco?", perguntei, me ajeitando na cadeira. "Tava, bicho. Voltei agora de tarde". "Velho, mande já esse texto pra mim, rápido!"
Rolaram as pedras
por Zezão Castro
As aventuras desta expedição rumo à terceira turnê dos Rolling Stones no Rio de Janeiro começam ainda em Salvador. Vôo partindo às 4, alguns números anotados num papel e a fé indelével de que alguém me atenderia ao chegar lá. De repente vejo Adonai, camarada de outras farras, na mesma fila de embarque, a caminho da casa do irmão, no Humaitá, em Botafogo.
²Minutos depois, após umas micro-algazarra nas alturas, já estamos eu, ele e mais dois camaradas daqui que conhecemos lá em cima, dentro de um táxi falando de cachaça, sinuca... Nascimento, o condutor, dando as dicas do bom e do pior. A primeira pichação que vejo, em tinta preta, num ponto de ônibus diz: "Só Jesus tira Pomba Gira, só Jesus tira Tranca Rua".
O sol já vai se levantando quando chegamos no Humaitá. O anfitrião, Jorge, nos oferta um dilema: duas cachaças mineiras e nos designa para diagnosticar qual a melhor. Mel para melar, violão, gaita e o som do Beggars Banquet, lançado pelos Stones em 1968. São apenas 9 da manhã.
Pela tarde, o amigo carioca Hélcio Pugliese, cenógrafo da Mocidade Independente de Padre Miguel e Caprichosos de Pilares, atende o celular e me permite usufruir de um canto (e que canto...) em sua casa, em Santa Tereza, ao lado da Lapa, comarca de travestis, estudantes, mendigos, traficantes, rockers, cocotas, sambistas, uma Babel com bar de forró, bilhar, som latino. Um maluco toca Cássia Eller, o Rappa, Ed Motta e a rua bomba.
Encontro o camacaense Lucas às 11h40 e o pensamento de ambos é: Copa já! No táxi, uma paraense de 32 anos nos revela: "Ron Wood está ali no Restaurante Aprazível, em Santa Tereza" (uma pausa)," mas não tô nem aí, se ele entrar aqui paga igual a todo mundo", arrematou. Penso em, imediatamente "pedir": meia volta, volver! E fantasio um belo episódio: lá chegando, entraria para jantar (embora só teria grana ali para água mineral), com mais sorte ainda, dois dedos de prosa com o cara... Volto ao mundo e o carro segue na madruga.
Copacabana nos primeiros momentos do sábado tem os famosos calçadões da Bossa Nova infestados por uma horda de loucos, vendedores de cerveja, etno-casais atados pelo euro, outros nem tanto, um coroa de cabelos gomalinados discutia em espanhol com sua acompanhante mais nova (flash de Almodóvar) e mariposas alugam seus vôos por uma onça.
Na frente, a geringonça metálica do palco com a passarela e a língua que move o mundo do rock. Rodas de violões, gente acampada dormindo em colchonete, e uma fila de uns 30 triciclos em frente ao Copacabana Palace em vigília rock.
Para pegar bom lugar foi precisei chegar às 16h30 do sábado, após pegar o metrô lotado da Estação Carioca e saltar na Siqueira Campos. Encontramos uma turma de locais na praia e logo um grupo de 6 pessoas estava em bom bate-papo sentado na areia. Até bolacha de chocolate e vinho circularam na roda. Tranqüilo demais.
O DJ Janot abre a noite com a versão groovada de Eumir Deodato para Also Spracht Zarathustra (1972), depois Barão Vermelho (mais uma dose/é claro que eu tô a fim), Chico Science (Maracatu Atômico), O Rappa, U2 (New Year's Day). O Afrorreggae vem na seqüência. É bem intencionado, com o discurso militante de "um só Rio, galera!", mas achei meio deslocado, papo pra ONG dormir.
Titãs vem lá pela 7 com repertório compacto e a jukebox rock'n'roll afiada com Flores, Homem Primata, Sonífera ilha, cover do Legião em Que país é esse. Muita gente gritando toca Raul e os paulistas mandaram Aluga-se, do Abre-te Sésamo.
PEDRAS NO CAMINHO - Antes mesmo que os Stones pisassem no palco, já se sabia que estavam a caminho pois os flashes pipocavam dos prédios em volta na direção da passarela. Eram mais ou menos 22 horas, palco escuro, quando, simultaneamente, as luzem acendem e o riff de Jumpin' Jack Flash rasga de lá pra cá. "Eta lelê, começou a zorra!" E tome-lhe It's only rock'n' roll, graçolas em portunhês: "alô galera" e a velha escola chuckberryana da dupla Wood-Richards girando a mil.
Darryl Jones no baixo e Charlie Watts bancam os alicerces. Sim, mais uma vez eu via os velhos Stones. Se o vocal já não é mais aquele, "Jeguer" ainda rebola e faz variadas caras e bocas e vai soprando a gaita. Ainda por cima ele fez da ex-modelo Luciana Gimenez, mãe de seu filho Lucas, uma nova Marquesa de Santos no reino do rock'n' roll brazuca. Os caras tão afiados e mandam Oh no, not you again, do novo A bigger bang, melhor que muita coisa que fizeram nos 80.
Estou a 50 metros do palco, atrás da ala vip, revezando palco com telão, rugas e acordes. Wild Horses leva uns poucos isqueiros a se acenderem e mostrou ao carioca onde a Blitz roubou a introdução de um hit. Midnight Rambler, do Let it Bleed - o momento mais bluesy do show. Live with me vem com speed de funcaço, o velho Bobby Keys mostra (bem) a que veio.
Ray Charles foi o homenageado da noite com "The night time is the right time", onde Lisa Fischer, a mesma backing vocal desde '94 (nota do editor: na verdade, desde 1989) faz às vezes de Margie Hendricks, das Raylettes. É o único cover do show.
Richards vai ao vocal em Happy, sobre uma garota libertária a quem pede seu amor para ficar feliz, Ronnie coloca uma guitarra havaiana no colo e faz os solos. A performance é convincente, clássica e embora a voz soe cada vez mais catarrenta, a la Dylan, manda bem.
Jagger volta, com nova roupa. Ron Wood dá uns beijos atrás do palco em uma loura em breve intervalo, vê-se pelo telão. Logo seguem com a disco music Miss You. Start me up (uma das mais festejadas pela galera, fruto de outras turnês por aqui e de uma propaganda de carro).
A chance dos mortais os verem de perto vem em Get off of my cloud, quando um palquinho se desloca. A massa se espreme em direção à direita. Vou na onda e fico uns quatro metros à esquerda de Charlie Watts, vendo a banda tocar pela costas. Em alguns momentos todos se viram para nós, celulares tiram foto. Ao som de Honky Tonk Women, o vagãozinho dá ré.
Só aí pagava o show. Vieram ainda Sympathy for the devil e minutos depois fecharam o show, voltando para o bis com You can't always get what you want. Urros e gritos com o hit Satisfaction, que nunca é demais ouvir de novo, principalmente se são os próprios Stones executando.
Ao fim do concerto de rock as galeras se misturam no vai-e-vem na beira mar, gente de todo canto. Dou um tempo olhando as caravanas e depois pego meu buzú lotado, pagando R$ 2 ao motorista pra saltar pela dianteira, sem registrar. Rio também é Brasil, Se todo mundo tem pegado sua ponta por que logo o motô não ia querer o dele? Sigo enfim, no bagaço, de companhia, só dezenas num ônibus cheirando a mato, suor e areia. Passo nos botecos do caminho, um maluco toca Marinheiro Só. Parto a mil e vou curtir o meu sono realizado mais uma vez. Acho que agora está bom, quatro shows do Stones já dá para ter o que contar aos filhos e netos, se eu chegar lá.
HORA DO ROCK 23.02 - O Hora do Rock desta quinta-feira fala sobre o show do Oasis no Brasil, disco novo do Futureheads, trabalho solo do vocalista do Ash (Tim Wheeler) e o Kaiser Chiefs sagrando-se grande vencedor do Brit Awards. O programa apresenta ainda o som do Pink Floyd, Syd Barrett, Love, Super FurryAnimals, Dogs Die In Hot Cars e PJ Harvey, além da elegância soturna deNick Cave e Leonard Cohen. Para ouvir: toda quinta, às 21h, na 90,1 (Globo FM). Para quem não mora em Salvador: www.gfm.com.br.
Blog (que, nos seus primórdios, entre 2004-05, foi de um programa de rádio) sobre rock e cultura pop. Hoje é o blog de Chico Castro Jr., jornalista formado pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia. Atualmente, é repórter do Caderno 2+ do jornal A Tarde, no qual algumas das matérias vistas aqui foram anteriormente publicadas. Assina a coluna Coletânea, dedicada à música independente baiana. Nossa base é Salvador, Bahia, a cidade do axé, a cidade do terror.
18 comentários:
Castro,
noves fora sua vocação para resenhar showsdosistones, conforme já regitrado por Sora, o que me impressionou de verdade foi saber que você tem amigo, com perdão da má palavra, cenógrafo.
Que porra é esta, Zé? Ainda bem que a Internet não chegou em Camacã, senão, sei não.
obrigado, José.
O debate com Luisão, inciado ontem (segunda) aqui mesmo, continua no fotolog dele, no http://ubbibr.fotolog.com/luisao/.
Quem quiser meter a colher, que se habilite...
Zezão seu fidaputa, mata noís de inveja!!
A pena ferina, o olhar aguçado, o vocabulário rebuscado, a provocação incontida e desabusada, o fino (da notícia) que satisfaz: esse é o grande Franciel Cruz em sua polêmica crônica (ainda) sobre o show dos Stones em Copa. Em uma palavra: imperdível.
http://puraingresia.blogspot.com/
Ainda somos os mesmos e vivemos como o Belchior?
As sociedades ocidentais vivem desde os primórdios da era moderna com esse 'mal da civilização': o medo do tempo. Ou melhor, o medo dos efeitos do tempo. Sobre a saúde, sobre a aparência, sobre a vontade. Narcisistas e individualistas que somos, ao contrário de boa parte das culturas milenares orientais, agarramo-nos ao mito da eterna juventude como náufragos a um pedaço de madeira. Como se a vida fosse possível (ou suportável) em eternas primaveras. A medicina tenta em vão disputar com Deus a nossa finitude e alguns pobres coitados tentam em vão prolongar a adolescência.
Não fosse suficiente todos os vampiros da obsolescência, encastelados em departamentos de criação, que maquinam minuto a minuto qual o nosso próximo desejo e assim mantêm em funcionamento a grande indústria do 'novo', por vezes nos deparamos também com as vítimas do mito de Peter Pan comportando-se com se fossem arautos da eterna juventude e vaticinando, como anjos exterminadores, o que é velho e o que é novo.
Para não tornar isso aqui um ensaio e sair dos contornos do que aqui de discute, fiquemos no rock'n'roll. Mr.Rock, esse jovem senhor de 50 anos, também não tem escapado dos equivocados falastrões do 'novo pelo novo'. Nascido na década da opulência norteamericana, onde os eletrodomésticos de vida útil limitada foram seus maiores símbolos, Mr.Rock foi moldado à imagem e semelhança de James Dean, em Juventude Transviada. Live fast and die young. Beautiful. Acontece que muitos escaparam à sorte de arrebentar um Porsche no primeiro muro ou de atingir a beatitude numa banheira de barbitúricos. E então, o que fazer? Não acreditar em ninguém com mais de 30?
A saída de alguns tem sido olhar a primavera das novas gerações e ali talvez colocar suas frustrações e esperanças. Uma minissaia aqui, um skate e um bermudão ali, uma matinée acolá e...voilá, forever young! Outros Youngs de, cabelos brancos, preferem seguir em frente, no entanto, e criar outro 'novo', esse só possível com o girar da roda do tempo e a experiência acumulada. Existem poucas coisas mais novas no rock do que roqueiros de sessenta anos fazendo boa música. Visceral e necessária. A bigger bang. Um novo patamar.
Basta com a covardia de encarar o tempo. Que também não anda numa linha reta positivista como pensam alguns. É cíclico. Não será com as bravatas dos que já trilharam alguns caminhos que os garotos que descobriram o rock'n'roll ontem farão sua história. Amanhã talvez, se tiverem sorte, se permitirão a viver intensamente. Passarão por um ou dois grandes amores, algumas frustrações, algumas vitórias. Talvez um filho, talvez um grande disco e continuarão a construir novos passos a cada dia. Com 20, 30, 40, 50, 60, 70 anos.
Amadurecer é, num primeiro momento, uma opção mas é, sobretudo, um privilégio. Para poucos.
porra marcos, virou um ensaio.esse lance de conviver com e ter o rock ( enquanto "ideia")como referencia a partir de uma certa idade é um desafio e questionamento constante.mas, what the hell, acho que é minha maldiçao.Frase atribuida a Lester Bags( com algumas modificaçoes):
- Voce nao escolhe o rock, o rock escolhe voce.
Na verdade eu ia postar sobre o podcast de Alexandre Matias direto do Porto Musical(ta vendo Marcos, eu disse PODCAST!)http://badtrip.com.br/vidafodona/category/podcast/, vao la porra!
tb no vida fodona de Matias referencia a Rogerio Big Brother, entre outros, como monstro sagrado do rock independente brazuca.mais do que merecido.
taí, nem me surpreende mais esta débilmentalidade enaltecedora do novo pelo novo. Enquanto isso, a maioria destes novos grupos pagam um pau pros seus velhos ídolos. Eu me refiro aos novos grupos de rock que importa, não os que conheceram a distorção pelo blink 182 e afins...
rapaz, só pq é velho, não quer dizer que é bom tb.
concordo contigo e tals, mas é isso.
rapaz, o aeroporto doisdejulho tá merecendo uma dedetização. uma massa tal qual aquela de gafanhoto do exorcista esperando o u2.
miwki, querida, desculpe se em algum momento transpareceu tal absurdo, mas nem de longe quisemos dizer tal asneira.
bomba h no 2 de julho.
é, cebola. parece que nem todos partilham disso. enfim...
leitura de carnaval e futuras consultas, guarde o link: www.burnbahiaburn.blogspot.com
ou o quê estaria fazendo lá: Radiohead, Ice T, Bachman-Turner Overdrive, Mansum entre outros.
É ler pra saber!
de novo: www.burnbahiaburn.blogspot.com
ué, não entendi essa alegria toda do nosso 007 de plantão, Maxuel Luedy. Acrescenta aí na caderneta secreta que eu tb fui na saída do Ilê, acreditem ( ok, tenho de admitir que a culpa foi de minha namorada). Onde tem putaria estarei presente sempre que possível ( ou suportável ). Ah, sim, quem disse que sentia falta das polêmicas fui eu também. Mas acabou a trégua. Viva o carnaval e sua horda de ninfetas em êxtase, quero é mais...
Verdade, verdade, agente espião é pegar pesado, mesmo q de brincadeira. É que vc falou como se tivesse sido o quarto segredo de Fátima, revelado por mim à vc no carnaval, ai ai. Tenho vergonha disso não, quase todo ano eu caio na bagaça mesmo, não significa muita coisa não, nem pouca pra falar a verdade. De qualquer forma, tenha medo de comentar lá no clashcity não, o ambiente pode parecer hostil mas a gente não morde, vc viu no carnaval...
Urucubaca Blues. Novo texto de Miguel Cordeiro no Clash City Rockers. Confiram.
ainda não li a carta capital, mas gosto da gestão do ministro gil. uma coisa que eu posso realçar d4e bom é a pulverização dos recursos de cultura no país.
exatamente, luedy. a bronca com o ministro vem dai mesmo.
a classe artística do eixão se queixa, com razão, da escassez dos recursos. pra mim, é inadimissível que a verba de cultura seja menor que os gastos de publicidade. mas ações no acre (ele existe mesmo?) existirem, acompanhem no site do ministério, são excelentes que ocorram. claro, não esquecendo dos critérios.
luedy, baby, os cds estão aqui, na hora que tu quiser...
amanhã??
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